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Category — Literatura

Dos descaminhos da melancolia

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No sobe e desce do humor nos últimos dias, ontem foi um dos meus melhores dias. Daqueles dias que a vida é prazerosa, e não um fardo imenso a ser carregado, como acontece em boa parte do tempo. Não sei o motivo (até devo saber, mas não vem ao caso), em algum momento da noite, lembrei-me de Aldous Huxley, mais propriamente de um trecho especial de “O Macaco e a Essência”, meu livro preferido de tudo que já li nesses mais de 15 mil dias como cidadão deste planetinha azul.

A lembrança do tal trecho e, por conseguinte, do livro, me fizeram lembrar uma listinha Top 10 que eu havia organizado alguns anos atrás a pedido de algum site, aquela típica listinha de insônia, em que o prazo se extingue e você acaba listando as coisas que vem a sua cabeça na hora aguardando ansiosamente o momento de apertar o “enviar” do e-mail para se livrar de uma tarefa tão árdua quanto prazerosa – desde quando este prazer passou a ser risco de vida (pesquisar)?

Fato é que em meio a pensamentos perdidos no espaço, voltei para algum dia perdido na última década do século passado, em que, apaixonado por uma garota que morava em outra cidade bem distante da minha, comecei uma incessante troca de cartas que, felizmente, foi reciproca, e rendeu dezenas de momentos especiais – e um coração partido, mas isso não importa. Numa dessas cartas, acho que no aniversário de 19 anos dela, eu fiz uma listinha de 19 várias coisas: músicas, discos, filmes e… livros. Aquela listinha…

Guardo todas as cartas que recebi (muitas) e então fui verificar se, na resposta da garota, ela falava sobre algum livro daquela listinha, e… não (e olha que são cinco páginas… ótimas – risos). E o desejo de rever aquela listinha se instalou porque acredito que aqueles 19 livros ainda são, 17 anos depois, os meus livros preferidos, os livros que me formaram e me fizeram ser quem sou. Os mais importantes. Acho (ou apaixonado acreditava nisso).

Dia desses, numa conversa de bar, alguém perguntou o motivo de eu escrever e manter um site, e eu disse que escrevo para tornar a ideia palpável, real, e guarda-la. Calhou de ter um site e dividir várias ideias, pensamentos e observações acerca do mundo com um monte de gente (que, muitas vezes, não querem pensar, só ler elogios – infelizmente faz parte), mas tudo isso poderia ser um diário, em que escrevo para que o Marcelo, senhor grisalho de idade com óculos pequenos e memória curtíssima, daqui uns 50 anos se lembre de algumas bobagens.

Por isso, sempre procuro dar um passo pra frente, o que gera a questão: se eu já fiz uma lista com 19 livros, por que oras tenho que parar de fazer o que estou fazendo para fazer a mesma lista de novo? Risos idiotas. Ahhh, a melancolia é imensamente traiçoeira. Abaixo replico a lista de 10 livros preferidos de todos os tempos que organizei em 2009 enquanto aproveito para abrir uma brechinha e tentar incluir “A Visita Cruel do Tempo”, de Jennifer Egan, no computo (junto com “O Resto é Ruído”, do Alex Ross, que preciso comprar novamente – dei o meu de presente)… e lembrar de outros.

E aproveitar para guardar as velhas cartas. É incrível como conseguíamos escrever tanto. Era… especial. Saudosismo? Talvez seja. E se for, não importa.

“O Lobo da Estepe”, Hermann Hesse
“O Macaco e a Essência”, Aldous Huxley
“Ciranda de Pedra”, Lygia Fagundes Telles
“O Tempo e o Vento”, Érico Verissimo
“Hamlet”, William Shakespeare
“Cartas a Um Jovem Poeta”, Rainer Maria Rilke
“O Casamento do Céu e do Inferno”, William Blake
“Retrato de Dorian Gray”, Oscar Wilde
“Achei Que Meu Pai Fosse Deus”, organizado por Paul Auster
“As Flores do Mal”, Charles Baudelaire

“A Insustentável Leveza do Ser”, Milan Kundera

Ps. Quando eu ler “Em Busca do Tempo Perdido”, do Proust, que só passei os olhos no primeiro volume quando tinha 19, 20 anos, com certeza um dos dez acima cai.

Leia também:
– As bibliotecas da minha vida (aqui)

setembro 13, 2013   No Comments

Hemingway: A Fome como Boa Disciplina

“Se você não se alimentava bem em Paris, tinha sempre uma fome danada, pois todas as padarias exibiam coisas maravilhosas em suas vitrinas e muitas pessoas comiam ao ar livre, em mesas na calçada, de modo que por toda a parte via comida ou sentia o seu cheiro. Se você abandonou o jornalismo e ninguém nos Estados Unidos se interessa em publicar o que está escrevendo, se é obrigado a mentir em casa, explicando que já almoçara com alguém, o melhor que tem a fazer é passear nos jardins do Luxembourg, onde não via nem cheirava comida, desde a Place de l’Observatoire até a rue de Vaugirard. Poderá sempre entrar no Musée du Luxembourg, onde todos os quadros ficam mais vivos, mais claros e mais belos quando se está com a barriga vazia, roído de fome.

Aprendi a compreender Cézanne muito melhor, a entender realmente como é que pintava suas paisagens quando estava faminto. Costumava perguntar a mim mesmo se ele também tinha passado fome quando pintava, mas imaginava que talvez apenas se tivesse esquecido de comer. Era um daqueles pensamentos doentios mas brilhantes que nos ocorrem quando estamos com falta de sono ou de comida. Mais tarde, bem mais tarde, concluí que Cézanne provavelmente passara fome, mas de maneira diferente.

Depois de ter saído do Luxembourg, você poderia andar pela estreita rue Férou até a Place St. Sulpice sem ver restaurante algum, somente a praça silenciosa, com seus bancos e suas árvores. Havia uma fonte com leões, e pombos andavam nas calçadas ou pousavam nas estátuas dos bispos.

No lado norte da praça ficavam a igreja e lojas que vendiam objetos religiosos e paramentos.

Para além da praça é que não podia prosseguir em direção ao rio sem passar por lojas que vendiam frutas, legumes, vinhos, ou por padarias e pastelarias. Mas, escolhendo cuidadosamente o caminho, conseguiria avançar pela direita, ao redor da igreja de pedra, cinzenta e branca, chegar à rue de l’Odéon e virar de novo à direita em direção à livraria de Sylvia Beach, sem encontrar muitos lugares onde se vendessem coisas de comer. A rue de l’Odéon era desprovida de restaurantes até chegar à praça, onde havia três.

Quando chegasse à rue de l’Odéon, nº 12, a fome estaria contida mas por outro lado, todos os seus sentidos estariam aguçados. As fotografias lhe pareceriam diferentes e descobriria livros que nunca tinha visto antes.”

Do livro “Paris é Uma Festa”,  Ernest Hemingway aos 22 anos

(dica do @rufatto)

agosto 31, 2013   No Comments

Sobre Nick Horby e Alta Fidelidade

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Na onda dos relançamentos dos dois primeiros livros do escritor britânico Nick Hornby, “Febre de Bola” (1992) e “Alta Fidelidade” (1995), o amigo jornalista Thiago Pereira me enviou algumas perguntas para uma reportagem especial que foi publicada no caderno Magazine, do jornal mineiro O Tempo, no domingo passado (04/08), e o texto serviu para resgatar o carinho que tenho por estes livros em particular – e por quase toda obra de Hornby.

Thiago dividiu a reportagem – que conta com a opinião de Christian Schwartz, tradutor dos livros de Hornby, o doutor em história e teoria literária Marcio Serelle, e Leonardo Bertozzi, jornalista da ESPN Brasil, além de mim – em três partes: o texto principal, “Uma sensibilidade pop na literatura”, e dois apêndices, “O texto de Hornby e a questão dos gêneros literários” mais “O futebol no campo das letras”.

Já escrevi bastante sobre Nick Hornby no Scream & Yell, tanto que perdi a conta. Aliás, contei aqui dia desses como “Alta Fidelidade” chegou a mim. Gosto da teoria dos pesos-médios e, sobretudo, de “Um Grande Garoto” (”Como Ser Legal” também, mas um pouco menos). Gostei de “Juliet Naked” e a peça “A Vida é Cheia de Som e Fúria” foi uma experiência espetacular (entrevistei Guilherme Weber na época).

Possivelmente, se você vem com certa frequência a este espaço,  já deve ter lido tanto “Febre de Bola” (não vale a fraca adaptação hollywoodiana “Amor em Jogo” – a versão inglesa com Colin Firh é bem melhor) quanto “Alta Fidelidade” (a versão de Stephen Frears é boa, embora não definitiva), mas caso não tenha lido, fica a recomendação: vale a pena. Muito. Abaixo, as respostas que enviei ao Thiago Pereira.

Quando você conheceu Nick Hornby? O que te chamou a atenção?
Conheci com “Alta Fidelidade”, em 1998, e a primeira coisa que me chamou a atenção foi a união de duas coisas que admiro bastante: relacionamentos e cultura pop. A forma com que Nick Hornby chocava estes dois temas me interessou muito, porque também era uma crítica a um certo esnobismo cultural que circulava – e circula muito ainda hoje – na época. Afinal, como uma pessoal pode ser legal se não conhecer Beatles? (risos). O interessante de Nick Hornby é que ele questiona isso, mas também confere alma ao tal esnobe, permitindo que muita gente se identificasse (e até a pessoal que não conhece Beatles, entendesse esse ser-humano que surgiu junto com Elvis e com a Indústria Cultural).

O que você apontaria como os motivos maiores da obra dele ter chamado tanta a atenção do público- inclusive mobilizando versões para cinema, teatro, etc?
“Alta Fidelidade” é um romance geracional, daqueles que retratam um grupo de pessoas em uma determinada época, neste caso, o decantado fim das lojas de discos (que, no fim, não acabaram, e estão cada vez mais vivas), a valorização de certa honestidade em artistas, a elevação de listas top alguma coisa a categoria de arte e coisas assim. O que você consome diz muito sobre quem você é, e Nick Hornby percebeu isso naquele momento olhando homens que se recusam a envelhecer como manda o figurino. É um belo exemplo de adultescente, que já havia sido antecipado em “Febre de Bola”, e vai ser explorado de forma ainda mais genial em “Um Grande Garoto”.

A chave de entendimento para a obra de Hornby é a conexão com a cultura pop, ou acha ele um grande romancista, acima de tudo?
A conexão com a cultura pop é um dos grandes destaques de boa parte de sua obra, mas há, sim, um grande romancista. Ele usa ferramentas para atingir um grupo x de pessoas, mas são apenas ferramentas. O que move o leitor é sua prosa e história envolventes.

“Alta Fidelidade”, em especial, é um livro que marcou época para uma geração do final dos anos 90, ligada em música. Será que hoje, com a música tão descompartimentada, tão espalhada em diferentes suportes, ele tem o mesmo apelo?
Sim, sem dúvida. E a volta do vinil é um sintoma de que o apelo continua o mesmo, quiça aumentou. A discussão sobre MP3, CDs e vinis tomou outras proporções no novo século. Quando “Alta Fidelidade” foi escrito, as lojas de discos e a própria música pop de qualidade estava em franca decadência. Hoje o cenário está mais estável, e esta estabilidade é fruto de um novo grupo de pessoas que pensa e conversa coisas que poderiam ser dialogadas na loja de Rob Fleming.

Ainda sobre “Alta Fidelidade”: qual a importância do livro para você, pessoalmente? Você também é um pouco Rob Gordon?

Uma jornalista, certa vez, fez a mesma pergunta. Eu respondi: “Devo ter coisas mínimas de vários personagens, mas não acredito que tenha um em especial que me absorva por inteiro. Não sou tão confiante, mas ainda assim sou mais confiante que os personagens dele (risos). Ou ao menos acho…”. E mesmo assim, no abre do texto dela, ela dizia: “Gosto de imaginar o Marcelo como um Rob Gordon tupiniquim”. A questão que fica é: somos o que achamos, ou o que as pessoas acham de nós? (risos). E essa questão é totalmente nickhorbiana. Então eu devo ter um pouco de Nick Hornby sim, mais do que eu gostaria, talvez.

Uma mania em “Alta Fidelidade” são os Top 5. De alguma forma ele materializou uma mania de muitos não? Você usa até hoje né, assumidamente no teu site…Hornby, de alguma forma, é um jornalista de música?

Hornby é um apaixonado por música, e que tem o dom de escrever bem. Isso praticamente o torna um bom crítico, porque a música, pra ele, tem um valor especial, que permite um livro como “31 Canções”. Quantas pessoas no mundo conseguiriam escrever livros sobre canções hoje em dia? O fato de ser atento ao universo pop e apaixonado por música o torna um jornalista de música em potencial, afinal, ele faria mais perguntas pertinentes para Bob Dylan do que a grande maioria dos jornalistas que participou da coletiva em São Francisco, 1965.

Pra fechar: consegue eleger 5 personagens favoritos na obra de Hornby?
1) Will Freeman, de “Um Grande Garoto”
2) Rob Fleming, de “Alta Fidelidade”
3) Duncan, de “Juliete, Nua”
4) Katie Carr, de “Como Ser Legal”
5) Nick Hornby, de “Febre de Bola”

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Leia também:
– “Howdy!”, do Teenage Fanclub, por Nick Hornby (aqui)
– Doce Miséria – A suavização de Nick Cave, por Nick Hornby (aqui)

agosto 10, 2013   No Comments

Download: Livro ‘Cidade Sonora’

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Baixe o livro “Cidade Sonora”, que conta com a participação de Emicida, Romulo Fróes, BNegão e mais 25 artistas. Download aqui

dezembro 31, 2012   No Comments

Download: o livro de André Midani

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Menos de três meses após seu lançamento, o livro “Música, Ídolos e Poder: do vinil ao download”, de André Midani, foi retirado das livrarias por ordem judicial. A família de Enrique Lebendiger, ex-dono da RGE, exigiu que o livro fosse recolhido, pois Midani descreveu Lebendiger como uma “figura exótica que não tinha capacidade nem seriedade profissional para acompanhar a carreira de um profissional do calibre de Chico Buarque”.

A editora Nova Fronteira tentou um acordo com a família de Lebendiger, mas o processo culminou na censura do livro. André Midani, por sua vez, criou um site e disponibilizou gratuitamente “Música, Ídolos e Poder” para download. “Podem ler… Podem baixar… Podem fazer o que quiserem, se quiserem, quando quiserem”, escreveu. O livro foi primeiro disponibilizado por capítulos, mas agora já se encontra em um arquivo único para download.

André Midani é um dos nomes mais importantes da indústria fonográfica brasileira dos anos 60 aos 90. Quando criança, esteve na Normandia em 1945 durante o desembarque das tropas aliadas no famoso “Dia D”. Depois veio ao Brasil, quando começou a trabalhar com música (oficio que ele já seguia em Paris antes de baixar na América do Sul) e se envolveu com a Bossa Nova, com a Tropicália e com os maiores nomes da música brasileira no período.

Uma policial mexicana, de posse de seus documentos, certa vez comentou: “Uma pessoa nascida na Síria, com passaporte brasileiro, que mora em Nova York, que vem de Medelím e passa pelo México, que diz trabalhar com música, e que fala espanhol com sotaque francês… não pode ser uma pessoa confiável!”. Como define Zuenir Ventura na introdução o livro, “Do vinil ao MP3” é uma espécie de Google da MPB moderna.

Download: http://www.andremidani.net/

Ps. Ainda vale citar a grande entrevista que André Midani concedeu à Folha de São Paulo em 2003 falando abertamente sobre jabá e explicando o caso Abril Music, que praticamente sepultou a música brasileira (leia a entrevista na integra aqui). Você, que está terminando a faculdade e precisa de um tema para o seu projeto de conclusão de curso (o TCC), tai uma bola quicando. É só rolar para as redes.

Ps2: em 2015, o livro virou um série imperdível da GNT. É possível assistir online aqui (clientes NET, Now, GVT, Sky, Claro HDTV, Multiplay, Vivo e Globosat)

dezembro 28, 2012   2 Comments

Balanço 2012: 16 livros em 12 meses

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Eu até achava que era mais, mas ainda assim estou feliz. Fazia um bom tempo que eu não lia tanto. Ok, comecei o espetacular “O Resto é Ruído” no meio de outubro de 2011, e só acabei em janeiro (e vou reler um dia!). Dali em diante tudo fluiu. Li os dois livros da Jennifer Egan em questão de semanas (e me apaixonei pelos dois). Gostei muito das conversas de Martin Scorsese com Richard Schinkel e achei que Howard Sounes pegou pesado demais com Paul McCartney (relevando isso, o livro é bom).

Reli Tony Parsons, Rainer Maria Rilke (após visitar o castelo de Duíno, na Itália) e Shakespeare e devorei mais de metade de “A Mesa do Mestre Cervejeiro”, de Garrett Oliver (esse tem que ser com calma). No quesito musical, “Vida”, de Keith Richards, foi o campeão, mas “Mick Jagger”, de Philip Norman, perdeu por pouco. E ainda vou escrever sobre o furacão Banksy, um dos caras que mais admiro no mundo hoje. Eis os 16 livros que me acompanharam em 2012:

– “O Resto é Ruído”, Alex Ross
– “A Visita Cruel do Tempo”, Jennifer Egan
– “O Torreão”, Jennifer Egan
– “Sexo na Lua”, Ben Mezrich
– “Conversas com Scorsese”, Richard Schinkel
– “A Intimidade de Paul McCartney”, Howard Sounes
– “Disparos do Front da Cultura Pop”, Tony Parsons
– “Elegias de Duíno”, Rainer Maria Rilke
– “Comédias”, Shakespeare
– “A Mesa do Mestre Cervejeiro”, Garrett Oliver
– “Vida”, Keith Richards
– “A Deusa do Amor”, Rita Hayworth
– “Autobiografia”, Neil Young & Crazy Horse
– “Guerra e Spray”, Banksy
– “Mick Jagger”, Philip Norman
– “A Ira de Nasi”, Mauro Betting e Alexandre Petillo

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Leia também:
– Sobre Scorsese e filmes que salvam almas, por Mac (aqui)
– Martin Scorsese, eu e a morte, por Marcelo Costa (aqui)
– Keith Richards: Gostar ás vezes é melhor do que amar (aqui)
– Marianne Faithfull: Drogas, Sexo e Mick Jagger (aqui)
– “O minimalismo e o rock and roll”, trecho de “O Resto é Ruído” (aqui)
– Neil Young propõe passeio por seus vícios, paixões e medos (aqui)
– “Disparos do Front da Cultura Pop” é aula de jornalismo cultural (aqui)
– Leia o primeiro capítulo de “Guerra e Spray”, de Banksy (aqui)
– Keith Richards, Rolling Stone Alone (aqui)
– Gram Parsons por Keith Richards no livro “Vida” (aqui)

dezembro 24, 2012   No Comments

Download: Mojo Book Doolittle

Clique na imagem com o botão direito e “salvar como”

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Em janeiro de 2007 escrevi uma história inspirada no disco “Doolittle”, do Pixies. O livro foi disponibilizado para download no site da Mojo Books, e esgotou duas edições de downloads – ficando fora de catálogo. Quem ainda não tinha, pode pega-lo agora aqui. A Mojo é uma editora 100% digital. Sua proposta é simples: Se música fosse literatura, que história contaria? Para ver todos os livros que lançados, clique aqui.

novembro 22, 2012   1 Comment

Gostar ás vezes é melhor do que amar

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 “O que resta pra você fazer numa idade em que a maioria da população adolescente de todos os lugares decidiu que você é o cara? A oferta era incrível. Seis meses antes eu não achava ninguém para transar – tinha de pagar, se quisesse muito.

Uma hora não existe mulher nenhuma para mim no mundo. Não tem jeito, elas só ficam no ‘bla bla bla bla’. No instante seguinte, ficam rodeando você sem parar. E então você fica: uau! Quando troquei o desodorante, as coisas definitivamente melhoraram. Então é isso que elas querem? Fama? Dinheiro? Ou é pra valer? E, claro, como você nunca teve chance com mulheres bonitas, começa a ficar desconfiado.

Fui salvo mais vezes por mulheres do que por homens. Às vezes, só um leve abraço e um beijinho, sem mais nada. Só me mantenha aquecido por essa noite, só um segurando a onda do outro enquanto as coisas estão difíceis, quando está tudo uma dureza. E eu digo: “Porra, por que você está se importando comigo quando sabe muito bem que sou um filho da puta e amanhã vou dar no pé?”. “Não sei. Acho que vale a pena”, ela diz. “Bom, não vou ficar discutindo”. A primeira vez que isso rolou foi com uma turma de mocinhas inglesas em algum lugar no Norte, naquela nossa primeira turnê (1961/1962). Depois do show você vai para o bar ou para um pub, e do nada acaba no quarto do hotel com uma garota muito, muito legal, que está indo fazer faculdade em Sheffield, estudar Sociologia e sei lá o que, e que decidiu ser especialmente legal com você. “Achei que você fosse uma moça esperta. Eu sou guitarrista. Só estou de passagem”. E ela diz: “É, só que eu gosto de você”. Gostar ás vezes é melhor do que amar.

No final dos anos 50, os adolescentes eram o novo mercado visado pela publicidade. Teenager é um termo inventado pela publicidade, uma expressão bem calculista. Ao chama-los de teenagers foi criado todo um movimento entre os adolescentes, uma espécie de autoconsciência, que originou um mercado não só para roupas e cosméticos, mas também para música e literatura e tudo mais. Essa faixa etária acabou sendo etiquetada à parte. E houve uma verdadeira explosão, um lote inteiro de púberes quebrando a casca do ovo e brotando naquela época. Beatlemania e Stonemania. Aquelas eram justamente as meninas que estavam morrendo de vontade de viver alguma outra coisa. Quatro ou cinco sujeitos magrelos ofereceram a válvula de escape, mas elas a teriam encontrado em qualquer outro lugar.

Nunca me esqueço do poder das adolescentes de treze, catorze, quinze anos, quando elas estão em bando. Elas quase me mataram. Nunca senti tanto medo de perder a vida como quando me vi cercado por adolescentes. Elas me esganaram, me rasgaram as roupas, a carne, e quando o bando entra nesse nível de frenesi, é difícil descrever, expressar o quanto é aterrorizante. Os policias fugindo apavorados, e então resta só você diante da carnificina que essas emoções descontroladas podem causar. Acho que foi em Middlesbrought. Eu não conseguia entrar no carro. Eu tentava entrar e aquelas malditas me arrancavam os pedaços. O problema é que quando pegam você, não sabem o que fazer. Quase me estrangularam com um colar, uma ficou agarrada nele de um lado, a outra puxando o colar do outro, “Keith, Keith”, e enquanto isso me esmagavam. O motorista entrou em pânico. O resto dos caras já tinha entrado no carro e ele simplesmente decidiu que não estava a fim de esperar. Fiquei ali, sozinho no meio daquela aldeia de hienas desvairadas. A próxima coisa que me lembro é de que acordei num beco perto da porta de acesso ao palco, porque evidentemente os policiais tinham tirado as pessoas. Eu tinha desmaiado por sufocação. Elas todas estavam em cima de mim: “O que vocês querem de mim agora que me pegaram?”.

Lembro de uma cena de contato real com essas meninas, um momento completamente inesperado, uma vinheta. O céu está carregado, dia de folga! Subitamente despenca uma tempestade. Do lado de fora do hotel vejo três fãs das mais fanáticas. O penteado bufante delas está sucumbindo sob a força das águas, mas elas não saem de lá. O que o pobre músico pode fazer? “Entrem aqui, meninas”. Meu cubículo está agora entupido com três garotas encharcadas. Elas soltam vapor, tremem. Ensopam meu quarto. O penteado das três, um desastre. Elas estão tremendo por causa da tempestade e porque estão no quarto de seu ídolo. Reina a confusão. Uma coisa é tocar do palco para elas, outra é ficar cara a cara. Toalhas se tornam uma coisa muito importante, assim como o banheiro. Elas fazem uma precária tentativa de se ressuscitar. Todos nervosos, tremenda tensão. Eu lhes ofereço café temperado com bourbon, mas não há nem vestígio de sexo no ar. Ficamos sentados conversando e rindo, até o céu limpar. Eu chamo um taxi para elas. Despedimo-nos como amigos.”

Trecho de “Vida”, autobiografia imperdível de Keith Richards lançada no Brasil pela Editora Globo (mais infos aqui)

agosto 2, 2012   No Comments

A intimidade de Paul McCartney

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Terminei ontem o meu sexto livro de 2012. “A Intimidade de Paul McCartney”, de Howard Sounes, se junta à listinha que já tem “O Resto é Ruído”, do Alex Ross, “A Visita Cruel do Tempo” e “O Torreão”, de, Jennifer Egan, “Sexo na Lua”, de Ben Mezrich e “Conversas com Scorsese”, de Richard Schinkel (além da releitura do primeiro volume de comédias de Shakespeare). 2012 está rendendo, ao menos para leitura.

Gostei bastante de “A Intimidade de Paul McCartney”. Já tinha aprovado a prosa rápida de Howard Sounes na ótima “Bob Dylan, A Biografia”, e nesta versão beatle, o jornalista vai muito além dos outros livros que pretendem rememorar os fab four. Claro, há bastante pimenta e fofoca de bastidores no livro, além do julgamento de Sounes ser bem pesado com Paul McCartney, embora ele tente relevar isso nos agradecimentos.

“Eu não tinha a intenção de critica-lo nem glorifica-lo excessivamente em sua carreira”, argumenta o jornalista. “Tentei contar a história épica de sua vida de modo verdadeiro e justo”, contemporiza. A justiça, porém, é diferente para cada pessoa, e Sounes pesa a mão em diversos momentos, como por exemplo quando esculacha (com certa razão e raríssimas exceções) quase toda produção musical solo do ex-beatle.

“A Intimidade de Paul McCartney” é um livro para ser lido com bastante cuidado, porém, tem muitos méritos. Traz histórias interessantes dos tempos dos Beatles que foram vetadas tanto na biografia (chapa branca) de Paul, “Many Years From Now”, de Barry Miles, tanto quanto no “Anthology”, mas seu maior mérito é dividir a vida de McCartney em duas fases: Beatles e carreira solo (o Paul pós Beatles é praticamente ignorado em “Many Years From Now”).

Sounes baixa a guarda com respeito (e chega a emocionar, embora solte uma ou outra farpa nas entrelinhas) no capítulo que relembra a morte de Linda e esmiúça o trágico casamento com Heather Mills, com a facilidade do acesso público aos documentos do divórcio, 68 páginas que escancaravam a vida de Paul (listando todas as suas propriedades, todo seu dinheiro e cenas do cotidiano do ex-beatle que viraram festa nos tabloides ingleses).

Fãs até devem ficar ofendidos com a pena afiada de Sounes (que pega pesado em algumas comparações com Dylan, por exemplo, quando diz que Bob, “no melhor de seus momentos, é um homem profundo, enquanto Paul, no melhor, é apenas um bom compositor – e um letrista medíocre”, ou quando esmiúça a fixação por Paul em viver do passado e continuar tocando as canções do mesmo modo de 50 anos atrás nos shows atuais, enquanto Dylan opta por recriar seu repertório toda noite), mas o saldo é bastante positivo.

Abaixo, um dos trechos hilários do livro, que, de certo modo, exibe o poder de sedução de Paul McCartney (como se suas canções já não bastassem pra isso)…

“Paul não divulgou suas experiências com a cocaína e a heroína à imprensa em 1967, isso aconteceu 30 anos depois. O pouco que ele relatou sobre ter usado LSD causou polêmica suficiente em uma época na qual os jornais estavam cheios de matérias sobre astros pop e pessoas próximas a eles presos por uso de drogas. Um amigo fotógrafo dos Beatles, John ‘Hoppy’ Hopkins, foi preso por posse de maconha no dia em que ‘Sgt Peppers’ foi lançado. Além disso, a batida policial na casa de campo de Keith Richards levou Robert Fraser, Keith e Mick Jagger a sentenças de 6, 12 e 3 meses de prisão, respectivamente. Os Stones foram soltos mediante fiança em poucos dias, esperando o julgamento do recurso, mas Fraser cumpriu quatro meses. Embora a intelligentsia considerasse as sentenças injustas, o editor do Times escreveu um elogiado editorial que ajudou os Stones a ganhar o recurso – havia uma sensação de que a policia, mancomunada com os tabloides, estava em busca do maior prêmio de todos: prender um beatle. A confissão sobre o LSD de Paul causou estranheza em John, George e Ringo, que se viram assunto de escrutínio indesejado sobre o uso de drogas, com a ironia de que Paul fora o último entre eles a experimentar ácido. ‘Pareceu estranho para mim’, comentou George anos depois para o documentário ‘Anthology’, “porque estávamos tentando fazê-lo tomar LSD havia mais ou menos um ano e meio – e um belo dia lá estava ele na televisão falando sobre isso”. Com essa declaração, George pareceu sugerir que Paul desejava atenção.

Em Liverpool, os McCartney ficaram preocupados com a noticia de que o membro famoso da família estava usando drogas. Tia Ginny convocou uma reunião de família para discutir a situação, o que a levou ao sul para resolver tudo pessoalmente com o sobrinho. ‘Então ela foi à Londres ficar com Paul’, conta o parente Mike Robbins. ‘Cerca de cinco ou seis dias depois ela voltou, e todos nos reunimos – eu vou lembrar disso para sempre – em sua pequena casa em Mersey View. A família perguntou se Ginny conseguira vê-lo, e a senhora de 57 anos tirou um baseado da bolsa de mão e perguntou, de maneira sonhadora: ‘Vocês já experimentaram um desses?’. A parentada acendeu e fumou a erva. ‘Rimos feitos uns doidos’, revela Mike. ‘Essa era a Tia Ginny’”.

E esse era Paul McCartney. Muito prazer.

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Paul McCartney na Ilha de Wight / Foto: Marcelo Costa

Leia também:
– Sobre Scorsese e filmes que salvam almas, por Mac (aqui)
– Martin Scorsese, eu e a morte, por Marcelo Costa (aqui)
– Jennifer Egan manipula o leitor em “O Torreão”, por Mac (aqui)
– “Sexo na Lua”, de Mezrich: sem a sorte de Zuckerberg, por Mac (aqui)
– “O minimalismo e o rock and roll”, trecho de “O Resto é Ruído” (aqui)

julho 19, 2012   No Comments

Grandes pausas do rock and roll

O vídeo abaixo é autoexplicativo, porém vale dizer que é um capítulo de “A Visita Cruel do Tempo”, grande livro da escritora Jennifer Egan. O blog da editora Intrinseca preparou outras derivações interessantes do livro, como uma mixtape para o personagem Bennie Salazar (uma aula de punk rock) que pode ser baixada aqui, alguns extras muito interessantes do livro aqui e uma lista com alguns dos livros preferidos da escritora aqui. Ela chega ao Brasil para a FLIP 2012, que começa hoje.

julho 4, 2012   No Comments