texto de Renan Augusto Dias
fotos de Camila Cara
Em 2007, surfando na gigantesca onda que foi o movimento emo, era lançado “Misery Business”, o primeiro grande hit do Paramore. De lá pra cá lá se vão 16 anos e diversas formações e vertentes da banda além de cortes e cores de cabelo da vocalista. Apesar de mutável (muitas vezes em demasia), o Paramore sempre soou datado. Depois de um hiato razoável, carreiras solos e um último disco cheio de novas referências para seus fãs e velhas referências para eles mesmos, é possível constatar: a passagem do tempo só fez bem ao Paramore.
A vocalista Hayley Williams subiu ao palco do Centro Esportivo Tietê no último domingo, dia 12 de março, com uma camisa dos Talking Heads. A banda novaiorquina é clara influência em “This is Why”, trabalho mais recente do trio, lançado em 2023 e que tem sido o maior contribuinte para o setlist da turnê sul-americana. E mesmo com a fã base completamente calçada na nostalgia dos primeiros trabalhos da banda que já foi considerada parte do movimento emo, as novidades deram o tom que tornou o show atemporal.
A fila quilométrica que percorria toda a avenida Santos Dumont foi vítima da inflação natural que as capas de chuva sofreram quando as primeiras gotas caíram. Porém, se mantiveram inabaláveis, mesmo depois da garoa se tornar um temporal. O Paramore ainda é um fenômeno midiático, daqueles de terem fãs insanos, mesmo depois de 10 anos da sua última aparição em terras brasileiras. As faixinhas na testa não deixam mentir. Os portões abriram pontualmente, e as grades foram tomadas sem demora. A pista premium, que era tão grande a ponto de parecer folgada, foi preenchida com mais calma.
Com 10 minutos de antecedência, a simpática Elke tomou o palco. Gigantesca, tanto em tamanho quanto em potência vocal e performance, Elke parecia muito realizada em ter conseguido tantos fãs “de tabela”. O público abraçou a atração de abertura, a ponto de cantar refrões. Talvez não apenas pelo fato da cantora ser namorada do baterista Zac Farro, um dos fundadores do Paramore, que deixou a banda em 2010 para retornar em 2017, mas sim pois ela realmente expressa uma energia muito pulsante, e tem boas músicas. Até o mashup de “Águas de Março” com “Mr. Brightside” ficou interessante, apesar de destoar bastante do resto de suas canções.
Já o Paramore foi pontual, e abriu o segundo dia de shows em São Paulo com a mesma música que vem usando durante toda tour, a impactante “You First”, do último álbum – a única do novo disco que está nos shows e (ainda) não foi usada como música de trabalho. E, mesmo assim, cantada a plenos pulmões pelo público, mostrando que o jogo já estava ganho. “That’s What You Get”, por sua vez, recebeu gritos efusivos e lágrimas logo após o soar do primeiro acorde – o público estava fácil, mas haviam predileções. Tanto que os pedidos incessantes por “Decode” percorreram todo o show. Pedido atendido, no ‘bis’, provocando uma catarse, muito provavelmente por essa que talvez seja o maior sucesso da banda não estar garantida no repertório, e que sequer foi executada na noite anterior.
Aliás, a banda promoveu diversas surpresas em comparação ao primeiro show: não tocaram a dançante “Pool”, que marcou presença na primeira apresentação, e surpreenderam com “Told You So” e” Crazy Girl”, além da própria “Decode”. Talvez tentando compensar o que alguns julgaram passível de vaias: uma confusão entre fãs, que deixou o grupo confuso com a reação do público. No domingo, não deram espaço para falhas, e sim para longos discursos de amor ao país e salientar que todos eram “uma grande e disfuncional família”, nas palavras da própria Hayley.
E além de promover e comemorar o retorno do baterista Zac Farro, o colocando no front para cantar uma música do seu projeto HalfNoise, Hayley estava falante e afim de diálogos mais próximos. Por vezes falou diretamente com fãs na grade, como quando disse para uma garota que gostou da camisa dela, com uma antiga estampa da própria banda. Pediu uma espécie de performance quando tocaram “Ces’t Comme Ça”, canção do novo álbum com trechos em francês (lembram da camisa dos Talking Heads?) e caiu enquanto corria de um lado pro outro, rindo da situação posteriormente.
A banda envelheceu bem, e seus dois últimos trabalhos confirmam a tese. No palco, mesmo desmembrada em comparação com suas primeiras versões, soam dinâmicos e competentes. Até mesmo os “músicos de apoio” tem, além de destaques nas canções em si, uma energia contagiante. Até porque, deve ficar difícil segurar a empolgação em meio a um caloroso público de meia idade que, naquele momento, voltou a ser adolescente. Nada mais justo. O que o Paramore entregou esse final de semana foi muito melhor do que entregaram 10 anos atrás. Somando toda essa autoridade do ao vivo ao bom gosto estético e sonoro do último disco, que não foi tão bem aceito pelo público mais conservador (que ainda assim marcou presença no show), o Paramore se consolida como uma das grandes bandas de rock que sobreviveu ao seu auge e hoje usam a inteligência para fazer a manutenção do seu legado.
– Renan Augusto Dias (@renanaugusto.dias) é baterista da banda Tropicadelia
Excelente texto! É incrível como a banda continua cativante nos palcos
Tenho certo ranço com questões que levantam coisas como “público de meia idade”. Lembro de um cara que escreveu sobre um show do midnight oil nesse espaço criticando os “tiozoes” que queriam ouvir blue sky mining, por exemplo.
O cara em questão fui eu, Ismael. Mas honestamente, queria entender qual o seu ranço com a expressão.
Eu sou um cara de meia idade, mais perto dos 50 que dos 40. O uso da expressão não me incomoda, acho que ela apenas caracteriza uma faixa etária do público. O que eu critiquei no show do Oil não foi a idade do público, e sim a postura desrespeitosa diante de qualquer canção que não eram os três hits radiofônicos que a banda teve no Brasil.