Texto e fotos por Marcelo Costa
Nos dias 12 e 13 de março, o Autódromo de Interlagos recebeu a quinta edição do festival Lollapalooza Brasil, e se a escalação, sem veteranos e com poucos nomes de impacto dentro do showbusiness mundial, arriscava afastar o público, o que se viu em dois dias de festival foi o contrário, com cerca de 160 mil pessoas marcando presença no evento, que começa a criar uma chancela parecida com a do Rock in Rio: não importa o artista que está no palco, importa que você esteja lá. Se esse fato tornar-se evidente, o Lolla Brasil pode, com esperteza, arriscar em grandes pequenos shows no futuro, visando surpreender o espectador. Mas melhor deixar o futuro para o final do texto e resumir o fim de semana de boa música no autódromo.
No sábado, a tarefa de abrir o festival era do Ego Kill Talent, às 12h, mas quem pedia atenção praticamente no mesmo momento era o The Baggios, velho conhecido do Scream & Yell. O duo sergipano viu o palco apagar assim que começou a passagem de som, mas o drama acabou revertendo-se em ponto positivo. Com 40 minutos de atraso, o duo viu o público crescer e assim que os bons riffs de Julio Andrade (guitarra e voz) e as pancadas de Gabriel Carvalho (bateria) ecoaram no Autódromo, o festival havia realmente começado. Convertido em trio, com a entrada do tecladista Rafael Ramos nas duas músicas novas apresentadas, o The Baggios continuo garantindo boa diversão rock’n’roll – mesmo pra quem não conhecia.
O quarteto californiano Vintage Trouble não se intimidou com um solzão porreta das 14h e mandou uma apresentação poderosa. Suando a ponto de encher uma represa, o vocalista Ty Taylor não abriu mão do terninho e dos trejeitos a James Brown, contagiando quem não conhecia a banda. Baita show. Dali para o Eagles of Death Metal foi uma caminhada de quase meia hora para ouvir o presepeiro defensor de porte de armas Jesse Hughes e sua banda mequetrefe, mas o show tem seus momentos bons e ruins – como toda piada (dependendo de quem conta/canta). Não precisavam assassinar Duran Duran, mas tem gente que acha graça.
O posto de grande show do sábado foi do Bad Religion, colocando o Eagles e o resto no chinelo (e olha que Jesse e sua turma assistiram ao show do Bad Religion da coxia – quem sabe aprendem algo). Foram nada menos que 24 canções e uma hora de porrada conscientizadora. Ao vivo, o Bad Religion soa como uma lição de moral de dedo em riste, mas a vantagem é que você pode pogar enquanto ouve a banda discursar sobre capitalismo, religião e punk rock. Com o acréscimo de Jamie Miller, ex-baterista do grande Trail of Dead, e canções de praticamente todas as fases da banda, o Bad Religion executou um dos shows emblemáticos desta edição do Lolla. Palmas.
De um show energético para um show soporífero. Defendendo seu elogiado “Currents”, terceiro melhor disco de 2015 segundo o júri convidado do Scream & Yell, o Tame Impala encharcou a sonoridade dos discos anteriores no lodo de pedais e tecladeiras que marcam o disco mais recente, e os fãs não arredaram o pé, entrando na vibe psicodélica da banda. Após perder Of Monsters and Men e Cold War Kids para o cansaço nos joelhos, e sem nenhuma paciência para o Mumford & Sons (que começaram a carreira limando as arestas do folk tradicional para as massas e agora encaram uma fase Coldplay para estádios) e a vibe Xuxa da Marina & The Diamonds, restou fechar a noite com a putaria doidona do Die Antwoord, mais dançante e menos pesado, mas ainda assim bastante divertido.
No domingo, a farra toda começou relaxante com o bom show dos guris da Dingo Bells, que trouxeram trio de metais para o palco e mostraram ótimos para as canções do elogiado “Maravilhas da Vida Moderna”. Também responsável por outro grande álbum de 2015 (presente na lista dos melhores de 2015 do Scream, & Yell), a Maglore carregou um público excelente para o palco do fim do mundo do festival, e a galera cantou junto e saudou a entrada de Hélio Flanders, do Vanguart. O melhor dos Strokes solo, com um riffzinho de guitarra à frente de Fabrizio Moretti, Albert Hammond Jr. fez uma apresentação honesta e totalmente rock’n’roll, sem os estrelismos que marcam sua banda famosa. Foi bacana.
Melhor show disparado do festival, o Alabama Shakes arrastou uma multidão para o palco do fim do mundo, que viu uma Brittany Howard ensandecida comandando uma banda dedicada à música, sem estripulias, maneirismos ou jogos de cena, apenas boas canções executas de forma primorosa. Um público imenso em um final de tarde gracioso (remetendo ao show do Johnny Marr neste mesmo palco em 2014) ouvindo uma banda poderosa vivendo seus melhores anos e fazendo seus melhores shows ao chocar o repertório caprichado de seus dois únicos discos de estúdio. Brittany e cia fizeram desde já um dos grandes shows do ano.
Seria impossível Noel Gallagher superar o Alabama Shakes e, na verdade, ele tá pouco se fodendo pra comparações de melhor ou pior: o lance dele é chegar, tocar suas canções solo que soam rascunhos de velhas canções do Oasis (que soavam rascunhos de tanta gente) e emocionar o público com números que, mesmo sem a voz de Liam, trazem lágrimas aos olhos. Um show com “Wonderwall”, “Digsy’s Dinner”, “Don’t Look Back in Anger” e “The Death of You and Me” já é, no mínimo, nota 7, mas essa versão mezzo acústica de “Champagne Supernova” é uma das melhores coisas que Noel vem fazendo ao vivo em sua carreira solo. De resto, perdemos no lado B em relação a concorrência (ganhamos “Listen Up” enquanto a Colômbia ouviu “Half the World Away” e o México, num show completo, “Fade Away”, “The Masterplan” e, mamma mia, “Sad Song”), mas ainda assim todo mundo saiu sorrindo.
Havia Jack Ü no tal palco do fim do mundo (e me arrependi de não ter ido), Jungle no outro lado e Emicida no palco eletrônico, e mais uma vez cedi ao rapper paulistano, responsável por um dos melhores shows nacionais da atualidade, e aqui, novamente, botando pressão e mandando ver nas boas ideias. Consegui escapar da Florence + The Machine (mas, ok, pra não dizer que não gostei de nada dela, pela TV, o vestido era bem bonito) e pegar o trem praticamente vazio com mais alguns companheiros desistindo da maratona antes do final oficial, mas felizes pelo fim de semana musical.
Difícil prever o futuro do Lollapalooza Brasil, mas o festival cada vez mais parece andar no trilho certo, com ótima oferta de comida, muitos caixas, banheiros e limpeza constante. O line up é algo a se destacar: pelo desenhado neste ano, a curadoria do Lolla Brasil tem a oportunidade de trazer alguns grandes nomes para 2016 e rechear a programação com dezenas de bandas que valem realmente a pena, entregando ao público um pouco mais do que apenas entretenimento. Fixo no calendário dos festivais nacionais, o Lollapalooza Brasil parece abrir caminho para um amadurecimento que, se feito totalmente ao contrário do Rock in Rio, pode vir a dar bons frutos para a música e o showbusiness brasileiro. Dedos cruzados e vamos torcer.
– Marcelo Costa (@screamyell) é editor do Scream & Yell e assina a Calmantes com Champagne
– Fotos por Marcelo Costa, exceção a foto de Noel Gallagher, por I Hate Flash / Divulgação
Leia mais
– Balanço: O melhor do Lollapalooza Brasil 2014, por Bruno Capelas (aqui)
– Balanço: O melhor do Lollapalooza Brasil 2013, por Marcelo Costa (aqui)
– Balanço: O melhor do Lollapalooza Brasil 2012, por Marcelo Costa (aqui)
Bad Religion matou a pau, curti o Alabama mais pelo vocal, a banda pareia meio cansada, Noel não veria nem se fosse com o Oasis. No domingo faltou falar do Seed e do 21 pilots , apesar de ser apenas uma dupla foi um dos shows mais animados do festival, os caras arrebentaram. Eminem e Planet Hemp não interessou vocês? Queria ver algum comentário sobre esses shows.
Não interessou.
Na minha modesta opinião, acho que esse é o único problema dos festivais com shows no mesmo horário…em qual eu vou???
É que tem uma lógica de não superlotar um palco. O Pearl Jam no Lolla foi terrível porque tava todo mundo ali só pra ver eles. Pra evitar tumulto (e mesmo riscos), eles fazem isso pra dividir a galera. Dói sim, mas é por um bom motivo.