Texto e fotos por Marcelo Costa
Demorou, mas o Brasil finalmente acertou as contas com o Hüsker Dü, uma das principais bandas independentes do cenário norte-americano dos anos 80. A primeira parte do acerto foi em setembro, quando Grant Hart, ex-baterista, vocalista e um dos compositores da banda, tocou 15 canções do Hüsker Dü em sua passagem por São Paulo (entre elas, os hinos “Don’t Want to Know If You Are Lonely” e “She Floated Away”). Em outubro, em três datas (duas em São Paulo, uma no Rio), Bob Mould, guitarra, voz e também canções da banda, tocou mais uma dúzia de números do Dü e, de quebra, uma boa leva de músicas do Sugar para alegria geral.
Se apenas 200 pessoas se animaram a ir ao centro de São Paulo num domingo à tarde para conferir a apresentação emocional de Grant Hart, voz e guitarra, em setembro (um show gratuito que não lotou os 300 lugares disponíveis), os cerca de 1600 ingressos (800 por noite) custando R$ 30 (R$ 15 a meia) para ver Bob Mould evaporaram em 24 horas – ele veio acompanhado de Jason Narducy (baixo) e Jon Wurster (bateria), dupla que além de formar a cozinha do Superchunk, gravou com Bob o excelente “Silver Age” (2012), álbum que apareceu em diversas listas de melhores do ano passado, e serviu para recolocar Bob Mould em evidência.
E o power trio não brinca em serviço. Nos dois shows em São Paulo, o guitarrista abriu a noite com nada menos que as cinco primeiras faixas de “Copper Blue”, que, segundo ele em entrevista ao Scream & Yell, foi de longe seu disco com mais visibilidade e o que mais vendeu. Sem tempo para descanso, o trio eliminou a melodia e encavalou “The Act We Act”, “A Good Idea”, “Changes”, “Helpless” e “Hoover Dam” em versões punk pop esporrentas, sujas e barulhentas num dos sons mais altos que a Choperia do Sesc Pompeia deve ter presenciado em sua longa história. Nada de firulas, apenas baixo, bateria, guitarra, voz e grandes canções.
O fim do set “Copper Blue” é o momento em que Bob Mould interage com a plateia. Na sexta, ele puxou a orelha de quem estava levantando câmeras e celulares: “A primeira vez que vi Buzzcocks, eu tinha 17 anos e fiquei de olho nos caras. Aproveitem o momento. Aproveitem a música”, ordenou o senhor de 52 anos, cabelos grisalhos e um pique de moleque. Na sequencia veio o set “Silver Age”, mais bem definido sonoramente, e tão barulhento quanto o set anterior, com a dobradinha “Steam Of Hercules” / “Come Around” marcaando a guinada para o momento punk psicodélico da noite, um descanso antes da selvageria do terceiro bloco do show.
Porque assim que começam os acordes de “Hardly Getting Over It”, presente no álbum “Candy Apple Grey” (1986), penúltimo disco de estúdio lançado pelo Hüsker Dü, os fãs do barulho se amontoam no gargarejo se preparando para uma memorável noite de pogo e stage dives como a Choperia do Sesc Pompeia não devia ver desde o começo do fim do mundo. “I Apologize”, “Chartered Trips”, “Something I Learned Today”, “Could You Be The One?”, “Hate Paper Doll”, “Flip Your Wig” e, principalmente, “Celebrated Summer” incendiam o lugar tanto quanto arrancam sorrisos emocionados de grande parte dos presentes (incluindo a banda).
No palco, quase todo tempo iluminado com luz fixa, sem ornamentos, decoração ou algo que distraísse a atenção do público, o trio dava o recado munido apenas de canções, histórias, três acordes e uma visível empolgação com a enorme festa. Nas duas noites paulistas, o bis foi aberto com a baladinha “If I Can’t Change Your Mind” (do Sugar) em versão acelerada e o show acabou com uma “Makes No Sense At All” (do Hüsker Dü) gritada em coro pelos presentes, encerrando uma das noites de rock’n roll mais divertidas na capital paulista em 2013. Demorou, mas o Hüsker Dü (e o Sugar) finalmente chegou ao Brasil. E não decepcionou. Que voltem muito mais vezes.
– Marcelo Costa (@screamyell) é editor do Scream & Yell e assina a Calmantes com Champagne
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Os dois shows em São Paulo foram lindos. Barulho sim, e pura emoção por trás. E o melhor: no final, o Bob Mould ficou um tempo tirando fotos e assinando discos para os fãs 😀