Três filmes: “Harold e o Lápis Mágico”, “Aquele Natal”, “Robô Selvagem”

textos de Marcelo Costa

“Harold e o Lápis Mágico”, de Carlos Saldanha (2024)
Um jovem garoto chamado Harold vive dentro de um livro com um giz de cera mágico (e roxo) que pode fazer absolutamente qualquer coisa ganhar vida, incluindo um avião, hélices, e, claro, seus amigos Moose e Porcupine, com quem ele passa o tempo entre as páginas do livro. “Inevitavelmente”, Harold cresce e, de repente, percebe que o narrador de sua história desapareceu. A solução? Utilizar seu giz de cera mágico para criar uma porta e adentrar o mundo real para tentar localizar o amigo. Com tema metalinguístico utilizado diversas vezes nas artes, “Harold and the Purple Crayon” (título original do livro infantil de Crockett Johnson lançado em 1955) tinha um potencial bastante amplo, afinal, o personagem central podia criar absolutamente qualquer coisa, mas o roteiro escrito por David Guion e Michael Handelman é completamente deficiente, pecando tanto em verossimilhança (ok, é um filme infantil sobre um giz que pode desenhar qualquer coisa que o personagem possa imaginar, mas daí a uma jovem mãe – vivida por Zooey Deschanel – com seu filho pequeno abrigarem dois marmanjos que acabaram de atropel… ops, conhecer, em sua casa por uma noite é forçar muito a barra) quanto em fluência da história (a trama paralela que flagra um bibliotecário com jeitão de vilão que é apaixonado pela mamãe Zooey é tão ruim, mas tão ruim, que chega a ser engraçada), o que felizmente repercutiu nas bilheterias, tornando “Harold e o Lápis Mágico” um dos grandes fracassos da temporada (custou US$ 40 milhões, arrecadou US$ 32 milhões). De certo modo, “Harold e o Lápis Mágico” remete a “Amigos Imaginários” (2023), de John Krasinski, na junção da animação com pessoas reais, sendo que ambos os filmes tinham um amplo território criativo para explorar, e (ainda que reservem alguns bons momentos na história) falharam miseravelmente em seu intento. Assista como forma de descanso para o cérebro.

Nota: 4


“Aquele Natal”, de Simon Otto (2024)
Sabe o que comédias românticas de sucesso como “Quatro Casamentos e um Funeral” (1994), “Um Lugar Chamado Notting Hill “(1999), “O Diário de Bridget Jones” (2001), “Simplesmente Amor” (2003) e “Yesterday” (2019) tem em comum com a animação natalina – disponível na Netflix – “That Christmas” (no original)? Todos foram escritos por Richard Curtis. No caso deste último, “Aquele Natal” compila pequenas histórias presentes na trilogia de livros “That Christmas”, “The Empty Stocking” e “Snow Day”, de Curtis com arte de Rebecca Cobb, para contar sobre um conturbado natal na pequena cidade costeira de Wellington-on-Sea, na Inglaterra, e a classificação de recomendação para crianças a partir de 10 anos adianta, de certa forma, o tom “provocativo” do filme, que inicia com uma peça escolar feminista chamada “As Três Rainhas Magas”, dirigida pela adolescente Bernardete, que introduz a história dizendo aos pais presentes que “Jesus era descolado. Barba, cabelão, era marceneiro, bem hipsterzinho. Com certeza ele não ia querer a mesma história chata de Natal de todos os anos”, para concluir: “Jesus iria preferir um Natal mais moderno, animadaço, com pegada vegetariana, multicultural e repleto de música pop, além de piadas sobre o aquecimento global”. A música pop que a garotinha que interpreta Maria, grávida, irá cantar na peça é… “Papa Don’t Preach”, e na parte da letra em que Madonna canta “I’m keeping my baby”, o menino Jesus, representado por uma melancia, irá se espatifar no chão deixando a todos com manchas vermelhas (de sang… ops, melancia) nas roupas – tudo isso com menos de 10 minutos de filme. Calma (ou não se anime tanto): daí pra frente, a história ficará mais quadradinha num ritmo meio de montanha russa, já que a seleção de contos que o roteiro costura não é homogênea. Ainda assim, “Aquele Natal” merece o selo “sessão da tarde em família”, pois mesmo tendo suas falhas (que seu filho nem irá perceber), cumpre a função de passatempo natalino sem parecer bobinho demais.

Nota: 6


“Robô Selvagem”, de Chris Sanders (2024)
O grande filme de animação da temporada, com 10 indicações ao Annie Awards (o Oscar das Animações) – superando “Divertidamente 2”, que teve 7 – e três pré-indicações ao Oscar 2025 (alguns especialistas preveem 9 indicações para o filme, incluindo a categoria principal), “Robô Selvagem” (“The Wild Robot”, no original) conta a história da unidade ROZZUM 7134, a Roz, um robô utilitário para serviços domésticos que, por um descuido no avião de transporte, cai em uma ilha deserta no meio do oceano, e tenta, sem sucesso, se aproximar dos animais da fauna local para ajuda-los, sendo atacada e rejeitada. Sem compreender o ambiente hostil em que está inserida, Roz se disfarça para observar a natureza e aprender como se comunicar com aqueles seres. Em sua busca por sobrevivência na ilha, Roz acaba caindo sobre um ninho de gansos, sendo que apenas um filhote de um dos pequenos ovos sobrevive, e, programada para ajudar, Roz coloca como missão cuidar da pequena ave, que ganha o nome de Bico-Vivo, até que ela possa sobreviver sozinha naquele território repleto de predadores. Apresentando assim, “Robô Selvagem” pode soar óbvio e piegas, mas o roteiro esperto de Chris Sanders – que co-escreveu e dirigiu “Lilo & Stitch”, de 2002, e “Como Treinar o Seu Dragão”, de 2010, e aqui inspira-se no livro homônimo de Peter Brown, lançado em 2016 – consegue controlar com esmero os momentos de emoção do filme ao mesmo tempo em que evita a sacarose criando uma narrativa que não apenas centra foco nessa família atípica formada por um robô e um ganso (e, ainda, uma raposa), como também, na segunda parte do filme, bifurca a trama ampliando a narrativa. Há pequenos pontos de convergência entre “Robô Selvagem” e o clássico “O Gigante de Ferro” (1999), de Brad Bird, em temas que norteiam desde sempre o imaginário sobre avanços tecnológicos vs vida humana (neste caso, animal – risos), e o resultado final é absolutamente sublime, um daqueles filmes (disponível para assinantes na Amazon Prime) para ver e rever e rever e rever.

Nota: 10

– Marcelo Costa (@screamyell) é editor do Scream & Yell e assina a Calmantes com Champagne.

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