Entrevista: Geordie Greep (ex-Black Midi) abre o jogo sobre álbum solo e rasga seda para Milton Nascimento e Clube da Esquina

entrevista de Alexandre Lopes

Em agosto de 2024, o grupo britânico Black Midi chocou seus fãs ao redor do mundo ao anunciar um hiato, depois de sete anos e três álbuns desafiadores aclamados pela crítica. “Black Midi foi uma banda interessante que agora acabou indefinidamente”, informou o principal compositor e vocalista, Geordie Greep, durante uma live em seu Instagram. O músico também revelou que os membros da banda seguiram rumos individuais, e, em outubro, Greep deu início à sua jornada solo com o lançamento do álbum “The New Sound” (2024).

Para Greep, a produção do novo disco foi uma experiência radicalmente diferente. Ao contrário do trabalho anterior com sua ex-banda, ele destaca que, desta vez, teve total liberdade criativa, sem as pressões do grupo. “Muitas vezes, no Black Midi, quando criávamos algo inspirado em estilos como disco, funk ou bossa nova, havia sempre um momento em que dizíamos: ‘Precisamos adicionar algo para tornar isso mais interessante, para que tenha mais a cara do Black Midi'”, lembra o artista. “Já neste álbum, procurei manter as músicas o mais diretas possível”, observa Greep.

O processo de gravação contou com a colaboração de mais de trinta músicos, em dois continentes distintos. São Paulo e Londres foram os cenários onde o álbum tomou forma, com as sessões de gravação acontecendo em locais diferentes e envolvendo músicos locais. Metade das faixas foi registrada no Brasil, com a colaboração de músicos como Chicão “Quartabê” Montorfano (piano, teclado), Dennys Silva (percussionista da banda de Liniker) e Thiaguinho Silva (baterista que, recentemente, tocou com Lianne Las Havas nos shows brasileiros da artista), que se juntaram a Greep sem se conhecerem. “Eles nunca tinham ouvido nada que eu tivesse feito antes, estavam apenas interessados nas demos que eu tinha feito”, contou. O trabalho final foi completado em Londres, com overdubs realizados com a equipe de músicos e produtores.

Musicalmente, “The New Sound” abrange uma diversidade de influências, começando com uma atmosfera de jazz fusion em “Blues” – que remete a alguns momentos do Black Midi. No entanto, o álbum logo se desvia para o “típico samba para gringo gostar” em “Terra” (com direito a pronúncia estranha do título). À medida que o disco avança, Greep mistura samba-jazz brasileiro e outros elementos latinos em “Through a War”, incorpora um rock progressivo pesado que pode lembrar King Crimson em “Motorbike” e culmina com a longa “The Magician” (de mais de 12 minutos), além de uma versão de “You Are But a Dream”, canção imortalizada na voz de Sinatra.

As letras de “The New Sound” também refletem as reflexões pessoais de Greep sobre relações e dilemas masculinos. Em entrevista à DIYMag, o músico revelou que se inspirou em conversas com outros homens sobre flertes e relacionamentos, observando as complexidades da natureza humana: “Não quero ser hipócrita, mas muitos homens são realmente escrotos, até com eles mesmos… Mas você pode até sentir simpatia por esses personagens. Você pode sentir pena deles e, ao mesmo tempo, desgosto”. A letra do single “Holy, Holy” já dá uma boa ideia desse pensamento: “E eu quero que você me diga que eu sou um dançarino perfeito / E eu quero que você me diga que eu cheiro muito bem / Eu quero que você me faça parecer mais alto / Você poderia ficar ajoelhada o tempo todo? O quanto isso vai custar?”.

A produção do álbum contou com a colaboração de Seth Evans – também ex-membro do Black Midi – que co-produziu o trabalho e contribuiu com baixo, piano e teclados. O resultado é um som mais pessoal e íntimo, mas que ainda preserva alguns elementos da sonoridade experimental da antiga banda. “The New Sound” marca um novo capítulo na carreira de Geordie, que busca explorar suas influências de maneira mais livre e ambiciosa, em busca de realizações que ele acredita que não seria possível alcançar dentro do Black Midi. Com uma proposta ousada, o álbum desafia as expectativas dos fãs e conduz o ouvinte a uma jornada musical fascinante.

Em entrevista via Zoom ao Scream & Yell, Greep falou sobre o processo de gravação de “The New Sound”, sua relação especial com a música brasileira – especialmente Milton Nascimento, Clube da Esquina e Egberto Gismonti – e o que, em sua opinião, está errado com a indústria musical. Confira abaixo esse papo imperdível.

Você lançou seu primeiro álbum solo agora, “The New Sound”. Eu ouvi e gostei bastante, mas é inevitável perceber algumas semelhanças com sua banda anterior, o Black Midi. Mas eu queria saber, do seu ponto de vista, como você acha que esse álbum é diferente do que você fez anteriormente?
Geordie: Bem, o processo criativo é idêntico. Então, essencialmente, é muito similar, né? No Black Midi, eu estava escrevendo a maioria das músicas, uns 90% delas. E eu levava para a banda e dizia: ‘Vamos fazer isso, vamos fazer aquilo’. Nesse álbum, escrevi todas as músicas, mas estou só levando para músicos de estúdio e dizendo: ‘OK, vamos tocar essa música, vamos tocar aquela música’, e tem menos pressão para ser algo feito pela banda. Então, a principal diferença é que eu acho que as performances de todos os músicos são bem diferentes. Está indo mais para essa ideia de ter músicos virtuosos de verdade tocando uma música e não necessariamente se preocupando se a performance deles os representa como artistas ou músicos. É mais do tipo: ‘OK, isso é o que você quer na música, vamos tocar’. Então muitas das músicas exploram gêneros e abordagens diferentes. Muitas vezes, no Black Midi, se fizéssemos uma música que fosse baseada em disco, funk ou bossa nova, qualquer que fosse o estilo, em algum momento da música a gente diria ‘ah, mas precisamos fazer algo para tornar isso mais interessante e dar mais a cara do Black Midi’. Mas com esse álbum, eu tentei manter a música o mais direta possível. Chamei os músicos de estúdio e pedi para eles tocarem a música do começo ao fim, confiando nas letras e na performance vocal para dar a ela algo interessante.

Entendo. Li que mais de 30 músicos estiveram envolvidos neste álbum, em dois continentes, em São Paulo e Londres. Como foi organizar tudo isso? Quanto tempo levou?
No geral, cerca de nove meses. Mas não foi uma coisa constante; foi mais como algumas sessões aqui, algumas sessões ali. Eu diria que no total fiz cerca de dez sessões de gravação. Então na verdade não foi tanto tempo assim. O principal desafio da organização realmente era conseguir a confiança para fazer isso, porque você sabe, uma vez que você se compromete a pagar músicos e a alugar um estúdio antes mesmo de ouvi-los tocar alguma música, isso pode ser assustador, certo? Se você é uma banda, pode ensaiar o tempo todo e descobrir se funciona ou não, vocês se conhecem, mas quando se trata de pessoas que você nunca conheceu, é como “uau, vamos ver como isso funciona”. Então, sim, foi um pouco assustador, mas esse foi o principal desafio: superar essa ansiedade.

O álbum conta com a participação de alguns músicos brasileiros. Como você os conheceu e como essas participações aconteceram?
Para algumas das músicas com um som mais clássico no álbum, que têm um estilo mais elegante e melódico, eu queria reunir bons músicos de estúdio em Londres e fazer uma grande sessão onde todos tocassem ao mesmo tempo, que soasse como Michael Jackson ou algo assim. Mas como essas músicas também tinham uma influência de música latina e brasileira, eu queria músicos que tivessem alguma experiência tocando esse tipo de som. O Black Midi estava em turnê no Brasil (nota: eles tocaram no Primavera Sound São Paulo 2023 e fizeram um side show no Cine Joia) e teríamos alguns dias de folga, então pensei “vamos fazer isso lá”. Eu liguei para o único cara que conheço em São Paulo, chamado Fernando Dotta, que gerencia um selo chamado Balaclava Records, e perguntei: “Você conhece algum músico, algum estúdio? Quero gravar algo enquanto estivermos aí”. Ele disse “claro” e chamou todos os músicos que foram parar no álbum. Ele simplesmente entrou em contato com eles, viu quem estava livre e gostou das músicas, e fomos e fizemos. Chegamos no estúdio e foi tudo muito tranquilo, a vibe era realmente boa. E foi uma sensação muito agradável, porque eu cheguei realmente sem saber o que esperar. Eu tinha enviado as músicas para eles, mas não sabia se iam gostar, mas quando cheguei e entrei na sala, eles disseram: “oh sim, gostamos muito da música, estamos afim, vamos tocar, vai ser legal”. Então foi uma sensação muito acolhedora, e assim que começamos a tocar as músicas, a principal coisa que estávamos fazendo era “Holy, Holy” (nota: que ganhou o clipe abaixo). Não demorou muitas tentativas e fechamos essa. Foi fácil e soou tão bem. Acho que, com músicos verdadeiramente bons, não se trata de tocar um milhão de notas ou algo assim, trata-se apenas de alguns grooves ou acordes bonitos, e você já pode ouvir “oh, esse cara é realmente bom”, sabe? Então foi essa a experiência de tocar com esses caras, eles eram simplesmente incríveis.

Você tem planos de tocar com eles em turnê ou algo assim?
Eu espero que sim! Se eu fizer uma turnê pelo Brasil e pela América do Sul no próximo ano, quero convidar esses caras para tocar. Quero que eles façam parte da banda.

Eu sei que as músicas “The Magician” e “Walk Up” (que tinha o nome de “Lumps”) foram tocadas ao vivo com o Black Midi. Mas você já estava gravando seu álbum solo antes do hiato da banda ser anunciado. Essas músicas já estavam planejadas para serem lançadas no seu álbum e não com o Black Midi?
Sim, nós estávamos tocando essas músicas nas últimas turnês porque não tínhamos material novo. E eu tinha essas músicas e pensei “ah, vamos tentar essas”. E foi bom e divertido de tocar, mas eu sempre senti que essas músicas tinham mais potencial do que da forma como estávamos tocando no Black Midi. Eu achei que estávamos meio que tocando tudo indo à loucura e tal, o que é legal, mas eu pensei que com essas músicas seria interessante explorar algo completamente diferente, sem a obrigação de fazer isso dentro da banda, fazendo do meu próprio jeito, onde eu pudesse trabalhar com vários músicos diferentes. Isso foi uma coisa que, no final do Black Midi… quer dizer, para algumas bandas eu acho que pode funcionar, mas para mim, eu achei que não era tão inspirador. Era só o fato de que, seja qual for o tipo diferente de música que você tem, que você cria ou quer fazer, sempre tem uma pressão estranha quando você grava em uma banda, no sentido de que cada membro dela coloca uma quantidade igual na música. Tipo, mesmo que eles estejam tocando só um instrumento, eles vão à loucura e colocam sua própria marca e tal, o que é legal, mas acho que algumas músicas não precisam disso. Algumas vezes é melhor apenas tocar de forma simples, só tocar a música. Essa foi uma das principais razões pelas quais eu queria trabalhar com músicos de estúdio, onde o trabalho principal deles é simplesmente tocar a música e talvez adicionar um pouco de seu próprio caráter e estilo. Mas, acima de tudo, só tocar a música e apresentá-la como uma canção. Esse foi o objetivo aqui.

Você teve Seth Evans e Morgan Simpson tocando em várias faixas, e Seth Evans também foi o co-produtor do álbum, junto com você. Você pretende continuar trabalhando com eles no seu trabalho solo?
Vamos ver, a porta está sempre aberta, sabe? Não vejo nada de estranho nisso. Eu quero trabalhar com o Seth Evans o tempo todo. Acho que fizemos esse álbum juntos, meio que o produzimos, mas ele também está fazendo sua própria música. Quer dizer, ele canta uma das músicas desse álbum, “Motorbike”, que nós escrevemos juntos. Originalmente a música era dele, e eu entrei e disse “ok, vamos fazer isso, mudar isso aqui”. Mas a gênese da música foi dele. Então eu quero continuar trabalhando com ele, quero ajudar a música dele e fazer coisas juntos. E ele pode me ajudar com a minha música. Acho que essa é uma ótima parceria.

A última faixa do álbum é “You Are But a Dream”, famosa na voz de Frank Sinatra. Para mim, o seu estilo vocal é parecido com o de um crooner. E acho que isso está muito mais desenvolvido no seu álbum solo. Você acha que isso faz sentido? Esse estilo é uma influência para você?
Sim, definitivamente! Eu gosto dessa ideia. Você pode imaginar que, nos anos 1940 e 1950, quando as pessoas ouviam esses discos na vitrola, quem fosse fã desses cantores, jovens mulheres ou o que for, ao ouvir essa música pelo alto-falante, elas realmente sentiam como se o cantor estivesse ali? Porque a performance era tão exagerada que parecia que, como por mágica, esse cantor aparecia na sua sala de estar. Então acho que é por isso que eles cantavam assim. E era realmente exagerado, ou muito terno, bem perto do microfone, para que as pessoas, em suas casas em toda a América ou onde fosse, ao ouvirem no rádio ou na vitrola, pudessem sentir como se o cantor estivesse ali na sala com elas. Acho que tem algo tão legal nisso. E especialmente agora, com a maioria das pessoas ouvindo música com fones de ouvido, até quando estão viajando e tal. É assim que a maioria das pessoas escuta música hoje em dia. Então me parece que se inclinar para essa coisa de cantar bem perto do ouvido, ou ter esse estilo de performance, com essa gama de emoções e estilos, é algo bom. Hoje em dia, a maioria das pessoas canta de forma bem simples, como se estivessem apenas tentando terminar logo a música, apenas delineando a melodia ou o que for, mas eu acho que sempre haverá valor em tentar fazer esse tipo de música que é uma performance, tentando se apresentar para o ouvinte, não apenas ser um som.

Eu vi os dois shows do Black Midi aqui no Brasil e lembro que, em um deles, você subiu no palco com uma música de funk carioca tocando nos alto-falantes (“O Bonde do Tigrão”) e, mais tarde, no festival Primavera Sound, vocês tocaram uma música do Clube da Esquina. Eu gostaria de saber qual é a sua relação com a música brasileira e, especialmente, com o Clube da Esquina.
Bem, esse álbum (do Clube da Esquina) é muito especial para mim. Acho engraçado, porque é uma coisa bacana quando há música que é muito ambiciosa e intelectual, e talvez seja progressiva, talvez entre em vários estilos diferentes. O álbum é quase fusion em alguns momentos, quase orquestral em outros, é uma coisa bem ambiciosa, mas, apesar de tudo isso, realmente se conecta com as pessoas, com pessoas de diferentes culturas, de diferentes origens. Você vai lá, procura no YouTube uma música desse álbum e vai ver que tem milhões de visualizações, e todos os comentários em diferentes idiomas dizendo o quanto as pessoas gostam dele. Acho que isso é o mais impressionante, especialmente com Milton Nascimento, que é um dos mestres nisso: ele corta através dessa música complexa e faz algo que é simplesmente muito humano, a maneira como ele canta, como ele compõe as músicas, como ele escreve, o violão, os acordes, tudo. Obviamente, eu gosto do “Clube da Esquina” e do “Milton Nascimento”, “Clube da Esquina II”, “Minas” e todos esses álbuns, que são obras-primas, mas minha música favorita do Milton talvez seja “Travessia”, porque é a mesma coisa: é uma música que você realmente sente a emoção, mesmo que você só esteja lendo a letra no Google Translate ou algo assim, você realmente sente. Não é que seja a melhor letra de todos os tempos ou os melhores acordes ou a melhor performance vocal, é tudo isso se juntando para criar um sentimento específico, que é meio impossível de replicar ou justificar o porquê de ser tão bom. Você ouve e, quando ouve, é “uau”, você realmente sente, é como se mudasse algo dentro de você. Então é por isso que esse cara é um gênio.

Acho que conheci esse álbum “Clube da Esquina” do mesmo jeito que a maioria das pessoas ocidentais conhecem: pelo YouTube, sabe? Você vai lá nas recomendações se você ouvir, sei lá, “In a Silent Way” do Miles Davis ou algo assim e aí aparece a recomendação para “Clube da Esquina”, sabe? Acho que essa é a grande coisa da internet: ela coloca todas as coisas no mesmo nível, ela não diz ‘isso é isso, isso você não pode gostar, isso tem que ser assim’, ela simplesmente diz ‘ah, você gosta disso, muita gente gosta disso também, então ouça essa recomendação’, sabe? É legal e eu acabei conhecendo o Egberto Gismonti assim também. Ele é um dos meus músicos favoritos, conheci através dos discos da ECM Records, ouvindo gente como Keith Jarrett e Jan Garbarek, e aí eu vi ‘ah, o Jan Garbarek toca com esse cara, o Charlie Haden, eles tocam com esse cara chamado Egberto Gismonti’ e então eu fui ouvir a música dele. Tem um disco chamado “Circense” ou algo assim, e é monstruoso, música insana, é música incrível e não importa muito para as pessoas que tenha essa influência brasileira na música dele, porque, sabe, muita coisa tem essa tradição por trás, mas mesmo assim, é algo além de só dizer ‘ah, é música desse país específico’. É música pura, é aventureira, clássica, experimental, fusion, seja lá o que for. Está tentando criar algo diferente, é ambiciosa. E claro, tem os caras como o João Bosco e tudo mais, e eu adoro essa abordagem mais melódica e tudo, é simplesmente brilhante. Mas claro, o melhor álbum de todos esses talvez seja o que Egberto fez com o Naná Vasconcelos, “Dança das Cabeças“, é um dos melhores álbuns de todos, sabe?

Bem, isso é legal, porque você realmente sabe muito sobre música brasileira, e gostei de saber como conheceu tudo isso, pesquisando na internet. Uma coisa levou à outra então?
Basicamente isso. Tudo isso aconteceu de maneira não linear, em momentos diferentes, mas essa é a parte boa da internet: você pode encontrar 100 anos de história da música de graça, só prourando na internet.

Das bandas mais novas que temos aqui no Brasil, eu gostaria de saber se você já soube de uma banda chamada Papangu. Eles são uma banda de rock progressivo e sludge, influenciada por King Crimson e Hermeto Pascoal e Sepultura. Eles são mais pesados, têm dois álbuns, e o segundo álbum é sobre Lampião, um famoso cangaceiro aqui no Brasil. Dá uma olhada, talvez você goste.
OK, legal! Vou dar uma olhada! Quando eu fiz a sessão, o baixista e o tecladista, Fabio Sá e Chicão, ambos me falaram sobre outro álbum em que tocaram, disseram que é bem parecido com isso, de um cara chamado Negro Leo.

Ah sim, Negro Leo! É insano, vi ao vivo e você simplesmente não acredita que aquilo tudo está acontecendo na sua frente. O som é muito legal.
Eu ouvi o álbum dele, achei incrível. Legal, único, como o Scott Walker, é bem mais do que um simples álbum. Muitos sons loucos e super legais.

Outra banda brasileira que eu realmente gosto é a Ema Stoned. É um trio feminino brasileiro que toca música psicodélica, mas influenciada pelo CAN e outras coisas assim. Acho que você vai gostar.
Como é o nome? Emma Stone?

É como a atriz Emma Stone, mas com menos um “M” e um “D” no final.
Ah, Ema Stoned! Sim sim, vou procurar!

No período pós-pandemia, apareceram várias bandas em turnê tendo dificuldades para agendar shows em seus países e no exterior. Como está sendo isso para você agora?
Bem, esse é um grande problema, mas acho que o problema maior é que a indústria musical foi construída em torno de quando a música costumava gerar muito dinheiro. Então, nas décadas de 1970, 1980 e 1990, para conseguir um álbum que chegasse ao número 1, você tinha que vender 600 mil cópias, 800 mil, um milhão de cópias, sabe? Você tinha que vender muitos discos. Hoje, você precisa vender cerca de 10 mil para chegar ao número 1. Não é nada comparado a antes, e mesmo com essas vendas equivalentes a plays no Spotify, sabe? Mas quase todas as mesmas pessoas ainda estão empregadas pela indústria musical, aquelas que trabalharam na indústria da música, então significa que o bolo é bem menor, mas ele ainda está sendo dividido da mesma forma. Então, quando você sai em turnê e tem o tour manager, o o agente de booking, a gestão, a gravadora, todas essas coisas que precisam tirar uma porcentagem do que você faz em shows, 40%, 50%, 60%, e você está ganhando, tipo, sei lá, 50 mil em uma turnê mundial enorme, vai logo virar você fazendo turnê pelo mundo e tocando para 100 mil pessoas e ganhando apenas 5 mil libras ou algo assim, sabe? Essa é a realidade, e se tiver sorte de ganhar isso. Acho que toda a arquitetura disso está errada. Não é o fato de que menos pessoas estão indo aos shows ou que as pessoas não querem mais ver música ao vivo. É a forma como a indústria está estruturada, não é realista para o número de pessoas que gostam de música. Se tornou uma coisa de nicho, e tudo bem, você ainda pode sair e fazer turnê como algo de nicho e as pessoas vão curtir. Algumas das minhas bandas favoritas têm só 10 mil pessoas no mundo todo que gostam delas, sabe? E elas só podem fazer turnê em lugares que cabem 200 pessoas. Se você não tiver tantos custos, você pode fazer turnês nesse nível e ganhar a vida. Mas o problema é quando você tem todas essas pessoas tirando uma porcentagem da turnê o tempo todo. Então, precisamos mudar isso se todos quiserem que a música ao vivo continue, se quiserem que as bandas ao vivo floresçam, precisam eliminar alguns desses empregos ou as pessoas precisam parar de tirar uma porcentagem, porque esse é o motivo de as bandas não ganharem dinheiro. E eles vão te dizer que é porque as pessoas não estão interessadas, mas é só porque eles querem manter seus empregos, sabe? É por causa de como a indústria está estruturada.

Seu álbum foi lançado pela Rough Trade, mas seguindo esse seu pensamento de turnês, você pretende começar um novo selo e lançar as coisas por conta própria?
Definitivamente esse é um dos meus objetivos. Eu acho que o próximo passo é começar um selo principalmente porque eu quero fazer álbuns com outras pessoas e fazer álbuns para outro público. Estou muito interessado em tentar, porque muitas vezes você vê bandas tocando ao vivo ou ouve a música de outras pessoas e pensa: ‘Isso é muito bom, mas eles poderiam mudar três coisas e deixar muito melhor, sabe?’ Uma coisa que acontece muito é que as pessoas são músicos incríveis, caras do jazz ou o que for, você vê eles ao vivo e pensa: “Uau, esse cara é um músico incrível, esse cara realmente toca”’. E aí eles vão fazer a música deles e colocam um milhão de faixas, colocam todas essas coisas diferentes, tipo autotune e coisas eletrônicas malucas e coisas onde eles não estão tocando e eu pensei: ‘Cara, você devia ter entrado e gravado ao vivo, você é um músico bom o suficiente, é isso que as pessoas querem ouvir, cara’. Isso é o que conecta as pessoas, isso é como o Blue Note e os discos da ECM Records, todos esses clássicos, sabe? Eles simplesmente entravam e faziam, não ficavam pensando demais ou fazendo remixes por dois anos ou o que fosse, sabe? Foda-se isso, só entra e grava em um dia. Então, eu quero tentar fazer alguns álbuns com pessoas e tentar ter essa abordagem mais simplificada de ‘vamos fazer o álbum em poucos dias’. Então, sim, definitivamente estou interessado em tentar algo assim.

Então, Geordie, espero ver você de volta aqui no Brasil em breve. Você planeja voltar aqui no próximo ano ou algo assim?
Eu espero que sim! Quero voltar. Talvez no próximo verão ou no outono, no segundo semestre do ano que vem, vamos torcer!

– Alexandre Lopes (@ociocretino) é jornalista e assina o www.ociocretino.blogspot.com.br

One thought on “Entrevista: Geordie Greep (ex-Black Midi) abre o jogo sobre álbum solo e rasga seda para Milton Nascimento e Clube da Esquina

  1. Putz!!!, sensacional essa entrevista o cara conhece mais de musica brasileira do que muitos ” entendidos ” e os argumentos deles são bem contundentes nada óbvios!!

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

Esse site utiliza o Akismet para reduzir spam. Aprenda como seus dados de comentários são processados.