texto por Luciano Ferreira
O Suede está de volta aos discos com “Autofiction” (2022), seu nono álbum de estúdio, passados quatro anos desde “The Blue Hour” (2018), álbum que fechou uma espécie de trilogia iniciada em 2013 com “Bloodsports”, trabalho que marcou o retorno da banda após um hiato discográfico de 11 anos, seguido por “Night Thoughts” (2016). “Autofiction” resgata uma sonoridade que andou um tanto de lado nos últimos trabalhos do Suede, voltado para canções mais densas e até um tanto sombrias.
Se “The Blue Hour” pegava o lado mais denso de “Night Thoughts” e o esticava a um ponto nunca antes visto na discografia dos londrinos – com sintetizadores e elementos orquestrados a todo vapor –, em “Autofiction” a opção é pelo lado contrário, com arranjos mais diretos numa aproximação mais com “Bloodsports”. É uma decisão enfatizada já na sequência de faixas que abrem o disco e que ganha reforço com o retorno do produtor Ed Buller, responsável pela produção dos três primeiros discos da banda (“Suede”, 1993; “Dog Man Star”, 1994 e “Coming Up”, 1996) e também de “Bloodsports” e “Night Thoughts”.
Para o líder e vocalista Brett Anderson, “Autofiction” é o disco mais punk da discografia do Suede, o que parecia inicialmente sem sentido quando analisados os singles lançados até então (primeiro “She Still Leads on Me”, depois “15 Again” e por fim “That Boy On The Stage”), e ainda soa no mínimo exagerado sonoramente falando – cabe melhor se dizer respeito a como a banda se preparou para esse novo trabalho, com o quinteto reunido e ensaiando ao estilo de bandas iniciantes, conforme declarado pelo próprio Anderson. A pandemia pode ter sido o motor para esse desejo de uma relação mais próxima, passado o período em que o isolamento forçou ao afastamento.
E se os arranjos em “Autofiction” estão mais diretos, o mesmo pode-se afirmar de algumas letras. Em “She Still Leads me On”, por exemplo, Anderson não só fala da importância da mãe como faz uma declaração de amor fortíssima: “But I loved her / With my last breath / And I loved her with a love that was strong as death / And I loved her / When she was unkind / And I loved her, I loved her, a dangerous mind”. Já “That Boy on The Stage” é sobre a própria banda: “He speaks of love and power / And all those pretty things / You know the voice that flatters you / It’s not the voice that sings.”
O amor é um tema que aparece em pelo menos três canções do trabalho, incluindo a vigorosa “Black Ice”, com uma poderosa linha de baixo fazendo a cama para uma letra que fala sobre a importância do senso de perigo na vida e de como o amor é doloroso: “And you still give me trouble (it breaks me up) / But I still wear your chain (and it makes me jealous) / Because life without danger is no life / Because all love is pain (all love is pain). E também em “The Only Way I Can Love You”, mais uma das declarações que Brett Anderson resolveu colocar no disco: “And if I disappoint you, just know I wrote this for you / Another way to do what I do wrong / I pretend I don’t adore you / But I’d take a bullet for you / Yes, it’s a sweet and bitter love”.
Em “Autofiction”, o Suede surge despido de todo o approach utilizado na produção de canções de seus discos antecessores, principalmente de “The Blue Hour”, que em boa parte das faixas trazia um lado orquestrado da Philharmonic Orchestra da cidade de Praga, o que não quer dizer que esses momentos épicos estejam ausentes do novo álbum, como demonstram as baladas “Drive Myself Home”, forte candidata a entrar na galeria de canções arrebatadoras do Suede, e “What Am I Without You”, apaixonada declaração de amor com versos pungentes cantados de uma forma como só Anderson consegue e com os típicos crescendos do arranjo (“Oh, what am I? / What am I without you? / What am I without you? / Your love makes me burn”).
Aqui as guitarras voltam a assumir o protagonismo nos arranjos e o glam rock, uma das grandes referências do grupo desde seu início, surge mais vigoroso, como em “That Boy on The Stage”. Mais do que um álbum punk, “Autofiction” é um álbum de guitarras, que guiam pelo menos 8 das 11 canções que compõem o disco (na edição deluxe são 15 faixas, as quatro a mais são bônus exclusivos dessa edição), quase num retorno ao estilo de trabalhos mais antigos da banda. E nesse entremeio, há duas faixas em que Anderson & cia permitem que influências pouco usuais brotem, como as batidas tribais de “It’s Always the Quiet Ones” e os sintetizadores proeminentes de “Turn Off Your Brain and Yell”.
O que o Suede mostra em “Autofiction” é que entre o certo, o novo e as apostas incertas, é possível misturar tudo isso sem desvelar em auto repetição ou no piloto automático. Engana-se quem acreditar ser um caminho fácil, mas o Suede o faz com maestria, e ainda que o resultado não seja arrebatador, permite apresentar um bom álbum, num nível acima da média.
– Luciano Ferreira é editor e redator na empresa Urge :: A Arte nos conforta e colabora com o Scream & Yell.
eles exageraram tanto no álbum anterior que acertadamente preferiram voltar às origens nesse novo trabalho. mas, infelizmente, poucas músicas me empolgaram. apenas um álbum regular, na minha opinião.
Não diria que eles exageraram no álbum anterior, mas que sua sonoridade tem a ver com o contexto em que foi produzido, refletindo o momento pessoal de seus integrantes. O mesmo podendo ser dito desse novo trabalho. Particularmente, gosto bastante do anterior, e esse aqui tem bons momentos e algumas variações de sonoridades interessantes.