texto por Luciano Ferreira
Quem reparou no titulo do novo álbum do Weezer e o associou ao clássico álbum do Radiohead, Ok, você está certo, a ideia de Rivers Cuomo foi justamente essa. Só que ao invés da sofisticada mistura de elementos eletrônicos moldando estruturas baseadas em riffs, texturas e dedilhados de guitarras, a banda de Cuomo opta por orquestrações e piano no arranjo das 12 faixas do álbum, totalmente gravado de forma analógica.
Num passado recente, Gruff Rhys (Super Furry Animals) fez algo semelhante em “Babelsberg” (2018), totalmente orquestrado e, claro, o Beach Boys, mais atrás, em “Pet Sounds” (1966). Não esqueçamos que Cuomo é tão fã da banda sessentista que compôs uma canção com o mesmo nome da banda para o álbum “Pacific Daydream”, de 2017.
A premissa do grupo de fazer um trabalho totalmente diferente do que fizeram até então funciona muito bem, considerando que já vinham mostrando certo desgaste em álbuns anteriores, alguns parecendo até autoparódias. Cuomo mostra que ainda tem feeling para compor canções que emocionam, como a pungente “Numbers” – com um quê de Coldplay –, em que ele narra o drama da geração atual, obcecada pelo numero de curtidas de amigos em suas postagens em redes sociais: “Olhe para ele, olhe para ela, eles tem milhões de curtidas… eu ouço a tristeza em seu sorriso”.
Essa relação homem/máquina, também tratada em “Ok Computer”, não é um conceito que se espalha por todo álbum, mas surge em vários momentos, como em “Screen”, que fala sobre pessoas vidradas em telas de celular, de computador ou outro aparelho: “Now the real world is dying / As everybody moves into the cloud / Can you tell me where we’re going? / Where will we be twenty-one years from now?/ Everyone stares at the screens / Everyone starеs at the screens”.
O escapismo, esse artifício salutar que em muitos momentos parece ser a única saída e refúgio de uma realidade que só adoece, também é um tema presente. Cuomo toca no assunto na balada acústica “Playing my Piano”, em que o instrumento é o elemento que de tudo faz esquecer, inclusive de lavar o cabelo; e ”Grapes of Wrath” – referência ao livro de mesmo nome de John Steinbeck – em que o personagem da canção se vê às voltas com o aparelho Audible (espécie de leitor de áudio book) enquanto faz referências a “Moby Dick” e “1984”, livros não lidos, mas ouvidos no aparelhinho (olha a tecnologia de novo).
Para além do uso de arranjos orquestrados e da dualidade homem/máquina, “Ok Human” marca uma serie de acertos que o tornam um dos melhores álbuns recentes do Weezer. Fazer canções mais curtas e enfatizar um lado mais suave e melódico são dois deles. Mas há que se notar que a força mais atrativa do disco se concentra nas canções iniciais, perdendo um pouco nas faixas finais, embora na sua segunda metade o álbum traga “Bird With a Broken Wing”, uma das melhores faixas do disco, com letra de cunho bastante pessoal. Cuomo fala sobre um período de insegurança e autocomiseração: “Now I’m just a bird with a broken wing / And I still have a song to sing / Turning night to day, warbling clouds Away / I’m just a bird with a broken wing / And this beautiful song to sing / Don’t feel sad for me, I’m right where I wanna be”; e a curtinha e atraente “Dead Roses”, que remete ligeiramente a Beatles.
As orquestrações de “Ok Human”, ainda que não sejam primorosas, são eficientes e cumprem a função precípua, criando um álbum não só diferente de tudo já feito pelo grupo, mas também interessante na maior parte do tempo, e “All My Favorite Songs” é um ótimo single para a abertura, trazendo uma letra confessional que catalisa o sentimento de muitos: “Todas as minhas músicas favoritas são lentas e tristes / Todas as minhas pessoas favoritas me deixam furioso / Tudo que parece tão bom é ruim, ruim, ruim”.
– Luciano Ferreira é editor e redator na empresa Urge :: A Arte nos conforta e colabora com o Scream & Yell.
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