Texto por Janaina Azevedo
Mark Lanegan já é velho conhecido do público brasileiro: desde 2010 (quando se apresentou num bar que não existe mais na Rua Augusta, em São Paulo), o cantor tem incluído shows no país em suas turnês de forma constante, tendo voltado em 2012 (estreando enfim com banda no Cine Joia), 2013, 2015 e agora em 2018. Considerando que ele já havia se apresentado mesmo antes disso, em 2009 com o parceiro Greg Dulli, podemos concluir que o Brasil está no mapa de Mark Lanegan definitivamente.
O show mais recente de Lanegan no Brasil foi no sábado, dia 8 de setembro, pela terceira vez no Cine Joia. Mark veio sem banda, mostrando que seu repertório é versátil o suficiente para caber em um formato acústico, que se resume a voz, guitarra de Jeff Fielder e teclados e programações de Shelley Brien, a esposa do cantor (na apresentação de 2010, Lanegan veio acompanhado apenas de violão).
Um fato importante: o show de Mark Lanegan não perde em potência pela falta de banda completa. Na verdade, especialmente por conta de Shelley e seus barulhos fantasmagóricos, a apresentação ganha profundidade e dramaticidade, o que ocorre tanto em músicas minimalistas por natureza (“Come To Me” e “Bombed”) quanto naquelas mais barulhentas (“Hit The City”, também do já clássico “Bubblegum” ou as mais recentes “Nocturne”, “Sad Lover” ou “Beehive”).
No entanto, a falta de pelo menos mais uma guitarra aparece, é verdade. Desta forma, todo impacto de “The Gravedigger´s Song” perde um pouco sem a profusão de riffs da gravação original. Porém isso é detalhe: a verdade é que, de um modo geral, as versões ficam muito bem acabadas nessa forma minimalista. Ponto para a competência do trio.
Das 25 músicas tocadas no show, sete são do “Bubblegum”, disco que completou 14 anos em agosto e segue baseando boa parte de suas apresentações. Quem quis ouvir as do último disco solo, “Gargoyle”, de 2017, ficou com quatro: “Beehive”, que lembra New Order, “Goodbye to beauty”, “Nocturne” e a quase ecumênica “Sister”. Teve cover (“Deepest Shade”, do Twilight Singer, “Oh Jesus Program” gospel de O. V. Wright e a arrebatadora “You Only Live Twice”, de Nancy Sinatra, aliás: ansiosa por mais Nancy Sinatra no repertório de Lanegan). Tenho a impressão de que o grande clássico, e uma das mais populares do cantor, porém, é do disco “Field Songs”, a triste “One Way Street”. Não por acaso, uma das maiores comoções do show.
O show termina com duas músicas do Screaming Trees: a rara “Where The Twain Shall Meet”, do álbum “Buzz Factory” (1989), e “Halo of Ashes”, do derradeiro “Dust” (1996), novamente no repertório após aparecer no show do Porão do Rock, em Brasília, 2013. Mas quem teve sorte mesmo foram os fãs do Chile, que receberam Mark dias após a apresentação de São Paulo: Alain Johannes subiu ao palco no bis para tocar “Hanging Tree”, do Queens of the Stone Age.
E, à frente de tudo, está Mark Lanegan, homem de mitos e mistérios, do alto de seus 53 anos, defendendo uma carreira extremamente produtiva sem olhar para trás nem se aproveitar de qualquer rótulo que poderia caber em sua carreira. A voz está intacta sim – foi curioso notar que, quando falava com a plateia brevemente, Mark soava um tanto mais rouco do que nos vocais propriamente ditos.
Ele está mais solto também – dançou discretamente, beijou a esposa, dedicou uma das músicas a um misterioso Tiago, coisa que quem viu os shows de 2012 em São Paulo ou 2013 em Brasília sequer cogitava acontecer. Prestes a lançar uma autobiografia (que deve sair em 2019 lá fora), estaria Mark Lanegan pronto para abrir suas vulnerabilidades ao público que acompanha sua música fervorosamente?
É assunto para debate, mas o único consenso é que o Brasil adora Mark Lanegan, que parece retribuir, com sua presença constante por aqui e suas apresentações que atingem direto o coração. Por mim, tinha mais é que vir todo ano.
– Janaina Azevedo (www.facebook.com/janaisapunk) é jornalista e colabora com o Scream & Yell desde 2010.