Três livros: MTV, Pavões, John e Yoko

por Bruno Capelas

“MTV, Bota Essa P#@% Pra Funcionar!”, Zico Góes (Panda Books)
No ar durante 23 anos (de 1990 a 2013), a primeira geração da MTV Brasil há tempos pedia um trabalho que contasse sua história. Diretor de programação da fase áurea da emissora, Zico Góes lançou-se à tarefa de explicar o funcionamento da “eme-te-vê”. Afinal, ele esteve presente em 19 dos 23 anos de existência do canal, sendo responsável por programas como “Barraco”, “Rock&Gol” ou o prêmio Video Music Brasil. As credenciais e o conhecimento de seu objeto, no entanto, não ajudam o autor em “MTV, Bota Essa P#@% Pra Funcionar”. Lançado em 2014, o livro sofre do clássico problema das autobiografias, sendo um (raso) trabalho de memórias. Quem espera uma história da MTV, ou mesmo reflexões aprofundadas sobre o espírito criativo e anárquico que reinava em boa parte dos momentos do canal 32 UHF (em São Paulo), pode esperar sentado. Na maioria dos casos, Zico embasa-se mais em suas opiniões do que em fatos, além de inflar o papel social e o alcance da MTV. A passagem que culpa apenas a internet pela morte do canal, por exemplo, é no mínimo discutível. Claro, é interessante saber a visão de Goés sobre seus comandados – de Tatá Werneck (“joia raríssima”) a Luiz Thunderbird (“dicção ruim, mas cheio de personalidade”) –, mas é pouco. Seja como for, o livro tem leitura rápida e fácil, valendo por aspectos curiosos, como a cisma com o jornal Folha de S.Paulo, os acontecimentos do último dia da emissora ou a revelação (?) de que a MTV manipulava as votações do Disk MTV, sua parada de clipes.

Nota: 5,5

“Pavões Misteriosos”, André Barcinski (Três Estrelas)
Autor de um dos melhores livros sobre música já escritos no Brasil – “Barulho! Uma Viagem Pelo Underground do Rock Americano, de 1992” –, o jornalista André Barcinski volta a empreender um bom registro sobre um cenário musical, dessa vez debruçando-se sobre o cenário da canção pop brasileira entre 1974 e 1983. Se “Barulho!” é resultado de uma turnê de Barcinski pelos EUA bem na época da explosão do grunge, este “Pavões Misteriosos” é o fruto de uma pesquisa profunda de um período negligenciado na história da música popular brasileira. Constrangido entre a época da Tropicália e os Festivais de um lado, e pelo estopim do BRock (termo criado pelo jornalista Arthur Dapieve em livro homônimo), a década definida por Barcinski teve ícones como Rita Lee, Raul Seixas, Secos & Molhados, Guilherme Arantes, Fagner e Ritchie – importantíssimos para a música feita até hoje na Terra de Vera Cruz. Além de ressaltar a grandeza dos nomes supracitados, o jornalista ainda descobre ótimos coadjuvantes e conta histórias da época, como os conjuntos que faziam gravações para todo mundo – Os Carbonos e os Famks -, os cantores “tipo importação” (como Morris Albert, de “Feelings”, ou Mark Davis, que depois se tornaria conhecido como Fábio Jr.), ou a explosão da disco music no País. Lançado em agosto de 2014, o livro tem apenas um pecado: é curto, e por vezes parece mais destinado a iniciantes que a leitores iniciados no tema, deixando um gosto de quero mais – como uma boa pop song de três minutos, não é?

Nota: 8,5

“John Lennon, Yoko Ono e Eu”, Jonathan Cott (Zahar)
Nove entre cada dez livros e reportagens sobre John Lennon costumam mostrar Yoko Ono como uma japonesa “excêntrica”, quando não a culpam por ser a responsável pelo fim dos Beatles. Não é, porém, o que acontece com “John Lennon, Yoko Ono e Eu”, do jornalista americano Jonathan Cott – um raro volume que mostra e explica a importância de Yoko para Lennon (e vice-versa). Repórter da Rolling Stone e estudante de poesia em Londres, Cott se tornou amigo do casal Ono-Lennon em 1968, quando entrevistou o beatle para a revista norte-americana e acompanhou a sessão de gravação de canções como “Glass Onion” e “Helter Skelter” no mítico estúdio 2 de Abbey Road. Como se não bastasse, o jornalista ainda foi a última pessoa a entrevistar Lennon, três dias antes de sua morte. Em “John Lennon, Yoko Ono e Eu”, lançado no Brasil em 2013, o jornalista conta a história das entrevistas que fez com o casal (ele também assinou um perfil de Ono para a RS em 1971), e dá foco às canções de Lennon, mas também aos trabalhos de Yoko nas artes visuais e na música, além de jogar luz sobre o relacionamento dos dois de maneira sensível. No livro, fica clara a noção de que, depois de McCartney, Yoko foi a outra grande parceria de Lennon. O trunfo do trabalho, porém, acaba também sendo uma de suas partes menos empolgantes: para não-iniciados, as passagens sobre as intervenções artísticas da japonesa podem ser entediantes, enquanto as entrevistas de Lennon são, quase sempre, um deleite (não só) para os beatlemaníacos.

Nota: 8

Bruno Capelas (@noacapelas) é jornalista, escreve para o Scream & Yell desde 2010 e assina o blog Pergunte ao Pop.

Leia também:
– Zico Góes: “Restart tinha um público e uma estética mais a ver com a MTV” (aqui)
– “Pavões Misteriosos” e outros 11 livros musicais lançados em 2014 (aqui)
– Melhores do Ano Scream & Yell: “Pavões Misteriosos” em segundo lugar (aqui)
– Discografia Comentada: todos os discos de Paul McCartney (aqui)
– “Many Years From Now”, a biografia autorizada de Paul, por André Fiori (aqui)
– As demos caseiras de Lennon e McCartney, por Marcelo Costa (aqui)
– “A Intimidade de Paul McCartney” é para ser lido com bastante cuidado (aqui)

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