por Kelson Douglas
Com mais projetos por neurônio cúbico do que qualquer outro músico, o ex-Scream, ex-Nirvana, ex-Them Crooked Vultures e atual proprietário de uma lendária mesa de som, não satisfeito em lançar um novo disco com sua principal banda (a.k.a Foo Fighters), também resolveu transformar todo o processo de criação deste álbum em uma minissérie. Ou melhor, um documentário em forma de série: “Sonic Highways”, uma produção da HBO com direção de próprio Grohl e roteiro escrito pelo oscarizado Mark Monroe.
Como uma espécie de road movie rock’n roll, “Sonic Highways” conta histórias sobre cada lugar por onde os Foo Fighteres passaram para gravar seu último trabalho, que leva o mesmo nome do programa. “Sonic Highways” conta com 8 músicas gravadas em 8 estúdios diferentes de 8 estados norte-americanos e dentre histórias flagradas na tela estão algumas pessoais dos integrantes, das cidades, dos Estados, dos estúdios, dos produtores e até dos convidados envolvidos no projeto.
O oitavo álbum do Foo Fighters foi gravado entre novembro de 2013 e julho de 2014 em Austin, Chicago, Los Angeles, Nashville, Nova Orleans, Nova Iorque, Seattle e Washington, DC. A série, exibida na gringa pela HBO, ganhou edição no Brasil pelo Canal Bis, que exibiu o primeiro episódio, sobre a gravação de “Something from Nothing” em Chicago, no domingo 30/11, e seguirá nos próximos domingos exibindo a série de Dave Grohl seguindo o tracking list do álbum – os episódios também podem ser encontrados na iTunes Store.
Logo de cara, a primeira coisa que dá para perceber é a qualidade da fotografia e da edição. Nas lentes, quem manda é o norte-americano Kenny Stoff, que já trabalhou com a banda anteriormente em “Sound City” – e com outros nomes de peso como U2, Soundgarden e Chevy. Com todo o poder que suas Blackmagic Design Pocket têm, Stoff captura detalhes intimistas de Chicago e Washington D.C, a “tranquilidade country” de Nashville, a loucura de Austin e Los Angeles, além, é claro, de todas as cores e energia da charmosa New Orleans.
Com todo esse material visual salvo nos HDs, os editores comandados por Meg Ramsay (outra veterana regressa de “Sound City”) brincam com cortes que levam o espectador num passeio ora frenético por capas de disco em movimento, ora pela calmaria que antecede as gravações (ou até da própria cidade). O roteiro de Mark Monroe entrega o dever de casa bonitinho e apresenta o melhor de cada parada de “Sonic Highways” fazendo com que o espectador tenha vontade de olhar os preços das passagens lá para o norte a cada minuto.
Seja ao mostrar as memórias e histórias de lendas como Buddy Guy, Steve Albini e James Murphy como para recuperar e valorizar nomes como Muddy Waters, Naked Raygun e Stevie Ray Vaughan (na presença do irmão Jimmie Vaughan), ou até de lugares como o sensacional Preservation Hall Jazz Band, Monroe é o cara que cuida do cheiro, da vontade de não parar de assistir este presente para os amantes da música. Deixando com Grohl a tarefa de dialogar com os fãs da banda, o roteirista usa sua metade do tempo de cada episódio para brindar ao som vindo da terra do Tio Sam, sem dúvida o grande tchan da série.
Já o diretor é o sujeito que fala pra audiência “foi aqui que eu cresci” ou “naquele bar eu assisti ao meu primeiro show de punk”. Assim como em “Sound City”, o vocalista mostra que aprendeu a ficar por trás das câmeras (algo que veio treinando com alguns clipes ao longo de sua carreira), tira o creme de cada entrevistado e sabe escolher o material que irá ao ar. Claro que o camarada não aguenta e tem que interferir um pouco mais do que precisava em alguns momentos, mas nada que atrapalhe o resultado final.
Tendo uma estrutura bem semelhante, cada um dos oito episódios segue a seguinte receita: duas colheres sobre a juventude de algum integrante, duas pitadas de aula sobre cidade, um pouco de instrução musical, 5 minutos de preparação do estúdio, ensaio e créditos finais com a faixa quentinha que foi tirada desta mistura, afinal, a ideia toda aqui é vender um disco (como em “Sound City” era vender um novo estúdio). Com isto em mente talvez fique fácil entender porque o sexto programa, falando sobre a produção da faixa “In the Clear”, em New Orleans, seja o mais brilhante dos oito.
Com uma linda (e dramática) história recente de superação após o furacão Katrina, este pedacinho da Louisiana abriga os tipos mais interessantes que o espectador verá na série “Sonic Highways” – e olha que a concorrência não é nada fraca – deixando até a gravação do disco e o Foo Fighters em segundo plano por quase uma hora de projeção. Se você quer assistir apenas a um capítulo de toda a série (vale o reforço: todos são ótimos), “In the Clear”, em Nova Orleans, é o obrigatório.
Quanto ao CD, ele não é uma unanimidade e não deve entrar nem em um Top 3 da banda, mas cada faixa produzida por Butch Vig parece soar melhor após assistir à série. De repente esta seja a ideia de Dave Grohl, seja seu Código da Vinci. Agora não basta mais ouvir sua voz e seus acordes de guitarra: se não assistir ao documentário, não procurar sua palestra no South by Southwest e não descobrir em qual banda ele fará alguma participação especial, a experiência do disco não será a mesma. E do jeito que ele é, ainda teremos muito disso pela frente. Seguindo a qualidade de “Sound City” e “Sonic Highways”, tudo bem.
– Kelson Douglas (@kelsondouglas) é especialista em cultura digital na região histórica de Minas Gerais
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Concordo: a série é tão boa que faz o disco do Foo Fighters soar melhor e faz a gente querer ouvi-lo com mais atenção após conhecermos toda a história que influenciou a música.
Assisti os 3 primeiros episódios e o de Nashville foi o melhor para mim; o texto está ótimo e preciso ; e o David Grohl (segurando relativamente bem o ego “estufado”), está se saindo um diretor/produtor muito melhor que um vocalista/guitarrista!!! esperando os próximos 5…
A série é boa, apesar do EGO monstro do Grohl. Mas faltou Detroit, terra de MC5, Stooges, Alice Cooper, Grand Funk e outros.
Eu também, como a silvana, assisti aos três primeiros episódios e, realmente, achei o de Nashville muito sensacional. Também estou super na expectativa dos próximos 5 e, felizmente, estou aprendendo muito e conhecendo novos (ou antigos, e desconhecidos para mim) artistas.
Washington D.C, Dischord e o genial McKaye: pra mim já valeria todo o projeto!