por Lucas Brêda
Sobreviver ao longo dos anos mantendo a identidade, entusiasmo e relevância é um desafio que todas as bandas com carreiras longas têm de enfrentar. No caso do Pearl Jam, já são 22 anos que separam o estouro de “Ten” – disco de estreia do grupo, um dos responsáveis por alçar o grunge ao mainstream – e o lançamento de “Lightning Bolt”, no dia 15 de outubro. De lá para cá, a banda gravou outros oito discos de estúdios, além de álbuns ao vivo e coletâneas. “Lightning Bolt” apresenta a fase atual dos cinco cinquentões (ou quase) de Seattle, e reforça um tipo de rock que é próprio do Pearl Jam, mesmo após duas décadas.
Quando veio ao Lollapalooza (São Paulo), em março, a banda se encontrava no meio das sessões de gravação do disco, que havia começado a ser composto em 2010. Desde então, foram quase sete meses, e um álbum que, diferente de seu antecessor – “Backspacer” (2009) –, é mais arriscado. Ora mais agressivo, ora mais sereno. Além disso, parece ser retrato claro do momento da banda, que estabelecida (quase) como uma empresa (com sede em Seattle), mantém o próprio selo – a Monkeywrench Records – e tem uma relação de fidelidade com os fãs. “Getaway”, faixa de abertura, sugere: “But I found my place / and It’s allright/”.
Entretanto, logo na frase seguinte, a canção revela sua temática essencial: “Holy rollers sitting with their backs to the middle/ All hands on deck, sinking is the bow”. Vedder abre o disco com acidez, criticando aquele tipo de pessoa que, por ter uma crença, sente a obrigação de convencer todos a sua volta a compartilhar das mesmas ideias. Na música, a referência é o fanatismo religioso. A eles, o cantor queixa-se: “I got my own way to believe”.
A primeira parte do disco é marcada por faixas mais intensas, como “Mind Your Manners”, “Lightning Bolt” e “My Father’s Son”. A primeira é provocante, quase um desabafo, guiada pelo riff quebrado de guitarra, e o ritmo mais acelerado de Matt Cameron, na bateria. É de “Mind Your Manners” uma das frases marcantes de Vedder: “The world’s a long love letter/and that makes me wanna cry”.
Com a música que dá nome ao álbum, o Pearl Jam retoma arranjos como os de “Wishlist” (de “Yield”, 1998) e “Unthought Known” (“Backspacer”, 2009), de começo tranquilo e guitarra abafada, que dá sucessão a refrãos potentes e profundos, na força da voz de Vedder. O vocalista prova que, aos 48 anos, ainda é um dos grandes cantores da música pop atual. E agora está dosando os momentos de mais vigor com os versos mais amenos, de tons mais graves, com uma voz quase terna – possível descendência de sua carreira solo.
Se boa parte de “Backspacer” (2009) tem influência direta do disco solo de Eddie Vedder (Into The Wild – 2007), “Lightning Bolt” não é diferente. Os lançamentos de “Ukulele Songs” e “Water On The Road” – registro em vídeo de Vedder acústico, ao vivo – revelaram um cantor sentimental, orgânico e íntimo, que volta a dar as caras para uma leva das canções do novo disco de sua banda. Dentre elas, “Pendulum”, “Yellow Moon” e a regravação de “Sleeping By Myself”, presente no último disco do vocalista.
“Sleeping By Myself” é uma das canções mais marcantes de “Ukulele Songs”, entretanto, em “Lightning Bolt” parece deslocada, mesmo com nova roupagem, solo de guitarra e os vocais de apoio de Matt Cameron. Apesar de colorir a segunda – mais singela e tranquila – parte do disco, é uma canção que soa desnecessária, e quando hega ao fim, a sensação é de que voltamos a ouvir o disco que paramos há 3 minutos.
“Não há nada mais legal do que ouvir uma música nascendo, aí ver o Eddie cantando por cima…”, disse Mike McCready em entrevista à Rolling Stone Brasil de Março deste ano. A frase do guitarrista parece tomar forma com a audição de “My Father’s Son”, onde a voz de Vedder surge entre os harmônicos de guitarra e a linha de baixo, trazendo um tema que atormenta o vocalista – e Freud – desde os primórdios. Clássicos de “Ten” (“Jeremy”, “Alive” e “Release”) foram criados a partir da indignação de Vedder em relação a seus pais – mãe que mentiu sobre verdadeiro pai, que por sua vez, nunca foi presente –, e desta vez, “My Father’s Son” vem como uma das canções mais agudas e sinceras de “Lightning Bolt”. Na letra, Vedder projeta a conversa com seu pai, “How’s about one conversation/ With nothing else left to be had?/ With this your young long lost son/ And his never had dear old dad”.
Com “Sirens”, o Pearl Jam tenta recriar um tipo de balada que lhe é peculiar (vide “Betterman”, “Off He Goes”, “Nothingman”). O sucesso, entretanto, não é absoluto. Se a criação dessas canções fosse como fazer um bolo, em “Sirens”, sobra açúcar. Mesmo sendo uma das favoritas dos integrantes, ela remete a alguns grupos que, há 10 anos, se espelhavam no próprio Pearl Jam para compor baladas extremamente melódicas e pegajosas – como o Nickelback e o Creed. “Infallible” segue a tônica e talvez seja o ponto baixo do álbum, com melodia repetitiva, quase enjoativa. Das baladas, “Future Days”, é a mais nova e interessante. Após a introdução de piano, ela segue guiada pelo violão dedilhado e um Eddie Vedder apaixonado encerrando um disco que reforça a presença do Vedder da carreira solo no momento atual da banda, e deixa incerto se isso permanecerá constante daqui pra frente.
As altas vendagens de “Lightning Bolt” só comprovam o quanto o Pearl Jam ainda é forte no universo da música pop, além de mais consistente que os contemporâneos de grunge Soundgarden e Alice In Chains, que também lançaram disco recentemente – sem tanta relevância. Se lançar bons álbuns é uma característica do Pearl Jam, “Lighning Bolt” segue linear em sua discografia, e mostra um grupo que não perde a cara, mas que está cada vez acomodado na zona de conforto. Fica o desânimo de quem esperava algo mais ousado, e, para o futuro, resta a expectativa por trabalhos mais sólidos, mais ambiciosos, que vão além de um conjunto de boas canções.
– Lucas Brêda (@lucasbreda94) é alagoano, mineiro e paulista. Comentarista de futebol e aspirante a jornalista. Assina o http://lucasbreda94.tumblr.com/
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O Pearl Jam não é de ousar. Não lançará um Kid A no futuro. É o tipo do acomodado que sempre está ganhando o jogo, não dependendo de muitos artifícios. Vide AC/DC, Kiss, Motorhead e Ramones.
Pelo som atual do PJ, acho que a proposta da banda daqui para frente, é deixar-se guiar pelo amadurecimento de seus fãs fiéis. Claro, abocanhando “novos” por conta das músicas mais “doces” da carreira solo do Vedder. Como fã, gostei do disco. Melhor que os dois últimos. A tônica: não esperava nada mais do que já estava esperando. PJ é difícil de decepcionar e ousar. Isso basta.
Tens razão. e outra coisa: o que é efetivamente ousar? Kid A pode até ser ousado, mas não é mais bacana que the bends ou ok computer. o importante é continuar no caminho escolhido, sendo relevante, fazendo boas musicas, shows fodas e mantendo a integridade
Por estes dias li que na literatura é comum o autor de uma resenha se embrenhar nas suas próprias idéias e enveredar numa crítica do que ele mesmo acha que seriam as boas escolhas que poderiam estar ali na obra. To percebendo que na música isso ta bem parelho.
Não, não estou trazendo à tona o debate sobre isenção. Foda-se, nem os cínicos estão mais dando conta de isenção. Mas seria pedir demais que no final do artigo vc NÃO fique com a impressão que precise saber mais sobre o tal autor da resenha pra saber de onde ele fala e pq falou tais coisas? A última frase é uma incógnita, parece ser cabível em qq resenha, tanto que os comentários que me antecedem tratam de OUSADIA. qq um pode ser cobrado por falta de ousadia e isso pariu as Lady Gaga da vida atualmente, ou os tiozão parodiando indie pra virar notícia.
Não, não é obrigatório elogiar. Tb foda-se isso. Mas pq o autor perde tempo com isso é que me impressiona… parece querer fisgar leitores pra sua próxima coluna “olha isso aí é uma merda, mas na próxima eu mando umas VERDADE pra vcs!”.
Ouvi a primeira vez o disco do PJ enquanto estava escrevendo isso aqui, e estive no Lolla deste ano com uma banda aparentemente cansada e tocando o foda-se, o disco é uma continuidade clara do Backspacer e tem na sua produção seu ponto alto, muito mais pop e com construções de ambiente mais claros e visíveis do que o que foi feito anteriormente. É um caminho, dentre tantos outros.
Concordo plenamente, Ismael. O ponto final, é que o PJ “NUNCA” vai ousar, não está no DNA da banda. Isso, podemos deixar para outros grupos, no entanto, num saldo final, a discografia do PJ, é bem positiva, poucas bandas da safra mais nova, vão conseguir a façanha de Vedder e companhia. Aliás, dos grupos da década de 90, com certeza, o PJ é um dos melhores.
Radiohead – gosto do Hail, Kid A, In Rainbows, mas de boa, igual ao OK Computer, never mais. O próprio Yorke ficou mal depois de lançar a obra, pois percebeu que ali, estava a sua obra máxima. O que eu espero, é que o Radiohead, solte as amarras, e faça um disco mais orgânico. Pois rock reto, também pode ser inteligente. E os caras são e sabem fazer. Vide The Bends.
O último disco decente do Pearl Jam é “No Code”. Depois disso eles viraram uma bandinha qualquer nota. Esse “Lightning Bolt” não é ruim, mas também não é bom. É um álbum pra se esquecer em dois meses. Uma pena. Ainda hoje ouço o “No Code” e “Vitalogy”. Esses discos novos do Pearl Jam só server pra mudar o nome da turnê. A questão não é ousar, é fazer o mais do mesmo bem. E nisso o Pearl Jam está pecando faz tempo.
Pearl Jam bom mesmo so foi ate o Yield, depois disso so coisa descartavel, esse novo album é bonzinho e so isso, muito pouco pra uma banda do porte do PJ, vinha ouvindo ele no ultimo mês e hoje não consigo lembrar uma musica sequer do dito cujo, alias, não lembro uma musica sequer dos 3 ultimos albums da banda.
Ta na hora da banda enveredar por novas sonoridades, LB ta muito mais do mesmo e sem a mesma energia de antes, não to pedindo pra banda fazer um Kid A, mas tentar algo novo as vezes é bom, essa zona de conforto deles ja deu o que tinha que dar.
Não acho que o Pearl Jam esteja pecado.Deve ser a questão da idade mesmo.A banda está tocando mais madura,fazendo seus discos de forma mais madura,não tem outro jeito.Mas o DNA está ali,canções fortes,isso que importa.Talvez o problema seja algo que marque,mas isso é questão do tempo,dos fãs,da sonoridade.Tem um pouco disso tudo.
O Pearl Jam continua relevante porque é uma banda que soube amadurecer sem precisar se enveredar por caminhos tortuosos (e muitas vezes catastróficos) como tantas outras com seus mais de 20 anos. Criar expectativas de que os tios façam um novo Vitalogy é minimamente estúpido. Digo que Lightning Bolt é adequado, coube certinho em 2013. Além do mais, o importante mesmo é que, quando as luzes se apagam e as guitarras gritam, não tem pra ninguém: o Pearl Jam, nos palcos, mantém o espírito de “once upon a time I could lose myself…”
como diria o outro: veja como é a natureza. gosto do Pearl Jam, acho umas das bandas mais sofisticadas da existência da música. souberam superar o grunge e tal…
outra coisa: acho Infalible uma das coisas mais ousadas e diferentes que eles fizeram em toda discografia. o Lighting Bolt (que me lembra um bocado o Binaural) me parece daqueles discos que daqui uns anos todo mundo vai parar e dizer que era muito bom, vai virar um disco cult. penso que isso tem relação com a idade. é um disco que saberá envelhecer. pode crer, por exemplo, que o Mac entende pra caramba o disco rsrsrs
A característica principal do PJ é realizar trabalhos sólidos, sempre com um conjunto de boas canções. Se por “ousadia” entende-se suceder discos sensacionais como “The Bends” e “Ok Computer” por um broxante “Kid A”, os fãs do PJ preferem dizer “não, obrigado”. Seguindo processo iniciado no clássico “Vitalogy”, o badass “No Code” espantou de vez o fã de ocasião, aquele cara que pegou carona no grunge sem saber do que a banda era feita. Desde então, o PJ lança ótimos discos sucessivamente e é dono de um dos melhores e mais concorridos concertos de rock do mundo. “Lightining Bolt” não só é o melhor trampo dos caras desde “Yield” como “Sirens” é a mais forte canção deles desde “Given to Fly”. Isso em um disco que ainda traz “My Father’s Son”, “Getaway” e “Let The Records Play”. Amadurecer de forma digna e manter-se relevante do Classic Rock não é para qualquer banda. O Pearl Jam conseguiu.
Hahaha, me deixe (eu e meus cabelos brancos) de fora dessa, Eder.
Mas ó, o tempo passou e “Binaural” continua sendo um disquinho qualquer. De tudo que está sendo discutido aqui, digo apenas: idade não é reflexo de acomodação. Paul McCartney e David Bowie lançaram grandes discos este ano (sem ousarem, fazendo o que sabem), Neil Young fez o mesmo no ano passado. Não dá pra ficar tapando o sol com peneira, sabe.
Marcelo,
Sei que não tem a ver com este tópico, estou conhecendo agora a carreira do John Mellencamp. Vale a pena ir atrás de alguns discos clássicos do cara? Lendo por aí, dizem que é o Springsteen segunda linha. Enfim, aguardo o seu comentário (se possível).
Parabéns pelo site. Repleto de informações relevantes.
desculpa Marcelo, mas esse seu enviado/colaborador devia se ater mesmo ao futebol alagoano (???).
A pessoa que ao longo de 22 anos usa o album “TEN” pra justifcar a evolução da banda não merece minha leitura.
Confio no Ligthning bolt como um album que, a cada audição melhora e sintetiza um rock maduro; nao vou dizer que seja grunge, pois não é mais desde vitalogy, mas é uma banda que ao vivo é uma das melhores em atuação e, com este album, pelo menos na primeira perna da turne que acompanhei, continua vigorosa e inspirada em seu propósito. isso ja vale 4 anos de espera.
Desculpo não, xará.
Resenha é opinião, e você não pode desmerecer a opinião de outra pessoa: é o que ela acredita e e ela tem direito de acreditar, ainda mais quando argumenta pra isso. Você pode não concordar com o ponto da argumentação, contra-argumentar, apontar coisas que fazem você achar que o tal objeto em discussão é relevante, mas diminuir a opinião de alguém é indesculpável.
eu nunca ouvi Pearl Jam. tô perdendo alguma coisa?