por Juliana Torres
O ano era 1987. Em uma cidade 144 km ao Norte de Seattle, uma cena completamente diferente da que estava acontecendo na maior cidade de Washington começava a surgir. Acompanhando de longe a explosão grunge que acontecia no sul do estado, Bellingham foi berço de dezenas de bandas de garage rock, que aproveitavam a distância geográfica para criar uma nova identidade que não se confundisse com a que deu visibilidade ao noroeste do país.
Entre um palco e outro surgiu o Mono Men. Com 26 anos de história e 10 álbuns de estúdio, a banda vem ao Brasil pela primeira vez e traz seu rock seco, inspirado no proto-punk local dos anos 60. Aproveitei minha recente passagem por Seattle – acompanhando o jubileu de prata da Sub Pop – para entender quais eram as principais mudanças na região desde o fim da era grunge em meados dos anos 90. “Tudo começou lá, você tinha que lidar com promotores ao invés de outras bandas ou clubes, se quisesse reservar um show. Não valia a pena o incômodo” relembra Crider.
Em papo exclusivo via e-mail com o Scream & Yell, o guitarrista e vocalista Dave Crider, também fundador do selo Estrus – responsável por lançar discos do Man or Astro-Man e Watts – e o baixista Dave Morrisette falam sobre as diferenças entre Seattle e Bellingham, o início da cena garage em Washington, o que beber quando estiver excursionando e dá dicas do que ouvir para curtir melhor a turnê sul-americana da banda. Bom papo!
Por que vocês demoraram tanto para fazer uma turnê pela América Latina? Nós estávamos esperando por vocês.
Dave Crider: Bom, ninguém havia nos chamado até agora. Isso não é muito preciso, mas o pessoal da Monstro nos chamou para fazer shows por aí em 2000, mas não pudemos então eles chamaram o Watts e foi um grande momento. Nós fizemos muitos shows com o MQN e com o Thee Butchers’ Orchestra. E nós bebemos MUITA cachaça.
Dave Morrisette: Eu não sabia que havia tanto interesse da América do Sul até Dave (Crider) voltar de uma turnê com o Watts, creio eu, e dizer que as pessoas realmente gostavam do Mono Men. Lamentamos que tenha levado tanto tempo. Quando nos reunimos para o aniversário do nosso amigo Carl, no começo deste ano, perguntamos ao Dave se ainda havia interesse de nos levar para aí. Realmente queríamos tocar na América do Sul e estamos super animados por termos essa chance. Estamos honrados em estar tocando para vocês e vocês se divertirão como nunca!
Será a primeira vez de vocês também na Argentina. Estão preparados para a energia do público argentino? Já viram algum vídeo de shows no país? É bastante intenso.
Dave Crider: Nós gostamos quando é assim – é como acontecem os melhores shows – venham com tudo!
Dave Morrisette: Dave Crider sabe a intensidade, mas eu não. Sei que fizemos shows em outros lugares que tiveram públicos realmente intensos e incríveis. Mas eu ouvi que vocês estão bem no topo, então nós estamos empolgados para ver pessoalmente.
Aqui no Brasil vocês tocarão em Brasília, em outro festival que trará nomes como Mark Lanegan e Suicidal Tendencies, vocês já tocaram com eles outras vezes? Como vocês se sentem a respeito?
Dave Crider: Nunca toquei com nenhum deles antes, mas sou grande fã do Screaming Trees e adoro o trabalho solo do Lanegan. Estou realmente ansioso para ver seu set, com certeza.
Dave Morrisette: Eu vi Lanegan com o Screaming Trees algumas vezes, mas não consigo me lembrar do Suicidal Tendencies (eu realmente bebia muito naquela época).
Em 2006 vocês fizeram uma turnê chamada “Spanish Attack” com shows em Bellingham e na Espanha. Algum motivo especial para escolher a Espanha?
Dave Crider: Na verdade, a Espanha nos escolheu. Nosso amigo Roberto, que organiza o Freakland Festival, em Ponferrada, nos fez uma oferta que não pudemos recusar. Nós sempre nos divertimos muito na Espanha e pensamos “por que não?”. Então nós tocamos no Freakland Festival e fizemos outros diversos shows… E tomamos MUITO vinho.
Dave Morrisette: A melhor razão: alguém nos chamou (risos). Nós amamos a Espanha e gravamos um disco em Madri, em 1995.
O Mono Men começou como uma banda instrumental em 1987 chamada Roofdogs, certo? O que restou desta banda no que é o Mono Men hoje?
Dave Crider: Definitivamente o EP “Shut UP” tem várias músicas que foram originalmente escritas para um LP do Roofdogs que nunca aconteceu. Rock instrumental é um dos meus favoritos – sempre temos uma música instrumental pronta. Estou realmente ansioso para tocar com (os argentinos do) The Tormentos novamente. Eles fazem um ótimo surf rock instrumental, eles sabem fazer isso direito.
Dave Morrisette: Dave Crider e eu somos os únicos membros do Roofdogs que gravamos algo. Aaron, o baterista do Mono Men, tocou no final dos dias da Roofdogs. E, sim, nós éramos instrumentais e 1987 parece ser o ano correto.
Em diversas entrevistas vocês gostam de relembrar que a cena em Seattle foi diferente do que aconteceu em Bellingham. Como foi o início da cena garage rock em Bellingham, cidade ainda mais isolada que Seattle no início dos anos 90?
Dave Morrisette: Não havia cena de garage rock em Bellingham antes de Dave começar a Estrus. Mesmo depois, fomos uma parte muito pequena da “cena musical de Bellingham”. Na época havia uma grande comunidade de blues, uma comunidade folk e de art rock. O Festival Garageshock talvez tenha gerado um grande interesse internacional, mas os músicos locais eram geralmente indiferentes a ele.
Fui ao Sub Pop Silver Jubilee este ano e fiquei decepcionada por vocês não estarem no line-up. Qual foi a importância do selo para a carreira do Mono Men?
Dave Crider: Eu não esperava que tocássemos no festival porque só lançamos um single com eles. Mas a admiração em massa por eles terem continuado com tudo durante esse aniversário foi realmente ótima. Mudhoney no Space Needle foi animal. Na verdade, nós estávamos tocando do outro lado da cidade, no Seattle Summer Festival com o Young Fresh Fellows – foi muito divertido. E nós tomamos MUITA cerveja.
Dave Morrisette: Nós trabalhamos com a Sub Pop de forma mais indireta. O single que eles lançaram foi ótimo, mas eu não acho que eles nos ajudaram tanto. Mas eles foram os responsáveis por toda a atenção que a cena musical de Seattle estava recebendo, então nós somos muito gratos.
Como era o relacionamento de vocês com bandas que estavam estourando na cidade vizinha? Vocês tocavam com o pessoal do Mudhoney, Mother Love Bone e Melvins?
Dave Crider: Nunca toquei com nenhuma dessas bandas. Eu sei que parece que em algum ponto todos nós tocamos juntos, mas nós estávamos longe de toda essa cena. Bellingham é 140km a norte de Seattle. Na verdade nós tocávamos mais no centro-oeste e na Bay Area que em Seattle.
Dave Morrisette: Nós não tocamos com essas bandas, mas tocamos com outras grandes bandas da região. As pessoas nunca ouviram falar de muitas das bandas, mas havia algumas realmente surpreendentes (Dead Moon, The Fallouts, Flop, Gravel, Gas Huffer, Young Fresh Fellows, Everclear, Girl Trouble, Galaxy Trio, Surf Trio, Marble Orchard). Vi muitas dessas bandas em lugares pequenos antes delas se tornarem importantes. Por exemplo, eu vi Nirvana, Skinyard e Coffin Break em um clube em Bellingham chamado Speedy O’Tubes, e eu só fui porque queria ver Coffin Break (risos). Kurt Cobain entrou em uma briga com seu baterista na época e o show do Coffin Break foi ótimo.
Li em alguma entrevista que é difícil para vocês tocar em Seattle. Que muita coisa havia mudado desde então. Podem falar um pouco sobre isso?
Dave Crider: Nós tocamos bastante em Seattle, mas como tudo começou lá, você tinha que lidar com promotores ao invés de outras bandas ou clubes, se quisesse reservar um show. Não valia a pena o incômodo, na verdade. Mas Seattle ainda tem vários ótimos lugares para tocar. Meu favorito é o Slim’s Last Chance Saloon, em Georgetown. Fiz um ótimo show lá com minha outra banda, The DT’s, Endino’s Earthworm e Tom Price. Eu bebi MUITO whisky.
Dave criou a Estrus Records em 1990 e todos os discos da banda são do selo. Você já imaginava se tornando um selo com diversas bandas?
Dave Crider: Na verdade, nós lançamos alguns singles em outras gravadoras, mas a maioria dos discos completos era mesmo pela Estrus. Definitivamente era apenas para lançar a nossa música, mas a coisa meio que expandiu a partir daí.
O que nós podemos esperar da Estrus para os próximos meses?
Dave Crider: Não lançaremos novos discos, mas definitivamente iremos reeditar alguns vinis.
Crider, você teve outras bandas como Watts e The DT’s que soavam muito diferente do Mono Men. Você sente que completava algumas lacunas pessoais tocando nessas bandas?
Dave Crider: Sim, todas as bandas são diferentes, assim como as pessoas que fazem parte dessa banda. Watts foi uma extensão do que nós estávamos fazendo, mas ter Jeff Bramies na banda, com suas influencias de metal, com certeza levou as coisas para outra direção. E, para mim, foi ótimo não ter que me preocupar em cantar, apenas em tocar guitarra. Estou super orgulhoso do disco que fiz com Watts. É algo parecido com que o acontece com o The DT’s. Eu conheço nossa vocalista, Diana, desde o colegial. Na verdade, ela estava na minha primeira banda naquela época. Nós sempre conversamos em ter uma banda juntos, mas o tempo nunca batia até que ela teve que se mudar para cá e terminar a escola. Quando o DT’s começou era apenas guitarra, bateria e voz, então isso me deu muito espaço para completar com a minha guitarra, o que me forçou a aprender a tocar diferente. Sempre me divirto tocando com o DT’s.
Se o Mono Men fosse lançar um disco agora, qual seria a principal diferença entre ele e o “Stop Dragging me Down”?
Dave Crider: Eu diria que, aproximadamente, 25 anos (risos).
Dave Morrisette: Provavelmente não muito. Nós tocaríamos os três acordes com muito gosto.
Além de vocês, obviamente, quais outras bandas vocês indicariam para ouvirmos antes dos shows de vocês aqui no Brasil?
Dave Crider: Tenho escutado muito o Unnatural Helpers, de Seattle.
Dave Morrisette: Bandas que eu sempre recomendo: The Nomads, The Saints, Dexateens, The Cynics, The Wipers, Watts…
Podemos esperar novos trabalhos do Mono Men para os próximos anos?
Dave Crider: Não há nada programado, mas, sabe como é “nunca diga nunca”.
Dave Morrisette: Eu espero que sim. Nunca dica nunca (risos).
– Juliana Torres (@jukiddo) é jornalista e assina o http://jukiddo.tumblr.com/
mono men ao vivo.
mais um sonho realizado.
muito boa a entrevista!!!
um abraço!!
Não conhecia Mono Men, fui ontem no Porão do rock só pra assistir mark lanegan e tive uma grata surpresa com som desses caras, grande show. Espero que possam voltar mais vezes e lancem novos trabalhos.