Texto por Leonardo Vinhas
Fotos por Stephan Solon (Via Funchal)
Rock and roll is NOT free. Custava R$ 180 no lugar mais barato, ou 100 com a carteirinha falsificada (ou na mão do cambista, se você soubesse pechinchar). Mas valia cada centavo, pois o rock and roll em questão estava sendo executado pelo senhor Ben Harper.
Teoricamente Harper veio ao Brasil para divulgar seu último álbum, o sensacional “Give Till It’s Gone”, mas parece que ele e sua banda de agora, os Relentless7, estavam mais a fim de tocar o que quisessem, como quisessem, celebrando a possibilidade de fazer boa música noite após noite.
Ingenuidade acreditar nisso? Difícil pensar assim ao ouvir “With My Own Two Hands” ser transformada em uma delicada peça de esperança, substituindo o tom reggae rock-paga-pau-de-Bob-Marley da versão de estúdio. Ou presenciar uma versão de uns doze minutos de “Lay There and Hate Me”, cuja intensidade (já bastante palpável no disco “White Lies for Dark Times”, de 2009) não diminuía por um segundo que fosse.
“White Lies for Dark Times”, aliás, parece ser o preferido do músico texano atualmente, pois dele saíram cinco canções que compuseram o repertório dessa úmida e quente noite paulistana: “Trouble with No Name”, “Fly One Time”, “Up to You Now”, “Shimmer $ Shine” (a abertura do show) e a já citada “Lay There and Hate Me”. Do disco mais recente, só a homenagem a Neil Young de “Rock’n’ Roll is Free” e a pungente “Don’t Give Up On Me Now”, que teve sua contundência emocional sublinhada por um falsete insuspeitamente frágil que a voz de Harper manifestava no refrão.
Aliás, o alcance vocal do cidadão parece aumentar com a idade. Em “Better Way”, ele variou do canto pop ao desabafo gutural sem qualquer dificuldade. “Where Could I Go”, preciosidade soul que Ben Harper gravou com os Blind Boys from Alabama, foi outro momento em que se pôde constatar que ele sabe equilibrar doses idênticas de sentimento e técnica sem que se distingua um do outro. O momento só não foi mais belo porque o mal-educado público foi incapaz de fazer silêncio quando Ben dispensou o microfone para fazer um número a capella. Havia muita conversa fiada para rolar, e isso era mais importante que ver um soulman em seu auge.
Soulman? Auge? Sim, Ben Harper tem soul. Mas sua música vai mais longe. O que ele faz hoje – desde que se associou aos Relentless7, para ser mais exato – é um blues rock sem qualquer dos clichês do gênero. E o cidadão está no auge. Como explicar seus dois últimos discos senão dessa forma?
Se é para correr o risco dos exageros, que seja sem medo: na verdade, a sensação era de estar presenciando uma lenda viva no palco. Infelizmente, Ben Harper é mal interpretado, e não só em território brasileiro. Aqui, vale lembrar, ele ainda é percebido como “aquele cara meio parecido com o Jack Johnson” – só porque ele apadrinhou o surfer boy e tem alguns hits acústicos. Ou pior, é lembrado como “o negão que canta aquela música com a Vanessa da Mata”.
Na gringolândia, ele é alguém que está à margem do mainstream sem necessariamente estar no underground. Porém, depois da extensa apresentação no Via Funchal naquela noite, era difícil não sair com a crença de se ter presenciado algo único, especial e poderoso. Algo que só a melhor música – e aqui não cabem sectarizações genéricas – pode proporcionar. Uma apresentação tão potente que torna até “aquela música com a Vanessa da Mata” uma canção desfrutável: “Boa Sorte/Good Luck” fechou o show, com a cantora brasileira como convidada. Não precisava disso: já sabíamos que éramos sortudos por ter estado lá.
– Leonardo Vinhas assina a seção Conexão Latina (aqui) no Scream & Yell e já entrevistou o Lambchop em 2002 (aqui) e escreveu sobre o show do Bad Religion em São Paulo (aqui)
Leia também:
– “Give Till It’s Gone”, um dos melhores álbuns da carreira de Ben Harper, por Leo Vinhas (aqui)
– ”Diamonds on the Inside”, Ben Harper: um disco essencial, por Tomaz de Alvarenga (aqui)
Se Boa Sorte/Good Luck não tivesse feito o baita sucesso que fez seria uma pérola esquecida que ninguém ouviu. Como fez torna-se execrável
Essa babaquice parece que não vai ter fim.
Uma música é boa, e essa é, independente de ser muito ou pouco conhecida.
Quanto Ben Harper, já gostei. Continuo tendo respeito, mas hoje em dia prefiro os originais.
O cara é um grande instrumentista e bom compositor, mas, para mim, não rola não. Tudo muito genérico e diluído. Tipo de som que meus amigos praieiros (sendo que onde moro não tem praia), maconheiros e metidos a naturebas curtem em conjunto com planta e raiz e demais genéricos. Chamo de reggae-rock-pop para o gosto médio.
Foi um “momento” único. Valeu o atraso de 1h, porque a banda de abertura (desconheço o nome, pois quando cheguei já estavam se apresentando) insistia em não sair de cima do palco.
Ótimo texto, se eu não tivesse ido nesse show, depois de lê-lo, com certeza teria me arrependido.
Preciso admitir que concordo com o Paulo Diógenes… e vi um show dele ano passado – foi tão emocionante quanto assistir tinta secar.
Faltam palavras pra falar dele,porque ele tem onze discos(contando com o dos blind boys of alabama)e não errou em NENHUM deles.E o mais incrivel não é só ele passar a margem do mainstream,mas também passar a margem da critica que prefere falar de nomes idiotas.Comparar com o Jegue Johnson é de uma burrice nojenta,porque esse branquelo só fica repetindo as musicas no violão,com aquela sensação hippie tosca de estar na praia.Fora que os playboys gostam dele.Mas,voltando ao Ben,ele é unico mesmo,passeia por todos os ritimos sem dar mole.É muito foda,e não está nem ai pras modinhas,simplesmente faz musica com o coração,fugindo desse clichê.
Jack Johnson é realmente insípido, inodoro e incolor. Som de modelete bobinha – desculpando a redundância.
Já o Ben Harper, como o Paulo disse, é genérico.
Ele me parece bem intencionado, mas falta sustança, como diria o matuto, ao seu som.
PS: Emocionante como ver a tinta secar transcreveu à perfeição. rsrsrsrrsrs