Texto por Marcelo Costa
O Snow Patrol era, até o meio de 2003, apenas mais uma bandinha indie do quinto escalão do pop mundial. Com dois bons álbuns lançados pelo selo escocês Jeepster (o cru “Songs For Polarbears” de 1998 e o mais trabalhado “When It’s All Over We Still Have To Clear Up” de 2001), o grupo mais chamava a atenção pelas participações especiais de membros do Belle and Sebastian em seus discos do que por mérito próprio. Isso tudo, porém, ficou para a história. No meio do ano passado, o Snow Patrol assinou com a major Interscope, recebeu o auxílio de Garret Lee (produtor do Basement Jaxx e TLC) na produção e colocou nas lojas europeias, em agosto de 2003, o aclamado “Final Straw”, que ganhou edição americana em março de 2004 e chega só agora, com um ano de atraso, ao Brasil.
Talvez não explique muito, mas este deve ser o primeiro disco que coloca este pobre resenhista em concordância com ‘pesos-pesados’ da “crítica musical nacional” :_) como Lúcio Ribeiro (Ilustrada) e Álvaro Pereira Júnior (Folhateen) (dois jornalistas que, por sinal, raramente concordam entre si). Convenhamos: um disco que consegue unir opiniões tão díspares deve ter alguma coisa interessante.
Em “Final Straw”, o Snow Patrow une a paixão por arranjos sinfônicos do Echo & The Bunnymen, o vício pelo doce psicótico do Jesus and Mary Chain e a obsessão pelas alfinetadas de eletrônica do Joy Division. Passado pela centrifuga pop dos escoceses, o resultado desta mistura é um britpop pungente e vigoroso, que remete ao Coldplay em algumas passagens. Porém, o sensível Gary Lightbody (guitarrista, vocalista, letrista e ‘dono’ do Snow Patrol) tem a vantagem de não cantar chorando e, principal, suas letras alcançam bons resultados relatando pequenos fatos do dia-a-dia.
São frases comuns que quase todo mundo já disse ao menos uma vez na vida. “Everything We Have Is All We Need”, canta Gary em “Wow”, a guitarreira segunda música do disco. “Lie Back And Surfer Now / We’ve Both Earned Our Reward” diz o refrão de “Gleaming Action”, outra que traz guitarras estridentes. “Iv’e Not Opened My Mouth / Can You Read My Mind So Easily” crava “Whatevers Left”. Um dos trechos mais belos do disco está no single “Spitting Games”, que além de um riff de guitarra tão potente que gruda na testa do ouvinte traz a frase “My Heart Is Burning Is Your Perfect Eyes / As Blue As Oceans And As Pure As Skies”.
Musicalmente, o grupo pratica pop songs assobiáveis da melhor qualidade. O repertório é tão coeso que poucas canções se sobressaem, mas é possível destacar o hit ‘Spitting Games”, a baladaça “Run” e “How To Be Dead”, a primeira do disco, que tem começo falso, manipulação de tapes, barulhinhos eletrônicos, defeitos e alto teor pop. Com este belo “Final Straw”, o Snow Patrol abandona o gueto indie e alça vôos mais altos. Logo logo, com o sucesso de massa batendo a porta, acontecerá o contrário do início da carreira: o Belle and Sebastian será apenas um grupo desconhecido cujos integrantes marcaram presença nos dois álbuns cult da banda de Gary Lightbody. O mundo dá voltas.
– Marcelo Costa (@screamyell) é editor do Scream & Yell e assina a Calmantes com Champagne.