"Don’t Believe The Truth", Oasis
por Jonas Lopes
Yer Blues
29/05/2005
Nenhuma banda da última década envelheceu tanto quanto o Oasis.
O primeiro trabalho da banda, o já clássico Definitely Maybe,
saiu há apenas onze anos, mas a banda já parece um dinossauro
com trinta anos de carreira nas costas. Um dos motivos para
isso foi o surgimento de muitos grupos que entraram "na
crista da onda". O velho comportamento da imprensa inglesa
- criar modas e salvações de rock a cada minuto para depois
descartá-las e substitui-las -, faz com que as bandas mais antigas
pareçam cada vez mais cadavéricas. Tem também o comportamento
dos Gallagher: a verborragia de Noel e a inconseqüência junkie
de Liam devem ser a coisa mais old fashioned para esse pessoal
coxinha e comportado de Travis, Starsailor e companhia. Coisa
do tempo em que roqueiro comia criancinha e morria de overdose.
Os lançamentos do Oasis já não são grandes acontecimentos há tempos. O último trabalho que gerou expectativas realmente altas foi Be Here Now, em 1997, quando as lojas abriram as portas de madrugada para vender o disco, rádios brigavam pelo direito de serem as primeiras a transmitir as novas músicas e um mega esquema de marketing foi armado pela Sony para atiçar o fanatismo dos fãs. Essa expectativa não se repetiu com os discos seguintes: só se falava em Travis e seu The Man Who quando Standing On The Shoulder Of Giants saiu, e os olhos do mundo estavam voltados para o que viria do Coldplay em 2002, quando os irmãos Gallagher soltaram Heathen Chemistry. A sorte foi Be Here Now ter saído poucos meses depois de Ok Computer, antes que o hype em cima do Radiohead atingisse seu ápice.
Claro que o Oasis também tem culpa no cartório, nesse processo
de envelhecimento. Pesa o fato de o som da banda ser essencialmente
velho e voltado para o passado. Ainda mais fazendo shows em
estádios, para dezenas de milhares de pessoas, uma coisa muito
década de 70. Mas o que se pode fazer? O resultado é pior quando
eles tentam soar "jovens", como nos loops de Standing
On The Shoulder Of Giants. Parecem tiozinhos de bermuda,
deslocados, querendo parecer cool aos olhos da molecada. Não
funciona. Melhor assumir o tom retrô de vez, então, e tentar
fazer o que a banda sabe de melhor. A primeira tentativa de
se reafirmar veio com Heathen Chemistry, superior a Standing,
mas ainda irregular.
Don’t Believe The Truth, sexto disco oficial dos Gallagher, dá um salto significativo de qualidade em relação a Heathen Chemistry. É um bom disco de rock burro - rock de verdade, sem vergonha de assumir isso. A banda toda está bem. Gem Archer (guitarra) e Andy Bell (baixo) estão finalmente à vontade e entrosados com os irmãos Gallagher. A única alteração na formação, sábia, é a entrada de Zak Starkey (filho de Ringo Starr) na bateria, no lugar de Alan White. Zak é sólido como o pai. Liam voltou a cantar como nos bons tempos, após a preocupante rouquidão e as engasgadas que vinha dando. Em The Meaning Of Soul atinge o perfeito equilíbrio entre técnica e energia. E Noel ainda é mestre no que sabe fazer melhor, grandes composições sem perder a simplicidade - como na barulhenta Mucky Fingers e seus três acordes.
A primeira metade de Don’t Believe The Truth é irretocável. Turn Up The Sun, composição de Andy Bell, faz jus à característica do Oasis de sempre abrir bem seus discos (só para lembrar: Rock ‘n’ Roll Star, Hello, D’You Know What I Mean, Fuckin’ In The Bushes, The Hindu Times; todas ótimas). Entre as primeiras, Noel canta duas: a excelente e sessentista The Importance Of Being Idle, talvez a melhor do disco e candidata a hit, e Mucky Fingers, que junto com The Meaning Of Soul representa o lado vigoroso da banda, de inspiração pré-punk. Em Love Like A Bomb Liam dá sinais de talento como compositor (o que já havia feito com Songbird, destaque de Heathen Chemistry). Lyla, o primeiro single, composta por Noel e cantada por Liam, também é muito boa. A decisão de privilegiar os rocks em detrimento das baladas foi acertada.
A segunda metade do álbum é menos consistente. A melhor faixa é Keep The Dream Alive, que, não fosse de Andy Bell, com certeza seria o primeiro compacto. Já Part Of The Queue e Guess God Thinks I’m Abel, a primeira de Noel e a segunda de Liam, são esquecíveis - Guess God Thinks I’m Abel funciona mais como piada, pela referência bíblica no título. Agora, de lascar mesmo é a mania que vem desde Standing On The Shoulder Of Giants de colocar pelo menos uma balada irritante, de tão açucarada. Antes era Little James e Stop Crying Your Heart Out, e agora é Let There Be Love. Terrível. Excesso de glicose faz mal, rapazes. Deviam ter tirado essa e colocado no lugar a instrumental I Can See It Now, b-side de Lyla. De qualquer forma, os pontos positivos do álbum sobrepõem com folga os negativos.
Numa hierarquia imaginária, Don’t Believe The Truth ocuparia
um quarto lugar na lista de melhores trabalhos do Oasis, atrás
dos imortais Definitely MaybeM e (What’s The Story)
Morning Glory e do subestimado Be Here Now. Pode
parecer pouco, mas, acredite, não é (faça as contas: é o melhor
disco do Oasis nos últimos oito anos!). E mais: essas são as
primeiras músicas da banda em anos que não nos deixam saudades
de Roll With It, Supersonic e Whatever.
Porém, mais que um disco, Don’t Believe The Truth
é um manifesto, feito para anunciar que Liam e Noel ainda têm
condições de bater de frente com qualquer uma dessas bandas
novas. E é melhor os coxinhas tomarem umas vitaminas, se quiserem
entrar na briga com esses titios.
Leia também:
A teoria das bandas coxinhas,
por Marcelo Costa
Heathen Chemistry, do Oasis, por
Marcelo Costa
Oasis ao vivo no Rock in Rio 3,
por Marcelo Costa
Heathen Chemistry, faixa a faixa
por Noel e Liam
Definitely Maybe, faixa a faixa,
por Ricardo Moscarelli
Familiar to Millions, do Oasis,
por Marcelo Costa
Links
Site Oficial do Oasis
|