"Homem-Aranha 3"
por
André Azenha Blog
23/05/2007
Muito se esperava desse "Homem-Aranha 3" ("Spider-Man 3", EUA, 2007), filme com o maior orçamento na história da sétima arte, cerca de U$ 300 milhões, e cuja data marcada para estréia foi confirmada antes mesmo do segundo longa da série chegar às salas de cinema, no segundo semestre de 2004. Sam Raimi, responsável por dirigir os dois longas anteriores, também já tinha sido confirmado para pilotar a nova produção. Natural então, após o êxito da franquia até o momento, que público, crítica e os próprios produtores tivessem as melhores expectativas.
Porém, após tanto burburinho, trailers impressionantes e boataria em torno dos vilões, eis a pergunta: Tudo isso pra quê? "Homem Aranha 3" não só é mais fraco de os dois filmes anteriores como também embaraça fãs das HQs do herói com cenas constrangedoras, roteiro displicente e tenta fazer de Peter Parker o emo mais famoso do planeta.
Essa segunda continuação foi projetada para vender milhões de dólares em produtos associados (bonecos, cadernos escolares, lancheiras, álbuns de figurinhas). Provavelmente essa pressão pelo retorno financeiro possa ter feito Raimi e equipe esquecerem de algo que estava dando certo até então: o roteiro. E foram somados personagens e mais personagens, tornando o filme extremamente longo, esquecendo o lado dramático - o equilíbrio entre drama e ação fez de "Aranha 2" o melhor da série, quiçá uma das melhores adaptações de quadrinhos já feita.
Na nova história, Peter Parker (Tobey Maguire) encontrou um meio-termo entre seus deveres como defensor dos fracos e oprimidos e seu relacionamento com Mary Jane (Kirsten Dunst). Porém o sucesso como herói e a bajulação dos fãs, entre eles Gwen Stacy (Bryce Dallas Howard, a ceguinha de "A Vila"), faz com que o aracnídeo se torne autoconfiante demais e passe a negligenciar as pessoas que se importam com ele. Pelo caminho, surgem Flint Marko (Thomas Haden Church), sujeito fugitivo da polícia que acaba virando o Homem-Areia, e está envolvido na morte do tio Bem, um simbionte alienígena que passa a alterar a personalidade de Parker e dará origem ao mega-vilão Venom (Topher Grace), e o velho conhecido Harry Osborn (James Franco), que busca vingança pela morte do pai.
Ao todo, são mais de dez personagens importantes, interpretados por bons atores, mas que por causa da falta de espaço na trama, acabam reduzidos a poucas cenas. Theresa Russell, a esposa do Homem-Areia, e James Cromwell, o capitão da polícia e pai de Gwen Stacy, são exemplos disso. Do elenco principal, quase nada se salva. O trio protagonista formado por Maguire, Dunst e Franco surge apático. James Franco escancara a falta de talento nos momentos dramáticos. Dunst não tem muito a fazer, e quando aparece até se sai bem, e Tobey Maguire, com sua cara de fuinha, foi sacaneado com um roteiro meia-boca.
Algo que deveria ser o ápice de trilogia ganha contornos de Zorra Total. Quando Parker encontra-se autoconfiante com seus feitos, passa a desfilar pelas ruas de Nova York ao som de black music arrancando olhares de mulheres recém-saídas de um desfile da Elite Models. Mais brega e tosco, impossível. Num outro momento, a confusão na personalidade do alter ego do herói é tanta que não dá pra saber se ele já está sendo controlado pelo simbionte alien ou se está doido mesmo. Pra piorar tudo, o herói ostenta uma franja digna dos emos (some a capacidade de aprender a perdoar e ficar emocionado com tudo, parecendo um bebê chorão, e temos o primeiro super-herói emo da Terra), e a cena em que dança num bar constrange a platéia de tão ruim.
Topher Grace (que deixou o elenco da série "That '70s Show" para poder participar da trama) está insignificante como o vilão Venom. E apenas Thomas Haden Church impressiona na pele de um bandido que só comete os atos criminosos para poder salvar a vida da filha pequena doente, transmitindo um interessante conflito interno. Ele não se orgulha do que faz. O ator trabalhou durante 16 meses para ter o físico necessário para o personagem e impressiona esbanjando muitos músculos.
O roteiro brinca com a inteligência do público. O maior exemplo de tanta obviedade e preguiça dos autores acontece com a personagem Gwen Stacy, interpretada pela talentosa atriz Bryce Dallas Howard, que surge loira e gostosinha no primeiro blockbuster pra valer de sua carreira (tá bom, teve "Apollo 13 - Do Desastre ao Triunfo"). Stacy é colega de sala de Parker. Ao salvar um prédio em perigo na Ilha de Manhattan, local de população com cerca de 1,5 milhão de habitantes, o Homem-Aranha depara-se com... Gwen Stacy. Ao marcar um jantar romântico com Mary Jane em um dos milhares de restaurantes da metrópole, Parker encontra... Gwen Stacy. Eddie Brock, antes de conhecer Parker estava saindo com... Gwen Stacy. Puta que pariu! Até um ser acéfalo que não consegue distinguir uma pêra de uma uva é capaz de perceber tamanha cara de pau no enredo!!
Mudanças na equipe técnica também podem ter contribuído para a diferença dessa para as produções anteriores. John Dykstra, vencedor do Oscar de Efeitos Especiais por "Homem-Aranha 2", declinou a proposta desse terceiro para trabalhar em "Hot Wheels" (2007). Já o compositor Danny Elfman se recusou a trabalhar neste, devido às diferenças criativas com Raimi também no longa anterior. Aliás, o cineasta dizia não gostar do personagem Venom e não pretendia incluí-lo nem neste ou em qualquer outro filme do Homem-Aranha que dirigisse, pois considera o vilão sem qualquer tipo de humanidade. Foi graças ao produtor Avi Arad, que alegou a popularidade do personagem, e ao roteiro escrito por Alvin Sargent, que o diretor voltou atrás na decisão. Lucro, Raimi! Queremos lucro!
Pra não dizer que "Spider 3" é completamente intragável, os efeitos visuais e algumas cenas de ação batem bola cheia. A transformação de Marko no Homem-Areia é linda e Venom é uma reprodução perfeita dos gibis. E o duelo no ar entre Parker e Harry Osborn num beco de NY é de tirar o fôlego. Nada mais que a obrigação pela dinheirama investida. Guardadas as devidas proporções, "Homem-Aranha 3" chega a lembrar o desastroso "Superman 3", de 1983 (aquele em que Christopher Reeve, vivendo o kryptoniano, desentortava - literalmente - a Torre de Pisa) – sabiamente ignorado por Brian Synger em "Superman – O Retorno". Se aqui, nos deparamos com Peter Parker tendo atitudes esquisitas, em momentos bisonhos, em "Super 3", víamos (ainda que o filme fosse bem mais tosco que "Aranha 3") Clark Kent em crise existencial enfrentando a si próprio num ferro-velho.
Dois casos de lançamentos que deveriam fazer de suas franquias, ótimas trilogias, e que fracassaram na tentativa. Por enquanto, "X-Men" é "a trilogia" no quesito adaptação de HQ, e "300" é a melhor adaptação dos quadrinhos para o cinema lançada em 2007. Agora é esperar pelo segundo "Quarteto Fantástico"...
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