Posts from — setembro 2014
Prata da Casa na Globonews
setembro 28, 2014 No Comments
Prata da Casa #17: Jonnata Doll
A terceira atração do mês rock do Prata da Casa veio de Fortaleza para mostrar as canções de seu empolgante disco de estreia, que leva o nome da própria banda, “Jonnata Doll e os Garotos Solventes”, e enquanto o quinteto instrumental praticava um rock and roll de altíssima qualidade, o frontman Jonnata avisava: “Nunca se esqueça que o mundo está contra nós, porra”. A deixa para a canção potente que abre o disco dos caras foi arrematada com Jonnata pulando para a pista, traçando uma linha imaginaria no chão e intimando os presentes: “Duvido vocês passarem dessa linha!”. A galera colou no palco e dali não saiu mais, seduzida pela postura agitada do vocalista.
O primeiro convidado da noite foi Lirinha, que, lembrando os velhos tempos do Cordel do Fogo Encantado, pisou no palco declamando poesia e, depois, encorpou o vocal da canção “Esqueleto”. Já o guitarrista Fernando Catatau, do Cidadão Instigado, bateu ponto na inédita “Crocodilo” e em “Esperando Por Você”. Jonnata não parou um segundo: rolou no palco, se rastejou aos pés da galera no melhor estilo Iggy Pop dos anos setenta, fez promessas de amor, caminhou sobre as mesas da choperia do Sesc Pompeia. O ótimo público, que já havia sido conquistado nas duas primeiras músicas, se entregou a banda em um dos shows mais quentes desta edição do Prata da Casa.
As fotos são de Liliane Callegari (mais aqui). Abaixo, dois vídeos.
setembro 23, 2014 No Comments
15 respostas sobre Bizz e jornalismo
“Eu estou me formando em jornalismo e a ideia do meu TCC é escrever um livro sobre a história da revista Bizz – para isso quero entrevistar jornalistas, leitores e algumas bandas que fizeram parte dela”, Gabriela
Eu começo meu livro falando das vantagens de ter sido jovem durante os anos 80. Você concorda que foi uma juventude bem diferente de hoje? Acha ela melhor de alguma forma? Por quê?
Foi diferente, mas isso não quer dizer que foi melhor ou pior, apenas que aconteceram coisas naquele período diferentes das de outro. Estávamos saindo de uma ditadura e vivendo um momento de abertura política; os yuppies estavam em ascensão; o futebol brasileiro começou aquela década como o melhor do mundo e terminou de forma vexatória (nesse caso, e eliminação precoce da equipe de Lazaroni em 1990 não foi tão marcante quanto os 7 a 1 que a seleção do Felipão amargou); havia, de certa forma, muita expectativa e esperança pelos anos futuros; aids e internet estavam começando a se proliferar, e, cada uma a seu modo, a mudar as relações das pessoas; ainda assim não acho que tenha sido uma juventude melhor ou pior do que agora: cada época tem suas particularidades e, muitas vezes, as pessoas tendem a deixar que a nostalgia valorize determinado período, mas nunca vou achar que jogar futebol na rua com os amigos, como eu fazia, seja melhor ou pior do que a molecada que passa o tempo livre jogando videogame dentro de casa. A sociedade passou séculos buscando maneiras para ocupar o tempo livre, e parece que agora encontrou uma forma bastante interessante. Se eu pudesse voltar ao passado e escolher, continuaria jogando bola no campinho de terra do fim da minha rua (é a minha nostalgia), mas também ia querer ter um computador…
Como foi pra você ser jovem naquela época? Você frequentava as danceterias? Como conhecia as bandas da época?
Para mim foi especial crescer num momento de abertura política em que o rock foi escolhido como válvula de escape por um povo que passou 21 anos silenciado pela ditadura. E eu não só ia a danceterias como organizava bailinhos com amigos (um deles era mestre em criar jogos de luzes mirabolantes) e rodava a cidade tocando discos, na função de DJ mesmo, e conhecia todas as bandas, até as mais independentes, mas isso em Taubaté, uma cidade que (mesmo entre Rio e São Paulo) parecia longe demais das capitais…
Por que acha que o Brasil precisava de mais uma revista de música em 1985? O que significou para o país o surgimento da Bizz?
Na verdade, um grupo de pessoas percebeu a ascensão de um público que estava interessado em consumir música, mas não só discos, informações também. E o primeiro Rock in Rio já era um sinal disso (sem contar que já havia outras revistas de música no mercado, como a Som Três, que era de instrumentos, mas também tinha reportagens; acho que a Roll é dessa época também). O surgimento da Bizz, no entanto, significou o nascimento de um novo modelo de jornalismo cultural, mais aprofundado, especializado e interessado em abastecer o público com novidades. A primeira fase da Bizz é exatamente isso: pegar grandes ícones do rock e apresenta-los ao público sem aspas, sem entrevistas, quase uma biografia da banda mesmo.
Com quantos anos você começou a ler a revista? Por que você lia ela, o que te atraia?
Comecei a ler com 15 anos, ou seja, no ano em que ela foi lançada. Eu já era interessado por música, tinha os bailinhos, já comprava os meus discos desde o meu primeiro emprego, um ano antes, já lia a Ilustrada, da Folha de São Paulo. A Bizz me atraia porque ela ampliava o leque de informações que eu tinha sobre artistas que eu já conhecia, mas sabia pouco, tanto quanto fazia me interessar por novos.
Você tinha uma seção preferida? Qual e por quê?
Sempre gostei da seção de Resenhas, da Discoteca Básica e do Entrevistão, clássicos das primeiras edições. Mais pra frente fui um fã da seção Zona Franca. Gostava da seção de Resenhas porque me mostrava uma maneira diferente de olhar para um disco, mesmo quando eu não concordava (e isso acontecia bastante). A Discoteca Básica era a seção de clássicos, discos que eu nem sabia que eu tinha que ouvir, mas tinha! O Entrevistão era interessante porque era mais profundo enquanto a Zona Franca surgiu num momento pré-internet e alertava sobre coisas que poderia ser muito interessante ir atrás.
Você ainda lia a revista na época da “Showbizz”? Acho que essa fase da revista foi muito cruel com os leitores e com a própria revista (a quebra da marca foi algo muito bizarro também). Muitos culpam o surgimento da música eletrônica pelo fim da Bizz e início da Showbizz. A revista não soube acompanhar o estilo, já que era uma música “sem rosto”. Você também acha que o erro começou por ai?
Como eu não estava na redação fica difícil avaliar uma mudança dessas. Para mim, claro, foi um choque: a mudança do nome, do logo, a adoção do formato tabloide, mas algumas das seções continuaram boas como sempre foram, por isso continuei comprando e lendo.
O quanto você acha que uma revista pode mudar por conta da indústria musical? Qual o papel da indústria na manutenção da revista?
A indústria é uma parceria sem ser parceria da revista. Da parte dela espera-se que ela abasteça o mercado de artistas interessantes que possam ser temas para a revista. Se a indústria não tem ninguém interessante, a revista não tem porque existir, ou então vai ter que apelar para o passado.
Você acha que houve uma “caretice” do jornalismo musical? É difícil achar algum lugar que publique textos tão doidos e engraçados como os da Bizz.
O jornalismo musical sobrevive nos blogs. Além disso, a internet nos permitiu ter acesso a cadernos de cultura espetaculares como o do New York Times, do Guardian e do El País, assim como veículos interessantes como a Pitchfork. Lógico, eles falam 0,01% de música brasileira, mas, atualmente, a música brasileira que importa não vende revistas, então fica difícil manter uma revista como a Bizz.
Você acha que as críticas musicais ainda têm seu papel? Na Bizz elas não eram tão chapa branca como hoje. Por quê?
As críticas continuam tendo um papel importante sim, até porque o crítico também atua como curador: ele está ali atento às centenas de discos que caem na web e são lançados mensamente e escrevendo sobre aqueles que ele acredita que o público deve dar atenção, porque as pessoas comuns não tem tempo para irem atrás de todos os lançamentos. Quanto a chapa branca, existem veículos e veículos: é complicado comparar a Bizz com publicações de linha mais conservadora, menos anárquica. Ainda assim, na web brasileira já existiram sites extremamente ácidos no que diz respeito à crítica, muito mais do que a Bizz.
Hoje os jornalistas têm mais medo das bandas do que as bandas dos jornalistas – rs. Há um medo de criticar? Como você faz a sua crítica? Você acha que ela tem que ser levada sempre pelo lado pessoal ou tem que ser algo mais pensado no gosto do leitor?
Difícil analisar sem exemplos: você diz que jornalistas tem medo de bandas: quais jornalistas? Não sei, mas acho que você está confundindo medo com amizade e admiração. É o caso do jornalista que gosta realmente de tal artista, e fala bem porque ele realmente acha aquilo. Não sei se existe medo de criticar, precisaria de exemplos. No meu caso, eu busco entender o objeto de arte – disco ou show ou festival ou filme ou… – no espaço/tempo: o que esse objeto representa para o tempo que a gente vive, o que ele está apontando. O que a crítica precisa buscar é entender o objeto de arte dentro de um todo, porque ele não está isolado: se os Beatles surgissem em 2010 e não nos anos 60 seriam outros, porque o ambiente influencia a pessoa. Desta forma, essa análise é totalmente pessoal porque diz respeito aos signos que cada pessoa adquiriu durante a vida, e que a fazem olhar o mundo (e escrever sobre) de forma particular. Há similaridades entre opiniões sim, mas um texto crítico pode dizer mais sobre o crítico do que necessariamente sobre a obra. Quanto ao leitor, a ele cabe ler, refletir, discordar ou concordar. Ele não diz respeito ao crítico e o crítico não tem que escrever pensando em agrada-lo. É como a relação do juiz com a torcida em um estádio de futebol: a torcida pode gritar, espernear e falar o que quiser, mas o juiz tem que agir com a sua consciência.
Você acha que a internet estragou o consumo de jornalismo musical ou que ela ajudou? Você vê um futuro pra esse tipo de jornalismo?
Ajudou e muito. A internet permitiu que as pessoas, qualquer pessoa, tivessem acesso a um mundo de coisas que ela desconhecia, incluindo ai grandes jornalistas culturais do mundo. Sem contar que ampliou o leque da profissão: se você contar quantas pessoas trabalhavam exclusivamente com jornalismo musical nos anos 80, 90, 00 e agora, é possível que agora o número de profissionais seja três, quatro vezes maior. Ou seja, o futuro é agora.
Querendo ou não, a Bizz foi a revista de música que mais durou no país. Qual foi o segredo de sucesso dela? E por que acha que acabou? Você acredita que esse é o futuro das outras revistas de música pelo mundo?
A Bizz surgiu na hora certa e acompanhou um mercado primeiramente em crescimento, depois em declínio. Essa foi sua cruz e sua espada. Não há como ter uma revista de música em um país cujo mercado da música é uma piada. Talvez uma revista cômica. Quanto ao resto do mundo, depende de cada mercado. O mercado português suporta uma Blitz, o mercado europeu suporta NME, Uncut, Mojo e Q, o mercado norte-americano suporta uma Rolling Stone.
Sobre o Scream & Yell, de onde surgiu a ideia de criar o site? Qual é o número de visitantes diários do site?
Entre 4 mil e 5 mil. O site surgiu da vontade de mapear uma cena local que era muito bacana, falar para outras pessoas de bandas que gostávamos não só da cidade, mas bandas de todo lugar que eram ignoradas pela Bizz, pela Ilustrada e por diversos outros veículos.
O que você acha que atrai o leitor para o Scream & Yell? O que ele tem de diferente das revistas e outros sites de música?
Tentamos (nem sempre com seguimos, é preciso admitir) aprofundar a discussão sobre um disco, um filme, um livro. Nas entrevistas tentamos entender o entrevistado, ir além de onde os veículos impressos (presos no limite dos toques e do papel) conseguem. Nunca foi uma forma deliberada de buscar público, mas sim de responder a dúvidas que nós mesmos tínhamos (e ainda temos). De alguma forma, certa parcela de público nos achou, e nos adotou. Fico feliz e agradecido com isso, embora ter ou não ter público não é a questão em um site independente e gratuito, mas sim sermos sinceros com a gente mesmo. Se ser sincero atrai leitores, ótimo. Se o leitor ficar incomodado com a sinceridade, paciência. A vida segue.
Agora que a Bizz acabou, quais são suas fontes de informações musicais? Nisso eu sei que a internet ajudou, mas como achar o site mais confiável, de credibilidade, para saber sobre música?
Minha fonte é o Scream & Yell, as fontes que abastecem o Scream & Yell, e desconfio que hoje em dia eu iria ser um leitor menos assíduo da Bizz exatamente por estar atuando na mesma área que a revista. Pra que eu vou ler uma entrevista com a Banda do Mar na Bizz se eu posso fazer uma entrevista também? Lógico, existem alguns jornalistas cuja opinião me interessa, de que eu gosto do texto, e quero ler, e se for numa revista eu vou comprar. Por exemplo, gosto das entrevistas do El País e do Guardian, mas raramente leio críticas porque elas podem influenciar o meu pensamento na hora de eu escrever a minha crítica, e eu prefiro tentar ter uma ideia própria, que pode até ser próxima da do Guardian (ou qualquer outro veículo), mas ainda assim é própria. A questão, no entanto, é analisar e entender o crítico, o veículo: isso lhe dará chaves para confiar e mesmo discordar quando determinado jornalista/jornal fala bem disso ou mal daquilo (nesses tempos de eleições isso é importantíssimo).
Veja outras entrevistas aqui
setembro 22, 2014 1 Comment
Prata da Casa na Attöm Dë Tv
O Eduardo Henrique Lopes, que já fez algumas pautas para o Scream & Yell, está desenvolvendo um trabalho próprio bem bacana, a Attöm Dë Tv. Fui o convidado do sexto programa e o resultado você assiste abaixo (os demais estão aqui):
setembro 20, 2014 No Comments
Prata da Casa #16: Molho Negro
A segunda atração do mês rock and roll do Prata da Casa veio das garagens de Belém do Pará: Molho Negro. Power trio stoner esporrento, o Molho Negro já vinha chamando a atenção com um ótimo álbum, “Molho Negro”, lançado em 2013, e dá um passo ao frente com o potente “Lobo”, lançado alguns meses atrás. O trio João Lemos (guitarra e voz), Raony (baixo) e Augusto (bateria) – acrescidos em cinco músicas de Anderson Foca, da Camarones Orquestra Guitarrística – mostrou-se bastante à vontade diante de uma choperia do Sesc Pompeia com um bom público.
No repertório da noite, canções dos dois álbuns com destaque para as ótimas “Se Ela Não É Lésbica Tem Namorado”, “Mania de Perseguição” e “Aparelhagem de Apartamento”, destaques do primeiro disco (download gratuito aqui), e grandes números do disco novo, como “Rui Barbosa” (“Em Belém nós temos uma rua idêntica à Rua Augusta, e ela se chama Rui Barbosa”, contou João), a matadora “Black Rebel Marambaia Club” e “Fã do Nirvana”. Jajá Cardoso, do Vivendo do Ócio, que já havia participado do show da Cassino Supernova, voltou ao Prata da Casa para celebrar no palco os amigos do Molho Negro. Outra grande noite!
setembro 19, 2014 No Comments
Prata da Casa #15: The Baggios
Abrindo setembro, o mês rock and roll do Prata da Casa 2014, os sergipanos do The Baggios chegaram inspirados após a boa apresentação no Porão do Rock (mesmo com os problemas de som) dois dias antes, e mostraram na Choperia do Sesc Pompeia tudo que podem fazer se os deixarem sobre um palco com um som potente. Numa das noites mais barulhentas do projeto em 2014, Julio Andrade (guitarra e voz) e Gabriel Carvalho (bateria) fizeram uma apresentação irrepreensível.
O show festejava 10 anos de estrada da dupla e Julio e Gabriel não só mostraram faixas de seus dois discos como de EPs menos conhecidos incluindo duas canções novas que devem integrar o terceiro álbum do duo. Como bônus, a dupla recebeu dois companheiros na metaleira em 10 canções, o que conferiu um gostinho especial à noite. No fim, a galera acompanhou os riffs de Julio no gogó e praticamente comprou tudo (vinis, camisetas, CDs) da lojinha da banda. Uma bela noite.
As fotos são de Liliane Callegari (mais aqui). Abaixo, dois vídeos.
setembro 16, 2014 No Comments
Discutindo música e mercado
Oito perguntas do jornalista Yuri de Castro (de março de 2014) “tateando para ir definindo um trabalho futuro”.
Lembro-me de uma impressão do show de estreia de “Cavalo”, de Rodrigo Amarante. Cito esse por ser o lançamento mais recente da geração do bode jornalístico. Os adjetivos para com a obra deram a impressão de monotonia, sonolência e até uma certa pretensão enrustida de despretensão. Não é regra, mas boa parte dos seus pares de redação se aproximaram dessa visão sobre o álbum e show. No entanto, meus pares (nascidos quase em 90) demonstraram uma certa vontade de interpretar o álbum como um movimento avante ainda que de passos lentos. Experimental. Como se não houvesse ali uma obrigação de fazer sucesso. Me desculpando pelo tamanho da questão e colocando em cheque uma certa intolerância da crônica musical mais tradicional no Brasil com o som da galera barbudinha-descolada, pergunto-lhe: você acha que o pós-Los Hermanos já nasceu mal fadado para quem não aceitou o jeito de uma geração em transição com conceitos de indústria musical?
Mais ou menos. O Los Hermanos foi aceito e respeitado, mas criou uma redoma em torno de si que fez com que imprensa se afastasse e o público os idolatrasse. Criou-se uma certa birra da imprensa com a pretensa intelectualização da música (e da atitude) desses caras, mas não vejo conflito de geração, pelo contrário, vejo a reafirmação da brasilidade que o rock nacional dos anos 80 começou negando, e que Paralamas acabou abraçando (ainda que fizesse mais reggae que samba). O Los Hermanos tinha público e imprensa nas mãos. Rodrigo Amarante e Marcelo Camelo ainda tem o público nas mãos. No fim das contas, cada geração olha para um objeto de arte com a bagagem que tem. Costumo brincar (falando a verdade) que um texto pode dizer mais sobre quem escreve do que, necessariamente, sobre o objeto que o inspirou.
Se faltou empolgação para o trato com bandas como Mombojó, sobram mimos para o som de novatos como o SILVA, a Mahmundi (particulamente sou pouco simpático aos últimos). Você crê em alguma preguiça dos mais calejados em relação a um certo resgate de alguma “brasilidade” (”filhos do manguebeat”, já li certa vez para o Mombojó) e mais boa vontade com quem se aproxima de uma estética mais etérea e internacional?
Quem diz que faltou empolgação com o Mombojó? “Nadadenovo” foi celebradissimo, e na votação de Melhores dos Anos 00 ficou atrás apenas de Cidadão Instigado e Los Hermanos. O que acontece é que havia uma expectativa que esse disco fizesse o crossover do indie para o mainstream, o que não aconteceu porque a banda pegou a indústria em um momento de queda. Ou seja, eles foram atrapalhados pela bolha (e também pela inocência daqueles que acreditavam que um disco encartado numa revista pudesse chegar às rádios por si só, sem jabá). SILVA surgiu em um outro momento. Se fosse o contrário, com SILVA lançando seu primeiro disco em 2004 por uma revista e Mombojó estreando em 2010, as coisas seriam diferentes para cada um deles.
Eu queria saber o que você acha muito ruim hoje em dia.
Tento não perder tempo com coisas ruins, pois nem as boas eu consigo prestar atenção.
Não é difícil separar um punhado de artistas que vão ficar no caminho do esquecimento. No Rio, o Letuce mesmo conseguindo soar um tantinho experimental pop nunca conseguiu o mínimo de expressão; em São Paulo, Fábio Goes escreveu belas canções pro nada. É claro que todo mundo conhece Nação Zumbi, mas poucas pessoas talvez saibam o quão ainda forte é esta banda em cima do palco e, inclusive, nos álbuns recentes. A culpa é nossa? A culpa é de um todo? A culpa é de um público que demorou a entender os canais de busca independente?
Artistas bacanas ficam no esquecimento desde sempre. Big Star é um caso desses. O fato é que o mundo mudou, a internet entrou na vida das pessoas e a relação com a música é outra. Não há juízo de valor aqui. Além é preciso pensar em como a música chega para o público. As rádios, desde que a Abril Music entrou no mercado aumentando o valor do jabá (e estourando Los Hermanos), estão falidas, viraram dial de publicidade, em que uma música x está ali para vender tanto quanto uma propaganda de margarina. Como Letuce vai chegar ao grande publico se não toca na rádio e nem na TV? O público consome o que lhe é oferecido. A grande massa não quer ir atrás do novo, ela quer pagar aluguel, trabalhar, viver e, no tempo livre, ter algo que a conecte com os outros ao seu redor. Desde sempre vivemos em nichos e precisamos de conexão. Torcidas organizadas, partidos políticos, fã-clube, a turma do boteco, o baile funk, tudo isso é uma forma de cada pessoa se sentir parte de algo, sentir que existe. Todos vivem em uma enorme zona de conforto, mas não dá para culpar ninguém. Ou será que dá?
Se formos montar uma linha do tempo, não creio ser algo chocho uma linha de frente com Curumin, Emicida, Criolo, Tulipa Ruiz, Metá Metá (estes só em SP). Todos possuem boas assessorias, obras que explicam um período de música pop no Brasil, estão na maior cidade do Brasil. Afinal, por que ainda reclamamos que não se faz música interessante no Brasil? Por que ainda há resquícios de implicância com um certo “circuito SESC” se este é o único que consegue fazê-los tocar? Há culpa artística nesse processo? Ou é apenas “deu azar de nascer agora em tempos de vacas magras”?
Respondo com o abre do texto que escrevi para o site português Bodyspace: “A música brasileira vive um de seus melhores períodos em toda sua história”. Ou seja, não me encaixo nesse “ainda reclamamos”. Sobre a implicância com o circuito SESC, acho que surge mais da “concorrência”, de gente que não consegue manter o mesmo padrão de cachês. Claro, o circuito SESC também colaborou no que tange abraçar um certo número de sonoridades e de artistas, seguir uma linha de “indie sambinha”, mas até isso já ficou para trás e vejo cada vez mais espaços dentro dessa programação para estilos variados. Todos os estilos precisam ter espaço, até o indie sambinha.
Tentou-se emplacar Cachorro Grande; teve Gram. Hoje, temos Nevilton. Tivemos uma leva mais mainstream-Bonadio: CPM22, Hateen. É possível que hoje todos toquem nas mesmas casas noturnas (vazias). Esvaziamos o rock no Brasil com tantas tentativas?
Quando você escreve “esvaziamos”, você diz respeito a quem? Não sou dono de gravadora, não pago jabá e não me importo se o cara é rock, rap ou samba, mas sim se ele é bom. A questão, no entanto, é: será que o rock representa a molecada de 12, 14 anos, de hoje em dia? O que as representa? A grande sacada da música pop, e talvez o que a faça especial, é que não há fórmula, e por mais que gravadoras tentem colocar goela abaixo do público artistas x e y, o público vai consumir o que ele quiser. E precisamos lidar com isso. Precisamos respeitar um público que escolhe CPM 22 a Nevilton. Porém, eu gostaria que o Nevilton tivesse o mesmo espaço que o CPM 22 teve (e o mesmo investimento). Dai talvez poderíamos mapear melhor os anseios da massa.
Aqui em SP. há uma parte da imprensa que implica a galera afrobeat. Se você citar Vanguart, ixi, pronto. Você reconhece que há uma má vontade? Se sim, por que? É assessoria voraz? No caso do Vanguart e congêneres é uma certa necessidade de convencimento que torna tudo mais grandioso do que é realmente — e isso afasta? Enfim, queria que você me falasse se reconhece que há já uma coisa contra — menos pelo talento, mais pelas impressões geradas. Não preciso citar que boa parte do jornalismo mais tradicional, por exemplo, não pode nem escutar o nome do Criolo. “Afetado”, “falso”, “fantoche”, é o que se ouve. Fique à vontade pra dizer o que pensa.
Há um gueto geracional que surgiu nos cadernos culturais dos grandes jornais no final dos anos 80, e que, naquele época, só admitia música estrangeira. É um fato. Mas precisamos sempre lembrar que imprensa são pessoas, e dai quando você começa a destrinchar as ideias desse ou daquele cara, talvez entenda que o fato de ele não gostar de Vanguart, por exemplo, é extremamente cabível no universo que ele vive – e que, muitas vezes, não tem nada a ver com o mundo real, que é o da noite, o dos shows, o das lojas de discos. Seria legal vasculhar as redações e perguntar para quem escreve de música a quantos shows ele foi no último ano, quantas vezes ele foi numa loja de discos nos últimos seis meses? Será que uma análise pode ser real feita dentro da redoma da redação? Há como entender o mundo observando tudo de sua baia? Embora alguns possam achar divertido, conhecer Amsterdam pelo Street View é bem diferente de caminhar por ela.
Volto um pouco. Não é difícil pra mim, mais novo, perceber uma certa falta de vontade com uma geração classe média, acostumada com as trocas de gosto no campus da faculdade pública. Hoje, no Twitter, caçoamos chamandos-os de “humanas.jpg”. Mas é uma geração que aprendeu a valorizar Novos Bahianos, sabe o valor do “Transa”, do Caetano Veloso e parece muito mais disposta a entender propostas menos retas, menos MTV — e por isso, parece disposta a tornar “Sou” de Marcelo Camelo um disco cult no prazo de 10 anos — justamente porque a mídia fez pouco caso. Qual seu grau de pessimismo em relação a tudo isso aí dessa pergunta?
Primeiro que colocar “Sou” na mesma frase que “Acabou Chorare” e “Transa” é uma heresia (risos). Cult? Não acredito. Marcelo Camelo só existe porque é um ex-Los Hermanos, e a banda teve uma carreira muito foda. A mídia não fez pouco caso: o disco tem lampejos de criatividade. Ainda assim, Camelo é responsável direto por essa geração aprender a valorizar Caetano, Chico, Novos Baianos. Nos anos 80, pré-abertura política, o cenário estava afundado na mesmice porque a Ditadura calou nossos maiores artistas. Após abertura política, o rock predominantemente inglês se traduziu como válvula de escape e, naquele momento, era importante fazer barulho, não dava para ser indie sambinha. A história vai seguir com Paralamas deixando Police pra trás e se tornando brasileiro, com Picassos Falsos, Raimundos e Mangue Beat (tudo crossover), mas o Brasil só se redescobre de verdade com “Bloco do Eu Sozinho”. Foi como se o Congresso Nacional baixasse uma lei: está permitido gostar de música brasileira. Exemplo prático: Maybees virando Ludov. O que acontece na sequencia é a derrocada da indústria, a falência das rádios e da MTv e, por fim, dos próprios Los Hermanos. Poucos setores da mídia hoje tem a força para respaldar uma cena. Ainda assim, o futuro é magnifico porque essa geração é excelente. Só que o mercado mudou. É preciso, agora, criar um novo mercado.
setembro 15, 2014 No Comments
Oito respostas para o Acesso Cultural
A jornalista Renata Souza, do Acesso Cultural, para uma pauta sobre a criação musical na era tecnológica. Leia o texto da Renata aqui. Abaixo minhas respostas…
Como começou seu envolvimento com a música? E atualmente? Fale um pouco do seu trabalho e um pouco do Scream e Yell.
Meu pai tinha uma vasta coleção de vinis nos anos 70, e eu sempre olhei aquilo com admiração. Hoje tenho mais de 10 mil discos (entre CDs e vinis e boxes) em casa, então acho que o envolvimento começou em casa. Para virar profissão eu precisei sair de Taubaté e vir trabalhar em São Paulo, e ainda assim demorou até eu migrar para a área de cultura, e enquanto isso não acontecia eu abastecia meu próprio site com aquilo que eu gostaria de ver nos grandes veículos. Este site, o Scream & Yell, existe desde 2000, e digamos que já passou da hora de descansar, mas vício é vício e a gente segue carregando ele até onde acha que consegue (pode ser semana que vem, pode ser em 2020, vá saber). Além dele escrevo sobre música e cultura para alguns veículos e, neste ano, assumi a curadoria do projeto Prata da Casa, do Sesc Pompéia, um sonho realizado que termina agora em dezembro (os sonhos bons duram pouco)
Quais as suas principais influencias musicais?
Não sei se tenho influências musicais, mas gostos de ideais passados pela música: nesse quesito, admiro muito o movimento punk e o DIY. Se fossem influências jornalísticas a lista seria imensa começando com Ana Maria Bahiana e André Forastieri e terminando na molecada que está escrevendo agora sobre música, e sempre surge com alguma boa ideia nova. Não dá para parar no tempo.
No cenário atual, quais bandas você indicaria como promissoras?
The Baggios, Molho Negro, Nevilton, Bruno Souto, Transmissor… a lista é enorme e o problema não é falta de bandas promissoras, mas de pessoas (e veículos) que as valorizem. A boa música está cada vez mais ampla no Brasil, e as pessoas precisam apenas descobrir isso.
Em sua opinião, qual a coisa mais legal na cena independente paulistana e o pior obstáculo?
A oportunidade de trocar ideias com músicos de diversos Estados: São Paulo está virando um nicho interessante que anda abrigando muitos nomes geniais da nova música, e essa turma toda aqui em São Paulo pode fazer coisas muito bacanas (e, claro, passar dificuldades: São Paulo não facilita). O pior obstáculo são a falta de bons espaços para as bandas se apresentarem e público interessado em conhecer o novo. A galera tá mais interessada em azaração em forró e barzinho de cover da Vila Madalena e da 13 de maio do que ouvir coisas instigantes. É uma pena.
O que você acha dos programas atuais de competição de bandas (Superstar, por exemplo)? E dos programas de auditório, como Raul Gil?
É um espaço na TV que precisa ser tomado, mas a curadoria, o corpo de jurados, tudo isso mais prejudica o artista do que ajuda. A sensação é de que todo mundo está a espera de uma piada, e não de uma boa canção.
A maioria dos críticos musicais atuais falam sobre um declínio na qualidade do cenário musical atual, principalmente do Rock e, principalmente, após os anos 90. Você concorda que falta qualidade, embora exista a internet que facilita o “nascimento” de novas bandas?
Discordo completamente. Quem fala isso é pai de família que não sai de casa para ver shows ou fica na redação até tarde fechando caderno acreditando que a gravadora vá enviar para ele o CD da próxima grande banda. Quem quer descobrir a qualidade do cenário tem que ir atrás das bandas.
Qual a importância da internet para a divulgação de bandas independentes?
Hoje em dia é vital. Fiz essa pergunta para cinco artistas que colocaram seus discos para download gratuito e todos eles, com veemência, disseram que o download os ajuda não só a vender shows, mas também a vender discos. A internet ajuda muito!
Até que ponto, em sua opinião, a imagem (visual de uma banda) é importante, além da qualidade musica.
Como diria aquela propaganda de refrigerante, “imagem não é nada, sede é tudo”. De nada adianta ter uma imagem e não ter grandes músicas. No mundo atual, é mais importante ser sincero do que ser “arrumadinho”. Até porque o marketing irá vender essa sinceridade. As camisas de flanela do Nirvana são prova disso.
setembro 11, 2014 No Comments
Marcelo Costa no Vitrola Verde
O Vitrola Verde é um programa em vídeo comandado pelo produtor musical, radialista, palestrante e professor César Gavin, e é uma bate papo agradabilíssimo sobre cultura pop, com alguns dos programas focados na coleção de discos dos entrevistados. Recebi César em casa e conversamos sobre jornalismo na internet, festivais internacionais, artistas e, claro, discos. Aproveitando já incluo abaixo, junto da minha entrevista, os bate papos imperdíveis de César Gavin com três grandes amigos: os jornalistas Sérgio Martins, Ricardo Alexandre e Regis Tadeu além de Sabrina Parlatore. Assista!
setembro 6, 2014 No Comments
Prata da Casa: Setembro de 2014
Após um mês de agosto mais próximo do jazz e do fusion (ainda que com acenos pop), a programação do Prata da Casa, do Sesc Pompeia, em setembro, valoriza o rock – que, dizem por ai, morreu. Para mostrar que o estilo está mais vivo do que nunca, a seleção aposta em quatro bandas elogiadas de quatro estados brasileiros fora do eixo Rio-São Paulo.De Sergipe e
com 10 anos de estrada surge a The Baggios, duo barulhento de guitarra e bateria que mostrará em São Paulo as canções de seu segundo disco, “Sina”, lançado em 2013 (falei dele aqui). O Pará marca presença com uma das bandas mais bacanas surgidas recentemente, o Molho Negro, combo de stoner que mostrará “Lobo”, seu (também) segundo álbum.
O Ceará está representado por Jonnata Doll e os Garotos Solventes, nome que atualiza a cena proto-punk nova-iorquina setentista para o Brasil do novo século. Já a Loomer, do Rio Grande do Sul, irá mostrar ao vivo as canções que compõe “You Wouldn’t Anyway”, álbum recém-lançado em vinil que mostra a paixão dos gaúchos por guitarras altas e microfonia.
O Prata da Casa acontece às terças-feiras, no Sesc Pompeia, a partir das 21h. Os ingressos gratuitos podem ser retirados nas bilheterias do Sesc Pompeia uma hora antes do show. Confira as quatro atrações de setembro:
THE BAGGIOS – 02/09
Com mais de 10 anos de carreira, o duo sergipano The Baggios já lançou dois álbuns, e o segundo deles, “Sina”, de 2013 (lançado em CD, em vinil verde e disponível para download aqui), é o disco certo no momento certo da banda, pois choca as influências setentistas (Led Zeppelin, Jimi Hendrix e Black Sabbath) assumidas de Julio Andrade (guitarra e voz) e Gabriel Carvalho (bateria) com uma azeitada pitada brasileira, como se Jimmy Page tivesse nascido no sertão e tocasse na banda de Alceu Valença. Gravado em Aracaju e masterizado em Seattle, “Sina” mostra que os limites da boa música brasileira estão cada vez mais amplos.
MOLHO NEGRO – 09/09
Uma das grandes canções do primeiro álbum deste trio paraense formado em 2012 avisa: “No iPod cabe de Gang do Eletro até At The Drive-In”, canta o vocalista e guitarrista João Lemos, mas o bom humor da letra de “Aparelhagem de Apartamento” (canção que ganhou um clipe divertido), no entanto, surge ambientado numa base potente de stoner rock sujo e dançante direto das garagens de Belém. Um dos destaques da mostra Terruá Pará 2013, o Molho Negro lançou em maio de 2014 seu segundo álbum, “Lobo” (ouça aqui), mantendo a porrada sonora em alta e fazendo da banda um dos principais nomes do novo rock brasileiro.
JONNATA DOLL E OS GAROTOS SOLVENTES – 16/09
Surgido em 2010 em Fortaleza, o quinteto Jonnata Doll e os Garotos Solventes adapta o protopunk nova-iorquino, elo entre a falência do sonho hippie no final dos anos 60 e o surgimento do punk rock na segunda metade dos 70, para a realidade brasileira. Seu álbum de estreia, lançado no primeiro semestre de 2014 e que leva apenas o nome da banda (ouça aqui), lapida as principais influências do grupo (Iggy Pop & The Stooges, Secos e Molhados, Richard Hell) e é um dos discos imperdíveis do ano. Nas letras, histórias de sexo, drogas, prisões, solidão e violência. No som, punk (tanto pré quanto pós) de alta qualidade.
LOOMER – 23/09
Muito barulho por tudo! Formada em 2008 em Porto Alegre, a Loomer precisou de apenas dois EPs (“Mind Drops”, de 2009 e “Coward Soul”, de 2010) para conquistar a atenção dos adeptos do noise e do shoegazer no Brasil. Não à toa, “You Wouldn’t Anyway”, o primeiro disco cheio da banda (com tiragem em vinil e disponível para download aqui), foi lançado em 2013 e envolveu três selos de respeito no cenário independente nacional – Midsummer Madness (RJ), responsável pela prensagem em vinil; Tranfusão Noise Records (RJ) e Sinewave (SP) apoiando no lançamento digital e masterização –, o que serve como atestado de qualidade para um grupo que aposta na distorção, na microfonia e no alto volume das guitarras.
setembro 2, 2014 No Comments