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Uma entrevista que não terminou

Entrevista concedida a Lafaiete Júnior entre janeiro e junho de 2011 (acho)…

Qual sua primeira lembrança musical?
Jorge Ben. E Vinicius. Meu pai tinha uma coleção extensa de MPB, e rolavam várias festas em casa. Uma lembrança marcante: dia do assassinato de John Lennon. Minha mãe, na sala, chorou muito. E eu não entendia o motivo… hoje até eu choraria.

Como foi sua adolescência? Passou, literalmente, entre discos e livros?
Sim. Fiz carteirinha de todas as bibliotecas de Taubaté, então não passava uma semana sequer com o mesmo livro. Devorava. Quando não tinha nada interessante para ler, relia. Nessas fiquei meses com o “Obras Completas”, do Oscar Wilde, em casa. E fiquei fã de uma coleção completa de obras do Shakespeare, uma edição antiga repleta de apêndices. Procuro ela até hoje para comprar. Já os vinis começaram aos 12, 13 anos. Eu e outro amigo discotecávamos nas festinhas da rua. Paralelamente, o rock nacional estava surgindo, e muita coisa boa acontecendo. Logo depois veio a Bizz. Um mundo novo se abriu. Com 16 anos minha casa já era o ponto de encontro da turma, o local em que todo mundo ia beber e fumar ouvindo boa música.

Isso foi em que ano? E você lembra quais foram teus primeiros vinis nessa época? E as capas da Bizz?
1982/1983 mais ou menos. Primeiros vinis… “Radioatividade”, da Blitz (também meu primeiro “grande” show – risos); “Ballads”, uma coletânea com 20 baladas dos Beatles e um disco da Rita Lee com o Erasmo. Já na época da Bizz, 1985/1986, começaram as compras desenfreadas, coisa de entrar na loja e sair de uma só vez com o “Dois”, da Legião, o “Selvagem”, dos Paralamas, o “Rock Errou”, do Lobão, o “Nós Vamos Invadir Sua Praia”, do Ultraje e o “Vivendo e Não Aprendendo”, do Ira!. Capas da Bizz… Bruce estampou a capa da edição número 1 da revista. Tenho a coleção completa, e essa particularmente está detonadaça de tanto que li. Ainda hoje, se alguma referência me vem a cabeça quando estou escrevendo, vou direto na revista conferir. É mais rápido do que colocar o CD-Rom no computador (risos).

Massa! Sua personalidade e repertório musical são bem pautados pela Bizz então. Qual a importância da revista para sua formação profissional e até mesmo pessoal?
Acho que é impossível de mensurar a importância da revista na minha formação e na minha vida pessoal. O fato de ser jornalista tem a ver com a revista também, muito embora meu pai tenha sido a grande inspiração para a profissão, mas a revista… putz, ela tornou viável a ideia que eu tinha do que eu queria ser. Foi fundamental no meu crescimento como profissional. Quando você passa sua adolescência lendo Ana Maria Bahiana, Alex Antunes e André Forastieri, sua vida só pode melhorar (risos).

Eu “descobri” o André Forastieri em um post no teu blog. Pirei. E já comprei revista só porque tinha o nome dele (risos). Virou uma referência. E você acha que as revistas que tratam de música hoje no Brasil têm esse “poder” de influência sobre os jovens? Pra formar uma possível nova geração de profissionais… Como a Billboard e a Rolling Stone, por exemplo.
Não, não tem. Infelizmente. Falta jornalismo opinativo no Brasil. Uma revista já chega às bancas atrasada em relação a internet, pela velocidade da informação. Ter textos opinativos, coisas mais pessoais, poderiam dar uma personalidade para a publicação e seduzir o leitor. É preciso seduzir o leitor. Por outro lado, existem vários profissionais na internet fazendo isso. Já recebi diversos e-mails de gente contando que decidiu fazer jornalismo devido ao Scream & Yell.

E desses profissionais da internet que você fala, consegue citar alguns que você gosta?
Tem muita gente nova bacana nas esquinas da internet. O pessoal do Urbanaque, do Move That Jukebox, por exemplo, são bons pacas no que se propõe. Não é a toa que nos juntamos sob o guarda-chuva Confraria Pop. Eu acredito neles, acredito no potencial. Da mesma forma que acredito e admiro o Coquetel Molotov, o La Cumbuca, o Alto Falante, o El Cabong e muitos outros. Mas se for para citar vou ficar com um monte de gente que migrou do papel para a web, nomes como o próprio Forastieri, o Alexandre Matias e o Lúcio Ribeiro, caras que continuam em contato com o papel, mas cuja vida já fica difícil de ser dissociada da internet

Agora sobre o Scream & Yell. Com surgiu a ideia dele? O que você pretendia?
Surgiu da maneira mais prosaica possível. Um amigo apareceu em casa num 25 de dezembro me propondo fazer um fanzine. Não lembro se chegamos a discutir isso antes, de onde ele tirou a ideia de fazer um fanzine. Dois grandes amigos da minha turma já tinham feito um fanzine, o Gambiarra, e talvez eu até tenha comentado sobre com o João Marcelo, o cara que batizou o Scream & Yell, mas realmente não lembro de onde ele tirou a ideia. Só lembro que ali na mesma hora desenhamos como seria o número 1 do Scream & Yell em papel. O foco naquele momento era falar da cena musical de Taubaté, nada mais do que isso. Tanto que no número 1 temos entrevistas com bandas de lá…

E sobre esse contexto do início do Scream & Yell… Consegue fazer um paralelo da cena musical que você tinha contato na época com a cena atual? O que mais mudou, o que não mudou… Como você percebe esses dois momentos…
Puxa, difícil. Eu morava em Taubaté, uma ilha entre São Paulo e Rio de Janeiro que não absorvia nada de bom e parecia longe demais das capitais. Taubaté era uma cidade metal. Até brinquei de roadie de banda trash lá. A cena era muito distante, e chegava a mim pela Ilustrada e pela Bizz. Naquela época – 1995/1996 – era difícil copiar CDs, os MP3 ainda não eram febre e o correio ainda era uma fonte inesgotável de troca de informações musicais (via fanzines). Hoje vivemos no período da múltipla informação. Temos acesso a mais discos que conseguimos ouvir, a mais textos que conseguimos ler. Conseguir a atenção do leitor é uma vitória hoje em dia. 15 anos atrás era mais fácil.

O Scream & Yell durou quanto tempo no papel? Tem vontade de voltar para o papel?
Pra você ver como o tempo passa, tive que ir atrás dos originais para confirmar as datas, todas perdidas na memória. O #1, com Kiss na capa, era para ter saído em janeiro de 1997. Fizemos nos últimos dias de 1996, editamos, mas na hora de imprimir não conseguimos patrocínio. Então o João, que fazia o fanzine comigo, se acidentou e morreu. Aposentei a ideia. Só voltei a ela no final de 1998, quando um cara, que tinha visto uma versão pirata do número 1 do Scream & Yell (risos) me pilhou para voltar com o zine (que na verdade nem tinha ido – risos). A edição número 2 saiu em janeiro de 1999 com Chris Isaak na capa. Ficamos super orgulhosos de colocá-lo em destaque. Aproveitei o embalo e finalizei a primeira edição, e lancei. Comecei a distribuir ela com o #3, que tinha o Echo and The Bunnymen na capa. O #4 saiu em junho, e foi uma edição especial de dia dos namorados (com poesia, indicação do “Baladas Sangrentas”, do Wander Wildner, para ouvir e um texto belíssimo que o Thales de Menezes, na época na Folha de São Paulo, liberou para nós: “Romance com alma Rock and Roll). O #5 tinha o cineasta Kevin Smith na capa e saiu em agosto de 1999. O #6 e último saiu apenas em março de 2000 com Jerry Lee Lewis na capa e uma tiragem de 1000 exemplares. Sempre tive vontade de fazer uma edição em papel novamente. Adoro os textos impressos. Qualquer hora me aventuro novamente. É uma porta aberta.

O Scream & Yell é um site de cultura pop… O que é cultura pop pra você?
O site começou com um foco em cultura pop, pegando o lado popular das artes. Então na literatura, no começo, falávamos de Nick Hornby. Em cinema, de Quentin Tarantino. Ou seja, buscávamos elementos populares que aproximassem essas artes da música pop. Com o tempo, porém, fomos ampliando o leque, tentando mostrar para o leitor que não há diferença para nós entre Gustav Mahler, Christopher Nolan, Wado e Bohumil Hrabal. Eles são todos objetos transformadores da cultura, agentes que podem ampliar a sua visão sobre o mundo. O cerne da criação do Scream & Yell, instintivamente, foi esse: falar de cultura de uma maneira que essa cultura amplie o universo do leitor – como as revistas e jornais e livros que li fizeram comigo. Então, voltando ao inicio da sua pergunta, cultura pop para nós hoje em dia é tudo. Exatamente tudo. Pra que limitar se o mundo, de alguma forma, se ampliou com a internet, mas tudo está muito mais próximo, né.

Já aconteceu alguma coisa engraçada ou diferente relacionada com algum texto que você escreveu? Alguém que não gostou e tal…
Dezenas de vezes, dezenas. Para o bem e para o mal (risos). Para o bem existe um monte de gente que diz que conheceu tal banda, tal filme ou descobriu tal coisa através do site. É daquelas coisas que dão orgulho. Já o contrário também ocorre. Muita gente discorda de um texto e leva para um lado pessoal do tipo: “Você está com inveja do Dinho Ouro Preto”. Ou: “Chris Martin é famoso e quem é você? Ninguém”. Fazer o que nessa hora? Rir. (risos)

Aquela pergunta chata: Marcelo Costa por Marcelo Costa. Rola alguma definição?
Haha, pergunta suspeita (risos). Acho que vale mais perguntar para algumas pessoas que me conhecem, jornalistas amigos, sabe. Acredito mais neles do que em mim (risos). Mas, vou tentar me resumir numa linha: um cara que alcançou o seu sonho, mas ainda não quer dormir. Diz muito… :)

Nesse caso (de história engraçada sobre algum texto), não aconteceu de alguém querer tirar satisfação com você pessoalmente não, né? (risos)
Não, mas estamos ai (risos). Uma vez escrevi um texto que apontava algumas coisas que considerava defeitos em um disco, e encontrei um dos caras da banda uns tempos depois: “A gente curtiu o que você falou porque você foi e ouviu o disco. Tem gente na banda que concordou, outro discordou, mas respeitamos a sua opinião”. Acho que é por esse lado. Não teria a manha de fazer algo para sacanear uma banda.

É possível notar nos seus textos uma paixão por aquilo que você faz. O que esse tal ato de escrever significa pra você?
É como se fosse respirar, não consigo pensar em outra coisa. Se tenho muitas ideias, e não escrevo, durmo mal (mesmo dormindo às 23h, por exemplo). Se fico acordado até às 3 da manhã e escrevo um texto que me satisfaça, durmo feliz (mesmo dormindo menos).

Qual banda ou artista te acompanha pela vida? Por quê?
Estava vendo a minha Last.Fm dia desses e fiquei surpreso: mais de 129 mil músicas ouvidas, mas os artistas que mais ouvi tem tudo 1800 músicas, e são poucos: Wilco, Costello, Dylan, R.E.M. e Radiohead. Mas então lhe digo que a banda que me acompanha é o Echo and The Bunnymen, que está lá embaixo na tabela, em 18 lugar. Mas são os discos deles que vou buscar quando quero ouvir alguma coisa especial. Como escrevi certeza vez, em uma coluna para a revista Noize, o Echo me explica. Isso é muito especial para quem ama a música.

De que você tem medo?
De milhões de coisas, o que não quer dizer que não eu não vá enfrentar estes medos. Medo obriga você a lutar. E eu sou leonino. Adoro uma briga. risos

Em quais momentos você ouve música? Você consegue parar pra fazer apenas isso? Como é essa relação mais “intima” que você tem com a música?
Putz, passo o dia inteiro com um fone de ouvido com algo rolando, mas não é a mesma coisa que ouvir em casa, prestando atenção, sabe. Ouvir música no trabalho é mais para ter um primeiro contato mesmo. Meu momento com a música é em casa, no meu som. Sou daqueles que só sabe se gostou mesmo de um disco se ouviu ele no seu próprio som, pois ele é a minha referência para música (risos). Mas isso de parar para ouvir é bem raro hoje em dia. Ouço mais para escrever. Costumo dizer que se estou ouvindo muito um disco, preciso escrever logo sobre ele para esgotá-lo e colocá-lo na estante. É tipo uma terapia. Muita gente quer escrever sobre música, e o que ninguém conta para elas é que elas vão precisar ver shows de bandas que não gostam e receber discos de artistas ruins. E o ato de ouvir música pode se transformar numa obrigação. Inevitavelmente acaba se transformando, mas ainda consigo me emocionar ouvindo um disco e vendo um show. Acho que meu coração ainda não caiu nas garras da arteriosclerose do “classic rock”, como definiu certa vez Ana Maria Bahiana (risos).

Você agora comanda o podcast Scream & Yell on The Radio junto com o Tiago Agostini, na Rádio Levis. Como tem sido essa nova empreitada? Fale um pouco sobre isso, de quem foi a ideia etc.
Na verdade agora somos quatro. Além de mim e do Agostini contamos com a presença do Marco Tomazzoni (jornalista cultural do iG e colaborador do Scream) e do Tiago Trigo (também colaborador do Scream). Nós formamos uma “família” Seinfeld e andamos juntos já faz um bom tempo, o que faz com que muitas ideias apareçam e desapareçam. Uma delas foi a de fazer um podcast. Chegamos a marcar data para gravar, ou ao menos estruturar a parada, mas não rolou. Uns seis meses depois recebi o convite da Rádio Levis para fazer um programa lá, gravado no estúdio deles para ser exibido na programação e disponibilizado para download. A ideia inicial era começar em quarteto, mas fui testando, observando o terreno. Começamos eu e Agostini, mas agora já estamos os quatro juntos, o que dá uma dinâmica interessante ao programa. E é um programa para falar sobre música. Foi mais ou menos isso que o Edu Parez, da Levis, nos pediu. Um olhar aprofundado, crítico e informativo sobre o que anda rolando. Além disso decidimos montar alguns programas especiais, e são eles que estão se destacando mais. A edição 6, inspirada no documentário “Uma Noite em 67” ficou excelente. No geral, ainda temos que melhorar muito. Rádio é uma mídia totalmente particular, mas a possibilidade do download do programa é simplesmente maravilhosa. Muita gente já nos escreveu dizendo que nos ouve no celular indo para o trabalho. Um amigo carioca disse que se divertiu muito com um programa (exatamente o 6) ouvindo numa caminhada no calçadão do Rio. Chegou em casa e foi atrás de algumas raridades que tocamos. Bacana isso.

E qual sua relação com as rádios? Você ainda acredita nas FMs?
Não só acredito como aposto todas as minhas fichas de que as coisas só podem mudar no País quando essa nova geração tomar as rádios. As grandes indústrias brasileiras cavaram sua própria sepultura apostando pesadamente no jabá. O que acontece é que há pouco espaço (quase nenhum, na verdade) para o novo, pois as rádios dependem do jabá e não vão abrir um espaço para algo novo, pois como ela vai oferecer de graça algo que tem gente que ainda paga para ocupar. Assim, o espaço livre é ocupado por classic rock. Os Estados Unidos conseguiram sobreviver, de certa forma, porque o circuito de college radios firmou-se como definidor de tendências para a juventude buscando sempre o novo. Abriu espaço para que muita gente legal surgisse. Não temos esse canal no Brasil, que permite ao novo artista ser conhecido pela massa, que ainda consome o rádio. A Rádio Oi tem um desenho ótimo, mas é preciso conquistar as demais emissoras. Como escreveu Wado, é preciso fazer funcionar a reforma agrária do ar.

Qual o texto de outra pessoa você gostaria de ter escrito? Algum motivo específico? E em relação aos textos que você escreveu existe um que você gosta mais que outros? Por quê?
Nossa, eu gostaria de ter escrito centenas de textos. Coisas do André Forastieri, do Tony Parsons, do Simon Reynolds e da Ana Maria Bahiana, várias. Não é a toa que criei uma seção no site chamada “Matérias Antológicas“. Tenho vários textos meus queridos… alguns por motivos pessoais, outros que acho que consegui me expressar bem, e ainda alguns problemáticos na construção, mas que mesmo assim se tornaram queridos. Alguns, de cabeça. “Tudo simplesmente acontece” (resenha sobre o filme “Magnólia”) e “O gosto amargo nos lábios de nossa alma” (texto sobre o filme “Sangue Negro“), “Noé” (resenha sobre “Hail To The Thief“, do Radiohead), “Bob Dylan, um retrato borrado da era de ouro do rock ‘n roll” (sobre o show dele em São Paulo) e as entrevistas com Ian McCulloch, André Takeda e Fernanda Young.

Você se sente realizado com o Scream & Yell? Ou falta alguma coisa?
Realizadissimo. O Scream & Yell chegou a lugares que nunca imaginei que ele iria chegar. Ele entrou na vida de milhares de pessoas como a música entrou na minha vida. E mais do que isso, ele se transformou em um veículo com uma cara de honestidade que me traz um orgulho imenso. Nesse quesito não falta nada, mas a gente sempre quer mais, quer que o site cresça, quer sobreviver do site (até para se dedicar mais a ele), quer amplificar as discussões ali, quer o mundo, mas estamos contentes com o pedaço de terra que conquistamos até hoje. Ou seja, ainda falta dinheiro. O que não me impede de me sentir realizado.

Aproveitando isso… como você percebe e encara a importância que o Scream & Yell tem para essas pessoas a que você se refere? Rola uma cobrança maior da sua parte em decorrência dessa importância?
Sinceramente, não costumo pensar muito nisso. Busco manter um padrão, e mantendo esse padrão estaremos satisfazendo a nós e a todos aqueles que encaram o site como algo especial. Mas encaro como um imenso reconhecimento, sem dúvida. A cobrança naturalmente é maior, mas fazemos as coisas da forma mais natural possível. Continuo escrevendo para mim mesmo, sendo o meu primeiro leitor.

Como você imagina que será teu futuro e o do Scream & Yell?
Jim Morrison escreveu certa vez: o futuro é incerto e o fim está sempre próximo. E é exatamente assim que me sinto. Tem semanas que dá uma vontade imensa de jogar tudo pro alto. Fico planejando a melhor maneira de dar cabo ao site sem me sentir culpado, essas coisas. O Scream & Yell é um filho e como tal exige muita atenção. Às vezes a estafa bate e fica difícil manter o bom humor. Por outro lado, 2010 foi o melhor ano do site. Disparado. Não só o melhor ano editorial (acho até que editorialmente tivemos anos tão bons quanto este), mas 2010 foi o ano em que surgiram mais oportunidades de negócio com o site. Parcerias, publi-editoriais, anúncios. Dá para dizer que 2010 será o primeiro ano que o Scream & Yell fechará no azul. E isso cria ótimas perspectivas para o futuro. As portas estão sendo abertas para o site, e não tem como pular fora do trem agora. Mas não posso bater o martelo e dizer que quero passar os próximos dois anos fazendo isso. Ou melhor, se fosse só fazer isso, tudo bem, mas o Scream & Yell é o que faço na hora de folga (ou seja, na hora de folga eu “trabalho” no Scream & Yell). E o futuro do site influencia o meu futuro. As melhores coisas que aconteceram na minha vida profissional foram conquistadas através do site. O plano no momento é seguir em frente e aproveitar esse momento de crescimento (do site e do mercado) e ver aonde vamos todos parar. E, sinceramente, eu não tenho a mínima ideia de onde tudo isso vai parar…

O Scream & Yell já acabou e voltou duas vezes, né? Decidiu parar nas duas ocasiões por esses motivos que falou? E por que decidiu voltar?
A primeira foi no susto. Estava acabando o contrato de um emprego, e eu acreditava que muita coisa iria mudar, e que entre elas eu não teria mais tempo para tocar o site. E pra deixar o site às moscas, melhor terminar. Porém, assim que anunciei o fim, uma centena de emails começou a lotar a minha caixa com mensagens de carinho, agradecimentos e pedidos para continuar. Não teve como. O site acabou por uma semana, sem sair do ar. Em 2003, o site não chegou a acabar, mas deu uma parada tão grande que desisti da capa tradicional e coloquei o blog como principal. Entre outubro de 2003 e maio de 2004 só tivemos um blog na capa. Fui retomando as atualizações conforme as coisas foram entrando nos eixos. Por que voltar? Porque é uma coisa muito legal de fazer, e eu queria provar que era possível continuar, que bastava ter força de vontade. Não queria desistir. Queria manter esse canal de conversa/contato com o mundo. E desde junho de 2004 o site vem se mantendo firme com uma atualização constante. A conversa está durando…

Na história do Scream & Yell você consegue citar dois momentos opostos: um que te deu muito orgulho e outro que nem tanto?
Momentos de orgulho são muitos. De verdade. Na primeira vez em que decidi acabar com o site (2003) recebi uma quantidade tão grande de e-mails e telefonemas que me senti obrigado a, de alguma forma, continuar. Foi tipo uma realização: “as pessoas se importam com esse site”. Foi um momento de muito orgulho. Também foi sensacional participar do Seminário Internacional de Jornalismo do Itaú Cultural ao lado do Jan Feld, do UOL, e do Alex Needham, do Guardian: um site independente ao lado de um dos maiores portais do País e de um dos maiores jornais do mundo. Quanto a momentos ruins… não saberia listar um momento específico. Acho que a falta de tempo faz com que muitas vezes um texto entre no site sem ter sido burilado, pensado, trabalhado adequadamente. Isso muitas vezes me frustra. Por outro lado, quando publico um texto bacana, isso me dá um sopro de energia, uma vontade de continuar fazendo isso por muito tempo.

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novembro 14, 2013   No Comments

13 respostas para o Som Imaginário

Queria bater um papo com você para uma coluna que tenho no meu blog (www.somimaginario.com) chamada Sempre As Mesmas. Como o nome mesmo entrega, faço – praticamente – as mesmas perguntas para pessoas diferentes. Fernando 18/10/2011

Deep Purple do Gillan ou da dupla Coverdale/Hughes?
Do Gillan, sem pestanejar. Por “Child in Time”, “Highway Star”, “Hard Lovin’ Man” e, mamma mia, “Smoke on the Water”. Por “Perfect Strangers” também, mas isso é outra coisa. Coverdale será eternamente um sub-Robert Plant.

Neil Young: do rock ou do folk?
Os dois. A essência do Neil Young está na genialidade com que ele consegue lidar com os dois extremos e ainda soar… Neil Young. Como que alguém pode escolher entre “Needle And The Damage Done” e “Powderfinger”?

Miles Davis vale em todas as fases?
Todas. Amar a música de Miles é respeitar a sua inquietação, entender que a música para ele estava em eterna transformação, uma busca que gerou uma das discografias mais importantes da história.

Nina Simone, Ella Fitzgerald, Billie Holiday ou Sarah Vaughan?
Difícil, hein. Muito difícil. Tendo a ficar com a Nina, mas a Ella…

Quais são os três discos de rock obrigatórios?
“London Calling”, do Clash, pra pessoa perceber que o rock não é burro; “Doolittle”, do Pixies, que mostra como o rock pode soar pop, mas também perigoso; “White Album”, dos Beatles, porque algum disco dos Beatles precisa constar de qualquer lista de obrigatórios. O álbum branco tem o dom de ir na contramão do “Sargeant Peppers” (o que começa já pela capa), e ainda assim soar absurdamente foda (exagerado, mas foda). É um daqueles discos em que a vida é tátil (talvez porque as vidas por trás dele estivessem em conflito).

Beatles e Stones. O que um tem que o outro não?
Beatles foi praticamente impecável enquanto os Stones cometeram vários deslizes. Por outro lado, os Beatles aguentaram o peso nas costas por uma década, e os Stones viveram cinco. Beatles é mais limpo, Stones é mais sujo. Beatles é amor, Stones é sexo. Essas bobagens. Não consigo escolher entre os dois. Os Beatles são mais importantes, mas o manual do rockstar foi escrito pelos Stones.

Peter Gabriel ficou pelo Genesis ou soube voar também solo?
Comecei ouvindo punk rock na primeira metade dos anos 80, então Genesis era algo meio que proibido no círculo (ainda mais que, naquela época, eles viviam a fase Phil Collins), mas nos anos 90 fui atrás de algumas coisas antigas e, putz, tive que comprar o “The Lamb Lies Down on Broadway” em vinil (e tenho até hoje). No entanto, nunca fui atrás da carreira solo do Peter Gabriel. Quem sabe o show no SWU não seja um acerto de contas…

O que tem essa cena indie lá de fora? É pra tanto barulho? Quem se salva hoje?
Hoje em dia essa coisa de independente anda meio deturpada. Antigamente, o lance todo girava ao redor da liberdade de criação. O cara era independente porque nenhuma gravadora queria lançar o disco dele, então ele fazia do jeito dele e lançava. O capitalismo, altamente adaptável, aproveitou a chance de também vender a liberdade. E os indies chegaram às grandes gravadoras, ao mainstream, ainda que no momento em que as gravadoras levavam uma rasteira do p2p. O que sobra hoje, como em qualquer cenário, é um balaio com gente genial (Arcade Fire, Franz Ferdinand, Decemberists) e um monte de diluidores. Mas sempre foi assim.

Radiohead é isso tudo?
E mais um pouco. No momento em que a internet estava matando o álbum como formato, os caras revalorizaram o conceito com um monte de bugigangas atreladas. Porque não amamos a música apenas pelo que ela é, mas também pelo que ela representa. O Radiohead é uma das últimas bandas a entenderem isso. E isso os distingue do resto.

Quem está fazendo coisa boa e nova no Brasil?
Muita gente. A música brasileira atual é a melhor do mundo. Se Simon Reynolds vivesse aqui ele nunca teria escrito “Retromania”. Mas como não achar o cenário uma merda se o disco mais esperado do seu país no ano é o novo do Coldplay? Aqui temos uma safra genial que aprendeu – via Los Hermanos – que o samba pode ser torto e nos representa. Nós temos ginga, coração e sentimentos. É isso que Romulo Fróes, Wado, Bruno Morais, Junio Barreto, Cidadão Instigado e outros estão mostrando. A melhor música do mundo está aqui, mas o próprio Brasil ainda não a descobriu.

Qual foi o álbum dos anos 2000?
Em conceito, “In Rainbows”, do Radiohead, pois mostrou que não basta ser música. Em efeito, “Is This It”, do Strokes, que influenciou um bocado de gente; em perfeição, “Yankee Hotel Foxtrot”, do Wilco, momento em que o popular encontra a arte. Porém, olhando de onde viemos e para onde vamos, é bem provável que o disco mais importante seja “Funeral”, do Arcade Fire, uma banda que entendeu a intensidade das emoções no novo século.

Qual o lançamento de 2011 até agora?
“Let England Shake”, PJ Harvey. Em um mundo de prêmios merecidos, ela ganharia o de álbum do ano, e ainda bem que a Inglaterra tem o Mercury Prize. Se fosse aqui ela seria engolida por qualquer modismo.

Estou em Dylan & The Band, The Basement Tapes, e você? O que você está ouvindo?
Dois discos novos: “The Whole Love”, do Wilco e “Samba 808”, do Wado. E acho que ainda vou ficar um bom tempo os ouvindo. “All Things Must Pass”, do George, caiu no colo fazendo estrago também. E alguma hora da semana eu coloco “The King is Dead” do Decemberists para acalmar a alma.

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novembro 14, 2013   No Comments

12 respostas sobre crítica musical

Para o Rafael em junho de 2011…

Quando o assunto é cultura, fala-se muito sobre como o consumo de música, cinema ou literatura mudou. Você acha que a reflexão sobre esses produtos mudou em alguma coisa, com a maior velocidade e acessibilidade que a popularização da internet trouxe¿ Você acha que a velocidade no consumo influenciou, de alguma maneira, na “velocidade” sobre o que se pensa sobre música, atualmente?
Totalmente. A relação das pessoas com os objetos de arte é totalmente diferente hoje em dia. Porém, se é certo ou errado, pior ou melhor, é uma outra reflexão. Temos também que tomar cuidado para não posarmos de nostálgicos e não cairmos na armadilha do “Ah, no meu tempo a relação com a música era diferente” por pura memória afetiva e falta de encaixe no modus operandi atual da indústria cultural. Porém, mudou e muito. E lógico que acaba influenciando a maneira como uma pessoa digere um disco. Antes ela tinha um disco que iria ouvir durante um tempo x. Agora ela tem todos os discos que quiser para ouvir nesse mesmo tempo x.

E o surgimento de novos espaços de discussão, como fóruns eletrônicos e blogs (que dispensam editores e limites de caracteres), em que eles mudaram o modo de discutir música no Brasil e no Mundo?
A coisa toda ficou mais direta, sem mediação. Isso possibilitou o surgimento de muitas coisas legais, mas também nivelou a discussão por baixo em outros casos. No entanto acredito que o saldo final é positivo. As pessoas acabaram descobrindo pares, pessoas que pensam e gostam das mesmas coisas que ela. E isso é um primeiro passo interessante.

Esse aspecto direto pode fazer com que a crítica seja menos “especializada”, no sentido de se aproximar mais do fã de música?
Depende do que entendermos como crítica especializada, pois se existe alguém especialista sobre um artista, este alguém é o fã. Se ele não for cego – como a maioria dos fãs são – a chance de ele fazer uma grande crítica muito melhor do que qualquer outra pessoa. Um médico que tenho um bom texto naturalmente pode escrever um texto melhor que um jornalista que cobre medicina, por exemplo. Acredito muito nisso.

Numa entrevista com o “blogdobracin”, você disse que, no início do Scream & Yell já havia “uma necessidade de escrever devido aos veículos que eu acompanhava (Ilustrada, Bizz) não estarem trazendo nada de novo. Então foi algo: ‘Se eles não falam das bandas que deveriam ser faladas, a gente fala’” A internet, no que diz respeito à crítica, também desempenha um espaço “alternativo” ao tipo de crítica associado a veículos tradicionais? Por que?
O espaço alternativo, via de regra, não precisa se preocupar com o anunciante, a gravadora ou uma produtora, e muitas vezes um grande veículo tem que lidar com isso, pois eles são anunciantes, e a coisa toda só funciona porque dá lucro, ou seja, ninguém vai fazer jornal para ter prejuízo. Assim, a relação entre patrocinador e veículo muitas vezes pode contaminar a crítica. Não é algo comum nem frequente, mas acontece. Em um veículo independente a liberdade é total (e o dinheiro quase sempre não existe).

Além da ausência dessa contaminação, em que um espaço mais “livre” influencia na crítica? É possível que essa crítica seja mais descompromissada? Se sim (ou não), como isso transparece nos textos?
A liberdade é uma faca de dois gumes. Então é possível sim que a crítica seja mais descompromissada porque a pessoa está escrevendo aquilo por vontade própria – ou outra coisa que o mova – e não para tapar um buraco dentro de um caderno de jornal. O modo de identificar isso é percebendo quanto tempo a argumentação (pró ou contra) se sustenta. Em um bom texto, a argumentação está presente em todas as linhas do começo ao fim (mesmo quando a frase está ambientando uma ideia).

O Scream & Yell começou num momento em que as possibilidades de “qualquer um escrever sobre música” ainda eram muito novas. O que você acha que mudou, nesse período¿
Começou a pintar muita gente legal escrevendo sobre música, e isso só pode melhorar o cenário todo. Se antes era tudo muito novo, agora qualquer pessoa domina a ferramenta de um blog, consegue ouvir um disco com facilidade e só precisa gastar neurônio para tentar decodificar aquela obra. Ou seja, felizmente aumentou a concorrência.

Você diz que o surgimento de mais gente escrevendo sobre música pode melhora o cenário todo. Em que sentido?
Quanto mais pessoas escrevendo, mais pessoas vão ler. Porque naturalmente todo mundo tem um círculo de amizades que acaba sendo envolvido por este projeto, que acaba se cruzando com os outros e… nasce uma cena ou algo bem legal. Quanto comecei eu tinha lá outros sites amigos que nem existem mais (Quadradinho, Pastilhas Coloridas – o Urbanaque continua firme e forte), mas de repente surgiram sites novos como o Move That Jukebox! e o Rock’n Beats (para citar dois) que estão fazendo muitas coisas legais. Isso só tem a acrescentar.

E com um número maior de opiniões e análises, a crítica ainda é capaz de estabelecer algum tipo parâmetro ou cânone?
O Metacritic está ai para exemplificar que isso é possível.

A seção de comentários, no Scream & Yell, desempenha um papel muito importante. A existência de comunidades como a da Bizz, no Orkut, também desempenha um papel importante no que se discute sobre música no país. Em que essas discussões, possibilitadas por redes sociais, fóruns de discussão e seções de comentários influenciam no trabalho de um crítico?

Elas não deveriam influenciar em nada. O crítico que escreve pensando na resposta do leitor (ou seja, na polêmica) está usando um artifício batido, que até funciona ainda hoje, mas me soa baixo. Tudo bem que você não pode deixar o leitor passível. O crítico tem que conquista-lo. No mais, uma boa discussão sempre aponta novos caminhos para as ideias.

Como você vê o papel do crítico de música, num contexto em que ouvir o disco antes mesmo que qualquer coisa seja escrita sobre ele é um fato corriqueiro? Por que essa reflexão (e essa opinião) ainda se faz necessária?

Porque a crítica ainda tem a obsessão de entender o mundo. A pessoa que compra o disco ou baixa está seguindo um impulso cultural, de entretenimento, de passatempo. O crítico deve ir um pouco além. Ele precisa entender o que aquele objeto de arte que foi consumido pela pessoa representa em nosso cotidiano histórico, econômico e político. Toda arte está inserida no momento histórico em que ela é criada. Assim é possível observar os movimentos sociais do mundo observando como as pessoas consomem cultura. Crítica é muito mais uma análise sociológica do que cultural. Por isso ainda é necessária, pois a humanidade vive entrando em vielas escuras.

Essa é pessoal, mas diz um pouco do que leva alguém a escrever uma crítica. O que te faz escrever sobre música?O que te leva a escrever (para o bem ou para o mal) sobre um disco? Quais são os nortes que te guiam, quando é hora de escrever o texto? A que o texto (e você, como autor da resenha ou da crítica ou do que quer que se chame um texto que realize uma reflexão de um disco, como o que você fez sobre o The Suburbs) se propõe?
Tentar entender o mundo. Um disco é um quadro que um artista desenhou, e de certa forma este quadro está recheado de detalhes, de signos, de códigos que permitem ao crítico visualizar as mudanças culturais pela qual o mundo está passando. No caso da resenha que você citou, minha busca ali é entender o motivo que fez o autor e o grupo comporem aquelas canções, e o respaldo que ele recebeu da sociedade. Buscar esse entendimento é fundamental.

Por fim, o que seria uma resenha “perfeita” pra você?
A resenha perfeita é aquela que faz o leitor perceber algo que ele não tinha entendido, faz ele refletir o disco que ouve. Pensar é nosso maior dom.

Veja outras entrevistas aqui

novembro 14, 2013   No Comments

Cinco respostas em dezembro de 2010

Marcelo, estou te enviando algumas perguntas para uma entrevista para o blog Rock Pará.
Grando abraço
Sidney
Como surgiu o blog Scream Yell?
O Scream é derivado de um fanzine, em papel, que circulou de 1996 a 2000. O site surgiu em novembro de 2000 seguindo a mesma vibe do fanzine.

Quais foram os melhores momentos de todos esses anos?
Nossa, foram muitos. O começo foi especial, pois eram poucos sites independentes especializados em cultura pop, e era tudo novo e tal. Mas, indiscutivelmente, 2010 foi o melhor dos dez anos do site. Rolou parceria com a MTV, dividi uma mesa de debate com o editor de cultura do Guardian para discutir jornalismo, fizemos 20 edições de um podcast na Rádio Levis, quatro festas na Casa Dissenso. Muita coisa.

Para você, já é possível viver com o blog? E como conseguiste?
Já é possível sim para algumas pessoas, mas eu ainda não consigo. O que banca a minha vida é o trabalho de edição na capa do portal iG. Ou seja, eu trabalho oito horas lá e mais um tanto em casa para manter o Scream atualizado. Mas se eu fosse um pouco mais persistente talvez já tivesse ganhando dinheiro com o Scream. O lance é que ou você é jornalista ou publicitário. As duas coisas ao mesmo tempo ocupa um espaço danado na vida de gente.

O que você da atual cena independente nacional?
É uma das melhores e mais variadas de todos os tempos. Há muita coisa ali que merecia estar em rádios e TVs.

O que conheces do Rock Paraense
Pouca coisa. Fizemos uma entrevista com a Suzana Flag, que lançou um disco belíssimo este ano. O Vladimir Cunha e o Adriano Costa sempre adiantam coisas legais, sem contar que o Vlad fez o documentário “Brega S.A.”, que serviu para apresentar muita coisa do Estado ao País (e ao mundo). Mas há muito ainda a conhecer.

Quais são os teus próximos projetos?
Continuar tocando o Scream da melhor maneira possível, e tudo que vem derivando dele (festas, shows, podcast). Já é um trabalho enorme.

novembro 14, 2013   No Comments

10 respostas em maio de 2009

Oi Marcelo, meu nome é Elaine e tô escrevendo uma matéria pruma revista da faculdade sobre as novas tecnologias na música e gostaria muito se você pudesse responder as perguntas abaixo! 14/05/09

A facilidade em se produzir música de forma mais “caseira”, ou informal, sem a participação obrigatória das grandes majors teve que tipo de influência na qualidade dessa música? Isso é positivo para o mercado fonográfico de forma geral? Explique
Qualidade é algo difícil de mensurar nesse caso, pois vamos ter diversos fatores que podem afetar ou não uma obra artística. Será que o músico compõe melhor sob pressão ou quando está livre? Se for quando está livre, que é o natural, o que explica o nível de qualidade durante a ditadura militar, quando os compositores precisavam trabalhar para compor e ainda dobrar a censura. Ou seja: facilidade é algo sempre bom, sem dúvida, mas a cobrança de um diretor artístico talvez fosse útil. Esse é um ponto. Para o mercado fonográfico é outra coisa, pois muita gente que produz caseiramente, 90% dos casos, não aparece na mídia. Seria positivo se houvesse espaço, mas o mercado fonográfico nacional fechou as portas com anos de jabá e estreita visão musical.

O que pode ser feito hoje, em termos de produção e divulgação, que era impensável há cinco, dez anos?
Ter um estúdio de gravação em casa já é um grande avanço. Lançar o trabalho na internet também. A web é uma ferramenta essencial na “nova ordem musical”.

Qual sua opinião sobre a facilidade em se baixar faixas gratuitamente pela internet? Qual o impacto dessa prática no mercado musical?
Baixar músicas gratuitamente é uma oportunidade do público conhecer o material antes de comprar. No Brasil não existe a prática de devolver um CD que não gostou (embora isso esteja no Código de Defesa do Consumidor) como acontece no Primeiro Mundo, e vejo o fato de baixar um álbum em MP3 e não comprar como a falta de atrativo que aquele disco causou em quem ouviu. Também acho uma grande bobagem ficarmos discutindo se é legal ou não baixar músicas. Isso é algo que era relevante dez anos atrás. A fase é outra. Agora é hora das gravadoras partirem para um novo modelo de negócio – agenciamento de shows, distribuição de CDs – e deixar de comparar anos 2000 com 1970 ou 1980. Não é a mesma época. O modelo de negócio mudou, e o mercado musical tem que mudar. Ele nunca vai morrer, pois as pessoas sempre vão consumir música. Vivemos uma Nova Idade Média (escrevo sobre essa teoria aqui: https://screamyell.com.br/blog/2008/11/16/a-nova-idade-media/). O mundo mudou.

Como seria possível regulamentar essa prática?
Não tem que regulamentar. Tem que mudar o enfoque do negócio. As pessoas vão continuar baixando músicas – quer as gravadoras queiram ou não.

Você acha que os internautas concordariam em pagar pelas faixas que baixavam gratuitamente?
Acredito que não, mas esse é um fato menor nessa equação. O que interessa é: imagina que pessoas da minha geração (nascidas nos anos 70) e das anteriores tem um jeito diferente de lidar com música. A gente consumia vinil, havia uma outra relação, tanto que até hoje compro CDs mesmo baixando discos. Agora transponha isso prum garoto de oito, dez anos, que acostumou-se a baixar músicas. Ele vai baixar a vida inteira sem sentir algum remorso passional, pois a realidade dele é outra, e não é errada. Isso quer dizer que quando essa nova geração tiver poder de consumo, ela não vai fazer como a minha geração e gastar dinheiro com CD. Ela vai usar esse dinheiro em outra coisa, o que quer dizer que o mercado da música como o conhecemos está com os dias contados, pois quando a minha geração bater as botas, quem irá comprar CDs? Ninguém.

Nos últimos dez anos, o que mudou basicamente em termos de produção musical em função da existência das novas tecnologias?
A facilidade em se alcançar o resultado que o músico queria no estúdio. Sem contar que você pode gravar em um estúdio agora e mandar esse material para outra pessoa em qualquer lugar do mundo. As facilidades são inúmeras.

Que setores da indústria musical tradicional estão, na sua opinião, fadados à extinção?
As gravadoras, mas ainda vai demorar uns 10, 15 anos.

Na sua opinião, qual o futuro do mercado musical?
O mercado vai existir para todo sempre. A forma de negociar a música será outra. Isso faz com que o futuro seja incerto, nebuloso, mas impressiona o fato de numa época em que menos se compra música, mais se consome.

Quais suas bandas contemporâneas prediletas? Explique o que elas tem de bom.
Radiohead e Wilco. Eles conseguem transformar o passado em futuro.

Você acha que os grandes festivais de música fazem falta? Qual a importância desses eventos na história da música popular brasileira na sua opinião?
A música precisa de espaços, e os festivais são uma grande fonte de divulgação. Não sei se atrelados a uma grande rede de TV, embora a TV seja uma mídia que também precisa ser ocupada. Como escreveu Arnaldo Antunes certa vez, a gente quer comida, diversão e arte, e esses eventos são ótimos para proporcionar arte, agitar o cenário.

novembro 14, 2013   No Comments