Voltando no tempo: Pampeana Gruit Ale
A cerveja existe há milhares de anos, e, no principio, ela era bem diferente do que nós estamos acostumados a beber. Consta que sumérios, egípcios, mesopotâmios e ibéricos já fabricavam cerveja 6 mil antes de Cristo, mas esse tipo de cerveja consumida no mundo todo hoje em dia surgiu apenas no século 12, na Alemanha, quando a Abadessa Hildegard Von Biden colocou lúpulo na mistura, descobrindo assim uma flor que não só combatia o adocicado do malte como tinha qualidades de conservante natural. Nascia a cerveja como nós conhecemos – e bebemos.
A questão que fica: como os cervejeiros faziam antes da descoberta do lúpulo? Para contrabalançar o malte e conservar a cerveja durante algum tempo era usado um gruit, que nada mais é do que uma mistura de ervas aromáticas que funcionavam como tempero e concediam a cada cerveja um sabor único e bastante particular. Como as ervas mudavam de região para região, cada localidade tinha uma cerveja sua, que era feita só ali usando os ingredientes locais – muitos deles moderadamente narcóticos (como o lúpulo, aliás, um parente distante da cannabis).
Com a popularização do lúpulo, num primeiro momento, e a rigorosa Reinheitsgebot (Lei da Pureza da Baviera), que em 23 de abril de 1516 definiu que os únicos ingredientes que poderiam ser utilizados na produção de cerveja fossem apenas água, cevada e lúpulo, o gruit perdeu terreno e desapareceu lentamente, até ressurgir junto ao movimento de microcervejarias norte-americanas dos anos 90. De lá pra cá, várias cervejarias (tanto californianas quanto belgas, britânicas e escocesas) produziram e ainda produzem cerveja apenas com gruit.
No Brasil, a honraria e coragem ficou a cargo do Lagom Brewpub, de Porto Alegre. Para festejar os dois anos da casa, em 2012, o pessoal arriscou e o resultado é a Pampeana Gruit Ale, que conta com diversas ervas, entre elas a Carqueja e o Guaco, típicos da região dos Pampas. A primeira prova saiu extremamente amarga, por isso o mel aparece na receita para equilibrar o conjunto. Vendida apenas em torneira (essas garrafas da foto são uma cortesia para um apaixonado que escreve sobre cervejas), a Pampeana Gruit Ale é uma bela surpresa.
No aroma, notas intensas de ervas além de melaço e alguma coisa de remédios de infância (isso mesmo). Ainda é possível sentir o malte de caramelo, nozes e álcool (são 8,3% de graduação alcoólica). O paladar valoriza as ervas, que causam sensações que remetem desde própolis e melaço até nozes, coco queimado e, claro, álcool. O liquido cria uma camada de sabor no céu da boca, e a descida deixa um rastro de mel por todos os cantos. O final é longo, adocicado e surpreendente. Eis uma cerveja única.
No balcão da Lagom ela é vendida por R$ 15 cada pint (R$ 10, meio pint), e acompanha uma carta que traz entre outras 10 e 15 cervejas (dependendo da época – a Lagom já produziu mais de 40 cervejas diferentes em dois anos de existência) com destaque para a intrigante Tripel (8,8%) da casa, que junta aveia, coentro e casca de laranja (e remete a anis) e para a sensacional Imperial Stout (9,5%). Sem contar com a Tiltap Irish Red Ale, receita vencedora do concurso Acerva Gaúcha, de 2011, feita por Jesael Eckert e… Wander Wildner (sim, sim!).
As cervejas da casa são divididas em três grupos cujo preço varia de R$ 7 o pint (PIlsen), R$ 9 (Belgian Ale, Weiss, Brown Porter, Tiltap, Blond Ale, Dunkweiss e Dry Stout) e R$ 13,50 (Tripel, Imperial Stout e a Columbus American IPA). Na parte de petiscos destaque para as brusquetas (que podem ser as tradicionais – tomate, ervas e azeite – ou então de cogumelos e, ainda, uma versão com gorgonzola e alho poró), mas ainda há um Entrecot Viking (500 gramas de carne grelhada acompanhada de purê e ervilhas) e Salsicha Bock com Queijo.
A Lagom fica na Rua Bento Figueiredo, 72, no Bairro Bom Fim, há cerca de cinco minutos a pé do Parque Farroupilha, e funciona de segunda a sábado das 18h às 23h. Merece muito uma visita – com o pint de Pampeana Gruit Ale na taça. Com a Lagom (e muitas outras cervejarias abertas nos últimos dois anos na capital gaúcha), Porto Alegre se junta a Curitiba e Belo Horizonte no quesito de boas cervejas locais. Já é um destino certo para os apaixonados por boa cerveja no lado debaixo do Equador.
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