Três perguntas: Fernando Rosa
Fernando Rosa é um dos nomes de primeira hora da internet brasileira. Quando a rede começou a engatinhar no país, ele colocou no ar o Senhor F, em 1999, um site essencial que, ao mesmo tempo, lançava luz sobre a história do rock brasileiro buscando nomes dos primórdios do cenário tanto quanto distribuía via download gratuito através de seu selo virtual os novos nomes da música brasileira. Posteriormente, o Senhor F se tornaria também um selo fonográfico e uma produtora de shows e festas sob o comando apaixonado de Fernando Rosa, um cara superativo, extremamente simpático e que é, provavelmente, uma das pessoas que mais fez coisas pelo cenário independente brasileiro.
Em 2008, Fernando Rosa, Sylvie Piccolotto e Pablo Hierro organizaram o Festival El Mapa de Todos, um evento que busca quebrar as fronteiras musicais entre os países latinos, e que segue com uma excelente vitrine da boa música feita na América Latina. Em 2012, o El Mapa de Todos acontecerá nos dias 6, 7 e 8 de novembro na casa de shows Opinião, em Porto Alegre, e contará com a participação de 15 artistas: Bareto (Peru), Juan Cirerol (México), Algodón Egipcio (Venezuela), Dënver (Chile), NormA (Argentina) e El Cuarteto de Nos e Franny Glass & Banda (Uruguai). Os artistas nacionais são Nenhum de Nós, Autoramas, Apanhador Só, Esteban, Bidê ou Balde, Medialunas, The Tape Disaster e Fábrica do General Bonimores.
Para saber um pouco sobre a relação de Fernando Rosa com a música latina, envie três perguntinhas rápidas:
Quando a música sul-americana surgiu na sua vida? O que a despertou?
Olha, um conjunto de fatores. Primeiro, tem a influência da música gaúcha que, por conta do Pampa comum, é meio uruguaia e meio argentina, e que cresci ouvindo no rádio. Depois, devido a proximidade com esses dois países, quando pequeno ouvia algumas rádios argentinas, ainda mais música tradicional do que rock. Na infância também ouvi muita música sertaneja paulista, com apelo mexicano, tipo Pedro Bento & Zé da Estrada, Tonico e Tinoco e outros tantos. Mas o mais determinante foi o convívio com jovens argentinos e uruguaios foragidos das respectivas ditaduras, em meados dos anos setenta. Alguns deles foram parar em minha casa, em Canoas, na Região Metropolitana de Porto Alegre, trazendo dor, saudade e discos – de artistas jovens como eles. Naquele momento, então com pouco mais de 20 anos, já tinha sido “convertido” ao rock, depois de uma escala na Jovem Guarda e na Tropicália, mesmo sem entender do que se tratava. Vale destacar ainda a repercussão da presença dos mexicanos Santana em Woodstock, que vi em filme, e imediatamente comprei seus discos, que saíram no Brasil. Ouvíamos discos de Almendra, Spinetta, Sui Generis, La Confradia de La Flor Solar e outros grupos roqueiros da época. Isso foi muito marcante e, desde então, assim como acompanhei o desenvolvimento do rock anglo-saxão, segui ouvindo o que rolava ali do lado. Também me interessei por artistas nacionais que fizeram essa ponte com a música em espanhol, como Milton Nascimento, Secos & Molhados, Fagner (um pioneiro, com o disco “Traduzir-se”), Belchior e alguns outros. Com o tempo, especialmente a partir dos anos noventa, fui ampliando o horizonte musical para além do Uruguai, do Argentina e da Espanha ouvindo artistas de outros países. Com o surgimento da internet, fechei o ciclo de gerações do rock da maioria dos países, baixando uma infinidade de discos, muitos dos quais conhecia apenas pela lenda. Outros fatores são extra-música, como a minha origem portuguesa-galega-espanhola e uma visão político-ideológica de defesa da integração latinoamericana.
Se alguém quisesse desbravar a América do Sul independente e roqueira, quais discos você recomendaria pra começar?
Uma resposta difícil, porque em todas as décadas e gerações, e em todos os países, tem discos geniais. Mas, vai então uma lista de artistas e grupos atuais, com seus lançamentos mais recentes, sem ordem de importância (nisso tem bastante de gosto pessoal):
Algodón Egípcio – La Lucha Constante (Venezuela)
Bareto – Ves Lo Quieres Ver (Peru)
Buenos Muchachos – Se Pule La Colmena (Uruguai)
Christina Rosenvinge – La Jovem Dolores (Espanha)
Cienfue – La Calma y La Tormenta (Panamá)
Davila 666 – Tan Bajo (Porto Rico)
Dënver – Música, Gramática, Gimnasia (Chile)
El Mato a Un Policia Motorizado – El Nuevo Magnetismo (Argentina)
Fernando Milagros – San Sebastián (Chile)
Francisca Velenzuela – Buen Soldado (Chile)
Franny Glass – El Podador Primaveral (Uruguai)
Gepe – Audiovisión (Chile)
Juan Cirerol – Haciendo Leña (México)
La Vida Boheme – Nuestra (Venezuela)
Lisandro Aristimuño – Mundo Anfíbio (Argentina)
Los Mentas – Unidad Educativa Los Mentas (Venezuela)
Los Negretes – México City Blues (México)
Los Vigilantes – Los Vigilantes (Porto Rico)
Manel – 10 Milles per Veure una Bona Armadura (Espanha)
Mima – El Pozo (Porto Rico)
Monareta – Fried Speakers (Colômbia)
NormA – A (Argentina)
Odio Paris – Ódio Paris (Espanha)
Vetusta Morla – Mapas (Espanha)
Xoel López – Atlântico (Espanha)
Como foi o processo de montar o line-up do El Mapa de Todos 2012?
Assim como nos anos anteriores, o lineup é resultado do acompanhamento do que está acontecendo nas respectivas cenas musicais independentes de cada país. Uma espécie de fotografia do momento, contemplando artistas novatos, como Algodón Egípcio, em ascensão, como Juan Cirerol, ou mesmo já consagrados, como Bareto, mas oriundos da cena independente local. Ouvimos os discos, vemos os vídeos de shows no Youtube, acompanhamos outros festivais, como Vive Latino (no México), lemos resenhas de discos e shows, etc para chegar a uma escalação final de acordo com a nossa capacidade econômica, que nos impõe limitações. No campo nacional, fizemos uma opção por valorizar os artistas que têm uma sintonia com a música latinoamericana. O gaúcho Nenhum de Nós, por exemplo, tem históricas parcerias com artistas argentinos e uruguaios, enquanto os Autoramas está entre os grupos brasileiros que mais circula pela América Latina.
Acima, um documentário em três partes sobre a edição 2011 do El Mapa de Todos, dirigido e produzido por Liege Milk. O Senhor F também disponibiliza um álbum contendo o áudio do festival, com uma faixa de cada artista. Baixe aqui
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