Posts from — maio 2012
Barcelona: Torta de Uísque e Rock and Roll
Texto e fotos: Marcelo Costa
O meu amor por Barcelona se renova a cada ano. É simples assim. Existem várias outras cidades mais encantadoras e mágicas (Praga, Veneza, Santorini, Paris, Amsterdã), mas em nenhuma delas me sinto tão bem quanto em Barcelona. É a cidade que eu gostaria de morar (quem sabe um dia). Um pouco pela arquitetura (e Gaudi é responsável direto), mas hoje em dia ainda mais pelo desenho urbanístico do Ildefons Cerdà, que consegue unir beleza com praticidade. Barcelona respira, e muito.
Batemos cartão na Revolver Records, uma das lojas mais sensacionais do planeta, com um vasto catálogo de raridades (comprei pictures discs do Joy Division e das Ronnetes), bootlegs (a parte de Beatles, Stones, Neil Young e Bruce Springsteen na estante é de fazer fã chorar) e lançamentos fresquinhos tanto em vinil quanto em CD. Tentei me controlar e consegui comprar apenas o “1965” do Afghan Whigs em vinil (relançamento duplo com um segundo vinil de bônus tracks), o CD do 13Th Floor Elevators e o DVD “1991: The Year Punk Broke”.
Porém, ao lado da Revolver (na Calle Tallers, primeira rua a direita de quem desce as Ramblas saindo da Praça Catalunha) agora há uma outra loja muito bacana, a Castelló, que também recheou seu acervo de bootlegs e lançamentos raros. Coisas como uma caixa com seis vinis e três CDs das sessões do “Exile on Main Street”, dos Stones, dois volumes com 15 CDs e quatro DVDs com tudo de raridade que o U2 gravou, um vasto catálogo de Beatles e muito, mas muito mais. Quando passar por Barcelona na próxima semana (para ver Stone Roses), quero voltar lá.
A primavera chegou quente por estes lados. Na quarta-feira, final de tarde, os termômetros marcavam 30 graus, mas a sangria e o vento do Mediterrâneo refrescam a cidade. Desta vez estou no Eixample, um bairro que começou a tomar forma em 1860, quando a cidade foi autorizada a crescer além das muralhas medievais. Nunca tinha ficado nem andado aqui, e estou adorando. Parece que entramos dentro da rotina catalã com nossos vizinhos indo ao supermercado e comendo e bebendo nas dezenas de restaurantes e casas de tapas da região. Até os preços são mais baratos que os das áreas turísticas, por exemplo.
Também já batemos cartão no Kiosko, um dos melhores hambúrgueres de Barcelona, e descobrimos uma ótima casa de tapas da bacia do Rio Prata, o Criollo, que tem ótimos preços, comida honesta e uma torta de uísque viciante. Caminhamos pelo Barrio Gótico, tomamos suco na Boqueria, e conferimos a abertura oficial do Primavera Sound 2012, com alguns shows gratuitos na praça do Arco do Triunfo – sem spray de pimenta. The Wedding Present e The Walkmen abriram a festa com shows excelentes para uma plateia numerosa.
David Gedge subiu ao palco às 19h55 (cinco minutos antes do previsto) com uma versão encorpada de “My Favourite Dress” (single presente no álbum “George Best”, de 1987) e “Back A Bit… Stop” (de “Valentina”, recém-lançado). De 1987 para 2012. Logo depois, anunciou: “Agora, ‘Seamonsters’ na integra”. O álbum produzido por Steve Albini em 1991 é um dos pontos altos da carreira da banda (mas os discos mais recentes merecem sua atenção) e versões poderosas de “Suck”, “Lovenest” e “Corduroy” mostraram que a nova formação do grupo está bastante entrosada. Nos bis, “Drive” e “Kennedy”. Poesias com riffs no talo.
Intervalo de 20 minutos para ir atrás de cervejas espanholas, e Walkmen no palco. Em discos, o grupo novaiorquino caminhou de um posto sub-Strokes (nos dois primeiros e bons “Everyone Who Pretended to Like Me Is Gone”, de 2002, e “Bows + Arrows”, de 2004) para um de sub-Wilco, com o altcountry correndo forte nas veias do vocalista e guitarrista Hamilton Leithauser. O show mistura essas duas fases de forma bastante distinguível, e diverte (com direito a single novo, “Heaven”, e hits antigos como “The Rat”). Ainda tinha Black Lips na sequencia, mas optamos por descansar.
A maratona do festival começa hoje no Parc de Forum e, na minha programação do dia, quero tentar ver Linda Martini , Archers Of Loaf, Lee Ranaldo, Death Cab For Cutie, Wilco, The XX, Franz Ferdinand e Spiritualized. Ontem, a produção do evento anunciou que irá transmitir 20 shows do festival pelo Youtube, entre eles os três principais desta noite (The Afghan Whigs, Wilco e Spiritualized) mais The Cure, Mazzy Star, Rufus Wainwright, The Drums, The Rapture e outros. Confira a lista toda aqui lembrando que o Brasil está cinco horas a menos que Barcelona (Wilco, por exemplo, toca às 18h no horário de Brasilia).
maio 31, 2012 No Comments
Barcelona: Chimay e Judas na geladeira
No Brasil, uma garrafinha desta acima custa entre R$ 17 e R$ 22. No supermercado ao lado do apartamento em Barcelona, 1,99 euros (R$ 4,90). A Judas é ainda mais em conta: 1,50 euros (R$ 3,70). Geladeira cheia (ainda com jamon serrano e azeitunas para tapas)…
maio 30, 2012 No Comments
Londres: Little Venice, Camden e Big Star
texto e fotos por Marcelo Costa
Novo dia de sol em Londres. E sol forte. A boa pedida do dia: um passeio de barco de cerca de 50 minutos pelo Regent’s Canal, que liga o Maida Vale a Camden Town. Sua construção foi iniciada em 1812, e o canal ainda mantém todo o charme em um trajeto nostálgico e bonito que passa na porta do Zoológico de Londres e segue até Camden Lock, coração de Camden Town numa paisagem que no início é povoada por barcos casa e, depois, por pequenos prédios de dois andares com ancoradouros no quintal.
O ponto inicial do passeio é em Little Venice, junção da Maida Avenue com o Warwick Crescent e Blomfield Road, em um pequeno lago. O metrô mais perto é o Warwick Avenue?, da Bakerloo Line e o passeio custa 7 pounds (10,50m ida e volta), e vale bem a pena. Quero fazer esse passeio de novo, mas desta vez não de barco, mas sim caminhando ao lado do canal, numa passarela que o acompanha até seu final em Camden Lock (várias pessoas fazem o trajeto a pé ou mesmo de bicicleta).
Descemos em uma Camden Lock muvucada de domingo debaixo de um sol de queimar brasileiro que acha que pode tudo. Uma passadinha rápida em uma loja de CDs (com alguns piratas sensacionais) e depois uma esticada ao pub The Lock Tavern (esse aqui), para provar a boa ale Pure Ubu e um dos pratos tradicionais de domingo para a família inglesa: frango, batata e mais algumas coisas que você pode ver na foto abaixo. Depois disso, mais uma passada em uma loja de CDs e vinis, a excelente Music and Video Exchange.
A MVE tem diversas filiais pelo Reino Unido (só em Londres devem ser umas 10 lojas) e trabalha com material usado, ou promocional, que eles colocam em suas prateleiras com preço muito mais em conta que o das megas HMV e Fopp. Claro, tem coisas caras como a primeira edição do primeiro disco dos Rolling Stones, que estava saindo pela bagatela de 350 libras (cerca de R$ 1.100), ou a primeira tiragem de “Dark Side of The Moon”, do Pink Floyd, que estava um pouco mais em conta: 265 pounds (R$ 830 em um vinil).
Mas se você quiser pechincha, tem para todos os gostos. Por exemplo, uma promoção que pode ser encontrada não só na MVE, mas em várias outras lojas de usados: eles embalam um certa quantidade de CDs e/ou vinis e colocando um preço no lote (e você tem que comprar sem saber o que há dentro). Algo como 60 vinis = 2 pounds / ou 120 CDs por 10 pounds (lembre-se: caixa fechada por sua conta e risco). Não arrisquei, muito porque isso tudo pesa e tenho mais sei lá quantos dias de viagem pela frente. E segundo porque iria ser um tempão olhando tudo e pensando no que fazer com aqueles que não passaram no crivo pessoal.
Depois até passei na HMV, e pela primeira vez deixei a loja sem um único item que fosse. Já na Fopp de Covent Garden não teve como escapar: dois vinis (Ben Kweller e M Ward, ambos por 16 pounds e com o CD de bônus acompanhando o disco) mais alguns CDs (13th Floor Elevators, Regina Spektor e um antigo do Black Keys). A noite, fechando um dia corrido, show do Big Star (sem Alex Chilton, óbvio, mas com vários convidados ilustres) no Barbican Center (local em que o Mutates gravou seu disco ao vivo de retorno).
O show foi bonito, mas excessivamente reverencial, como se ninguém no palco ousasse encarar a alma de Alex Chilton. Dos convidados, bons momentos com Norman Blake, Mike Mills, Alexis Taylor, Jon Auer e Ira Kaplan (Brendan Benson deu cano), mas quem sacudiu mesmo o teatro foi Ray Davies, que surgiu para cantar a sua “Till The End Of The Day”, que Alex Chilton e compania gravaram nas sessões do terceiro disco, “Third / Sisters Lovers” (já falamos do álbum aqui).
Tudo lindo, tudo bonito, até a hora de pegar o metrô e descobrir que a sacola com os CDs e um acessório da Apple Store para um amigo ficou em alguma das baldeações. Já escrevi para o “Achados e Perdidos” do metrô, mas acho difícil aparecer. No entanto, escrevi e eles respondem em 21 dias (segundo o email que me enviaram). Esquecimento: coisas de muita cerveja misturada a noites mal dormidas e cansaço de viagem. E olha que estou no começo da minha tour…
Eu até queria escrever mais! Detalhar o passeio de barco, que é bem legal, falar mais do show truqueiro mas com coração do Big Star, do bar Canela, que fica em Covent Garden e oferece comida brasileira (coxinha, feijoada, pastel de nata) e falar do maravilhoso Beef Carbonnade que comi no meu pub preferido de Londres, o Belgo (olha a descrição: “48 hour slow cooked beef, marinated in sweet Gueuze beer with Bramley apples and plums. Served with a choice of Stoemp mash or frites” -> mais aqui). Mas o cansaço bateu. Bora dormir…
Melhor não brincar: nessa quarta começa o Primavera Sound em Barcelona… bora descansar =)
maio 29, 2012 No Comments
Bruxelas: Judas e o esgoto engarrafado
Texto e fotos: Renato Moikano (@renato_moikano)
Penetra na festa! Começa aqui o Scream & Yell Europe 2012 Tour – Metal Edition… Enquanto Marcelo Costa inicia sua saga pela Inglaterra, antes de cair em Barcelona para o Primavera Sound, eu faço uma viagem mais mainstream pelo mundo das arenas de metal da Europa central e Escandinavia. Em seguida passo uns dias com o Mac por Paris (tem Guns, tem Marilyn Manson, o que será que vai rolar?), por Luxemburgo (tem Lou Reed tocando coisas do “metallico” Lulu), por Cork (tem Tom Petty, e aqui não tem nada de metal) e finalmente por Donnington acompanhando os dois últimos dias do Download Festival – que esse ano tem Black Sabbath.
A aventura começa de fato nesta segunda-feira, em Werchter, na Bélgica (sim, a mesma cidade do Rock Werchter). É lá que o Metallica recebe Soundgarden, Mastodon, Channel Zero, Gojira e Ghost no Werchter Boutique. Metaleiros de butique, uni-vos que o James Hetfield e compania irão apresentar na íntegra seu “Black Album”. A bolacha de 1991 será executada de cabo a rabo para celebrar os 20 anos da produção que tirou o Metallica da lista de Grandes Bandas do Metal e colocou-o entre as Maiores Bandas da História. Ponto.
Dia 29, na Noruega tem Ozzy & Friends. Era pra ser um show do Sabbath, mas a doença de Tony Iommi mudou os planos. Mesmo assim tem o devorador de morcegos tocando com Slash e tem também Black Label Society do Zakk Wylde (e eu dormindo em um barco! É sério. Era a hospedagem mais em conta da cidade de Bergen, que, segundo algumas estatísticas, é a cidade em que mais chove no mundo: são 300 dias de São Pedro lavando o banheiro em 365 do ano). A viagem continua passando pelo Primavera Sound de Barcelona, onde o Napalm Death irá combater um trecho do show do The Cure… E por aí vai.
Desembarquei no sábado em Amsterdã com a missão de descolar um jeito de chegar em Bruxelas. A pressa era ansiedade pra conseguir comprar um passe de trem especial para o show do Metallica em Werchter. O bilhete dá direito ao trem de ida até Leuven, busão fretado ida e volta até Werchter, e trem de retorno pra Bruxelas. Apesar da venda de ingressos para o show acontecer tranquilamente pela internet (comprei o meu ainda em dezembro), esse passe só era vendido nas estações.
Cheguei em Amsterdã na estação Central de Bruxelas (ou “Bruxelles-Central / Brussel-Centraal” -> eles tem duas línguas). Pergunta aqui, pergunta ali e nunca ninguém ouviu falar no tal bilhete especial do Werchter Boutique. Resolvi ir para o hotel. Sem malas e de banho tomado conseguiria insistir na busca pelo passe especial. Estou no Siru Hotel, um estabelecimento modernete no norte da capital belga. A duas quadras da Estação Norte.
A estação é imensa, maior que a central, lotada de imigrantes ilegais acampados nos seus corredores. Ainda assim, deserta em um sábado à tarde. No balcão consigo finalmente a informação de que sabem do que se trata meu pedido. O diálogo é truncado. Meu francês é nulo, e o inglês do atendente também. Mesmo assim, é atencioso ao extremo e sai de seu posto para me encontrar na fila e tentar entender melhor o que eu estou pendindo.
Quando retorna ao seu posto começa uma sequencia assustadora de caretas enquanto observa o monitor de seu terminal. Faz que sim, faz que não, franze a testa, sorri, fecha o semblante, respira fundo e me responde: “The train is full”. Existem quatro tipos de passes para esse festival. Apenas um deles garante o retorno a Bruxelas. Os outros passam longe daqui. Resolvo comprar um que vai para Oostende, no norte do país. Mais tarde penso em como voltar para Bruxelas.
Ao explorar a cidade sou surpreendido por um festival de Jazz. Uma espécie de virada cultural sem sustos, com palcos espalhados por cada praça do centro de Bruxelas. E quartetos, sextetos, big bands, e até rappers se apresentando. Já são quase 21h e Bruxellas insiste em ter dia claro, e sol forte. Hora de parar para um cerveja e comer alguma coisa. Escolho o À la Mort Subite, um bar do início do século passado que já recebeu em suas mesas rodas de intelectuais belgas…
O que me atraiu foi a carta de cervejas e o fato de, em alta temporada, não ter quase nenhum turista por ali. Na carta oferecida pela casa, muitas cervejas da Alken-Maes. Entre elas uma Brown Ale chamada Judas. O nome me atraiu e pedi uma grande, 900 ml. Tal qual seu homônimo bíblio, esse tal Judas belga também vai te trair… horas depois. Para acompanhar peço uma tábua de queijos e passo mais de uma hora observando o movimento do bar que recebe em sua maioria belgas.
Com quase dois litros de cerveja em mim (fora duas Chimay que tomei durante a tarde) resolvo dar mais uma volta pelo centro. Passam das 22h mas a noite ainda não caiu por completo. A Grand Place, um dos principais pontos turísticos da cidade, já está iluminada e segue abarrotada de gente que acompanha um show de rap no tal festival de jazz. Barraquinhas no entorno vendem cervejas, cones de batata frita e waffle entupidos de coberturas doces.
No caminho para o hotel, macaco velho que sou, compro alguns doces, água, e mais umas garrafinhas de Coca-Cola e chá Lipton para abastecer o frigobar do quarto. Penso em escrever este primeiro texto para o Mac na chegada, mas sou vencido pelo cansaço e apago na cama. Às 4h da manhã sou acordado. Judas voltou como uma fortíssima dor de cabeça e uma ressaca tão hedionda que chega a acordar um defunto. Sede, o quarto parece um deserto. No frigobar resolvo devorar a garrafa de chá. Giro a tampa e ouço barulho de pressão saindo. Isso não é bom. No primeiro gole quase cuspo. É refrigerante de chá preto! Algo como esgoto engarrafado… A viagem só está começando.
maio 28, 2012 No Comments
Londres: I’ll Be Your Mirror, Dia 3
Texto e fotos por Marcelo Costa
A previsão do tempo não errou para o domingo e um sol castigador fez a turistada disputar as sombras de Londres enquanto as garotas locais encurtavam os shorts e os homens retiravam a bermuda do guarda-roupa. No Alexandra Palace, enquanto dezenas de famílias aproveitavam o dia de sol no parque, o canto do cisne da edição 2012 do I’ll Be Your Mirror tinha hora para começar (12h, com o início da exibição de “American Movie” no ATP Cinema) e acabar (00h quando terminaria a exibição de “King of Kong”). Entre os filmes, uma dezena de shows.
A programação pessoal começou com o belo show do Arches of Loaf, combo indie norte-americano com alguns dedos do pé no grunge. Formado em 1991 e desmontado em 1998, o Arches retomou o barulho no ano passado, e este show no festival mostra que o grupo está bastante afiado abusando do contraste da delicadeza do vocalista e guitarrista Eric Bachmann com a postura “tenho os cabelos do Anthony Kiedis e agito como o Flea” do hilário baixista Matt Gentling. Um belo show para rever com mais calma.
Quase no mesmo horário, os canadenses do Siskiyou entretiam uma pequena audiência em uma sala com um show promissor, que merece atenção. Quinze minutos depois, Yuck no palco, e aquele som que você já ouviu diversas vezes em dezenas de outros discos corta o ar com uma nuvem de microfonia, e diverte. O show é bom (valorizado pelo ambiente do palácio do povo), e ganha alguns créditos pela excelente transposição de arte com filmagem da banda ao vivo no fundo do palco. Nada como ouvir canções frescas e envolventes como “The Wall”, “Suicide Policeman” e “Get Away” num volume alto e de qualidade.
Pausa para descansar as pernas, comer pizza e beber uma ale aguada, mas ok, e lá se foi o show do Tennis, grupo de Denver comandado pela belezinha Alaina Moore. Ok, rolou pegar o trecho final da penúltima música e a última, e o show vende bem a banda (algo entre Keane, Killers, Coldplay e Cardigans). Também havia perdido o filme “Stalking Pete Doherty”, mas o que importava de verdade era que, em alguns minutos, uma das melhores bandas dos mundo voltaria aos palcos: The Afghan Whigs.
O público (um pouco menor que o de sábado) de cerca de 2 mil pessoas compensou os buracos na plateia cantando tudo que Greg Dulli rasgava no microfone – e sua voz, personalíssima, impressiona pelo alto nível de qualidade que se mantém do início ao fim do show. O trio de fource original do grupo – Greg Dulli (vocais e guitarras), Rick McCollum (guitarra base) e John Curley (baixo) – surgiu acompanhado de um terceiro guitarrista, um excelente baterista mão pesada e um terceiro músico que se alternava entre teclados e violoncelo.
A gangue de preto entrou pontualmente às 21h30 com a introdução de “Crime Scene Part One”, do álbum “Black Love” (1996) antecipando o sonho. Na sequencia, “I’m Her Slave” (“Congregation”, 1992), “Uptown Again” (do grande “1965”, 1998) e “What Jail is Like” (“Gentlemen”, 1993) bastaram para conquistar a audiência, que gritava as letras com um sorriso enorme no rosto. Da metade para o final, o céu caiu na Terra com “Crazy”, “My Enemy”, “66”, “Debonair”, “Bulletproof” e uma versão poderosa de “Summer’s Kiss”. Para o bis, a nova cover de “See and Don’t See”, uma versão de “Lovecrimes”, de Frank Ocean, “Fountain and Fairfax” e a intensa “Miles Iz Ded” confirmaram: o Afghan Whigs voltou com sede de palco. Que show. Que voz.
No balanço geral, o I’ll Be Your Mirror 2012 mostrou um bom número de grandes shows em um espaço confortável, sem empurra-empurra nem muvuca. Ainda assim, é um festival caro demais, em que o espectador paga pelo conforto, mas paga muito (ainda mais em se tratando de Reino Unido, com a libra dobrando o dólar e colocando no bolso). O preço do ticket de três dias saiu praticamente o mesmo de mega festivais como Rock Werchter, na Bélgica, e Primavera Sound, em Barcelona, mas o I’ll Be Your Mirror não vende quantidade, mas qualidade. E barulho. Muito.
maio 28, 2012 No Comments
Londres: I’ll Be Your Mirror, Dia 2
Texto e fotos: Marcelo Costa
Na base do chutometro, o primeiro dia do I’ll Be Your Mirror 2012, com Slayer de headliner e ingressos a 35 libras, parece ter levado umas seis mil pessoas para o Alexandra Palace. No segundo dia, com ingressos a 65 libras e curadoria especial do Mogwai, cerca de 2 mil pessoas acompanharam os shows, tanto que a área maior, onde ocorreu o show do Slayer na sexta-feira, ficou fechada enquanto as bandas tocavam no segundo palco (e os nomes “menores” tocavam em um terceiro local, bem parecido com uma pequena sala).
A programação, mais extensa no fim de semana, começava ao meio-dia e meio, mas decidi chegar só às 16h para acompanhar o show do Chavez, banda nova-iorquina das mais preguiçosas (em quase 20 anos de existência, só lançou dois álbuns, o segundo deles, “Ride the Fader”, editado no Brasil no começo dos anos 2000 pela Trama), mas que faz um post rock com acentos indies de altíssima qualidade. O show, inclusive, foi mais indie que post, com uma bela parede de guitarras aclimatando a voz de Matt Sweeney. “Top Pocket Man” arrancou sorrisos e aplausos.
O Codeine veio na sequencia para seu primeiro show em 18 anos (o pontapé da turnê de retorno foi no I’ll Be Your Mirror) e com o público nas mãos (o baixista Stephen Immerwahr repetiu ao menos cinco vezes durante a tarde a frase “Vocês são muito bondosos”) honrou o convite dos escoceses. “D”, faixa que abre o primeiro álbum do grupo, lançado pela Sub Pop em 1991, foi a escolhida para dar início ao show, que caminhou delicadamente (mesmo nos momentos de inferno sonoro) na fronteira entre a melancolia e a loucura. Um show intenso e idílico… perfeito para o fim do mundo.
Não lembro quantas vezes já tive o prazer de ver o Mudhoney (acho que seis ou sete), mas sem dúvida esta vai para o topo, mérito do som impecável do festival, que valorizou a porradaria do grupo. Um Mark Arm ensandecido e com trejeitos de Iggy Pop jogou lenha na fogueira logo no início – com “Judgement, Rage, Retribution and Thyme” (de “My Brother The Cow”, de 1995), e dois hinos dos primórdios: “Sweet Young Thing Ain’t Sweet No More” e “Touch Me I’m Sick” –, mas também abriu espaço para as novíssimas e inéditas “Chardonnay” e “Widow Of Nain”. Showzão.
Surge então o louco de pedra Warren Ellis com seu Dirty Three (figurinha carimbada em dezenas de festivais deste ano) mais violino, vinho, canções novas (do recém-lançado “Toward the Low Sun”) e uma iluminação impecável. O som do trio (formado em 1992 e do qual ainda fazem parte o multi-instrumentista Mick Turner e o baterista Jim White) parece uma junção de Gogol Bordello (o lance do violino), Devendra (o lado hippie) e Explosions In The Sky (as viagens instrumentais), e funciona muito ao vivo. Sem contar que Warrren é uma peça: “Essa música é contra o capitalismo, contra governos, contra toda babaquice do mundo… e… que música vamos tocar mesmo?”. :~
Estrelas da noite (e após dois shows absurdos de bons no Brasil neste mesmo maio), o Mogwai fez sua típica apresentação para ninar dragões. O set list trouxe a maioria dos números que também bateram ponto nos shows brasileiros (“Rano Pano”, “I’m Jim Morrison, I’m Dead”, “Mexican Grand Prix”, entre outras), mas algumas surpresas surgiram, como “Sine Wave” (do álbum “Rock Action”, 2001), o ótimo b-side “Ithica 27ø9” (1996) e “Auto Rock” (do “Mr Beast”, de 2006). O final com “Mogwai Fear Satan”, “Batcat”, o som poderoso do ATP e a iluminação esplendorosa foi algo simplesmente perfeito.
Segundo a previsão do tempo, o sol deve surgir ainda mais forte neste domingo. Segundo a previsão dos deuses bastardos do rock and roll, a volta do Afghan Whigs deverá ser um dos grandes momentos do ano. Ainda tem Arches of Loaf, Yuck, passeio pelo Regent’s Canal e, quem sabe, uma pernada por Camden Town (embora no domingo isso não seja lá tão recomendável). Partiu I’ll Be Your Mirror, Dia 3… mas antes melhor dormir…
maio 27, 2012 No Comments
Londres: I’ll Be Your Mirror, Dia 1
Fotos por Marcelo Costa
O Palácio de Alexandra é uma edificação icônica datada de 1873 (contrapartida do norte ao também icônico Palácio de Cristal, no sul de Londres), construída para ser um centro público de educação, recreação e entretenimento, que foi usado pela BBC durante muitos anos (a torre da empresa ainda funciona no prédio), tem uma bela vista da cidade e atualmente recebe diversos eventos culturais, entre eles o I’ll Be Your Mirror, festival criado pelo pessoal do All Tomorrow’s Parties para louvar o barulho.
O Elson já tinha dado a dica em sua cobertura da versão EUA do ATP: “o festival de música mais barulhento do planeta” (leia aqui). Em Londres, 2011, o festival soou mais comportado (o que não quer dizer menos clássico) com Portishead de curador convidando PJ Harvey para uma noite e Grinderman para a outra (entre diversas atrações extras), mas 2012 promete deixar todo mundo com os tímpanos zunindo devido a uma escalação ensurdecedora dividida em três dias.
É sexta-feira, amor, e o sol recebe uma horda de camisas pretas mal-encaradas que caminha pelo bonito Alexandra Park, cuja primeira noite terá o Slayer de headliner tocando a integra do álbum “Reign in Blood”, de 1986, um dos primeiros e mais violentos crossovers de metal e punk da história. Cenário idílico: de um lado do parque, rapazes de camisa com gola rolê jogam golfe. Do outro, metaleiros de todos os cantos da Europa bebem cerveja como se fosse água.
Dividido em dois palcos, o esporro começa (ao menos para mim) no palco menor com o YOB, trio norte-americano de doom metal que faz uma barulheira dos diabos, mas não convence. No palco principal, os dois bateristas do Melvins causam o primeiro corre-corre do fim de semana, a maioria da galera pra frente do palco, uns 10% atrás de protetores de ouvidos. Buzz Osborne maneja sua guitarra como se ela fosse uma máquina de eletrochoque e uma nuvem densa de aspereza corta o ar.
Entorpecido após uma hora de barulho e levemente cansado da maratona de três dias de shows seguidos (só faltam mais uns 15 dias de shows), opto por “descansar” no ATP Cinema assistindo a “Se7en”, o grande filme de David Fincher, mas sou obrigado a deixar a sala 15 minutos antes do final para pegar um bom lugar para assistir ao grande show da noite (nem no meio e nem no gargarejo, locais garantidos de pancadaria e pogo): Slayer.
Duas músicas “novas” abrem o cortejo (“World Painted Blood” e “Psychopathy Red”, de 2009), mas é com “Die by the Sword” que as primeiras cervejas são arremessadas para o alto e a pancadaria começa. “Chemical Warfare” e “Dead Skin Mask” (a segunda do poderoso “Seasons in the Abyss”, de 1988) mantém o clima de desordem, mas basta o riff clássico de “Angel of Death” ecoar no Palácio para a galera urrar a chegada de “Reign in Blood”, tocado na integra e sem pausa para limpar o sangue da testa.
A coesão da banda ao vivo continua impressionante. A condução de Dave Lombardo é algo do outro mundo e, em vários momentos, Kerry King e sua guitarra parecem ser um objeto só. Tom Araya continua sendo um grande mestre de cerimonias (acho que “mensageiro de más noticias” soaria melhor) e Gary Holt, do Exodus, continua segurando a bronca enquanto Jeff Hanneman se recupera. Um massacre digno de uma das bandas mais violentas do planeta, que terminou, no bis, com “War Ensemble”, outra do “Seasons in the Abyss”.
O I’ll Be Your Mirror segue neste sábado com uma seleção de bandas escolhidas a dedo pelo pessoal do Mogwai. Meu plano pessoal é ir de chinelo, levar o sensacional livro novo da Jennifer Egan na mochila, me ajeitar em um canto do West Hall e ficar ali entre 16h e 23h, horário em que passarão pelo palco principal, em sequencia, Chavez, Codeine, Mudhoney, Dirty Three e Mogwai, encarregado de fechar a noite. Bom barulho para todos nós.
maio 26, 2012 No Comments
Londres: Greenwich e Borough Market
Textos e fotos: Marcelo Costa
Minha ideia pessoal nesta passagem por Londres era explorar um pouco mais a cidade e fazer alguns passeios que eu havia deixado de fazer nas passagens anteriores. Problema 1: comprei tickets para shows em todas as seis noites que estarei na cidade (o que já elimina fugidas noturnas). Problema 2: o tempo corre bem mais rápido em uma viagem dessas, em que coisas vão surgindo no roteiro, e quando você vê resta pouco tempo para os passeios programados.
Dentre os passeios que eu mais queria fazer, uma ida a Brighton, que tínhamos agendado para este sábado de sol, foi deixada de lado. Mas ainda assim conseguimos ir de barco pelo Tamisa do centro de Londres até Greenwich, almoçar um fish and chips por lá, dar uma olhadela rápida no observatório (7 libras pra entrar, fica pruma outra) e na linha meridional, beber uma cerveja e voltar de trem. Rápido, mas legal. Amanhã queremos navegar no Regent’s Canal.
No meio da correria da sexta-feira consegui passar em uma das minhas lojas preferidas da cidade, a Fopp de Covent Garden, e sai de lá com 14 CDs (por 68 libras), mas ainda quero voltar e fuçar com mais calma. Também comprei uma cincoentinha para a Canon Rebel XTI que eu trouxe, e até apanhei um pouco dela no primeiro dia I’ll Be Your Mirror, mas preciso aprender a brincar com a criança (quem mandou matar as aulas de fotografia na faculdade)…
Ainda na sexta, na compania de Tiago Trigo e Juliana Zambelo, batemos ponto no Borough Market, um mercado de varejo com dezenas de barraquinhas bem interessantes, com comidas do tipo sanduiche de carne de pato e/ou coelho, bratwursts alemãs, fish and chips londrino, queijos, doces, cervejas, frutas, bolos, e tudo o mais que o bom paladar quiser provar (e que o estômago aguentar).
Algumas fontes dizem que o mercado existe desde 1041, tendo sido criado logo ao lado do atual (do ladinho do metrô London Bridge), cujo primeiro desenho data de 1851 (com alguns acréscimos em 1860), e que virou febre da turistada nos últimos anos (para desespero dos londrinos – se é que existem londrinos em Londres). Arrisquei um fish and chips (dos três peixes disponíveis – Cod, Haddock e Plaice – escolhi o último, mais incomum) e aprovei.
Praticamente colado em uma das várias saídas do Borough Market está o excelente pub The Rakes, com um catálogo caprichado de cervejas belgas. Os preços estão em torno de 3 libras a 5 libras o pint para beber no balcão, mas quis arriscar uma Molen Amarillo (9 libras o pint), uma double IPA holandesa de 9,2% de graduação alcoolica, aroma frutado carregado e paladar levíssimo, que esconde muito bem a cacetada de álcool que carrega. Me apaixonei. Procurarei por ela Amsterdã…
Segundo consta, cheguei exatamente em Londres no dia em que o outono mais frio dos últimos 300 anos foi embora. A cidade está mais alegre e os parques lotados, com muita gente aproveitando para namorar o sol nessa sua curta passagem anual pelo território (são só dois meses e mais alguns dias, tem que aproveitar). É hora de colocar bermuda e chinelo e partir pra rua. Ou para um palácio (me espera, ATP)…
maio 26, 2012 No Comments
Londres: Noite clássica com Elvis Costello
Fotos por Marcelo Costa
O Royal Albert Hall é a sala de concertos mais luxuosa de Londres. Localizada em uma das laterais do Hyde Park, a casa foi inaugurada pela Rainha Victoria em 1871, e se tornou um dos edifícios mais charmosos do Reino Unido. Uma agenda com cerca de 350 apresentações superlota o calendário anual da casa (com música clássica, rock e pop, ballet e ópera, esportes, cerimônias de premiação, eventos escolares e da comunidade, apresentações de caridade e banquetes) e em dois dias deste maio maluco (o mais frio dos últimos 300 anos, mas que hoje deve ter chego aos 30 graus) está recebendo Elvis Costello.
É a segunda noite da turnê The Spectacular Spinning Songbook no Albert Hall (e o show número 62, cujo roteiro inclui mais oito apresentações fechando em Amsterdã, 05/06), e uma espécie de casino foi montado no palco: uma imensa roleta com diversos nomes de canções, artistas e temas é girada por alguém da plateia (quase sempre, uma mulher) e o resultado define o set list. Há desde nome de canções como “Alison” e “I Want You”, temas como Cash (em que ele toca canções de Johnny Cash), Joker (a pessoa escolhe qualquer música da roda) e Roses (com três canções com a palavra “rosa” no título).
Além da roda da sorte, o palco traz outras coisas inusitadas como um local para as mulheres dançarem (e sensualizarem – quem “abre” a noite é a dançarina da turnê, uma bela cover de Rihanna) e uma espécie de bar (com coquetéis azuis – a sorteada na plateia pode provar o drink). Costello entra no palco cerca de 10 minutos após as 21h e começa o show furioso com três versões aceleradas de canções do álbum “This Year’s Model”, de 1978 (“You Belong To Me”, “Lipstick Vogue” e “Radio Radio”) mais uma do debute, “My Aim Is True”, de 1977 (“Mystery Dance”). São só os primeiros 10 minutos…
Após a abertura bombástica, o cantor assume a persona de mestre de cerimonias, com chapéu e batuta, explica o conceito do show (“Essa será uma noite com canções de amor, dor, sexo e morte, não necessariamente nessa ordem”) e recebe a primeira “convidada” da plateia: ela se chama Barbie, deve ter uma 25 anos e sua pele extremamente branca contrasta com o cabelo e botas pretas, e pede para a plateia louvar o Chelsea (“Desculpa, mas eu sou Manchester”, provoca Costello). Ela gira a roleta e… o primeiro Jackpot da noite surge.
Quando a roleta para nessa casa, a pessoa (ou o próprio Elvis) escolhe um tema e a banda executa um trio de canções (entre as possíveis escolhas estão “Time”, com canções com a palavra “Time” no título; “Aim”, com canções do álbum “My Aim is True”; “Imperial Chocolate”, com canções dos álbuns “Imperial Bedroom” e “Blood & Chocolate”, entre muitos outros temas). Nesta noite, Barbie escolhe o Jackpot “Girl”, e Elvis Costello apresenta “This Year’s Girl”, “Spooky Girlfriend” e “Party Girl” na sequencia.
Lucy, outra moça escolhida do público, entra na sequencia e também sorteia um Jackpot. Desta vez, os Imposters tocam quatro músicas do álbum “Get Happy!!!”, de 1980 (“I Can’t Stand Up For Falling Down”, “High Fidelity”, “5ive Gears In Reverse” e “King Horse”). Então Costello chama duas irmãs aparentemente quarentonas para o palco, que conseguem aquilo que provavelmente 90% das 8 mil pessoas presentes no Albert Hall queria: “Alison”, clássico do álbum “My Aim Is True”, surge em uma versão pungente e emocional para alegria da audiência.
Os Imposters, versão atualizada dos Attractions, que como única mudança traz o excelente baixista Davey Faragher no lugar de Bruce Thomas (o baterista Pete Thomas e o tecladista Steve Nieve estão com Costello desde a turnê do primeiro álbum de 1977, com algumas idas e vindas) é uma das bandas mais coesas e vigorosas do mundo. O instrumental é impecável e marcante, e o trio está sempre à mercê de Costello: dependendo da situação da roleta, ele para Davey, olha para Pete, e começa a canção. A banda o segue e a massa sonora impressiona com detalhes de baixo, teclado e bateria sendo ouvidos com perfeição.
O quarto giro na roleta traz outro Jackpot, e o tema desta vez é “Time”, que traz um bloco com as canções “Strict Time”, “Man Out Of Time” e uma versão poderosa de “Out Of Time” (cover dos Stones). Outro giro na roleta traz o quarto Jackpot da noite (e só tem uma casa com a palavra na roda!), o que faz Costello brincar: “Sério? Logo não teremos mais o que tocar”. Ele abre com “The Stations Of The Cross” (com citação de “Get Ready”, dos Temptatios), segue com “Poisoned Rose”, de Nick Lowe, com o próprio no palco, e fecha o bloco com uma versão fodaça de “Watching The Detectives” (com citação de “Help Me”, de Joni Mitchell).
A noite, então, reserva outro momento inusitado: o Hammer of Gods, em que uma pessoa tem que marretar uma base e conseguir tocar um sino. Prêmio: escolher a canção que quiser. A sexta dama da noite consegue o feito na terceira marretada, mas se enrola na hora da escolha. “Quer uma ajuda do público?”, pergunta Costello (a saber: eu teria escolhido “I Want You”, “Veronica” e “So Like Candy”). Ela murmura algo e Elvis emenda o trecho mais poderoso da noite, com “Favourite Hour” (trazendo Steve Nieve no órgão centenário do Royal Albert Hall), “Deep Dark Truthful Mirror” e fechando o show com uma versão de chorar de “Shipbuilding”.
O primeiro bis junta canções de via clássica (“A Slow Drag With Josephine”, “Jimmie Standing In The Rain”) e acústica (“Tramp The Dirt Down”, “National Ransom No.9”), e Elvis deixa o palco após uma versão poderosa de “Oliver’s Army”. O segundo bis abre com “Beyond Belief”, e ainda traz “Purple Rain” (Prince) em versão suingada, “Clubland”, “Pump It Up” (com citação de “Day Tripper”) e Nick Lowe, que acompanha os Imposters em “Heart Of The City” e em “(What’s So Funny ‘Bout) Peace, Love, and Understanding” (canção sua, um dos maiores sucessos da carreira de Costello).
No total são 2h45 minutos de show em que além de cantar e entreter a audiência, Elvis Costello sacaneou as Olimpíadas (“Minha homenagem aos Jogos: Eis a pira olímpica”, diz levantando sua batuta, para bradar na sequencia: “Foda-se os Jogos Olímpicos”), o Jubileu da Rainha e os políticos, mostrou um extenso domínio de repertório em um show de 32 canções (a noite anterior trouxe “apenas” 29, mas com inclusões honrosas de “Folsom Prison Blues” e “Cry, Cry Cry”, de Johnny Cash, e “Trouble”, de Elvis Presley) e que é acompanhado por uma das melhores bandas do planeta.
Esse é um daqueles shows em que só a canção bastaria (o repertório vasto do artista e a seleção cuidadosa de covers garante), mas Elvis criou um circo interessante cuja promessa é soar diferente em cada noite. E clássico. E inesquecível. Um show perfeito em suas imperfeições (a voz de Costello falha bastante na parte final, o que não o impede de força-la ao máximo), que se renova todas as noites de forma surpreendente, e merece ser visto de novo, de novo e de novo. Definitivamente, um dos grandes shows da temporada 2011/2012. Mesmo que “I Want You” tenha ficado de fora nesta noite…
Veja também:
– Três vídeos: Elvis Costello no Royal Albert Hall (aqui)
maio 25, 2012 No Comments
Londres: Jubilee Line x The Zombies
Textos e fotos: Marcelo Costa
Londres não quis deixar São Paulo solitária em dia de greve de metroviários: problemas na Jubilee Line fecharam a linha cinza desde às 16h, e o caos se fez. O bordão aqui (devido aos problemas recorrentes do metrô) é: #querovernaolimpiada (e é sério! Risos). Esse atraso fez com que quase eu perdesse o show do The Zombies, mas no fim das contas deu tudo certo. Do começo então.
Voo Amsterdã / Londres sossegado, e passagem pela temida imigração do Reino Unido mais #sussa ainda: “É a primeira vez que você vem para cá?”, pergunta a moça e antes que eu responda “Quarta ou quinta, não me lembro”, ela vê os carimbos no passaporte e começa a “brincar” (“Luton, 2008, Heathrow, 2011, Glasgow, 2009…”) e me libera na sequencia dizendo “welcome”. Como a Jubilee Line estava um caos, me senti realmente em casa (viu #kassab).
Depois de bater cabeça em várias combinações para chegar ao B&B, desisti e, pela primeira vez, peguei um taxi em Londres – a melhor coisa que eu poderia ter feito após quase um dia viajando (São Paulo -> Rio de Janeiro -> Amsterdã -> Londres). Saiu por 16 libras (uns R$ 45), o que em comparação é caro demais (afinal, se o metrô tivesse ok eu não estaria pagando nada), mas me deixou na porta do B&B, pronto para deixar as malas e correr para o show.
Banho de perfume tomado, cheguei ao Jazz Café para encontrar uma comitiva de brasileiros, entornar três pint de Guiness que desceram parecendo água (bastante potável) e ver um show beeeem bonito do Zombies. A sensação é a de um show perfeito para terceira idade, se nossos pais e avós tivessem bom gosto (e/ou tivessem sido drogados). É tudo correto, de extremo bom gosto, uma execução perfeita, uma sonoridade que muitas vezes é tão doce quanto um sonho de creme.
A qualidade da voz de Colin Blunstone (do alto de seus 66 anos) impressiona e quando o tecladista e chefão Rod Argent assume o primeiro vocal, faz muito bonito (mas seu show particular é mesmo no orgão Hammond). Alguns momentos são de fazer fãs do Beach Boys (e Brian Wilson) chorarem como criancinha, principalmente as pérolas do clássico “Odessey and Oracle” (1968): “Care of Cell 44”, “This Will Be Our Year”, “I Want Her, She Wants Me”, “Beechwood Park” e, a mais celebrada da primeira parte do show, “Time of the Season”.
A primeira parte do show traz 15 músicas, muitas delas novas (eles lançaram um álbum de inéditas em 2011, “Breathe Out, Breathe In”), e os tiozinhos (no caso do baixista Jim Rodford, que tocou uns 20 anos com o Kinks, vovô) não desapontam. O instrumental é impecável e a acústica do Jazz Café valoriza cada detalhe da canção. Em alguns momentos basta fechar os olhos para se sentir no final dos anos 60. Queria eu estar mais inteiro para apreciar ainda mais a apresentação.
Então eles anunciam uma pausa de 20 minutos, e prometem um segundo set caprichado. O corpo detonado após mais de 24 horas de voos e entorpecido por três pints de Guiness pede cama, e não resisto. Antes de deixar o Jazz Café vou dar uma bisbilhotada no set list da segunda parte: mais 10 canções e várias coisas bacanas (como “God Gave Rock And Roll To You”, da carreira solo do Argent, que ganhou cover do Kiss, e “Summertime”, famosa com Janis Joplin). Cogito ficar, mas a alma já tinha partido – bêbada. Melhor segui-la.
Set list apenas da primeira parte do show
maio 23, 2012 No Comments