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Attitude is Everything

Essas duas histórias que seguem abaixo estão flutuando na atmosfera da minha mente desde o fim do ano. Mais precisamente no dia 31 de dezembro quando assisti ao especial do programa Alto Falante sobre os festivais europeus. Uma das reportagens chamou a minha atenção. Alguns dias depois, já em Ouro Preto, Lili leu no Estado de Minas uma reportagem interessante que praticamente tinha o mesmo tema. As duas reportagens tratavam sobre… atitude.

Atitude vem do latim aptitudinem e do italiano attitudine, e significa uma maneira organizada e coerente de pensar, sentir e reagir em relação a grupos, questões, outros seres humanos, ou, mais especificamente, a acontecimentos ocorridos em nosso meio circundante. É um dos conceitos fundamentais da psicologia social. Faz junção entre a opinião (comportamento mental e verbal) e a conduta (comportamento ativo) e indica o que interiormente estamos dispostos a fazer. Entrando no coloquial: é quando deixamos de ser imóveis e começamos a nos movimentar.

A reportagem em questão do Alto Falante é a primeira do primeiro bloco em Londres (assista aqui). O chapa Terence Machado entrevista Suzanne Bull, produtora do festival Attitude is Everything, que explica: “É um evento para melhorar o acesso de pessoas deficientes em shows. (…) O projeto começou faz oito anos, quando escrevi para uma revista de música falando como era ruim o acesso para deficientes em shows. Alguém da prefeitura de Londres leu e me ligou perguntando se eu gostaria de receber algum dinheiro para começar o projeto”, conta Bull.

A entrevista segue e Suzanne fala mais sobre o projeto (site oficial), que é bastante interessante, principalmente quando um deficiente comenta que já esteve no Brasil, foi a shows, mas não viu outros deficientes na platéia. “Eu sempre fui a shows durante toda a minha vida, sozinho, e eu queria que todo mundo fosse. O Attitude is Everything é uma boa maneira de fazer as pessoas acordarem. É só tornar mais fácil o acesso a deficientes. Temos dinheiro como todos e queremos gasta-lo em eventos”, diz um entrevistado. O lance todo que quero grifar, porém, é que tudo isso começou com uma carta escrita para uma revista.

Após assistirmos à reportagem, caçoamos pensando como isso nunca poderia acontecer no Brasil. Imagina: você vai, reclama sobre algo que está errado em nossa sociedade (e são tantos erros) e a prefeitura ou o governo, quem quer que seja, liga para você oferecendo um dinheiro para que você monte um projeto para resolver este problema. Lindo, né. E completamente utópico, certo? Bem, mais ou menos. No dia 03 de janeiro, uma manchete de um caderno qualquer do Estado de Minas contava: “Moradora consegue criar Defesa Civil em Brumadinho em uma semana”.

A história de Ilma Cândida Sobrinho é o melhor exemplo de que atitude é tudo. Em 24 e 25 de novembro de 2008, Ilma, 53 anos, participou de um seminário em que o meteorologista Ruibrant dos Reis alertava para um volume alto de chuvas na cidade de Brumadinho, que poderia causar enchentes e muita tragédia. Preocupada com a previsão, Ilma procurou a Defesa Civil da cidade e descobriu que ela só existia no papel. “Isso acontece muito. Decretam o órgão apenas para captar recursos”, conta a moradora para a reportagem.

Ela não desistiu, foi atrás do procurador-geral de Brumadinho, que autorizou a reativação do conselho. “Fizemos, em uma semana, o estudo que era para ser feito durante todo o ano”, conta. Segue a reportagem: Na segunda 15 de dezembro, ela, temendo a forte chuva prevista, e já com o mapeamento das áreas de riscos em mãos, retirou três famílias de imóveis que poderiam desabar.  Na quarta, 17, a previsão se confirmou: Brumadinho foi alagada pelas águas do Rio Paraopeba, que chegou a subir 10 metros. A família de Alessandra Silva dos Santos foi uma das que foram retiradas antecipadamente. “Se estivesse lá quando a tempestade chegou, eu e os meus cinco filhos não sobreviveríamos.”

Nesse dia, centenas de casas ficaram submersas. Cerca de 2.000 pessoas ficaram desalojadas, 200 famílias desabrigadas, 25 casas totalmente danificadas e quatro pontes atingidas, sendo que duas delas foram levadas pelas correntezas. Ilma acionou centenas de voluntários, Corpo de Bombeiros, Polícia Militar e a Defesa Civil do estado. “Já tínhamos avisado todos os habitantes, por isso, eles estavam preparados. Mesmo assim, foi uma loucura, porque a nossa preocupação de salvar todos era imensa, tanto é que fui à rádio da cidade pedir ajuda da comunidade”, conta. Brumadinho teve uma vítima: um senhor de 64 anos foi levado pelas correntezas do Rio Paraopeba.

Em dezembro de 2007 escrevi um longo texto chamado “Sonhar é permitido, viver é permitido”, em que entre outras coisas dizia: “se já sabemos que não podemos confiar em ninguém, que não existem sonhos quando o assunto é política, dinheiro e poder, então está na hora de fazermos as coisas nós mesmos. E, mais do que nunca, deixarmos o social de lado e agirmos no pessoal. Sim, mudarmos as coisas ao nosso redor primeiro. Sempre fomos acomodados demais, mas precisamos mostrar que se as coisas podem dar certo, elas tem que começar a dar certo dentro da nossa própria casa, do nosso próprio ambiente de trabalho, da nossa família, do nosso bairro. Sempre acreditei que fazer o bem é a melhor coisa que uma pessoa pode fazer para mudar o mundo, e apesar de parecer a coisa mais piegas, é no que eu acredito realmente.”

Quando esses três episódios (as duas reportagens e a lembrança do post antigo) se juntaram na minha cabeça, algo meio que pedia um texto como esse. Reclamamos demais. Da família, do emprego, do governo. E o problema não é reclamar. Reclamar é essencial. Acomodados não reclamam e acabam se aconchegando na monotonia de uma vida errada.  Evite isso a todo custo. A partir do momento que temos noção de que algo está errado, de que as coisas poderiam ser diferentes e bem melhores, precisamos nos mexer. Com inteligência, cautela, malandragem e boa vontade. Precisamos criar atalhos para que as saídas se tornem mais claras. Não dá para ficar parado olhando o mundo girar. Não dá para chorar sobre a cerveja derramada. A vida passa rápido demais. É bom se mexer.

Links:
– Assista ao programa Alto Falante no Youtube (aqui)
– Leia a reportagem do Estado de Minas sobre Ilma (aqui)

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