Mostra de SP: Godard, Ang Lee, Ian Curtis e Kurt Cobain
“One + One”, Jean-Luc Godard – Cotação 4/5
“Sympathy for the Devil”, Jean-Luc Godard – Cotação 3/5
“One + One” é cria de Godard; “Sympathy for the Devil” é a montagem que os produtores fizeram insatisfeitos com o material original do cineasta, à sua revelia. A rigor, é o mesmíssimo filme com a diferença que o primeiro traz a visão de Godard sobre a obra fechada e o segundo é a visão dos produtores que, claramente, não entendiam muito tudo o que o cineasta estava filmando e dizendo. Desta forma, alteraram a seqüência de esquetes (e anularam o crescendo que o roteiro de “One + One” explora de forma convincente), alongaram uma ou outra cena (o que não acrescenta nada) e colocaram mais Rolling Stones (o que acaba enchendo mais o saco, afinal até um mesmo um clássico como “Sympathy for the Devil” enche a paciência sendo ouvido a exaustão). Dentre as duas versões, a de Godard é claramente melhor, o que não quer dizer muita coisa: ambos os filmes trazem o mesmo conteúdo panfletário que faz muita falta nos dias de hoje, mas são para pouquíssimos ouvidos, olhos e coração.
Godard faz um elogio ao comunismo enquanto dispara frases certeiras contra os Estados Unidos, dá espaço para que os Panteras Negras dissertem seus ideais em passagens antológicas, lê e relê os conceitos de Mao e, na melhor passagem do filme, entrevista uma dama chamada Eve Democracy que defende a desculturalização. Para ela, “para se ser um intelectual revolucionário, é preciso deixar de ser intelectual”. A participação dos Stones é apenas para aficionados. Godard filma a banda gravando “Sympathy for the Devil”, mostra que Bill Wyman era um enfeite (a melhor linha de baixo do filme é feita por Keith Richards), que Brian Jones já estava em outra dimensão e que Mick Jagger centraliza as atenções. Mas é só a banda gravando. Em “One + One” as cenas são vistas em uma ordem coerente, que exibe o crescimento do arranjo, mas mesmo assim são dispensáveis. Os Stones, em 1968, eram um gancho para Godard discursar para a juventude. Visto hoje em dia, tanto “One + One” quanto “Sympathy for the Devil” são obras de museu, retratos de um tempo que se foi. Melhor do que chorar sobre as cinzas do baseado fumado é acordar e entender o mundo como é hoje. Há muito que fazer. Godard fez a parte dele…
“Lust, Caution”, Ang Lee – Cotação 4/5
O primeiro filme de Ang Lee pós-sucesso de “Brokeback Mountain” se passa na Xangai dos anos 40, é falado em chinês, mas trata do mesmo tema: o amor proibido. Se em “Brokeback Mountain” o diretor chocava ao retratar de forma tocante uma história sobre “o amor que não ousa dizer o nome”, em “Lust, Caution” o romance choca por carregar nas tintas do sexo explícito, mas também conta uma belíssima história de um amor impossível. As cenas de sexo são fortes, mas o melhor é se concentrar no drama da jovem revolucionária Wang Chiah-Chih que se apaixona pelo homem que devia matar. Em um país tão apolítico – e carnal – quanto o Brasil talvez este novo drama de Ang Lee não bata tanto quanto “Brokeback Mountain”, mas não se engane: é arte da mesma estirpe.
“Control”, Anton Corbijn – Cotação 3,5/5
Em sua estréia em longas, o badalado fotógrafo fez um belo filme sobre a história de Ian Curtis, vocalista e letrista do Joy Division, que se suicidou em 1980. O ator Sam Riley convence no papel principal, as partes em que a banda está em cena (que são poucas) são excelentes e as imagens de Manchester são belíssimas. Baseado no livro escrito pela mulher de Ian, Deborah, o filme só peca em valorizar as dúvidas amorosas do vocalista enquanto não aprofunda seus dramas e fantasmas pessoais. Como uma fotografia, “Control” exibe uma belíssima imagem, mas carece de alma. Isso não desmerece de forma alguma o filme, mas é uma maneira copo meio vazio entender que Ian se matou por não conseguir lidar com suas mulheres (e ai se inclui a filha Natalie). Ou queremos esperar de nosso herói algo mais do que ele talvez tenha sido.
“About a Son”, AJ Schnack – Cotação 1/5
Kurt Cobain merecia muito mais do que este falso documentário travestido de imagens de luxo de um karaokê sobre Seattle e Aberdeen. “About a Son” apresenta cerca de uma hora e meia de áudio de entrevistas feitas pelo jornalista Michael Azerrad que não trazem nada de novo nem explicam ou conseguem aprofundar a dimensão do mito. Ao contrário, “About a Son” é constrangedor. Algo está errado quando a melhor parte de um filme sobre um gênio do rock surge quando ele explica sua paixão por tartarugas. Kurt está certo: jornalistas são uns bastardos filhos da puta. Só isso explica como um cara usa um material tão bacana de áudio de uma forma tão tosca e canhestra. De péssimo gosto.
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