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Quanto vale o novo disco do Radiohead?

Ôôôôôôô, quanto vale o show, Lombardi?
Quer pagar quanto, Sílvio?

Direto ao ponto enquanto o garçom traz uma cerveja escura: o Radiohead é a melhor banda do mundo, e isso já faz dez anos, mais precisamente desde quando Thom Yorke e cia jogaram o arrebatador “Ok Computer” (ainda em formato real, CD mesmo) nas lojas. E 1997 parece tãoooo distante. Foi o ano que Woody Allen chocou o mundo ao se casar com sua enteada, Soon-Yi; o mesmo ano em que Xuxa anunciou sua gravidez; e em que Fernando Henrique Cardoso estava exercendo a metade de seu primeiro mandato como Presidente de uma República chamada Brasil (ou seria Eldorado?).

De lá pra cá quando se fala o nome de Woody Allen ninguém pensa mais em Soon-Yi, mas sim em Scarlett Johansson, atual musa do diretor em seus filmes recentes (principalmente no excelente “Match Point”); Sacha, a filha de Xuxa, já ganhou capa “solo” de Caras versando sobre seu aniversário em que rolaram Bonde do Tigrão, “Ilarie” e outras pérolas; e Luis Inácio Lula da Silva (quem diria) já está no meio de seu segundo mandato. O Corinthians era 17º no Brasileirão de 1997 e está em 18º no deste ano, o que prova que nem tudo muda, não é mesmo.

Mas o que aconteceu com o Radiohead? A rigor, a fama e o sucesso conquistados com “Ok Computer” deram um nó na cabeça dos integrantes da banda, que precisaram aprender em um ano o que o R.E.M. teve uma década para decorar – e o que levou Kurt Cobain para o lado de lá da força em apenas dois anos: a maneira certa de lidar com a mídia e a indústria. O resultado desse curso rápido e intenso pode ser verificado no excelente documentário “Meeting People Is Easy”, que flagra o momento exato de uma banda se libertando do mercado fonográfico (e de si mesma, por que não).

Os próximos passos foram óbvios: discos impopulares que serviram para despistar a mídia enquanto o público iniciava uma idolatria sobre o quinteto cujo altar passou a ser a Internet (nada mais normal para uma banda que cravou “Ok Computer” como nome de disco). Shows, aparições em TV, letras, entrevistas e tudo o mais superlotou a rede com informações passo-a-passo do grupo britânico. “Kid A” (2001) foi um dos primeiros álbuns a ser vazado em larga escala na Web (bons tempos do Napster), o que não atrapalhou sua escalada normal nas paradas nem diminui as filas para os shows do Radiohead, muito pelo contrário.

Seis anos e dois álbuns oficiais depois (”Amnesiac” – também conhecido como “Kid B” – e o político “Hail To The Thief”), o Radiohead pára o mundo pop com o anúncio de um álbum novo de forma totalmente inusitada: na segunda-feira passada (01/10), o site oficial do grupo avisava que a partir do dia 10/10 estará á venda “In Rainbows”, sétimo álbum de inéditas da banda. Não bastasse o anúncio surpreendente, o modo de vender o trabalho também é inovador: “In Rainbows” terá venda online com dois meses de antecedência no site oficial (www.inrainbows.com) e o ouvinte irá pagar pelas músicas o valor que ele quiser pagar. No dia 03 dezembro, uma versão real do álbum será vendida por 40 libras (aproximadamente R$ 150) e conterá um disco duplo de vinil, um CD multimídia com todas as nove faixas deste primeiro lançamento mais sete faixas extras, fotos, arte e letras. Uau.

O que tudo isso significa, caro leitor? Não só que o Radiohead continua sendo uma banda à frente de seu tempo, mas que as gravadoras como nós a conhecíamos estão com os dias contados – agora mais do que nunca. Porque “In Rainbows” não será lançado por nenhum grande selo. O contrato da banda com a poderosa EMI/Parlophone terminou em 2005 e desde então o Radiohead tem o “passe livre” na música pop. Essa estratégia doida de lançamento de “In Rainbows” cheira a revolução. Pense: não estamos falando de qualquer banda, mas sim da principal banda do mundo (e não sou eu apenas quem diz isso; qualquer tablóide de qualquer canto do mundo carrega nas tintas em relação ao grupo de Thom Yorke). A estratégia do Radiohead de se desamarrar das gravadoras pode demarcar uma nova era no modo de se negociar música pop, e para uma indústria que já perdeu a batalha do MP3, a derrota digital no modo de se negociar canções pode significar o fim da guerra – e de um abusivo controle sobre a obra artística musical de décadas e décadas.

A importância de “In Rainbows” para a música pop é muito mais teórica do que prática. Não que o valor de suas músicas seja inferior em qualidade a sua importância histórica, mas a estratégia de lançamento tende a causar um burburinho que poderá colocar as canções em segundo plano. É um fato, ainda mais se levarmos em conta que das dezoito canções anunciadas para o álbum, só quatro são realmente inéditas: “Weird Fishes”, “Faust Arp”, “MK 1? e “MK 2?. As outras catorze canções e meia (incluindo a metade da faixa quatro, “Arpeggi”) circulam pela rede – em excelente qualidade e diferentes versões – faz meses. Ou seja, “In Rainbows” já chegará ao tocador de MP3 do fã como um álbum conhecido, que ele terá ouvido muito mais do que vários discos reais lançados neste ano. Apesar da palavra final em termos de arranjo e letras ser dada apenas no dia 10, “Bodysnatchers”, “15 Steps” e “Down Is the New Up” (por exemplo) podem ser ouvidas em alta qualidade agora-neste-momento-já na Internet.

E ouvindo estas versões das novas canções, à primeira impressão é de que os arranjos continuam fundindo rock e eletrônica, mas a guitarra de Jonny Greenwood está muito mais presente no som da banda (”Bodysnatchers”, “Down Is the New Up”, “Up On The Ladder”), embora existam momentos calmos/líricos (”All I Need”, “Videotape”, “4 Minute Warning”). Nas letras, Thom Yorke novamente dá sinais de querer se desvencilhar do cargo de Messias: “Eu não tenho a mínima idéia sobre o que estou falando / Estou preso neste corpo e não posso sair”, canta no refrão de “Bodysnatchers”. Porém, ele nunca foi tão direto quanto em canções como “House of Cards” (”Não quero ser seu amigo / Quero ser seu amante”) e “All I Need” (”Eu sou todos os dias / que você escolhe ignorar / Você é tudo que eu necessito”). O que permanece nas letras, no entanto, é um forte sentimento de inadequação que agora também se confunde com partida: “Esta é minha maneira de dizer adeus / Porque eu não posso fazer isso cara-a-cara”, canta Thom em “Videotape”; em “Weird Fishes/Arpeggi”, o protagonista se compara a um peixe que planeja escapar; em “4 Minute Warning” o personagem quer se esconder dos bombardeios.

Entre letras e músicas em versão bootleg fica quase impossível cravar uma avaliação da qualidade de “In Rainbows”, mas as onze canções disponíveis permitem algumas pequenas certezas: “In Rainbows” parece um “Hail To The Thief 2? da mesma forma que “Amnesiac” parecia um “Kid B”. Não parece destacar nada que venha a fazer do álbum algo tão importante quanto “Ok Computer”, e talvez nem precise mesmo. O Radiohead já caminha faz tempo à frente do mundo pop. Sua estratégia de divulgação, no entanto, deve dar uma chacoalhada em todo o cenário, entrar para a história e abrir um novo caminho no modo de se comercializar música. Acredite: é algo muito importante porque lida com as relações entre um determinado artista e seu público. Na prática, ninguém precisa pagar para baixar as músicas de “In Rainbows”, afinal elas vão estar em programas de trocas de arquivo e blogs de MP3 minutos após serem colocadas à venda no site oficial. A grande sacada, no entanto, é a banda depositar sua confiança sobre seu público. Pode ter certeza que muita, mas muita gente mesmo vai pagar pelo álbum. Pelo simples prazer de se apoiar uma idéia original e que respira a revolução. Quanto vale? Bem, o preço é o de menos, mas estive pensando em quanto vou pagar, e acho que, Seo Silvio, o show vale US$ 5, algo em torno de R$ 10, para mim um bom preço sobre um CD que virá sem capa, encarte, letras e um material tateável que me faça sentir sua real existência.

Pago com prazer e vou ficar torcendo para que daqui dez anos o Radiohead ainda me surpreenda com boas músicas e atitudes acima de qualquer suspeita. Vou esperar, também, que Woody Allen permaneça vivo e filmando, que Sacha chegue as vinte anos sendo matéria de capa da Bravo ou da EntreLivros (hehehe) e que os futuros presidentes dessa Eldorado chamada Brasil consigam nos devolver a fé não só nos partidos políticos, mas nas pessoas mesmo. Ok, Corinthians campeão do mundo, mas ai seria pedir demais. Realmente, acho que só posso contar com as mãos do cinema de Woody Allen e o abraço da música de Thom Yorke e seus amigos. Será que as gravadoras vão existir/resistir até 2017?

Tracking List: – CD 1 (10/10)
“15 Step”
“Bodysnatchers”
“Nude”
“Weird Fishes/Arpeggi”
“All I Need”
“Faust Arp”
“Reckoner”
“House of Cards”
“Jigsaw Falling Into Place”
“Videotape”

Disco bônus: (03/12)
“MK 1?
“Down Is The New Up”
“Go Slowly”
“MK 2?
“Last Flowers”
“Up On The Ladder”
“Bangers and Mash”
“4 Minute Warning”

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