Três discos: Colleen Green, Holiday Sidewinder, Carolina Donati

resenhas por Gab Piumbato

“Cool”, Colleen Green (Hardly Art)
No disco anterior, Collen Green dizia querer crescer. Agora ela é “cool”: óculos escuros, pose descolada, ar de quem passa incólume pela vida. Daí ter chamado Gordon Raphael, produtor dos primeiros discos dos Strokes, para assumir a condução dos trabalhos no estúdio. “I Wanna Be a Dog” faz lembrar de “Vida de Cachorro”, dos Mutantes (bem melhor, por sinal). Canções simples, bateria, baixo e guitarra (um sintetizador aqui e ali), sem virtuosismo nem estranheza. Tudo muito bem polido e asséptico. Esta é a diferença dos Strokes para os concorrentes: até mesmo a pior canção deles desperta alguma reação. Ouça “Highway” de Colleen Green e você vai entender por que nenhum jovem tem mais vontade de tocar guitarra hoje em dia. “Pressure to Cum” é a canção instrumental mais entediante da história do indie-rock. Colleen Green é cool, nós estamos coolíssimos e o universo não se expandiu um milímetro nestas 10 canções.

Nota: 4

Ouça: Spotify, Bandcamp, Youtube

“Face of God”, Holiday Sidewinder (Lab78)
O fim do mundo é sempre o começo do mundo. Um pensamento sempre leva a outro pensamento. Uma canção sempre leva a outra canção. Não é moleza acompanhar o fluxo de consciência de Holiday Sidewinder nestas oito faixas. Ao contrário de um sonho louco jamais filmado de David Lynch, as viagens sonoras aqui mais desorientam do que encantam. Tudo é inseguro, frágil, assustador. Não devemos esquecer a grande participação de Nick Littlemore, tanto como músico quanto como produtor deste álbum, tentando ordenar a confusão mental de Sidewinder (ela disse ter tido alucinações com anjos em igrejas católicas em Roma e Londres). Este, de fato, não é um disco para ouvir num dia ensolarado. Até o Indiana Jones cobriu o rosto para não ver o que havia dentro da arca sagrada. Holiday Sidewinder ousou ver “a face de Deus”. E está aqui para dar o seu testemunho. “Face of God” é uma vitória e um buraco negro. “The Best Is Yet To Come”, diz a última canção. É preciso acreditar.

Nota 8

Ouça: Spotify, Youtube

“Arde”, Carolina Donati (Independente)
“É preciso arder. E não só nos versos”, disse o poeta Eugénio de Andrade. A foto da capa de “Arde” capta à perfeição o som de Carolina Donati em seu segundo disco. A faixa-título tem todos os toques duma balada sessentista, um prodígio de composição. Donati estudou música na Pontificia Universidad Católica Argentina, mas este é o tipo de canção que não se aprende na escola, necessitando de anos e anos de audição e imaginação. Em suma, de vida. Será este o melhor álbum argentino do ano? A cada repetição, as canções melhoram: é uma guitarra com fuzz tocando apenas uma nota, é o efeito chorus banhando uma introdução de lo-fi, é a voz de Carolina se sobressaindo entre todos os instrumentos. Os dois minutos finais que encerram o disco, de “Lo Que Viene Después”, compõem o momento musical mais belo da década.

Nota: 10

Ouça: Spotify, Bandcamp, Youtube

– Gab Piumbato é jornalista e autor da melhor discografia comentada de Bob Dylan em português (aqui)

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