Faixa a faixa: o duo ASA apresenta o EP “Instintos”

por Marcelo Costa
Faixa a faixa por ASA

Formado pela baiana Ananda Góes (voz) e pelo paulistano Fabricio Di Monaco (guitarras, baixo e sintetizadores), o duo ASA apresenta o seu primeiro EP, “Instintos” (2021), um trabalho cuja realização reflete muito a produção nestes tempos modernos – e, claro, na pandemia: gestado à distância, a parceria dos dois começou com o desejo de Fabricio ter uma voz feminina cantando em colaboração, e acabou rendendo várias canções (e um projeto) que atualizam a MPB setentista e oitentista com um olhar atual, alternativo.

“Queria muito encontrar alguém com quem houvesse afinidade musical e que se interessasse pelo projeto não apenas como intérprete, mas que topasse fazer parte dele. Falei com muitas, em São Paulo, onde moro, mas foi através da indicação de Lucas Arruda, de quem sou parceiro em algumas canções, que cheguei até Ananda, lá de Salvador”, conta ele. “Quando fui contactada por Fabricio, a ideia era uma colab, não sabíamos que acabaríamos virando um duo. E essa evolução do projeto foi algo super sinérgico no início da quarentena”, diz ela.

Indo do soul aos sons mineiros do Clube da Esquina, o EP “Instintos” faz um panorama das influências das memórias musicais de Ananda e de Fabricio, que vão de Marina Lima e Rita Lee & Roberto de Carvalho a Prince e Roxy Music unidas com um desejo de buscar o novo. Com mixagem de Ricardo Câmera e masterização de Brendan Duffey, “Instintos” pode ser ouvido em todas as principais plataformas de música digital e é decupado pelo duo no faixa a faixa exclusivo abaixo.

Faixa-a-faixa, por ASA:

Nova Inteligência
Fabricio: A canção nasceu uma balada e a frase “Mudanças no ar” veio junto com a melodia do refrão. Ela foi criada por volta de 2015, num clima de consolidação da virada de século, com as quedas do gênero, do patriarcado que, no nosso ponto de vista, são fatos consolidados. Ao longo da pré-produção, já em 2017, ela ganhou intensidade, riffs de guitarra e se aproximou do rock, junto com a chegada dessa força conservadora querendo segurar toda essa transformação positiva de que a parte da letra já escrita tratava. Veio então o contraponto, com frases como “O mundo se move e você não escapa” e “A vida devolve o que a arma dispara”, que retratam essa polarização que vivemos até hoje.

Ananda: “Nova Inteligência” é uma que eu curto muito porque tem o ímpeto de uma mudança de percepção individual e coletiva, pra mim é queridinha, gosto do rock que vem com ela. Eu a acho mais provocadora, na sonoridade, nas ideias de reviravolta de consciência de sentido de realidade e é quase uma prévia do que vem depois dos “Instintos”, do que já tá nascendo para o próximo trabalho em vista.


Sempre Mais
Fabricio: Na concepção buscamos um arranjo pulsante, com groove, mas em um clima mais etéreo, mais viajante, como as produções da Roxy Music e da Marina no começo dos 80s. A letra traz a possibilidade de extrairmos beleza das pequenas coisas, pequenos gestos no dia a dia, sem nos apegarmos à beleza proposta pelo consumo, pelos padrões. Essa beleza, no fim das contas, traduz quanto amor nutrimos pelo outro, pelas coisas simples.

Ananda: Toda vez que eu vou falar de “Sempre Mais”, lembro de uma coisa que a Nancy Viégas, uma multi-artista incrível que fez a preparação vocal pra minha interpretação nela, disse. Na altura, pouco antes da pandemia, gravei as vozes no Casa das Máquinas, que fica perto da Orla Marítima de Salvador. A metáfora que ela me deu pra direção vocal era: “A vibe aí é esquema tu de patins na orla, sentindo o vento e deslizando”. Depois dessa dica eu entendi tudo, encaixou nessa simplicidade etérea que a música tem, ficou mais completa com um vocal que andou de patins sentindo o vento.


Algoritmos
Fabricio: Nosso track com mais groove no EP “Instintos”. Nele abordamos a multiplicidade de encontros possíveis trazida pelos apps de relacionamento, as redes sociais, por um lado e como paradoxo, quando um desses encontros se torna especial e eclipsa os demais, se tornando fonte de uma parceria para a vida.

Ananda: “Algoritmos” traz essa ideia de estar numa realidade múltipla, cheia de aspirações diferentes… Coloca a gente ali na qualidade criativa de “Deuses perdidos em nossas projeções”, como Fabrício bem pontuou na letra, o emaranhado de conjecturas que a gente tenta entender, e as letras de Fafá sempre contam com um otimismo de encontrar sentido nisso tudo, nem que seja pra descobrir que é uma realidade projetada que só tá na nossa cabeça. “Algoritmos” tem esse clima. Inclusive essa a gente teve que terminar em casa num clima distópico digital total mesmo, foi estofado pra tudo quanto é lado e REC!


O Novo
Fabricio: “O Novo” foi escrita para Gabriel, meu filho. Há um bom tempo tinha esse tema para uma canção, mas ela demorou pra nascer, pois a canção “Gabriel”, de Beto Guedes e Ronaldo Bastos, escrita para o filho de Beto, já era a canção que pra mim traduzia todo esse sentimento e que acabou bloqueando meu processo de criação. Em 2017 ela nasceu, inspirada pela sonoridade desses mineiros e ao discutirmos a letra eu e Ananda adaptamos o texto que ampliou seu significado para todas as relações de amizade que envolvem o cuidar, o ver crescer.

Ananda: “O Novo” é uma música que nasceu pra Gab, como a gente falaria aqui na Bahia: filho de Fafá (risos). E fala de libertar todos Gabs do mundo para viverem e amadurecerem mediante um amor que deixa livre pra escolhas, que escolhe não condicionar e que aceita a busca de quem você ama sem impor suas ideias. Tudo isso nesse clima mineiro.


Instintos
Fabricio: A canção com espírito mais livre do EP. Ela fala da noite urbana, de sair, conhecer pessoas, dos estados alterados de consciência, de algo que nesse isolamento não conseguimos ainda voltar a viver. Nos envolvemos muito na concepção estética desse track. Ele chegou a ter uma outra versão finalizada, de que sobrou pouca coisa, até que eu e Ananda chegássemos a esse resultado, que realmente curtimos.

Ananda: “Instintos” é uma realidade felina, nosso lado desbravador. Como no sonho vívido dos gatos… Uma fantasia real que vai te revelando o engano dos sentidos. Vejo como uma música de descobertas, o instinto espreitando experiências, o desejo amadurecendo o ego. Condição biológica , é sobre nosso animal noturno.

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