entrevista por Renan Guerra
Com o lançamento de “Tem Conserto”, em 2019, Clarice Falcão deu novos rumos a sua carreira musical, deixando de lado o violão e investindo de vez nas batidas eletrônicas. Nessa pista de dança, Clarice fez alguns fãs torcerem o nariz, mas conquistou muitos outros e, para estes, ela vem lançando uma enxurrada de conteúdo.
Desde o início da quarentena já tivemos o lançamento de um EP chamado “Eu Me Lembro”, com releituras de suas faixas antigas agora em clima eletrônico, contando com a participação de Letrux; um feat com clipe ao lado de Linn da Quebrada na faixa inédita “After do Fim do Mundo” e dois clipes novos, para as canções “Só + 6” e “Dia D”, do disco “Tem Conserto”.
Esse ano ainda seria a estreia da artista nos palcos do Lollapalooza, porém a quarentena impôs o cancelamento do evento. Longe dos palcos, Clarice tem utilizado esse tempo para focar nos seus lançamentos previamente planejados e para intensificar sua relação com seus fãs via internet. De forma virtual, pelo WhatsApp, conversamos com ela sobre todas as mudanças de sua carreira, assim como sua relação com a música eletrônica, as festas de underground, sua persona na internet e seu dia a dia na quarentena. Confira o papo:
Pra começar, eu queria saber como você está passando essa fase de quarentena?
Às vezes bem, às vezes mal. Eu comecei muito tranquila, falei assim: “Ai, isso vai ser de boa”. Então inventei várias coisas, como cozinhar cada dia a comida de um lugar diferente, para darmos a volta ao mundo. Deu duas semanas e eu já estava “qual o sentido de viver? Não tem sentido”. Depois voltei a ser produtiva, fazer esportes, mas daqui a pouco, na outra semana, eu já estava “por favor, me leve, eu não aguento”. Então estou entre um termo e outro.
Mas antes de começar a quarentena você já tinha preparado muitas coisas de trabalho para serem lançadas.
Sim. Esse ia ser um momento – foi de certa forma – muito bom e diferente na minha carreira, até pra começar chamando de carreira, já que eu nunca chamei assim. Acho que nunca levei tão ao sério, “vou fazer clipe para todas as músicas, vou fazer isso e aquilo”, mas eu ia tocar no Lollapalooza, estava com uma turnê marcada pela Europa, uma turnê pequenininha, só eu e o Lucas [de Paiva], bem sem saber se a gente ia perder ou ganhar dinheiro, mas eu estava bem empolgada. E junto com isso, um monte de coisa pra lançar, vários clipes para serem lançados. Eu estava: “Caraca, vai ser o meu ano”… e foi o ano do Coronavírus. Mas é aquela coisa também: é uma reclamação muito “ah, pobre menina rica branca”, porque tem uma galera que está se fodendo muito, então sou muito privilegiada de ter a minha casa, de ter algum dinheiro guardado. Dizer “ai nossa, eu não pude ir pra Europa”, tadinha, né?
Mesmo assim você está lançando vários clipes, inclusive um que não estava no seu cronograma inicial, que é sua parceria com a Linn da Quebrada, em “O After do Fim do Mundo”.
Sim, a música estava planejada, mas o clipe a gente ia fazer na rua, tipo o fim do mundo, com roupa do fim do mundo. Compus a música antes do Coronavírus, o fim do mundo era muito mais uma interpretação política do que a gente está vivendo, pois nunca imaginei que a gente fosse passar pelo que está passando: um vírus que está dizimando uma parte da população. Eu até cheguei a pensar: Faz sentido? Não faz sentido? Vai parecer que eu fiz pra isso… mas eu acho que é tão um sintoma do que a gente já vivia, de uma coisa muito doida de não ter água aqui no Rio, acho que o mundo já estava dando sintomas de que está acabando, de que a gente está acabando com ele há muito tempo, e então achei que fazia parte do que eu compus e do que a Linn compôs por cima, isso é só mais um sintoma.
E como foi para você esse encontro com a Linn da Quebrada? Pois ela é uma artista que vem de um outro universo bem diferente do seu, mas vocês tiveram uma espécie de conexão nessa faixa.
Foi maravilhoso! Quando compus a música, pensei que precisava de outro olhar, de um olhar que não venha de mim, das minhas experiências, e a primeira pessoa que pensei foi a Linn. Conheci o trabalho dela quando vi o show no festival da Red Bull, em São Paulo. Fiquei muito chocada com a presença de palco dela, de espírito mesmo, de alma. Depois conheci o trabalho dela de fato: as músicas, as composições dela e da Jup do Bairro, e fiquei muito fascinada. E depois disso a gente se encontrou em algumas festas de eletrônica e de after e falei “cara é perfeito!”. E toda vez que a gente se encontrava eu falava: “Sou muito sua fã, gosto muito de você” e ela também falava isso. Então foi a primeira pessoa que eu pensei. E foi muito doido porque mandei uma mensagem pra ela de áudio: “Linn, desculpa, não sei se estou atrapalhando aí e tal, mas fiz uma música que fala isso e isso, vou te mandar o que eu tenho composto e queria muito um verso seu”. E, cara, a resposta dela foi muito linda e ela ficou muito chocada, que isso é uma coisa que ela tem falado, que ela vem falando sobre: “Não tenho mais paciência para quem acha que o mundo não acabou, não tenho mais paciência para isso, então me tocou muito essa música, quero muito fazer”. E ela entrou muito de cabeça. Eu já estava com a passagem comprada para ir pra São Paulo pra gravar com ela, cara a cara, e tipo dois dias antes estourou a coisa do Corona, não deu pra sair, e tive que cancelar e gravamos a distância. Mas o verso dela é muito lindo.
Você falou dessa coisa das festas de música eletrôncia e tal. E como foi a sua aproximação desse universo até chegar no último disco, o “Tem Conserto”?
Foi muito doido. Eu já gostava de música eletrônica, mas eu não sabia que se chamava música eletrônica. Quando tinha 16 anos, eu tinha um fotolog de fã – um fãtolog – para a Björk, eu era muito fã, amava demais. Eu também gostava de The Postal Service, que é um projeto que parece um pouco com o Lucas e comigo, pois é um cara que vem totalmente de música eletrônica com um cara que vem do folk, de músicas mais pro violão. E acho que por eu tocar violão e por as minhas letras serem algo que eu queria dar atenção – gosto muito de fazer letras, acho que sou mais uma letrista do que uma musicista, uma instrumentista ou uma intérprete –, então achei que no primeiro disco (“Monomania”, 2013) fazia muito sentido o folk, já que sempre gostei de folk e assim botava as letras em primeiro plano. Até porque as letras eram meio darks: de assassinato, de matar gente, meio obsessivas. Achei que era uma virada interessante cantar como se fosse uma música de amor, mas quando você vai olhar de perto é maluquice, sabe? E conforme o tempo foi passando, nessa época eu era casada – eu casei com 19 anos – e me separei, teve o “Problema Meu” (2016), que é um disco que eu acho muito de transição, muito importante, mas que é um disco que eu tinha acabado de separar, eu não sabia o que eu era sozinha, o que era eu mesma. E com o tempo fui me apaixonando por essa cena eletrônica. Sempre fui muito festeira antes de casar. Aqui no Rio tem uma boate chamada Fosfobox – tem até hoje – e eu entrava com carterinha falsa e saia loucaraça, enfim – pior que essa entrevista vai sair na íntegra e eu falando que entrava com carteirinha falsa. Aliás, outro dia fui de novo lá e o moço da Fosfobox falou: “Eu lembro de você, já te peguei aqui com carterinha falsa”. E eu disse: “Eita, você trabalha há muito tempo aqui” (risos). Eu sempre gostei muito de festa, mas quando voltei a ficar solteira comecei a me apaixonar por essas festas e por essa música, por tantos motivos: a festa de eletrônica é uma festa muito inclusiva, eu sinto que tem uma coisa de quando eu ia nas baladas de “rock independente” ou não-sei-o-que, era sempre para um tipo de público, era sempre politicamente neutro, sabe? E eu sinto que as festas de underground tem um cunho político que me fascina muito, tem uma aceitação de todos os tipos de corpos e de entidades e eu sinto que tem menos uma vibe de pegar gente só por pegar gente, de essa ser a função em si, mas sim muita gente gostando de ouvir a música. Teve uma época que eu achava que música eletrônica era poperô, musica de playboy, e fui entendendo que não, que isso é um lado da música eletrônica, e que tem lados muito melhores e muito mais interessantes – na minha opinião, né, nada contra. E tem a parada de fazer música eletrônica, que é muito legal, você faz em casa, pois tem algo de opressor pra mim no estúdio, até financeiramente, pois você tem que dar um resultado tal até tal hora, cada hora que você está lá você está pagando. E como artista independente, isso é muito agoniante. A primeira vez que gravei “Minha Cabeça” foi no estúdio, e eu não estava satisfeita com o resultado, mas eu não tinha dinheiro para pagar mais horas de estúdio e gravar mais vozes. Depois acabei regravando tudo em casa.
Você sente que há duas respostas para esse trabalho: as pessoas que te apoiaram nesse universo e outras que aparecem toda hora dizendo “ah, mas você não vai tocar mais violão, não vai mais tocar folk”? Como você lida com isso?
Há muito! E entendo muito, porque alguns artistas meus – meus! [risos] –, meus ídolos já mudaram radicalmente e eu não curti e acontece. E não culpo, não acho que a pessoa tem que (curtir). Até porque não sou eu, é o meu trabalho, por isso que não gosto muito de me botar nessa situação de ídolo ou de musa, porque na realidade é o meu trabalho. E enquanto trabalho, se podem gostar ou achar ruim, não é comigo diretamente, é com o que estou fazendo, com a obra. Então por outro lado, sinto que se eu tivesse deletado tudo que eu fiz dos streamings, seria uma coisa, mas está tudo lá, sabe? Não acho que seria genuíno da minha parte ficar tentando fazer vários “Monomanias”, apesar de achar que seria mais lucrativo, tipo até hoje o que é mais ouvido (na minha discografia) é o “Monomania”, é o que atinge a maior quantidade de pessoas, era a época em que eu enchia mesmo o Circo Voador e ficava gente de fora, mas não seria genuíno, seria eu tentar mimetizar uma coisa que foi muito verdade pra mim naquela época, mas que não é mais hoje.
Como você vê então esse processo de voltar para algumas faixas que você fez no EP “Eu Me Lembro”. Como foi esse processo de selecionar elas, de reencontrá-las, digamos assim?
Nossa, foi muito gostoso. Foi feito na verdade para o show: eu queria muito fazer um show que englobasse o “Monomania”, pois não tenho a menor vergonha, eu amo o “Monomania”, gosto muito do disco. Queria muito que o show tivesse o disco, mas não queria que o show tivesse um momento a parte, tipo “agora parou o ‘Tem Conserto’, vou pegar um violãozinho e vamos lá”, porque acho que isso não é interessante para o espetáculo, fica fragmentado, fica como se fosse um show de esquetes, e não era o que eu queria. Então peguei o que acho que permanece, que é o DNA das letras, porque acho que hoje em dia as letras são menos engraçadas, talvez, ou menos exageradas, mas acho que tem um DNA, um eu-lírico ali que continua. De todo modo, pegar essas letras e trazer para uma sonoridade que faço hoje em dia, sem perder a alma delas, foi muito trabalhoso, a gente teve muito medo. Eu e o Lucas tentamos várias músicas, teve algumas que a gente não conseguiu, talvez um dia a gente consiga. “Macaé”, por exemplo, eu não consegui fazer uma versão que eu achasse esse meio do caminho de ela não perder a alma que ela tem, mas ela ainda fazer sentido com o que gosto hoje, com o que escuto hoje. Várias músicas a gente conseguiu e as pessoas começaram a pedir, “como é que eu escuto essa versão dessa música?”, e eu pensei “vamos fazer”. É esquisito, não lembro de alguém que fez isso, de pegar as músicas antigas e regravar completamente diferente, mas foi muito legal.
E nessa nova fase você também tem uma grande preocupação com os visuais, tanto que você tem lançado vários clipes, um deles é o clipe de “Só + 6”, que é ao lado do pessoal do Teatro da Pomba Gira, aqui de São Paulo. Como foi a sua ligação com eles?
Conheço o Marcelo [D’Avilla] há um bom tempo, sou amiga dele, e sou muito amiga do Thiago Roberto, eles fazem juntos a Popporn, e sempre vou, fui, eu já li poemas eróticos no festival, admiro muito o rolê deles em São Paulo, acho que é essencial. Acho que a Popporn e a [festa] Dando tratam a coisa do sexo e do sexo gay e da coisa do estigma, mas também atentando pras proteções, para o Prep e tal. Isso é tão bonito. É como falei antes, de que as festas de eletrônico e essas festas underground têm uma preocupação política além da diversão e do hedonismo. Sempre curti muito o Marcelo como artista e vi o [espetáculo] Demônios e fiquei encantada com o visual e com a poesia da peça. Um dia ele estava aqui no Rio, na casa de um amigo, a gente estava conversando, ele e o meu amigo, bebendo, conversando, e eu falei: “Cara, queria muito que você fizesse um clipe meu”, e isso foi antes do disco sair. “Eu vou lançar um disco agora e gostaria muito que você dirigisse”, e ele disse “Tá bom, qual é a música mais esquisita do disco?”. Pensei muito e falei, “cara, acho que ‘Só + 6’ é a mais esquisita do disco”. E ele falou “tá bom”. Nunca mais falou disso, achei que ele tinha esquecido. Cara, quando ele chegou, acho que foi no começo desse ano, em janeiro, ele veio com um projeto de seis páginas, Power Point, foi a coisa mais linda, muito pensado, cada coisinha pensada poeticamente, e com essa galera que eu já tinha amado, do Teatro da Pomba Gira, e mais uma galera também, por que o Teatro é só de homens gays, e a gente queria ter mais tipos de pessoas, e, enfim, foi maravilhoso.
E o clipe mais recente é “Dia D”, que curiosamente tem várias pessoas que são importantes para você participando dele. Como foi esse outro clipe?
Gosto muito de fazer coisas com amigos, com gente próxima. Até quando, por exemplo, fui fazer o “Tem Conserto” com o Lucas, ele era namorado da minha amiga, ele não era meu amigo, e agora ele é um dos meus melhores amigos, agora ele fica aqui em casa no Carnaval, sabe, e a gente ferve junto. Então gosto muito de trabalhar com amigos, os diretores do clipe são o Filipe Oliveira e o Pablo Monaquezi, dois dos meus melhores amigos, e na hora de fazer o casting foi muito por essa vibe de “quem é importante pra gente, quem faz sentido?”. Tem até a minha mãe [a escritora e roteirista Adriana Falcão] beijando minha madrinha na boca! Não era para elas se beijarem, minha mãe que inventou, era só para elas estarem de casalzinho, uma botar a mão na bunda da outra e tal, mas daqui a pouco estavam se beijando. E tem a galera justamente das festas de underground daqui, da Rave RJ, que fazem a festa Até as 4. Enfim, acho que dá pra ver no clipe que é genuíno, que é pessoal, é o que sempre tento buscar. É o que eu falei de fazer um outro “Monomania” ou que sempre tento fazer uma coisa que seja de verdade, mesmo que às vezes seja tosca. O “Dia D”, por acaso, a gente pensou assim: “Vamos fazer um clipe lindo”, mas lembro do “Eu Escolhi Você”, que era o clipe das pirocas, cara, o clipe era horroroso, não tinha diretor de fotografia, era só a gente na minha casa tirando a roupa e filmando, sem a menor pretensão de ser político, era só um clipe para engraçado, desistigmatizando e dessexualizando o corpo, mas era bem feio, a fotografia era sofrível, porque a gente fez tudo em casa, mesmo assim acho que tem uma coisa bonita. O “Irônico” também, no carnaval, a gente só fez com celular, então é isso, sempre achei esquisito, eu nunca me senti confortável para chamar um diretor que eu não conheça e falar “toma, entreguei essa música e inventa aí”, pois é tão pessoal, né?
Sim. E no caso do “Dia D” você também ficou conversando com os seus fãs na internet sobre o lançamento do clipe ou não, em função da quarentena. Nesse sentido, você tem criado essa relação maior com eles no Twitter. Como é pra você voltar a ter esse tipo de relação depois que você teve, em alguns momentos da sua vida, uma hiperexposição?
Essa pergunta é maravilhosa porque, realmente, em 2013, quando teve o Porta [dos Fundos] e o “Monomania”, a gente estava nessa turnê do “Monomania” e começou a ficar muito grande. Foi uma exposição muito grande, começou a ter gente balançando van, invadindo camarim. E eu nunca tive essa pira de ser celebridade, nunca na minha vida. Sempre gostei de fazer arte, de fazer as minhas coisas, mas não é um lugar em que fico confortável de ter uma fila pra tirar foto comigo, sabe? Como se eu fosse o Mickey, pois acho que me coloca num lugar como se eu fosse acima e, na verdade, enfim… é um lugar que não me deixa nem um pouco confortável. E no meio dessa turnê a gente estava enchendo tudo, lotando, mas comecei a ter crises de pânico, comecei a ter crise de ansiedade, eu sofria pra entrar no palco. E lembro que o show era todo programado, tudo que eu falava era escritinho, e eu não me mexia do lugar, eu ficava parada cantando… não estava sendo divertido, não estava sendo bom pra mim e começou a ser o contrário, começou a ser muito sofrido e parei. Por um lado, acho que foi a coisa mais burra que já fiz na minha vida, porque foi o momento que eu estava de fato ganhando dinheiro, fiz o comercial do Pão de Açúcar e tal, eu estava começando a ganhar dinheiro sendo uma artista independente. Mas mesmo assim ainda foi a decisão certa, parei a turnê no meio, em 2013, nessa época eu não falava direito no Twitter, não usava Instagram, tentava manter a minha vida mais privada possível, e ok, falei “não vou mais fazer isso, é impossível”. Com o tempo fui ficando mais saudável mentalmente, e comecei a entender que às vezes eu mesma me colocava nesse lugar, até não tendo um Twitter. Não me comunicando talvez eu me botasse num lugar de inacessível mesmo. E eu entendia que o problema era que eu não estava botando as coisas nos meus termos e agora que tenho tentado fazer e tem funcionado é isso: justamente botar as coisas nos meus termos, de eu falar do jeito que eu falaria, sem falar de um jeito como se eu fosse uma diva pop. Não sou e não tenho essa vocação para diva pop. Tem gente que ama e faz isso muito bem, eu não tenho, não vou cobrar meet & greet, isso nunca vai acontecer, porque não quero me botar nesse lugar. Então, comecei a me zuar, a zuar as pessoas, os fãs, e fazer dessa relação um pouco mais horizontal. E dizer “cara, se você me encontrar no Carnaval doidona, eu vou conversar com você, mas eu não vou tirar foto, porque eu vou estar doidona”. Coisas muito simples. Agora se eu estiver na rua, prefiro bater um papo, honestamente, acho mais rico, tipo “pô, você gosta dessa música, por quê? Te tocou de que maneira?”, mas, óbvio, se você quiser uma foto, eu nunca neguei foto na rua, mas acho tão mais interessante essa relação horizontal de uma pessoa que gosta de seu trabalho e a pessoa que fez o trabalho, é enriquecedor pros dois lados, é muito bonito conversar com alguém que se tocou com o que essa música disse, que algo mudou na vida dela, é muito bom pra mim. Então agora essa coisa de “votem nas fotos”, “será que eu lanço, porque eu não ia lançar, mas eu tô vendo que a quarentena vai durar muito e eu tô muito ansiosa que o clipe tá muito legal, o que vocês acham?”, é uma conversa de igual pra igual, sabe?
No início da nossa conversa você falou no sentido de passar a enxergar agora a sua carreira musical como uma carreira. E como você concilia esse seu lado musical com a Clarice atriz? Ano passado você participou de “Shippados”, da Globo, então como tem sido essa conciliação entre os dois universos?
É difícil, às vezes quando eles se cobrem, um por cima do outro, fica mais difícil, muitas vezes eu termino fazendo um pouco pior um deles ou com a cabeça em outro, mas o que eu tento é fazer em blocos. Então na época do “Shippados” eu dei uma parada no disco. Daí terminou o “Shippados” e a gente finalizou o disco, lançou o disco, comecei a fazer turnê. E também tem uma coisa que a carreira de atriz e autora é muitas vezes o que financia a minha carreira de cantora, porque não sou de gravadora, até então nunca entrei em edital, termino tirando do meu bolso. Por exemplo, o comercial do Pão de Açúcar foi o que pagou o meu segundo disco, já o “Shippados” pagou a masterização do “Tem Conserto”. Esse disco foi muito mais barato, feito em casa, mas foi a série que pagou a masterização. Então termina que uma coisa vai alimentando a outra, tanto financeiramente quanto artisticamente, por exemplo, no próprio “Shippados”, o que aprendi tanto de interpretação, mas de liberação, de parar de noiar com o meu corpo, eu levei para outros lugares, levei para [fazer o clipe de] “Dia D” de lingerie, fazer o [clipe de] “Só + 6” toda de látex. Então sinto que vou aprendendo uma coisa aqui e utilizo ali, pode ser legal.
Agora você lançou muita coisa, produziu muito, e o que você vai fazer a seguir nesse cenário que a gente nem sabe direito quando vai passar. Você está fazendo algum plano?
Então, tenho muitos planos para a minha família do The Sims [risos]. Agora estou muito assim “eu não sei o que eu vou fazer da minha vida”, eu tenho um projeto de seriado, mas que não foi ainda nem aprovado, então não tem nem o que dizer, mas a gente está trabalhando nele já tem algum tempo e agora estamos trabalhando por Hangout, mas assim, meio The Sims [risos]. Além disso, tem alguns clipes que a gente está pensando fazer em quarentena mesmo, tipo “CDJ” que é uma música de que gosto muito. A gente fez algumas imagens do Carnaval desse ano, para de repente fazer uma segunda versão do clipe de “Irônico” com a versão do EP, isso pode ser uma coisa que a gente lance, mas acho que de lançamento grande mesmo, feito a gente teve de “Dia D” e “Só + 6”, que eram clipões, clipes mesmo, com cara de gente, eu não sei quando vai ser, mas acho que talvez tenham algumas surpresinhas, algumas coisas legais.
– Renan Guerra é jornalista e escreve para o Scream & Yell desde 2014. Também colabora com o Monkeybuzz.
Achar que Postal Service tem metade que veio do folk é forçar a barra. Veio do rock, mais precisamente do “rock independente” que depois é citado de forma não lá muito abonadora na mesma entrevista.