por Eduardo Lemos
Nick Drake lançou três discos entre 1968 e 1972, mas é seguro dizer que quase ninguém os escutou. Tímido e pouco afeito ao mundo da música, não chegou a fazer uma dezena de shows. Não há nenhum registro em vídeo de suas apresentações ou entrevistas. Foi somente após a sua morte, em 1974, aos 26 anos,que sua obra ganhou admiradores mundo afora. E este movimento passou a ter cores brasileiras no ano passado, quando nasceu o projeto “Nick Drake: Lua Rosa”.
A iniciativa – inédita no Brasil – se desdobra em ações multilinguagens. Uma delas é o Lua Rosa Sessions, série de vídeos em que artistas brasileiros criam suas versões para músicas de Nick Drake. O convidado da vez é o cantor e compositor paraense Arthur Nogueira, que interpreta a clássica “Time Has Told Me”. A canção abre o disco “Five Leaves Left”, de 1969, que completa 50 anos de seu lançamento.
Os vídeos foram dirigidos pela italiana Sara de Santis e pela brasileira Licia Arosteguy, conhecida pela direção de fotografia de clipes de Karol Conká e Aíla, dentre outros. A engenharia de gravação ficou por conta de Otavio Carvalho (indicado ao Grammy Latino em 2015), do estúdio Submarino Fantástico. Assista o registro abaixo, confira entrevista com Arthur e também o vídeo de Jan Felipe interpretando “River Man”!
Como você recebeu o convite para interpretar Nick Drake?
O convite partiu de você, que idealizou o projeto “Nick Drake: Lua Rosa”. Quando conversamos, você me disse ter gostado do meu último disco, “Rei Ninguém“. Já havia recebido o convite com alegria, mas saber disso deixou tudo ainda melhor, porque “Pra Nós”, a balada de que fecha esse álbum, eu compus no violão, pensando nas baladas do Nick Drake.
Porque escolheu “Time Has Told Me”?
A primeira canção do Nick que ouvi foi “River Man”. Foi um espanto e uma das maiores descobertas da minha adolescência, em Belém. Como “Time Has Told Me” abre o “Five Leaves Left”, essa foi a segunda composição dele que ouvi, quando fui em busca de sua obra. Até hoje, é uma das que mais ouço e gosto de tocar. Penso que podemos considerá-la uma das faixas que melhor resume o estilo de composição do Nick Drake. Está tudo lá: seu extraordinário violão, com um riff criado a partir de uma afinação específica, que se repete, porém ganha novas intenções conforme a letra se revela em versos belos e profundos.
Como você esse movimento de valorização da obra dele no Brasil?
O trabalho do Nick Drake não foi reconhecido enquanto ele estava vivo. Esse foi o maior motivo dos seus tormentos. E é sempre assim: penso que a grande aflição de um compositor, no caso, de alguém que escolhe a música como sua maior forma de expressão, é a dúvida sobre sua obra ter ou não ter lugar no mundo. O Brasil atravessa um momento sombrio, de ameaças à arte e à cultura, mas o movimento de valorização do Nick Drake, que se deve em grande medida à resistência dos envolvidos com o “Nick Drake: Lua Rosa”, é um atestado de que a obra dele encontrou seu lugar e resiste como o poema de Ovídio — em tradução de Antonio Cicero:
“Terminei obra que nem a ira de Júpiter
nem o fogo ou o ferro ou a voraz velhice
abolirão. Que chegue a hora decisiva
para o meu corpo apenas e encerre o espaço
dos meus dias: e que a melhor parte de mim
eleve muito acima dos mais altos astros,
perene, e que nosso nome seja indelével,
e que onde quer que se abra a potência de Roma
sobre as terras dominadas eu seja lido
pelo povo, e que de fama através dos séculos,
segundo os presságios dos poetas, eu viva.”
– Eduardo Lemos é jornalista e pesquisador. Estuda a obra de Nick Drake há quase uma década.
Mais um legado de Renato Russo. Talvez tenha sido quem tenha chamado a atenção a Nick Drake a partir do Stonewall Celebration Concert.