Três perguntas: Tatiana Pereira

por Marcelo Costa

No mundo hiper-conectado que vivemos, muitos os que acreditam que a Internet é um mal – do mesmo jeito que culpavam os aviões por lançarem bombas na Segunda Guerra Mundial. Mas, assim como os aviões, a Internet é uma ferramenta que pode ser usada de acordo com o que cada um deseja, para o bem e para o mal. Dessa forma, se alguns preferem criar fake news para manipular os incautos, bem, a culpa não é da Internet. Por outro lado, a Internet pode abrigar um número enorme de coisas boas, e Tatiana Pereira escolheu a web para publicar seus manuscritos em um blog, que agora chegam enfim a versão livro, “De Analgésicos & Opioides [Dos Pronomes Pessoais e Obliquos]”.

Lançado de maneira independente, o volume reúne todo o material publicado no blog www.deanalgesicoseopioides.com.br – “exceto os posts pessoais”, ela explica, “mas o livro contém muito material inédito”, avisa. Sua apresentação online adianta: “Tatiana = substantivo próprio, feminino, singular. Dizem também que é derivada do verbo irregular tatear. Às vezes doce, às vezes ácida, às vezes tudo ao mesmo tempo! Uns fazem da literatura, analgesia. Outros, euforia. Ela abusa das duas. Tatuou as pessoas de Pessoa para garantir poesia na sua caminhada. Somatiza sentimentalidades [laudo comprovado pelas crises de alergia]. É Farmacêutica Bioquímica por opção, Estrategista de Marketing por dedicação e Aprendiz de Escritora por [r]evolução”.

No bate papo abaixo, Tatinha conta o que despertou nela o desejo de escrever (um filme através de uma professora), fala de sua relação com a escrita e a posterior publicação online (“Primeiro escrevo, muito, muito, muito, e depois escolho o que vou postar no blog de acordo com o momento”, conta) e como a música e a cerveja artesanal fizeram parte do processo – com direito a três playlists no Spotify e um kit de cervejas escolhidas com cuidado que fizeram parte de um box no pré-lançamento do livro – hoje disponível para venda no site da autora (que ainda permite o download gratuito de seu Mojo Book sobre o álbum “Ocean Rain”, do Echo and The Bunnymen). Música e poesia, poesia e música. Venha conhecer!

Como a literatura, o escrever, surgiu para você? E quando você começou a perceber que, “oi, isso dá um livro”? Ou você já escrevia pensando em publicar?
Começou muito cedo, aos 9 anos, quanto a professora de redação da quarta série passou o filme “Sociedade dos Poetas Mortos” para uma sala de crianças de 9 a 10 anos. Embora não tivéssemos noção alguma de quem eram os escritores citados, saí com a sensação de que poderia ser quem eu quisesse. No mesmo dia comecei a escrever poesia – muito ruim, por sinal – e desde então nunca parei de escrever. Já o “De Analgésicos & Opioides” foi um texto que escrevi em 2005 depois de uma reflexão sobre a literatura e uma relação que nem tinha começado, mas terminou sem o cuidado que deveria. O texto eu nunca publiquei, nem no livro, porém gostei do título dele e passei a escrever várias prosas poéticas que harmonizavam com esse título, afinal, a literatura é capaz de trazer analgesia, mas também é suficiente para te dar as sensações do ópio! Foi quando surgiu o blog.

O blog De Analgésicos Opióides tem um tempo / espaço todo próprio: esse ano, por exemplo, há um texto em janeiro, outro em fevereiro, maio e junho não tiveram, como funciona na sua cabeça essa coisa maluca e ao mesmo tempo maravilhosa de escrever e decidir quando vale a pena publicar? E quanto do blog entrou no livro?
O De Analgésicos é uma versão “manuscrita” que foi sendo compartilhada no blog com a mesma lógica como os livros estão expostos na minha estante “de estar”: por ordem sentimental. Primeiro escrevo, muito, muito, muito, e depois escolho o que vou postar no blog de acordo com o momento. Tem texto que foi publicado em 2018, mas que foi escrito em 2011. Tudo acontece “offline”, o blog é apenas uma maneira de compartilhar alguma coisa. Assim, todos os textos do blog entraram no livro – exceto os posts pessoais – mas o livro contém muito material inédito, ou seja, pelo menos 60% do livro não está no blog! Agora estamos trabalhando para transformar o blog num site do livro contendo episódios de quem já leu, um mapa de onde o livro está e que ele tenha uma vida pós-lançamento.

Há muito de cultura pop nas páginas de “De Analgésicos & Opioides [Dos Pronomes Pessoais e Obliquos]” e eu sei que você também é uma grande fã de cervejas artesanais. Se você fizesse uma playlist (já fez??) com músicas ou discos ou bandas para ouvir lendo o livro, quais bandas não poderiam faltar? E quais cervejas harmonizam aqui?
Costumo dizer que o livro contém todos os sentimentos e sabores que eu já experimentei, mas que fiz ficção para que tivesse certa sobriedade. Por isso uso os pronomes e não nomes para os personagens. É uma maneira de tornar todo mundo que lê parte do livro e uma forma de emprestar as minhas referências sem tornar o livro biográfico. E daí entra a cultura pop quando cito músicas, filmes, artes plásticas e de maneira bem sutil, empresto retrogostos e notas do mundo das cervejas como adjetivos para os pronomes. O livro tem uma playlist oficial no Spotify, que reúne todas as músicas que são citadas nele e outras playlists de criação literária, que ajudam na hora de escrever. São elas “De Analgésicos & Opioides”, “Cafofo Sessions” e “Lull”. Na pré-venda do livro fizemos um box contendo o livro e um kit de cervejas da Wals. Selecionei a Dubbel, Trippel, Quadruppel, 42 Saison e a Petroleum. Nem preciso dizer que pelo teor dos capítulos, muitos deles harmonizavam com a Petroleum, mas confesso que as pessoas preferiram as notas mais suaves. Mas durante o processo de escrita as trappistas me acompanharam na maioria das vezes – são minhas prediletas, com destaque para as La Trappe e Duvel – e outras que foram frequentes e deram beleza para o que poderia ser incômodo literário, foram a Baladin Leon, a Bierland Russian Imperial Stout e a Petroleum.

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