Rock nacional no mercado das raridades

por Marcelo Costa

Os assassinos de plantão adoram vaticinar a morte dos formatos de música do mesmo jeito que outros adoram dizer que o rock morreu. Dessa forma, a fita cassete foi enterrada a sete palmos no cemitério do mercado da música ali no final dos anos 90, mas anda circulando como fantasma nos dias de hoje (e assustando muita gente). Já o vinil, chegaram a decretar a sua morte, mas ele, esperto, se entocou num canto escuro de um boteco de beira de estrada e foi ficando, ficando, ficando até alguém o convocar para ser, novamente, a estrela da noite. E ele anda brilhando cada vez mais.

Já o Compact Disc, bem, esse estão querendo assassinar já faz tempo, mais precisamente desde o começo do século, quando as redes P2P e o iPod se popularizaram, e muita gente achou que o MP3 ganharia esse combate mercadológico no primeiro round. E lá se vão uns 15 anos. Mais interessante ainda em perceber que o CD continua vivo (num mercado que se transforma regularmente e agora cultua o streaming até a próxima onda) é perceber que ele já tem itens raros, relíquias que, muitas vezes, podem custar até 50 vezes mais que um CD que está sendo lançado hoje (enquanto a mesma edição em vinil custa, muitas vezes, o preço de um CD atual… vá entender).

Isso não é novidade para os fãs de vinil, afinal, uma cópia do disco proibido de Roberto Carlos, “Louco por Você” (1961), custa atualmente a ninharia de R$ 5.950 no Mercado Livre e cerca de R$ 8.500 no Discogs – outro campeão são os volumes do “Tim Maia Racional”, edição original da Seroma,. A surpresa é descobrir que esses preços chegaram aos CDs, com uma farta coleção de raridades custando uma pequena discoteca em sites de venda. Claro, preço ofertado não quer dizer preço de venda (se a pessoa quer mais de R$ 8 mil no LP do Roberto não quer dizer que ela vá vender), mas isso sinaliza um curioso mercado de raridades, do qual, em se falando de CDs, exibe ofertas como:

 

NENHUM DE NÓS – CARDUME (1989)
Segundo disco dos gaúchos do Nenhum de Nós, “Cardume” emplacou um imenso hit (a versão de “Starman”, de David Bowie, traduzida como “Astronauta de Mármore”) e ganhou edição em CD no mesmo ano. Nunca mais relançado, há um exemplar a venda no Mercado Livre por R$ 999,99 e outro no Discogs por R$ 2,174.25. Olha na estante, porque essa poupança o Collor não confiscou…

LOBÃO – VÁRIOS DISCOS
A discografia dos anos 80 de Lobão recebeu uma tiragem pequena em 1991 e… desapareceu. Hoje, porém, é possível encontrar alguns itens iniciais do Grande Lobo em CD no Mercado Livre por preços variáveis. O álbum “O Rock Errou”, de 1986 (com os hits “Revanche”, “Noite e Dia” e “Canos Silenciosos”) custa de R$ 300 a R$ 1000. Já o CD do álbum “Cuidado” (1988) é vendido por R$ 799. Mais caro ainda é um exemplar de “Ronaldo Foi Pra Guerra” (1984), R$ 989,99. Uma pechincha.

LULU SANTOS – LULU (1986)
O disco “maldito” de Lulu Santos, muito por causa da música que fecha o disco, “Ro-Que-Se-Da-Ne”, que conta a história de um diretor de gravadora que “fuma, bebe e cheira e quer pegar no meu pau”. Talvez por essa provocação, esse disco que traz diversos grandes hits de Lulu (“Casa”, “Condição”, “Minha Vida”, “Um Pro Outro”) tenha tido uma edição em CD em 1991 e desaparecido do mercado. Mas tá baratinho (já esteve melhor cotado) para o padrão de raridades: R$ 190 (nem é tão “caro”, mas coloquei esse disco na lista porque morro de vontade de ter ele na coleção)…

KID ABELHA – TOMATE (1987)
Outro álbum que se mantém em um preço “aceitável” é o primeiro disco de estúdio do Kid Abelha sem Leoni, “Tomate”, que na época foi lançado com pompa numa capa dupla de luxo em vinil, mas nunca reeditado em CD após essa primeira edição de quase 10 anos depois, de 1996, cujo preço varia de R$ 160 a R$ 299. É o disco dos sucessos “No Meio da Rua”, “Amanhã é 23” e “Me Deixa Falar”.

HANOI HANOI – CORAÇÃO GEIGER (1992)
Esse deve ter leitor que não sabe que saiu oficialmente, mas o quarto (e último) disco do grupo do baixista Arnaldo Brandão pela EMI também é um item raro para fãs custando cerca de R$ 200 o CD usado raro.

CAPITAL INICIAL – RUA 47 (1994)
Em 1993, Dinho deixou o Capital Inicial e partiu em carreira solo. Com um novo vocalista, e tendo “Enter Sandman”, do Metallica, como norte, o grupo gravou esse álbum, “Rua 47”, que não deu em nada, mas virou um item de colecionador raro entre os fãs. Só para você ter uma ideia, a fita cassete deste disco custa R$ 280 no Mercado Livre. Já os CDs variam de R$ 570 a R$ 799! Uou!

VERTIGO – VERTIGO (1994)
Fora do Capital Inicial, Dinho Ouro Preto se aventurou num projeto grunge chamado Vertigo e o CD, que saiu pela Rock It (selo de Dado Villa-Lobos e Andre X) com distribuição da EMI, virou uma caça ao tesouro pelos fãs com preços variando entre R$ 690 e R$ 857! Esse eu tenho na estante (junto ao “Rua 47” e quase todos os próximos). Uma pequena fortuna…

JUPITER MAÇÃ – A SETIMA EFERVESCENCIA (1997)
Esse é quase um recorde: a versão em CD do clássico “A Sétima Efervescencia”, de Júpiter Apple, consegue ser mais cara que a versão em vinil duplo, linda, relançada recentemente pela Monstro Discos. Sério. A versão em CD mais em conta está na faixa dos R$ 219, mas há vendedor pedindo R$ 800 (é possível comprar quatro vinis duplos do “Sétima” com esse valor e ainda sobra para um drink).

CASCAVELETTES – ROCK’N AULA (1989)
E já que o assunto é Flávio Basso, que tal saber que há a versão em CD do disquinho lançado por eles pela EMI é um dos recordistas desta seção? Ok, é verdade, tem gente vendendo o CD por R$ 95 no Mercado Livre (e a fita cassete por R$ 200), mas há um anúncio oferecendo o CD por… R$ 4.800. O melhor é o diálogo na caixa de perguntas do site:

– Amigo vem quantos cds por este valor?
– 1
– Amigo… Acho que você errou feio no preço.
– esta tudo correto

Então, ok.

CPM 22 – A ALGUNS QUILÔMETROS DE LUGAR NENHUM (2000)
Lançado de maneira independente em 2000, o disco de estreia do CPM 22 é uma raridade. Segundo conta o texto da Wikipedia,  “o CD saiu no final de novembro, um dia antes da saída para a sua primeira turnê pelo Sul do Brasil juntamente com as bandas Lagwagon (Califórnia) e Fun People (Argentina). Levaram uma mala cheia de CDs que foram vendidos nesses shows. Em dois meses foram vendidas 4 mil cópias”. Essas cópias agora custam entre R$ 500 e R$ 1200 no Mercado Livre. Bom é o diálogo entre o vendedor e um possível interessado no site:

– Boa tarde amigo, foram produzidas quantas tiragem desse cd saberia me dizer?
– Bom dia, se não me falha a memoria apenas 2 mil, os integrantes da banda mesmo não tem o CD, só um deles que tem, conforme entrevista no Danilo Gentili a um tempo atrás, onde meu anuncio foi citado, e até então era único no site, depois surgiram o demais ok obrigado
– Sério mesmo, esse valor todo nesse álbum?
– Sim, e não sou o único a vender por este preço, mas garanto que o meu é o mais novo

RAUL SEIXAS – EU RAUL SEIXAS (1991)
Lançado pela Phillips em 1991, o show de Raul Seixas na Praia do Gonzaga, em Santos, é um item raríssimo para fãs, com só dois exemplares disponíveis no Mercado Livre, um custando R$ 3889,00 e outro, felizmente, mais barato, só R$ 3500 (e nem parece o Raul na capa, né). Mas esse é possível encontrar na Discogs por apenas R$ 200…

– Marcelo Costa (@screamyell) edita o Scream & Yell e assina a Calmantes com Champagne.

Leia também:
– 10 pérolas raras do Rock Brasil anos 80 (DeFalla, Nau, Black Future) (leia aqui)
– O rock nacional anos 80 e a Censura Federal (Blitz, Lobão, Ultraje) (leia aqui)
– Rock Brasil, 10 Discos (Legião, RPM, Ira!, Ultraje, Sepultura), 30 Anos (leia aqui)
– Assista ao documentário sobre o disco “Rock Grande do Sul, 30 Anos” (leia aqui)

 

5 thoughts on “Rock nacional no mercado das raridades

  1. Esse lance de ‘raridade’ perdeu o rumo. Todo mundo acha que tem uma raridade em casa e bota preços ridículos nos itens. Até aí tudo bem, ‘faz o que tu queres pois é tudo da lei’.

    O problema não é quem vende, o problema é quem compra. Se uma cópia num preços desse vende…

    Agora, em contrapartida, cds de bandas conhecidas custam cada vez mais barato e pra quem está começando uma coleção ou pra quem ainda não tem títulos conhecidos o melhor momento é agora. Faz um ano que compro CDs direto de vendedores ingleses e primeiras edições de bandas como Oasis, Cardigans, Supergrass, Ash, e muitos outros não custam mais de 1 Euro cada no Discogs.

  2. O formato de cd já está morto! O que não é ruim, agora temos plataformas digitais! Acabou o monopólio de gravadora multinacional no mercado. Se o rock nacional está em baixa, a culpa é das gravadoras que instituíram o Jabá no Brasil, que nada mais é do que uma corrupção. Só entrava na programação de rádio, artistas de catálogo dessas gravadoras. Estão colhendo o que plantaram! Mataram a música brasileira.

  3. Nos últimos 6 ou 7 anos resolvi correr atrás dos discos de bandas independentes nacionais que sempre escutei mas não havia tomado vergonha na cara de comprar. Confesso que ao mesmo tempo que rola uma grande satisfação em achar aquele disco que está a tanto tempo fora de catálogo, existe um estresse muito grande por conta deste pseudo mercado de raridades.
    Infelizmente muita gente se aproveita disto para abusar nos preços, seja no Mercado Livre, seja na Galeria do Rock e as vezes até as próprias bandas e selos que lançam os discos.

    Felizmente, a maioria da minha coleção consegui por preços que cabiam no meu bolso mas deu trabalho. Agora, esse caso do CPM22 é uma piada.

  4. E o clássico “Monstro” do Okotô que chega a custar 953 fucking bestanaros? Se rolar parte II, avisa

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