Balanço: Lollapalooza 2018

texto por Marcelo Costa
fotos Equipe MRossi / Divulgação

Com 72 atrações divididas em quatro palcos durante três dias e a maratona começando por volta das 11h45 e terminando ali pelas 23h, quase 12 horas ininterruptas de programação de shows em palcos tão distantes um do outro que valiam ao menos por um mês de academia, o Lollapalooza Brasil 2018 festejou três dias sold out de sua 7ª edição somando 300 mil pessoas no total do fim de semana (a sexta esgotou os ingressos durante o evento, enquanto o sábado e o domingo estavam esgotados semanas antes). Musicalmente e estruturalmente, o saldo foi bastante positivo numa das melhores edições do festival no Brasil até agora.

Ainda que com que headliners recauchutados (The Killers e Pearl Jam encabeçaram a edição de 2013, ainda no Jóquei, e, mesmo estreando à frente do evento, o Red Hot Chilli Peppers já é figurinha carimbada no Rock in Rio), a programação vasta trouxe boas surpresas para os mais variados tipos de fãs. Problemas de organização como os de 2017, que causaram filas enormes nos bares, foram sanados com sabedoria nesta edição com uma oferta ainda maior de áreas para alimentação e bebida, e as pulseiras eletrônicas deram certo. No quesito merchandising, a área do antigo “Chef’s Stage” foi transformada em uma imensa megastore. Ficou bacana.

Marcos Bragatto (Rock em Geral), Marcelo Costa (Scream & Yell) e Rodrigo James (Esquema Novo) falam do Lolla 2018

O grande acerto desta edição, porém, foi o deslocamento do palco eletrônico (que ficava atrás da Chef´s Stage anteriormente, e onde ficou alocada o local nesta edição) para a entrada do evento (onde, em anos anteriores, se apresentaram Lorde e BaianaSystem) e este primeiro palco para uma nova localização, próximo ao palco mais distante no autódromo (sim, aquele lá no fim do mundo). Ou seja, o palco eletrônico ganhou mais visibilidade, e área final do evento ganhou dois palcos que alternavam programação (quando acabava o show em um, começava no outro) e se tornou um dos locais mais movimentados do Lollapalooza 2018.

Como é impossível ver tudo sozinho, a cobertura do Scream & Yell ficará focada em três destaques por dia: no primeiro foi possível conferir quase a integra da grande apresentação de Rincon Sapiência e bocejar em algumas músicas do RHCP (cuja guitarra soava inaudível) e Mac DeMarco (uma piada sem nenhuma graça). No sábado foi possível sacar de longe o bom show do O Terno e fugir correndo do Imagine Dragons. Já no domingo, a voz de Lana Del Rey foi encoberta pelo coral dos fãs, e fica a dúvida se ela cantou mesmo ou se foi playback (não deu nem para perceber, porque estava impossível ouvir sua voz), mas que ela sensualizou horrores, isso ela fez. Abaixo os nove destaques do festival para o editor do Scream & Yell.

SPOON
Da formação indie poderosa que pariu “Ga Ga Ga Ga Ga” em 2007 e fez um show arrebatador no Festival Planeta Terra, na Vila dos Galpões, em 2008, sobrou pouco nos discos e shows seguintes do Spoon (e isso tanto no Primavera Sound quanto no Popload Festival), mas eis que os demônios do rock and roll atiçaram Britt Daniel e, ancorados no excelente disco lançado em 2017, “Hot Thoughts” (presente na lista de Melhores do Ano do Scream & Yell), o grupo fez um baita show no palco principal do Lolla. Foram só 13 canções (a ausência de “You Got Yr. Cherry Bomb” foi sentida), mas tocadas com vontade e arranjos fortes que conquistaram a imensa plateia presente desde às 4h20 para vê-los. Showzão!

ROYAL BLOOD
Muita gente adora matar o rock a toda moda do momento, e se depender do duo Royal Blood, essa pessoa está fudida. Sério. O que Mike Kerr (baixo e voz) e Ben Thatcher (bateria) fizeram no Lollapalooza Brasil merece ser estudado. Aposentando a guitarra, Mike dominou uma imensa plateia urrando canções barulhentas enquanto seu parceiro massacrava o kit de bateria e as rodas de pogo se multiplicavam. Mike aproveitou para elogiar o Cine Joia (onde a banda tinha feito um show ainda mais violento na noite anterior) e dizer, galhofento, que o melhor lugar do momento para se estar naquele momento era ali, no Lollapalooza. Cerca de 15 mil pessoas (talvez mais) concordaram. Viva o rock and roll no grande show de todo o fim de semana.

LCD SOUNDSYSTEM
Após uma grande apresentação extra (e gratuita) armada neste mesmo palco do Lollapalooza um dia antes do evento (na quinta-feira), o LCD Soundsystem retornou na sexta-feira com um set list mais robusto (13 canções contra as 9 do dia interior) e uma apresentação surpreendentemente ainda melhor. Comandado por um lacônico James Murphy nos vocais e acompanhado por mais sete amigos (entre bateria, guitarra, baixo, programação, xilofone, percussão e um milhão de transistores e valvulados espalhados pelo espaço), o LCD chegou chutando a porta com “Daft Punk Is Playing at My House” logo na abertura e não deixou a peteca cair um segundo sequer do show. A versão de “All My Friends” foi uma das coisas mais lindas desta edição do Lollapalooza Brasil. Manteve o alto padrão daquele show inesquecível de 2011.

DAVID BYRNE
Com uma presença massiva de teens no evento, o show da lenda David Byrne deve ter deixado muito fã de Oh Wonder, Lana Del Rey e Imagine Dragons com uma interrogação na testa, confusão que só seria amplificada pelo ex-Talking Heads, que adentrou ao palco (belamente coreografado no formato caixote) sozinho, de chinelos e terno cinza, para sentar-se numa cadeira e, tal qual um personagem de Shakespeare, cantar com um cérebro nas mãos. Assim que os integrantes da banda adentraram o local, ninguém conseguiu ficar parado nem conter o sorriso com aquele homem grisalho disparando hinos de sua ex-banda do quilate “I Zimbra”, “This Must Be the Place”, “Once in a Lifetime” e, claro, “Burning Down the House” no show mais delicioso de curtir do Lolla 2018.

THE NATIONAL
Pessoalmente, gostava muito mais deles quando os vi em 2008 na Bélgica (no Rock Werchter) e na Espanha (no FIB). Era a fase “Boxer” e a banda ainda não tinha enveredado perigosamente pelo jeitão Coldplay de fazer hits (explorado bastante em “High Violet”, de 2010), mas dai Matt Berninger enfio o pé num lodo depressivo nos dois discos seguintes e o The National voltou a ser um grupo a ser levado a sério praticando um rock sombrio entremeado por guitarradas e muita melancolia. Eleitor de Barack Obama, Matt criticou o momento de merda pelo qual passa os Estados Unidos, e contemporizou: Vocês todos são mais jovens que eu. Vamos consertar isso”. “Fake Empire” surgiu poderosa e “Mr. November” ainda impressiona. O show no Circo Voador deve ter sido ainda melhor. Esse leva o prêmio de show mais doloroso do Lolla 2018.

PEARL JAM
No Twitter, comentei que essa quarta turnê da turma de Eddie Vedder no país manteve o alto padrão de qualidade das apresentações anteriores, mas foi um tiquinho inferior a de 2013 que havia sido inferior ao de 2011 que havia sido inferior a de 2005, o melhor de todos os shows deles no país. Amigos corrigiram: “Esse show foi bem melhor que o de 2013”. Confio neles. Ali no palco principal, a sensação é de que a banda estava mais leve, não tão focada, mas se divertindo muito num show com sete músicas do milionário “Ten” (1991) e covers óbvias (“Comfortably Numb” e “Baba O’Riley”), indicando que essa seria uma noite para o povão das FMs, mas também quatro raridades da coletânea “Lost Dogs” (2003) e covers não óbvias (“Mountain Song” com Perry Farrel e “Pulled Up”, do Talking Heads, em declaração apaixonada a David Byrne), presenteando os fãs mais antigos. Com o Pearl Jam não tem erro: sempre será showzão.

METRONOMY
Sentindo na pele a difícil tarefa de tocar no meio da tarde debaixo de um sol escaldante (algo que 90% dos grupos brasileiros é escalado a fazer todo ano) e sem o apoio das luzes, que poderiam ajudar na vibe dançante do repertório do grupo, o Metronomy fez um show contido, mas interessante, que destacou muito mais a presença carismática da baterista Anna Prior (que chegou a assumir o microfone em “Everything Goes My Way” e desejar “boa sorte na Copa” ao Brasil) do que a do líder Joseph Mount, que fez tudo sozinho no último disco, “Summer 08”, de 2016. No final, a plateia comprou a ideia dançante do quinteto, mas a sensação é de que esse show funciona mais à noite e num local fechado.

LIAM GALLAGHER
Depois de abandonar o palco após quatro canções no Lolla Chile alegando doença e cancelar uma Lolla Partie na quarta-feira em São Paulo, Liam subiu ao palco do Lolla Brasil primeiro na quinta-feira para mostrar que estava recuperado. A diferença entre este show (9 canções) e o de domingo (12) foi que o segundo teve mais números da carreira solo, o que, por fim, acaba diminuindo o impacto da apresentação – ainda que “Wall of Glass” e “For What It’s Worth” sejam grandes hits. A voz já era e Liam canta gritando sem nenhuma melodia qualquer canção, e tanto “Wonderwall” quanto “Supersonic” recebem o mesmo tratamento vocal. Porém, quem somos nós para reclamarmos de clássicos do Oasis no repertório, né mesmo. Ainda que com a voz fudida, o show de Liam foi 10 quilômetros melhor que aquela apresentação modorrenta do Beady Eye num Festival Planeta Terra. Cuide-se, Liam.

THE KILLERS
Encerrando o Lollapalooza Brasil 2018, o Killers montou uma boa forma invejável despejando hits, bom humor e até recebendo Liam Gallagher no palco – ele não cantou, só entrou de fininho para assustar Brandon Flowers e trocar cumprimentos. Tudo aquilo que faz do Killers ser o que eles são esteve presente no palco principal do Lolla: a breguice jeca sem tamanho, a afetação, os hits chicletes, está tudo ali. “The Man”, um dos singles do álbum sério recente “Wonderful Wonderful” (2017), abriu a noite, mas logo vieram hits que são impossíveis de não cantar, pular e dançar: “Somebody Told Me”, “Smile Like You Mean It”, “Human”, “Read My Mind”, “All These Things That I’ve Done”, “When You Were Young” e, encerrando, “Mr. Brightside”. Segundo Brandon, “demoramos 5 anos para voltar. Da próxima vez, não vamos demorar tanto”. Será? No fim, um bom show que casou com a festa de fogos do final do dia. Mais Las Vegas que isso, impossível.

– Marcelo Costa (@screamyell) edita o Scream & Yell e assina a Calmantes com Champagne

5 thoughts on “Balanço: Lollapalooza 2018

  1. Realmente o show do The Killers foi excelente e a cara do Flowers quando viu o Lian Galagher no palco foi impágavel. Senti falta das críticas das atrações nacionais, principalmente do Mano Brown que para mim foi um dos melhores shows do festival. E bota implicância com o Imagine Dragons, hein…vocês críticos sempre batem na tecla que o rock não se renova, que festival só tem velharia aí uma banda nova , que com 3 discos já faz show só com hits, leva uma multidão digna de headliner (os outros palcos foram esvaziados na hora do show do ID) e fazem um puta show são tratados com descaso e desprezo…

  2. Vi esse PJ pela TV, então minha opinião tá longe de ser acurada, mas o que vi na telinha estava bem melhor do que aquilo que eu vi no Jockey em 2013 – o show foi mais “chapa branca” e “classic rock” (no mau sentido) do PJ que já vi.

  3. concordo com o Leo Vinhas

    eu estava na grade do Jockey em 2013 e vi pela TV em 2018 e achei o show que vi no sofá infinitamente melhor

  4. Aliás, vi em 2013 no Jockey e vi no Parque O’Higgins também… o show nos nossos vizinhos conseguiu ser ainda pior, depois daquela noite prometi à mim mesmo que não veria mais um show do Pearl Jam [já tinha visto um show espetacular em 2011], tanto que vou agora ver o segundo show solo do Vedder e deixei de ir nas tours de 2015 e desse ano

  5. Por favor fan dessas duas bandas não levem para o lado pessoal, mas sinceramente ( opinião minha ), The Killers e uma das bandas mais subestimadas desse século, talvez pelo fato de agradar mais a critica inglesa do que a americana além do enorme sucesso de público mas no geral acho a banda bem genérica.
    Já o Imagine Dragons, parece uma banda concebida por publicitários indie, pop, dançante de arena.
    Mano Brown fez um ótimo show, gostei também da simpatia e o talento do Anderson Paak na bateria.

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