Três séries: “Manhunt: Unabomber”, “Deuses Americanos”, “Na Rota do Dinheiro Sujo”

“Manhunt: Unabomber”, de Andrew Sodroski (2017, Discovery)
Texto por Adriano Costa
Entre 1978 e 1995, Ted Kaczynski (Paul Bettany) espalhou terror nos EUA com bombas enviadas por via postal. Para expor ideias e inconformidade com o rumo que a sociedade estava tomando, Ted matou três pessoas e feriu outras 23. Conhecido como Unabomber, ele foi uma pedra e tanto no sapato do FBI até finalmente ser preso em 1995 devido a uma nova técnica de investigação chamada linguística forense, baseada em cartas fornecidas pelo irmão depois que leu um manifesto publicado nos jornais. Essa técnica foi criada meio na marra e na necessidade pelo agente Jim Fitzgerald (Sam Worthington), especializado em criar perfis de criminosos. Andrew Sodroski aproveitou a onda de produções sobre crimes reais na televisão e criou pelo canal Discovery “Manhunt: Unabomber” que estreou em 2017 e está disponível no Netflix. Não confundir com “Mindhunter”, que apesar de ter o mesmo teor em linhas gerais, caminha com outra pegada, outro ritmo e outros objetivos. Como é uma produção do Discovery, os oito episódios têm um ar de documentário inerente, contudo passa longe daquelas produções horríveis feitas para a TV em outras épocas. Tudo nela é pensado com cuidado e as atuações são competentes, mesmo sem ser brilhantes. Situada principalmente nos anos de 1995 e 1997, quando Jim Fitzgerald entra na força-tarefa e precisa provar a todo momento que aquilo que percebe é válido quando todos dizem o contrário, “Manhunt: Unabomber” tem a capacidade de prender na frente da tela, apesar de já se saber o final. Explorando a conexão do agente do FBI com os questionamentos feitos por Kaczynski no manifesto a série mergulha em águas mais profundas, porque apesar da maneira brutal e covarde que foi usada para propagá-lo, o texto traz pontos interessantes, ainda mais em tempos como o nosso onde a tecnologia é cada vez mais senhora de tudo.

Nota: 7,5

“Deuses Americanos”, de Bryan Fuller e Michael Green (2017, Starz)
Texto por Adriano Costa
“Deuses Americanos” (American Gods) é a obra mais completa do britânico Neil Gaiman na literatura. Publicada em 2001, o livro teve edições nacionais no decorrer dos anos, inclusive uma excelente “edição preferida do autor” em 2016 pela Intrínseca. Versando sobre a formação dos EUA e usando os deuses e lendas que os milhões de imigrantes trouxeram nos corações e bolsos, Gaiman criou um trabalho repleto de nuances como a relação do país com seus formadores, o combate do velho contra o novo e a maneira que esse novo molda a sociedade, entre outras coisas. Mesclando realidade e fantasia como poucos sabem fazer – além do peculiar humor – era difícil imaginar como transportar isso para a televisão quando foi anunciada uma série sobre o livro. Produzida pelo canal Starz e criada por Bryan Fuller (de “Hannibal”) e Michael Green (roteirista de “Logan” e “Blade Runner 2049”) com Gaiman participando ativamente do processo, a série é um acerto fenomenal. Disponível no Brasil na Amazon Prime Video, a primeira temporada tem oito episódios e direção precisa de nomes como David Slade (“30 Dias de Noite”) e Floria Sigismondi (“The Runaways”). A história tem como protagonista Shadow Moon (Ricky Whittle) que, prestes a sair da cadeia, descobre que a esposa Laura (Emily Browning) faleceu. Na sequência é abordado pelo misterioso e intrigante Mr. Wednesday (Ian McShane) que após dura negociação o convence a trabalhar para ele. No decorrer disso, Shadow se vê inserido em algo que não passa nem perto de entender e conhece estranhas figuras. Na briga dos deuses antigos contra os novos (como tecnologia, internet, etc.), “American Gods” reluz a cada momento, a cada cena. Também merecem destaque a entidade irlandesa conhecida como Mad Sweeney (Pablo Schreiber) e Gillian Anderson estupenda como a deusa moderna Media, onde é responsável pela melhor cena do ano vestida de Marilyn Monroe.

Nota: 9

“Na Rota do Dinheiro Sujo”, de Alex Gibney (2018, Netflix)
Texto por Marcelo Costa
Presente entre os documentários indicados ao Oscar 2018, “Abacus: Pequeno o Bastante para Condenar” foca num pequeno banco de Nova York acusado de fraude hipotecária. O banco conseguiu provar sua inocência, mas a história lança luz sobre como grandes culpados da crise de 2008 (Goldman Sachs, Merrill Lynch, Citigroup, JPMorgan) não foram punidos, sequer acusados. Na esteira do tema, a Netflix disponibilizou em janeiro os seis episódios da série documental “Dirty Money”, que joga mais lenha na fogueira. Dirigido por Alex Gibney, Oscar de Melhor Documentário em 2007 por “Um Táxi para a Escuridão” (sobre as violações constitucionais e de direitos humanos do governo Bush com base no homicídio de um inocente taxista), “Dirty Money” descreve casos de corrupção organizada, algo que se assemelha ao crime organizado, motivadas pelo capitalismo selvagem, porém, praticadas por grandes empresas (e pessoas) como Volkswagen, HSBC, a farmacêutica Valeant e Donald Trump. Com forte potencial de embrulhar o estômago do espectador, “Na Rota do Dinheiro Sujo” mostra como a Volkswagen criou um software para driblar testes de poluição colocando carros que poluem 40 vezes mais nas ruas; como o banco HSBC vem continuamente burlando o sistema e aceitando (lavando) dinheiro sujo do tráfico mexicano (que matou mais de 100 mil pessoas nos últimos 10 anos); como profissionais de má índole tornaram o mercado farmacêutico “lucrativo” demitindo cientistas e aumentando de R$ 30 para R$ 700 o preço do mesmo medicamento; como Trump construiu seu império de castelo de cartas ancorado na imagem, na fortuna do pai e em práticas desonestas além de utilizar a Casa Branca em beneficio de sua marca; entre outros. Uma constante: a maioria dos acusados (HSBC, Volkswagen, Trump, Valeant) segue no mercado praticando o mesmo crime, afinal, no capitalismo selvagem, se você é pobre e é pego com 10 gramas de maconha, você é preso; se você é rico (e filho de desembargador) e é pego com mais de 100 quilos de maconha (ou um helicoca), você posa para foto e mostra no grupo do Whatsapp pros amigos tirando sarro da Justiça. “Na Rota do Dinheiro Sujo” escancara o que eu, você, nós, todo mundo precisamos saber para que possamos decidir em quem podemos confiar no mercado. Não é muita gente, mas estas pessoas, estas empresas, abrem a lista. É só o começo. Que venha a segunda temporada.

Nota: 9

– Marcelo Costa (@screamyell) edita o Scream & Yell e assina a Calmantes com Champagne
– Adriano Mello Costa assina o blog de cultura Coisa Pop: http://coisapop.blogspot.com.br

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