Boteco: 12 cervejas dos EUA

por Marcelo Costa

Começando uma sequencia de cervejas dos Estados Unidos pela linha Hop IPA da Rogue, de Newport, no Oregon, que já havia passado por aqui com as versões 7 e 8 Hop IPA, e agora retorna com a 4 Hop IPA, uma Session com quatro lúpulos produzidos na própria fazenda da Rogue: Farms Rebel, Freedom, Yaquina e Alluvial Hop além de seis maltes próprios. Com uma bela coloração laranja e creme bege clarinho de ótima formação e longa retenção. No nariz, bastante frutado (mamão, maracujá, grapefruit) sugerindo cítrico e doçura além de herbal (pinho) sobre uma base doce que sugere caramelo. Na boca, caramelo e maracujá chegam juntos no primeiro toque, mas logo depois a doçura é encoberta por frutado e herbal, que se destacam. A textura é suavemente picante e terrosa. Já o amargor de 55 IBUs é marcante, mas limpo e saboroso. Dai pra frente surge um conjunto bem gostoso, com frutado, herbal e doçura bem combinados. No final, amarguinho herbal. No retrogosto, maracujá, grapefruit, pinho e caramelo. Boa.

Do Oregon para o extremo nordeste dos EUA, mais precisamente Portland, no Maine, com mais uma Shipyard a marcar presença por aqui, desta vez a Island Time, uma Session IPA que foi produzida pela primeira vez em abril de 2016 e cuja receita utiliza dois lúpulos made in USA (Amarillo e Simcoe) mais os maltes Pale e Carafoam. De coloração alaranjada mais clara que a Rogue 4 Hop IPA, a Shipyard Island Time exibe um creme branco de ótima formação e longa retenção. No nariz, notas cítricas puxadas para limão e uva verde com leve presença herbal trazendo algo de grama e pinho sobre uma base de malte que remete a biscoito. Na boca, a textura é seca e picante. O primeiro toque traz frisância e herbal que se abrem, na sequencia, em notas cítricas (casca de limão e uva verde) e herbais (pinho e grama). O amargor (40 IBUs) é suave, mas ganha certo impacto com a presença de acidez, suave, mas perceptível. Dai pra frente, um conjunto interessante, que segue na pegada do limão prometendo refrescância até o final, amarguinho e cítrico. No retrogosto, mais casca de limão. Interessante.

Do Maine para a capital do Illinois, Chicago, com mais uma cerveja da brilhante Goose Island a marcar presença por aqui, Gillian, que integra a linha badalada de Sours da casa (que ainda traz a Lolita, Juliet, Halia e Madame Rose), geralmente envelhecidas em velhas barricas que antes abrigaram vinho. No caso da Gillian, cuja base assim como da Halia é uma Farmhouse Ale, ainda há adição de morango, pimenta branca e mel. O resultado (apresentado em garrafas de 750 ml) é uma cerveja de coloração amarela turva, totalmente juicy, como um suco de manga ou cajá. O creme é branco com leve traço bege, mas não há muito tempo para observa-lo, já que a formação se desfaz rapidamente. No nariz, uma confusão maravilhosa de aromas funky: mel, morango, campo, curral, pimento do reino, vinificação e madeira. Na boca, curral, acidez e azedume juntos no primeiro toque podem assustar desavisados, mas há morango, cítrico e doçura na sequencia, tentando equilibrar a aridez sensacional do conjunto. A textura é arisca e a preocupação com o amargor é dispensável, já que há tanta coisa provocante aqui que não será isso a te “assustar”. Dai pra frente, uma cerveja ao menos tempo arisca e aconchegante, que finaliza de maneira frutada (e levemente azeda). No retrogosto, cítrico, azedume, acidez e uma constelação de corações. Sério, essa cerveja é foda.

De Chicago para de Louisville, Kentucky, com a segunda Against The Grain a marca presença por aqui: a primeira foi a The Brown Note e agora é a vez da Double Balling, uma American Barley Wine cuja receita une os maltes Maris Otter e Caramel com os lúpulos ingleses Nugget e Kent Goldings. O resultado matura três meses em velhos barris de Bourbon Angel’s Envy. Na taça, uma cerveja de coloração âmbar acastanhada levemente turva exibe um creme bege de ótima formação e retenção para o estilo (e para os 12.5% de álcool). No nariz, caramelo, Bourbon, coco e madeira são as primeiras notas que se percebe numa paleta aromática que ainda traz, de maneira secundaria, mapple syrup e baunilha. Na boca, caramelo e Bourbon aparecem logo no primeiro toque. Na sequencia, coco, madeira e álcool, de maneira suave. A textura é melada, licorosa e potentemente alcoólica. Dai pra frente surge um conjunto muito caprichado, que combina bem a maturação em velhos barris de Bourbon com a pegada Barley Wine da receita. O final é caramelado e picante. No retrogosto, mais caramelo e picância alcoólica. Suaves. Muito boa!

Estreando no Scream & Yell, de Saint Petersburg, na Florida, a primeira cerveja da 3 Daughters Brewing Company a pintar por aqui: Bimini Twist IPA, uma American India Pale Ale de 7% de graduação alcoólica e 72 IBUs. De coloração ambar alaranjada com creme branco de excelente formação e longa retenção, a 3 Daughters Bimini Twist IPA exibe um aroma com marcante resina dividindo a atenção do bebedor com notas cítricas (maracujá distante), herbais (pinho) e terrosas sobre uma base suave de malte. Na boca, doçura caramelada no primeiro toque seguida de herbal mais intenso do que cítrico e, depois, resina suave e um amargor bastante potente, mas que não parece ser de 72 IBUs (50 talvez?). A textura é suave com leve picancia enquanto o conjunto se baliza entre o frutado (grapefruit) e herbal (pinho) de um lado com a doçura caramelada do outro, com a resina batendo levamente. O final é amarguinho e herbal. No retrogosto, grapefruit, resina suave e pinho. Uma boa Old American IPA.

A 11ª cerveja da Anchor, de São Francisco, na Califórnia, a passar por aqui, é uma American IPA produzida pela primeira vez em 2017 e cuja receita une malte 2 Row Pale com os lúpulos Citra, Bravo, Ekuanot e Denali mas adição de amoras na fermentação secundária. O resultado é uma cerveja de coloração âmbar turva suavemente avermelhada com creme bege claro de excelente formação e média alta retenção. No nariz, a Anchor Blackberry Daze IPA traz caramelo, amora, minerais e terroso oferecendo um conjunto interessante, mas que funciona apenas como um bloco único de aromas, e não como uma paleta aromática em que se identifica com facilidade cada um dos ingredientes (é até um pouco difícil separar uns dos outros). Na boca, a mesma sensação de confusão é apresentada no primeiro toque, em que nenhum ingrediente se destaca, porém, na sequencia, a amora passa a dominar todo o conjunto de maneira suave. A textura e levemente picante e cremosa enquanto o amargor (50 IBUs que soam 35, máximo 40) é discreto. Dai pra frente, uma cerveja provocante, com a amora se envolvendo com os lúpulos. O final é suave com um tiquinho de amargor. No retrogosto, amora, caramelo, minerais e terroso.

Da Califórnia para Longmont, no Colorado, casa da Oskar Blues Brewery, com a sétima cerveja deles a passar por aqui (conheça as anteriores), uma IPA com malte Barley, trigo vermelho e um blend de cinco lúpulos: Enigma, Vic Secret, Ella, Topaz e Galaxy. De coloração dourada cristalina com creme branco de boa formação e média retenção, a Oskar Blues IPA apresenta um aroma com notas cítricas (maracujá, abacaxi e grapefruit) e herbais (pinho) em destaque sobre uma camada bastante suave de caramelo. Na boca, o primeiro toque traz cítrico e herbal deliciosos (pinho e grapefruit dando o rumo) com leve doçura caramelada. A textura é suave, quase cremosa, e os 70 IBUs do amargor chegam limpos, nada agressivos, abrindo as portas para um conjunto bastante saboroso, intensamente lupulado, medianamente amargo e muito refrescante. O final é cítrico e amarguinho. No retrogosto, pinho, grapefruit e amargor suave. Boa.

Retornando para a Califórnia, desta vez para Escondido, cidade que abriga a Stone Brewing, que retorna ao site com a Ghost Hammer, uma IPA que utiliza o novo lúpulo Loral, que agora aparece denominado – até o ano passado era conhecido pelo código HBC 291, que, inclusive, foi usado na Duvel Tripel Hop 2016. De coloração dourada levemente turva com creme branco de ótima formação e longa retenção, a Stone Ghost Hammer exibe um aroma floral, herbal (erva doce, pinho) e levemente frutado(melão e limão) sobre uma base doce de caramelo com leve toque de especiarias (pimenta branca). Na boca, bastante herbal no primeiro toque (erva doce e leve erva cidreira) salpicado com pinho e doçura cítrica. Na sequencia, doçura suave e um leve amargor, 56 IBUs bem comportados. A textura é suave, quase cremoso, com leve picância num conjunto bastante agradável, com um lúpulo bem interessante e diferente. O final é herbal e amarguinho. No retrogosto, chá de ervas, cítrico discreto e amargor pontual. Boa.

De Escondido para San Diego com a primeira cerveja da Alpine Beer (que produz suas receitas na fábrica da Green Flash) a passar por aqui: Willy Vanilly, uma Wheat Ale que recebe adição de baunilha. De coloração dourada com creme branco de boa formação e média permanência, a Alpine Willy Vanilly exibe um aroma com baunilha saltando para fora da taça e contagiando o ambiente – sabe Amandita, aquele wafer recheado da Lacta? Aquele cheiro – e se sobrepondo a tudo. Na boca, novamente predomínio de baunilha, que domina o primeiro toque, a segundo e a sequencia até que no final abra a guarda pra deixar perceber leve presença de trigo e pão. A textura é leve e cogitar amargor aqui é quase piada: sério, é uma Amandita líquida! O final é doce, com chocolate ao leite e baunilha se unindo a trigo e pão fresco. No retrogosto, pão fresco e Amandita. Gostei bastante!

De Chico, uma cidade californiana de 90 mil habitantes próxima de Sacramento, surge a Sierra Nevada, que já passou por aqui com a Hop Hunter, Pale AleOktoberfestTorpedo, Otra Vez e Kellerweiss, e retorna agora com seu sétimo rótulo: Sidecar, uma American Pale Ale que une os lúpulos Cascade, Equinox e Mandarina com adição de casca de laranja. O resultado é uma cerveja de coloração alaranjada escura com creme branco de excelente formação e retenção. No nariz, laranja e tangerina se destacam sobre uma suave base maltada que sugere caramelo e biscoito. Na boca, domínio cítrico (tangerina, laranja e toranja) no primeiro toque seguido de bastante herbal (pinho intenso) e amargor baixo e envolvente (35 IBUs). A textura é seca e levemente picante. O conjunto honra o estilo APA, com suavidade maltada, um belo perfil cítrico com toque herbal e um amargor bastante leve. O final é… toranja. No retrogosto, amargor suave, toranja e pinho. Boa!

De Healdsburg, no condado californiano de Sonoma, a terceira Bear Republic a passar por este espaço (as duas anteriores foram a Hop Rod Rye e a Big Bear Black Stout) é o carro chefe da cervejaria: Racer 5, uma belíssima Old American IPA que combina os lúpulos Chinook, Cascade, Columbus e Centennial com os maltes Pale e Crystal e um pouquinho de trigo. De coloração alaranjada com um creme espesso e branco de excelente formação e longa retenção, a Bear Republic Racer 5 apresenta um aroma notadamente lupulado com notas cítricas (grapefruit) e herbais (pinho) flutuando sobre uma base de mel e caramelo. Na boca, uma reprise perfeita do que o aroma adiante com toranja e leve doçura no primeiro toque seguida de herbal (pinho), leve resina e um amargor deliciosa, 75 IBUs que passeiam sobre a língua e vão morrer lá no fundo da garganta. A textura é picante e cremosa enquanto o conjunto prima pelo equilíbrio, que combina toranja, pinho, mel, caramelo, doçura e amargor, caprichadamente. O final é cítrico e amarguinho. No retrogosto, resina discreta, toranja, pinho e felicidade IPA. Baita!

Encerrando o passeio pelos EUA por Stowe, em Vermont, estado que abriga a The Alchemist, famosa por suas IPAs inovadoras Heady Topper e Focal Banger, mas que aqui marca presença com a Luscious, uma English Imperial Stout de coloração marrom quase preta com creme bege escuro de boa formação e média retenção. No nariz, muito chocolate derivado da torrefação exprimindo doçura e um sútil amargor são os destaques num primeiro momento. Com calma, e conforme a cerveja aquece na taça, pode-se perceber também baunilha, café, fumaça e leve alcaçuz. Na boca, doçura de chocolate ao leite no primeiro toque que vai ganhando tons de chocolate amargo na sequencia aliado a alcaçuz, suave percepção alcoólica, baunilha e café. A textura é levemente licorosa e o amargor, potente, mas aconchegante num conjunto soberbo, que em nenhum momento soa agressivo, mas, sim, convidativo. O final é macio, com amargor suave e herbal. No retrogosto, chocolate (ao leite e amargo), baunilha e café. Sensacional.

Balanço
Abrindo a série com a Rogue 4 Hop IPA, que é uma delicinha frutada e herbal, que não alcança o brilho da 7, mas bate a 8, fácil . Já a Shipyard Island Time surpreendeu por trazer bastante limão num conjunto bem refrescante. Absolutamente apaixonante, a Goose Island Gillian é daquelas cervejas que eu amaria ter engradados dela separados em casa. Beberia o resto da vida, feliz. Um pouco abaixo, mas ainda assim sensacional, a Against The Grain London Balling é uma baita American Barley Wine com álcool lá em cima, mas um conjunto arrebatador. Já a 3 Daughters Bimini Twist IPA é uma boa Old American IPA, com resina destacada enquanto a Anchor Blackberry Daze IPA soa estranha no início, mas se aconchega, com a amora buscando um espaço pra chamar de seu. A Oskar Blues IPA manteve o nível das anteriores da cervejaria que passaram por aqui numa boa India Pale Ale de amargor limpo e muito frutado cítrico e herbal. A Stone Ghost Hammer IPA se apoio na diferença do lúpulo Loral para criar seu perfil, e consegue um resultado arrebatador. A Alpine Willy Vanilly é uma Amandita (aquele bombom wafer da Lacta) liquida. Uma delicia. Já a Sierra Nevada Sidecar é uma APA caprichada, com bastante laranja, tangerina e toranja, e pouco amargor. Um clássico da Bear Republic, a Racer 5 consegue é uma Old American IPA sensacional, com amargor marcante, textura suave, doçura presente e bastante cítrico e herbal. Incrivel. Fechando com a The Alchemist Luscious, uma RIS macia, convidativa e deliciosa. Amor.

Rogue 4 Hop IPA
– Produto: Session IPA
– Nacionalidade: EUA
– Graduação alcoólica: 4.44%
– Nota: 3,41/5

Shipyard Island Time
– Produto: Session IPA
– Nacionalidade: EUA
– Graduação alcoólica: 4.5%
– Nota: 3,31/5

Goose Island Gillian
– Produto: Sour
– Nacionalidade: EUA
– Graduação alcoólica: 8.6%
– Nota: 4,16/5

Against The Grain Double Balling
– Produto: American Barley Wine
– Nacionalidade: EUA
– Graduação alcoólica: 12.5%
– Nota: 3,96/5

3 Daughters Bimini Twist IPA
– Produto: American IPA
– Nacionalidade: EUA
– Graduação alcoólica: 7%
– Nota: 3,29/5

Anchor Blackberry Daze IPA
– Produto: American IPA
– Nacionalidade: EUA
– Graduação alcoólica: 6.5%
– Nota: 3,25/5

Oskar Blues IPA
– Produto: American IPA
– Nacionalidade: EUA
– Graduação alcoólica: 6.43%
– Nota: 3,39/5

Stone Ghost Hammer
– Produto: American IPA
– Nacionalidade: EUA
– Graduação alcoólica: 6.7%
– Nota: 3,40/5

Alpine Willy Vanilly
– Produto: Wheat Ale
– Nacionalidade: EUA
– Graduação alcoólica: 5.5%
– Nota: 3,39/5

Sierra Nevada Sidecar
– Produto: American Pale Ale
– Nacionalidade: EUA
– Graduação alcoólica: 5.3%
– Nota: 3,33/5

Bear Republic Racer 5
– Produto: American IPA
– Nacionalidade: EUA
– Graduação alcoólica: 7.5%
– Nota: 3,77/5

The Alchemist Luscious
– Produto: Russian Imperial Stout
– Nacionalidade: EUA
– Graduação alcoólica: 9.2%
– Nota: 4,25/5

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– Top 1001 Cervejas, por Marcelo Costa (aqui)
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