Resenhas por Adriano Mello Costa
“O Casal Que Mora Ao Lado”, de Shari Lapena (Editora Record)
Anne e Marco Conti são um casal normal, moram em uma casa confortável e acabam de ter a primeira filha, Cora, que está nos primeiros meses de vida. Entretanto, essa é apenas a imagem superficial, pois por dentro o casal vive momentos difíceis, com a mãe em depressão pós-parto e o pai repleto de problemas no trabalho. O convite dos vizinhos para um jantar então se apresenta como boa oportunidade para o casal sair um pouco, desopilar a cabeça, socializar com outras pessoas. Contudo, o jantar não anda da melhor maneira e, além disso, os pais precisam ir de meia em meia hora ver como a filha está já que os anfitriões não queriam crianças no local, apenas adultos. Em uma dessas visitas a mãe percebe que a filha sumiu, desapareceu. É a partir desse rapto que a escritora Shari Lapena começa a desenvolver “O Casal Que Mora Ao Lado” (The Couple Next Door, no original), livro publicado em 2016 que a editora Record lança no Brasil agora. Com 294 páginas e tradução de Márcio ElJaick, a obra ambiciona ser um suspense policial cheio de reviravoltas que adiciona pontualmente novas informações para mudar a percepção do leitor a cada página. Porém, apenas ambiciona e nada mais. A realidade é que a obra é um imenso agregado de chavões do estilo que são escritos de maneira rasa e sem muito ritmo e cometem o erro fatal para um livro de suspense: antecipam costumeiramente suas revelações, aquilo que em teoria deveria surpreender a quem lê e ditar novas direções. Pode enganar ao leitor não muito acostumado a enredos mais elaborados, prova disso são as milhares de cópias vendidas, mas para quem espera sempre algo de um nível maior, “O Casal Que Mora Ao Lado” é um desastre quase que completo.
Nota: 3 (leia um trecho)
“O Menino da Mala”, de Lene Kaaberbøl e Agnete Friis (Editora Arqueiro)
Nina Borg é enfermeira da Cruz Vermelha na Dinamarca, ajudando imigrantes por fora quando possível. Já prestou serviço em países com situação complicada, sempre com a intenção de ajudar as pessoas. Casada e com dois filhos, tenta seguir adiante em uma vida que vez ou outra abdica em troca da obstinação constante de lutar contra a injustiça. Essa faceta volta à tona quando uma amiga liga e pede para que vá urgentemente retirar uma mala de um armário na estação local. Quando chega ao local e faz o que foi pedido se depara com um menino de 3 anos desacordado e nu dentro da mala. Assustada e sem saber o que fazer de imediato, vê as coisas piorarem quando um homem furioso chega à estação e vai diretamente ao mesmo local que ela acabou de retirar a criança. “O Menino da Mala” (Drengen I Kufferten, no original) foi publicado em 2008 e ganhou edição nacional em 2013 pela editora Arqueiro, com 256 páginas e tradução de Marcelo Mendes. Escrito em dupla por Lene Kaaberbøl e Agnete Friis, o livro fez bastante sucesso e ganhou edição em vários países. Esse sucesso levou a mais dois livros com as aventuras da enfermeira (“Morte Invísivel” já foi publicado aqui) e é mais um retrato da produção de romances de suspense e policiais dos países escandinavos. Nina Borg foi comparada a Lisbeth Salander da trilogia Millenium, do sueco Stieg Larsson, porém as semelhanças ficam apenas no perfil físico. A protagonista de “O Menino da Mala” é bem diferente e já traz na essência o altruísmo, o inconformismo, a busca pelo bem, por mais duro que isso seja. Enquanto inserem Nina na luta para descobrir quem é o garoto encontrado e sobreviver a isso, as autoras aproveitam – mesmo com uma escrita rasa – e criticam o tráfico de pessoas e crianças oriundas de países mais pobres, um mercado vil e violento que demonstra que nem tudo que brilha é ouro no próprio país.
Nota: 6 (leia um trecho)
“Ninfeias Negras”, de Michel Bussi (Editora Arqueiro)
O pintor francês Claude Monet (1840-1926) é um dos grandes nomes do Impressionismo e suas telas valem uma fortuna. Nos seus quadros, Monet eternizou diversas vezes a pequena cidade de Giverny, na França, onde nasceu, viveu e retratou ninfeias das mais variadas estirpes. O escritor francês Michel Bussi, de “O Voo da Libélula”, usou esta cidade como palco para o romance policial “Ninfeias Negras” (Nympheás Noirs, no original), publicado no país de origem em 2011 e que em 2017 recebe edição nacional pela editora Arqueiro. Com 352 páginas e tradução de Fernanda Abreu, a trama começa para o leitor com o assassinato de um renomado e rico médico habitante do local, cheio de pequenos segredos. No entanto, conforme se percebe no decorrer das páginas, a história tem início em anos muito mais distantes, mais longínquos. Conduzido primordialmente por uma senhora que não se identifica logo, mas que observa todos os fatos, a narração também avança para outras duas mulheres fundamentais da obra, uma mais jovem, ainda criança, e uma professora da única escola da cidade. Dividindo a trama nesses três eixos, o autor vai construindo com cuidado cada personagem e coloca o leitor em desavisada situação de conforto que só se quebra na verdade nas páginas finais. A dupla de detetives encarregada do caso merece destaque, com personalidades, gostos e anseios bem distintos, funciona bem, fugindo no que é possível do lugar comum típico dessas orquestrações. Mascarado sobre um romance policial comum, mesmo que bem edificado, “Ninfeias Negras” esconde nas suas linhas pontos interessantes como a intensidade da relação entre as pessoas e a arte, não obstante cutucando um pouco esse mundo, e entra na cabeça do ser humano com intensidade no que tange a medos, privações, egoísmos e perda de esperança, o que faz o livro ir um pouco além.
Nota: 7,5 (hotsite)
– Adriano Mello Costa (siga @coisapop no Twitter) assina o blog de cultura Coisa Pop
Li anos atrás O Menino da Mala, e acho que você foi generoso com nota 6.
Achei uma escrita bem rasa e com uma história que não me empolgou. Daria nota 4.
O assunto abordado no livro (e na região) é interessante e válido, talvez por isso o “6”, mas a escrita realmente fica devendo bem. 🙂