Boteco: 10 cervejas de GO/DF

por Marcelo Costa

Intitulando-se “a primeira microcervejaria cigana do centro-oeste”, a X, sediada em Brasília, produziu essas duas receitas que seguem em Goiânia começando pela Blanche do Cerrado, uma Witbier com sementes de coentro, casca de laranja e limão siciliano, como manda o figurino. De coloração amarela levemente turva (puxado para a escola Blue Moon) com creme branco de baixa formação e média permanência, a Blanche do Cerrado apresenta um aroma que respeita o estilo oferecendo frutado cítrico (laranja e banana), condimentado suave e doçura maltada. Na boca, textura suave com leve picância. O primeiro toque traz agradável frutado cítrico seguido de banana, doçura caramelada e amargor leve (15 IBUs). Na sequencia, um conjunto redondinho oferecendo refrescancia mais cítrico, doçura e leve condimentado na medida certa. O final é levemente amargo. No retrogosto, banana, laranja e coentro. Gostei.

A Micro X Oberkorn Marzen foi premiada no 5º Concurso Estadual de Cerveja Caseira, da Acerva Paulista, em 2014, e segue o clássico estilo alemão Oktoberfest. Na taça, ela apresenta uma coloração âmbar acastanhada levemente translucida com creme bege de baixa formação e rapidíssima dispersão. No nariz, doçura maltada intensa oferecendo bastante caramelo, mel e algo que remete a guaraná. Há um levíssimo herbal presente. Na boca, a textura é bastante suave. O primeiro toque reforça o predomínio das notas derivadas do malte tostado – que dominam todas as fases do conjunto – com caramelo e mel em destaque seguidos de amargor leve (25 IBUs discretos), que abre as portas para, novamente, um conjunto maltado brindando o bebedor com mais caramelo, mel e guaraná além de um discreto herbal. O final é maltado. No retrogosto, reforço de mel e caramelo.

De Goiânia e aberta em 2015, a Lionfish marca presença primeiro com a Femminili, uma Pale Lager que, segundo o rótulo, recebe adição de rosa e hibisco. De coloração âmbar acastanhada com creme bege de baixíssima formação (um traço de espuma) e retenção, a Femminili apresenta um aroma maltado com bastante oferta de caramelo e leve presença de pão doce. Há discretíssima percepção de lúpulo herbal e hibisco (mas nada de rosas). Na boca, textura sedosa com primeiro toque reforçando a ideia de doçura de mel e caramelo com suave traço herbal passado quase despercebido. O amargor é baixo e, dai em diante, uma cerveja que se caracteriza por não exibir os itens adicionados na receita, escondendo-os sob uma cortina de malte. O final é maltadinho e, no retrogosto, caramelo, pão doce e hibisco bem suave.

Continuando com a Lionfish, agora com a Vienna Lager da casa, e tirando o fato da Femminili ter uma coloração acastanhada enquanto essa Vienna puxa suavemente para o caramelado, no paladar as duas cervejas se parecem levemente. Assim como na Femminili, a formação de creme decepciona com um filetinho branco de desaparece rapidamente. No nariz, uma oferta mais profunda de doçura caramelada e mel com leve percepção de açúcar queimado e um suave toque cítrico, bem discreto, mas interessante. Na boca, textura sedosa com leve picancia metálica. O primeiro toque é uma oferta suave de caramelo e mel seguido de leve amargor, que abre as portas para um conjunto equilibrado que continua a saga do caramelo e do mel (como manda o estilo) até o final, maltadinho. No retrogosto, caramelo. Dentro do estilo.

Fechando o trio da goiana Lionfish com a India Pale Ale da casa (garrafa verde – há uma versão em garrafa azul que não fez muito sucesso no Untappd), uma cerveja de coloração meio amarela, meio alaranjada com forte turbidez que, pela primeira vez entre as três da casa, exibe um creme de verdade, bonito, espesso, de boa formação e média alta permanência. No nariz, lúpulo (alemão) à frente, como tem que ser, ofertando notas herbais (grama, pinho) com leve cítrico distante. Na boca, textura cremosa com leve picância. O primeiro toque traz doçura média rápida seguida de amargor herbal convincente abrindo as portas para um conjunto que respeita as características da escola American IPA sugerindo lúpulo herbal, mas com uma forte base de caramelo. O final e seco e amarguinho. No retrogosto, suave herbal.

Tradicional point de rock e cervejas de Brasília, o Bar Godofredo desenvolveu a receita das três cervejas da linha Porco Loco (uma Weiss, uma IPA e uma Vienna Lager) e a parceira Bierbaum, de Santa Catarina, assumiu a produção. Como é de se imaginar, a Porco Loco Vienna Rost é a Vienna Lager da casa. De coloração âmbar acastanhada com creme bege clarinho de ótima formação e boa permanência, a Porco Loco Vienna Rost apresenta um aroma com malte em destaque (como pede o estilo) oferecendo caramelo e um leve off flavour amanteigado, que não chega a atrapalhar o conjunto, mas está presente. Na boca, textura cremosa. O primeiro toque traz caramelo seguido de amargor comportado (27 IBUs). Dai em diante, uma cerveja maltada, caramelada e com leve amanteigado. No final e no retrogosto, caramelo.

Kombi abastecida com várias torneiras de cervejas especiais nacionais e importadas que marca presença em vários eventos em Brasília, a Corina Cervejas Artesanais também tem seus rótulos próprios (segundo o Untappd, 17), entre eles a sensacional Conic Double IPA e esta ótima Linda, Leve & Solta Pêiu Êiu produzida Klaro Microcervejaria, em Goiânia, uma American Pale Ale de coloração ambar alaranjada meio dourada com creme branco de boa formação e alta retenção. No nariz, um aroma discreto sugere caramelo e suave presença herbal. Na boca, a textura é quase cremosa com leve picância. Se o aroma não brilha, o paladar diz a que veio oferecendo caramelo, pão, cítrico e herbal suaves (e deliciosos). O amargor é baixo (28 IBUs), mas eficiente abrindo as portas para um conjunto leve e refrescante. O final é amarguinho suave. No retrogosto, herbal, amargor suave e leve caramelo.

No mercado desde 2001, a Cervejaria Goiaz só entrou na área de cervejas especiais em 2014, quando colocou na praça sua linha de cervejas Colombina, que já conta com oito rótulos. Essa Gynhattan é uma American Wheat que utiliza lúpulo Sorachi Ace e recebe adição de Cagaita, fruta do Cerrado rica em vitamina C e antioxidantes. De coloração amarelo palha (mais para Hoegaarden do que para Blue Moon), a Colombina Gynhattan exibe um creme branco de boa formação e permanência. No nariz, cítrico delicado, floral campestre, herbal e especiarias se destacam chamando a atenção do bebedor. Na boca, textura frisante. O primeiro toque traz especiarias (capim limão e anis) seguida de leve cítrico e suave amargor efervescente, que abre as portas para um conjunto refrescante e delicioso. O final é seco e levemente ácido enquanto o retrogosto traz especiarias, um toque campestre e leve limão siciliano. Delicia!

A Colombina Saison do Pé Rachado junta seis tipos de malte, dry hopping de lúpulo alemão Saphir e um elogio a goianidade com adição de polpa de pequi. De coloração dourada com leve turbidez e creme branco de baixa formação, quase que apenas um traço de espuma que se desfaz rapidamente, a Colombina Saison do Pé Rachado exibe no aroma forte presença do pequi em uma paleta que ainda traz acidez suave, azedume leve, cereais, doçura de malte distante mais notas herbais e campestres. Na boca, a textura é levemente frisante (como pede o estilo). O primeiro toque traz doçura frutada seguida de acidez suave, picância e amargor comportado. Dai pra frente surge uma Saison mais doce que o tradicional (méritos do pequi) e bem fora da curva e interessante. O final é logo e seco. No retrogosto, pequi e caramelo.

Encerrando a série cervejeira DF/GO com a Colombina India Pale Ale, que recebe dry hopping do lúpulo australiano Galaxy e adição de uma rapadura típica do cerrado, a Moça Branca. De coloração âmbar acastanhada como creme bege claro de muita boa formação e retenção, a Colombina India Pale Ale apresenta um aroma bastante suave para uma IPA juntando doçura maltada (caramelo, açúcar mascavo, melaço) com um cítrico bem leve sugerindo maracujá. Na boca, a textura é cremosa e levemente picante. O primeiro toque oferece doçura de malte tostado, com caramelo e açúcar queimado brigando pela atenção do bebedor. O lúpulo surge logo depois, mas fica na retaguarda oferecendo cítrico distante e influenciando de forma comedida no amargor, baixo (40 IBUs segundo o rótulo, mas parece menos). O final é cítrico e levemente amarguinho. No retrogosto, caramelo, açúcar queimado e maracujá distante.

Balanço
De Brasília, mas produzida em Goiânia, a cigana X marca presença primeiro com a Blanche do Cerrado, uma witbier redondinha, como manda o figurino do estilo (mais USA que Bélgica). A Micro X Oberkorn Marzen também segue a tradição, desta vez alemã, ainda que o conjunto centre bastante foco no malte tostado sem aprofundar o conjunto, que fica centrado em mel e caramelo durante todas as fases. De Goiânia, a Lionfish Femminili é um Pale Lager maltada sem atrativos (esqueça as rosas e o hibisco porque eles estão mais presentes no rótulo do que no líquido). A Lionfish Vienna Lager, por sua vez, aposta no básico e cumpre o que promete: entregar uma cerveja dentro do estilo (o problema é ela custar a mesma coisa que a Brooklyn Lager, benchmarking atual do estilo). A melhor do trio da Lionfish é a IPA da casa, que mantém a simplicidade, mas é corretinha. Presente no PicniK Festival 2016 com uma barraca, a Porco Loco marca presença aqui com sua Vienna Lager, mais caprichada que a versão da Lionfish – mesmo com off flavour –, mas ainda assim bem simples. Também presente no PicniK Festival 2016 (com uma Double IPA encantadora, a Conic), a Corina marca presença aqui com sua ótima Pale Ale (ou Pêiu Êiu, como eles grafam divertidamente no rótulo), que recomenda: se você estiver em Brasília e quer beber boa cerveja, procura saber onde a Kombi da Corina está. Para fechar a série DF/GO, três cervejas da Colombina. A primeira é a Gynhattan (Goiânia + Manhattan), uma American Wheat caprichadíssima que me surpreendeu! Bem saborosa. A segunda Colombina é a Saison do Pé Rachado, que recebe adição de pequi, estrela da receita. O conjunto me soou desiquilibrado, mas há futuro nessa junção de um estilo rebelde belga com a tradicional fruta goiana. Vale experimentar e acompanhar o desenvolvimento da receita. Fechando o trio com a Colombina IPA, outra receita interessante pela adição da rapadura, mas que parece que necessita de pesquisa e mais trabalho para conseguir o melhor dos lúpulos e da rapadura para resultar num grande conjunto. Do jeito que está, está ok. Mas tem potencial.

Micro X Blanche do Cerrado
– Estilo: Witbier
– Nacionalidade: Brasil
– Graduação alcoólica: 5%
– Nota: 3,05/5

Micro X Oberkorn Marzen
– Estilo: Oktoberfest
– Nacionalidade: Brasil
– Graduação alcoólica: 5,3%
– Nota: 2,99/5

Lionfish Femminili
– Estilo: Pale Lager
– Nacionalidade: Brasil
– Graduação alcoólica: 4,5%
– Nota: 2,20/5

Lionfish Vienna Lager
– Estilo: Vienna Lager
– Nacionalidade: Brasil
– Graduação alcoólica: 4,5%
– Nota: 2,78/5

Lionfish India Pale Ale
– Estilo: India Pale Ale
– Nacionalidade: Brasil
– Graduação alcoólica: 5,3%
– Nota: 2,93/5

Porco Loco Vienna Rost
– Estilo: Sweet Stout
– Nacionalidade: Brasil
– Graduação alcoólica: 5,5%
– Nota: 2,93/5

Corina Linda, Leve & Solta Pêiu Êiu
– Estilo: American Pale Ale
– Nacionalidade: Brasil
– Graduação alcoólica: 5,2%
– Nota: 3,15/5

Colombina Gynhattan
– Estilo: American Wheat
– Nacionalidade: Brasil
– Graduação alcoólica: 5%
– Nota: 3,39/5

Colombina Saison do Pé Rachado
– Estilo: Saison
– Nacionalidade: Brasil
– Graduação alcoólica: 4,8%
– Nota: 3,05/5

Colombina India Pale Ale
– Estilo: Belgian Dubbel
– Nacionalidade: Brasil
– Graduação alcoólica: 6%
– Nota: 3,00/5

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