Entrevista: Marco Butcher

por Andye Iore

Marco Butcher, 47 anos, foi embora do Brasil há dois anos, mas deixou ótimas lembranças e muitos fãs. Uma lenda do rock independente brasileiro, Marco tem duas características que se destacam: a primeira é uma extensa carreira em mais de 15 bandas desde o começo da década de 1980. A segunda é não se importar muito com o que já fez, mesmo que esse passado seja muito importante para fãs, amigos e ex-companheiros de bandas. Ele quer sempre ir pra frente, fazer mais.

Os 35 anos de carreira proporcionaram que ele compusesse aproximadamente mil canções, segundo sua própria estimativa. Incluindo algumas músicas que permanecem inéditas, ‘escondidas’ nas gavetas de casa. E vem muito mais por aí. Marco Buchcer mora com a esposa em Winston Salem, na Carolina do Norte, nos Estados Unidos, desde 2014, onde está ativo como nunca, compondo e tocando. Sempre com muito pouco para falar de suas ex-bandas e entusiasta para falar de seus atuais projetos.

Nesta toada, o músico revela que alterna trabalhos de restauração e pintura de interiores com sua música. Atualmente divide seu tempo musical entre gravações e shows com Rob K., no The Jam Messengers (que nesta semana sai em tour pelos Estados Unidos com shows na Virginia, Pensilvânia e Nova York), e o lançamento de um terceiro disco do duo Jesus & The Groupies (que acaba de lançar um EP com suas covers favoritas de canções de canções de Howlin Wolf, Bo Diddley, Fred MacDowell e John Lee Hooker).

Marco Butcher sabe que sua memória não é das melhores. Para piorar ele já lançou tanta coisa que mal lembra, justamente por esse desapego das coisas passadas. Até seu apelido passa por isso. “Acho que Butcher veio da tradição das antigas bandas punks e 60s, dos membros usarem o nome da banda como sobre nome. O nome da banda [Thee Butchers Orchestra] foi ideia minha. Acabou pegando. Acho que os amigos começaram a chamar assim e ficou. Nós três da banda usávamos Butcher. Isso tem mais de 20 anos…”, força a memória.

O Projeto Zombilly, parceiro do Scream & Yell, fez um resgate histórico da carreira de Marco Butcher incluindo uma entrevista com ele falando sobre o que anda fazendo. Um cara que vale a pena acompanhar a carreira.

Por que você decidiu viver nos Estados Unidos?
Me mudei pra cá dessa última vez em 2014. Já tinha morado aqui em outras fases da minha vida, sempre em cidades e estados diferentes. Acho que com o tempo percebi que estava passando mais tempo aqui que no Brasil. E, é claro, o fato de ter minhas bandas aqui fez muita diferença na decisão.

Quais foram as ultimas coisas que você gravou e lançou?
No momento tenho projetos diferentes rolando, como o “Five Kinds Of Bad”, que é um álbum de outtakes do The Jam Messengers, sendo lançado na Inglaterra pelo selo Sour Moon Records. Também com os Messengers temos um split single que fizemos com os Black Mekon, também saindo na Inglaterra. Fora isso, os Jesus & The Groupies estão pra lançar seu terceiro álbum que leva o nome de “Weapons Nature Provided” e trás como convidado o texano Walter Daniels (do Jack O Fire, Bigfoot Chester) nos vocais, gaitas e saxofones. O álbum também conta com várias participações de gente como Chet Weise (do Immortal Lee County Killers) fazendo algumas guitarras, Texcala Jones (do Tex & The Horseheads) fazendo vocal em uma das músicas, Mike Mariconda (do The Devil Dogs) nas guitarras e por aí vai.

Como é sua rotina aí nos Estados Unidos? Você vive de música?
Eu e minha esposa moramos numa parte da cidade que é meio como um bosque ou floresta se preferir. Então, apesar de ser bem perto do centro da cidade ainda temos muito espaço e privacidade pra poder trabalhar em casa. Montei um pequeno estúdio aqui há um ano e meio. E de lá pra cá tenho tentado deixar a coisa melhor na medida do possível, investindo tempo e equipamentos na sala e coisas do tipo. Viver de musica? Não acho que poderia dizer que sim. O que rola é juntar tudo entre shows, venda de discos, produção de outras bandas e tal. Mas também trabalho fazendo outras coisas.

O que seria diferente se você tivesse continuado no Brasil?
Difícil dizer. Acho que tudo na real. Morar aqui facilita minha vida em vários sentidos. O primeiro deles é que eu e o Rob K entramos num processo de tours e gravações que é muito mais regular e bem estruturado. Depois o fato de poder ter esse tempo pra trabalhar no meu estúdio e criar a música que quero, da forma que ouço na minha cabeça, é bem importante pra mim.

A maior parte dos discos que você lançou está fora de catalogo e raramente se encontra para comprar hoje. Você pensa nisso, em relançar algo ou foca só em lançar coisas novas?
Cara, eu não sou muito do tipo que olha pra trás e coisa parecida. Não costumo pensar no que já foi feito e se ainda faz sentido ou se está ou não em catalogo, nem nada do tipo. É claro que se alguém em determinado momento for a fim de fazer algo assim, relançar minhas coisas, seja lá com que banda for, é provável que eu diga ok. Mas, contar comigo pra cuidar disso eu diria que é no mínimo bem complicado. Gosto de gastar meu tempo olhando pra frente.

De tudo que você já gravou e de todas bandas que já participou, o que te dá mais orgulho. Tem algo que você não goste?
Acho que no final o orgulho vem da oportunidade de poder trabalhar com pessoas que você gosta e respeita na música. Não sei dizer se tenho algo que goste mais. Faço discos por motivos diferentes. Então, em algum momento é claro que todos eles fazem sentido pra mim. Se não gosto, não lanço. Não faria sentido.

É comum no meio das onemanbands os músicos fazerem seus próprios instrumentos, experimentar com objetos. Você já fez algum instrumento, usou algo incomum?
Na verdade não me vejo como onemanband de forma alguma. Toco só às vezes e com amigos às vezes. Mas não penso onenamband como minha forma de fazer e mostrar música. Não acho que eu faça parte da cultura onemanband nesse sentido. Então, na real, sei pouco sobre. É claro que experimentos fazem parte da música. Ainda mais quando você começa aos dez anos. Cansei de destruir caixas, panelas e tudo que eu pudesse socar na tentativa de construir uma bateria [risos] pras minhas primeiras bandas de garage que moraram por algum tempo na garagem da minha antiga casa em São Paulo.

O Pin Ups é idolatrado no meio independente brasileiro. Você parece não compartilhar da mesma idolatria dos fãs. O que representou você tocar na banda?
Eu não sigo muito revistas ou zines e coisas do tipo. Meu interesse em música é música e não o que esse ou aquele crítico acha sobre música. Então, de certa forma, essas informações raramente chegam pra mim. E, quando chegam, meio que deixo passar porque pra mim não faz muito sentido se agarrar em passado. Mas, de fato não tenho muito pra falar sobre.

Pouca gente sabe, mas você cantou no Garage Fuzz no começo da banda. O que você lembra?
Bons tempos! Sempre curti o pessoal da banda e sempre fomos amigos. Mas na época que eu estava na banda o lance era bem mais SST e musica estranha, punk rock talvez! Não sei se eu chamaria aquela fase de hardcore. Bem provável que não.

Vamos falar de garage rock… o Brasil tem muitas bandas bacanas, mas não tem uma organização, uma cena. É meio cada um por si…
Não vejo a coisa como uma cena. O que na real acaba sendo mais legal. Acho que temos alguns músicos flertando com esses estilos nos últimos anos e misturando isso a coisas mais atuais ou experimentais se preferir.

E o que representa o garage rock pra você?
Acho que tem duas formas de ver isso: uma é a ideia de começar a banda ensaiando em garagens. E enfim, mantendo a coisa toda o mais simples possível. A outra tem mais a ver com cena ou tendência. O que na real acabo não prestando muita atenção. Toda essa onda revival, bandas soando ou tentando soar como nos 60s e tal. Não é algo que eu acompanhe. Gosto da ideia de viver meu próprio tempo. Acho a coisa toda de revival meio cansativa.

E como tem sido seu processo de composição atualmente?
Na real, nunca penso em música pra compor música. Vem de outras coisas. Da vida, da rua do que está rolando na minha rotina ou falta de rotina. É muito mais fotográfico na minha cabeça, eu acho. Às vezes, a própria letra faz a música. Não tem muito um formato. Cada som acontece de uma forma.

O que você planeja para sua carreira no futuro?
Sem planos! No momento minha esposa está produzindo “Night & Day”, que será o próximo álbum a ser lançado pelos Jam Messengers. Talvez no final desse ano ou começo do ano que vem. Fora isso, shows shows shows e mais shows! Estar na estrada é pra mim a única coisa certa. O resto eu deixo ser acidental e assim vemos o que rola.

– Andye Iore (@andyeiore) é jornalista em Maringá e Cianorte (PR), fã de Cramps desde 1986 quando ouviu “Surfin’ Dead” no filme “A Volta dos Mortos Vivos”. Apresenta o Cinema na Música na rádio Música FM de Cianorte (89,9 FM) e o Zombilly no Rádio na UEM FM (106,9) e na Alma Londrina (www.almalondrina.com.br) além de ser responsável pelo site Zombilly.

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