Três CDs: Wilson, Knopfler e Sexsmith

por Marcelo Costa

“No Pressure Pier”, Brian Wilson (Capitol)
Décimo primeiro disco da carreira de Brian Wilson e primeiro álbum de faixas inéditas em sete anos, “No Pier Pressure” (2015) se apoia na fama de convidados especiais, como se e o eterno beach boy necessitasse desse expediente frouxo. “Runaway Dancer”, com participação de Sebu Simonian, do Capital Cities, tem batidinha fake ridícula e soa tão insossa que parece aquelas balas gosmentas que grudam entre os dentes e incomodam tanto que a gente promete nunca mais experimenta-las. “On the Island” conta com o duo She and Him, Zooey Deschanel (com vozeirão mais grosso que o habitual) e M. Ward, numa canção que resume o principal defeito de “No Pier Pressure”: excesso de produção. Nada soa espontâneo, divertido, emocional; tudo parece forçado. Há duas canções com astros de TV: Peter Hollens, estrela do The Sing-Off, não é o problema de “Our Special Love”, mas sim o som terrível da bateria; já “Guess You Had to Be There”, da cantora country Kacey Musgraves, que ficou em sétimo lugar no Nashville Star, soa uma canção dela com participação de Brian. Os números com os ex-Beach Boys Al Jardine e David Marks soam menos vergonhosos, ainda que a intro musak de “The Right Time” cause calafrios. Entre os raros destaques estão a boa participação de Nate Ruess, do grupo FUN! (isso mesmo), em “Saturday Night”, e a ausência de Lana Del Rey (que não conseguiu gravar sua parte vocal por problemas de agenda) na grande canção do álbum, “The Last Song”, uma linda balada que lamenta o fim dos Beach Boys.

Nota: 4

“Tracker”, Mark Knopfler (Mercury)
Legitimo representante dos artistas vitimados pelo sucesso de massa, o guitarrista e vocalista Mark Knopfler segue sua batalha para se livrar da sombra do Dire Straits, uma banda que vendeu 30 milhões de cópias de um disco, “Brothers in Arms”, de 1985, cravando seis hits incontestes nas paradas e tocando tanto que, em determinado momento, bastava ecoar o riff de “Money for Nothing” ou as trovoadas da faixa título para que o ouvinte acusasse uma AVC. O imenso sucesso do Dire Straits rendeu fama e dinheiro para Mark Knopfler, porém o enjoo causado pelo excesso de audição de seus riffs e voz fez com muita gente associasse o nome do grande guitarrista (que, aos 65 anos, já dividiu álbuns com Chet Atkins e Emmylou Harris, produziu Bob Dylan e Randy Newman e gravou nove trilhas sonoras) com algo ruim, o que é uma imensa bobagem. “Privateering”, o belo álbum duplo lançado em 2012, já mostrava que valia a pena parar e ouvir com atenção o homem, e este recém-lançado “Tracker” mantém a chama da boa música acesa apoiando-se em jazz, blues, música celta e folk – ainda que aqui e ali pelos quase 80 minutos da edição deluxe do álbum, o ouvinte esbarre em passagens que remetam a “Sultans of Swing” e “Brothers in Arms”, entre outros clássicos. Os riffs suaves de Mark Knopfler brilham em “Laughs and Jokes and Drinks and Smokes” (em que divide o arranjo com solos de violino), no folk “River Towns”, no r&b “Hot Dog” e no belo dueto com a cantora Ruth Moody (“Wherever I Go”), destaques de um álbum elegante e suavemente melancólico.

Nota: 7

“Carousel One”, Ron Sexsmith (Compass)
Quando surgiu com seu segundo álbum, “Ron Sexsmith”, de 1995 (“Grand Opera Lane”, de 1991, o primeiro, independente, até hoje é pouco conhecido), este músico canadense parecia destinado ao sucesso. Porém, após a ressaca grunge, o mundo pop estava atento ao britpop e não muito interessado em canções doloridas de um rapaz que, no clipe de “Secret Heart”, parecia um jovem e deslocado Roy Orbison (ou como elogiou o All Music Guide, provocante: “Com franja nos olhos e uma aparência inocente e anticool típica de caras que sempre apanharam na escola e não podiam juntar duas palavras na frente de uma menina sem gaguejar, Ron Sexsmith deixa a dúvida se é um mestre da afetação ou um idiota erudito”). Após 20 anos de uma carreira errática (14 discos em 9 gravadoras diferentes), Ron Sexsmith ressurgiu após dois elogiados bons discos – “Long Player Late Bloomer” (2011) e, principalmente, “Forever Endeavour” (2013) –, o que influenciou diretamente o bom humor presente neste novo “Carousel One”. Acompanhado de músicos tarimbados (que acompanharam Bob Dylan, John Lennon, Graham Nash e John Lee Hooker, entre outros), Ron parece fazer as pazes consigo mesmo num álbum primaveril em que canta a alegria de ter um cachorro (“Saint Bernard”), um amor ao lado da cama ao acordar (“Loving You”) e para fugir como Bonnie e Clyde (“Getaway Car”). “Não há necessidade de ter medo”, ele canta em “All Our Tomorrows” com uma experiência que (médicos poderiam receitar) tem o poder de confortar e iluminar dias nublados de corações e almas perdidas.

Nota: 7,5

– Marcelo Costa (@screamyell) é editor do Scream & Yell e assina a Calmantes com Champagne

Leia também:
– 2004, o ano em que Brian Wilson ressurge na música pop (aqui)
– DVD: um tributo especial para Brian Wilson com jeitão de obrigatório (aqui)
– Três discos: “Smile”, “Gettin’ In Over My Head” e “Live At The Roxy Theatre (aqui)
– “That Lucky Old Sun”, Brian Wilson: as melodias continuam inesquecíveis (aqui)
– “Do It Again: A Tribute to Pet Sounds” com Daniel Johnston e outros (aqui)
– “That’s Why God Made The Radio”: belíssima despedida dos Beach Boys (aqui)
– “Brian Wilson Reimagines Gershwin” é uma homenagem elegante (aqui)
– Pequenas Cagadas e a Eternidade dos Beach Boys pós-“Smile” (aqui)
– Brian Wilson em SP: “um dos melhores eventos musicais da vida” (aqui)

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