Cinema: o premiado “Miss Violence”

por Adriano Costa

A crise financeira que o mundo atravessou em 2008 deixou sérios danos em várias nações. A Grécia (que já não andava bem das pernas fazia um bom tempo) foi uma dessas nações e em 2010 teve um agravamento das consequências desse período e navegou em uma nova crise que resultou em pedido de ajuda bilionário para a União Europeia, além de medidas internas que iam de cortes de gastos públicos, aumento impostos e reformas diversas. É esse país que serve de ambiente para o filme “Miss Violence” (2013).

Dirigido por Alexandros Avranas, que também assina o roteiro em parceria com Kostas Peroulis, “Miss Violence” foi badalado em festivais no ano passado, sendo premiado em alguns como o de Estocolmo (melhor roteiro) e Veneza, que deu a Alexandros Avranas o prestigiado Leão de Prata de melhor direção, além da premiação de melhor ator para Themis Panou. A película também passou por aqui antes de ir para o circuito comercial na 37ª Mostra Internacional de Cinema de São Paulo.

A cena de abertura do filme é uma festa de aniversário para uma garota de 11 anos que exibe uma família dançando desajeitada ao som de “Dance Me To The End Of Love”, de Leonard Cohen. Com a canção ao fundo e um leve sorriso nos lábios, essa mesma jovem se dirige para a sacada do apartamento e salta para a morte. A câmera faz uma pequena viagem até mostrar o corpo da menina estendido em meio a muito sangue enquanto a família, incrédula, observa uma poça de sangue surgir ao lado do vestuário (simbolicamente) todo branco da garota.

A família retratada é composta por Themis Panou, que faz o papel de chefe dessa casa também habitada pela esposa, duas filhas, um neto e uma neta. Após o suicídio, a preocupação passa não somente pela tragédia em si, mas também pelo fato da diminuição da renda familiar que sofrerá um abatimento do benefício dado pelo governo. No cenário difícil em que o país se encontra isso realmente pesa para o personagem de Themis Panou. Junte-se a isso uma nova gravidez da filha mais velha (de pai desconhecido, como os anteriores) e o medo do serviço social cortar todos esses benefícios.

Esse panorama primário aponta para um drama de sobrevivência, mas nem de longe é possível imaginar o rumo que a trama percorrerá e a quantidade de sordidez que será demonstrada na tela. A câmera de Alexandros Avranas opta por muitos enquadramentos e, auxiliada por um roteiro de poucas palavras, apresenta uma família sufocada vivendo entre o medo, a conivência e a falta de opção. O roteiro é elaborado com o intuito de provocar, isso fica bastante claro devido às opções tomadas na parte final, contudo a opção não é gratuita e condiz muito bem com a dosagem gradual que o nível de brutalidade vai se apresentando.

As decisões tomadas pelo personagem de Themis Panou não são justificáveis em momento algum, nem pela crise existente, já que essas decisões são tomadas há muitos anos, torando “Miss Violence” um filme duro, frio e isento de moralidade, que agride e causa desconforto a quem assiste. Guarda comparações com trabalhos como “Old Boy”, do sul coreano Park Chan-Wook, não pela temática envolvida, mas pelo grau de desumanidade exercida. “Miss Violence” é mais um exemplo do bom momento que vive o cinema grego e revela um proeminente cineasta.

– Adriano Mello Costa (siga @coisapop no Twitter) e assina o blog de cultura Coisa Pop

Leia também:
– Para editor do Scream & Yell, “Miss Violence” foi o grande filme da Mostra SP 2013 (aqui)

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