Ludov retorna com “Miragem”

por Bruno Lisboa

Na estrada desde 2002, época em que o singelo hit “Princesa” (presente no EP de estreia, “Dois a Rodar”, de 2003) era bastante veiculado na MTV Brasil, o Ludov era mais um exemplo de qualidade da safra 00’s do rock nacional ao lado de nomes como Bidê ou Balde, Cachorro Grande, Video Hits e CSS, entre outras tantas que ficaram pelo caminho. Passados 12 anos, a banda paulistana formada por Vanessa Krongold, Mauro Motoki, Habacuque Lima e Paulo Chapolin segue na ativa e coloca na praça seu quarto trabalho, “Miragem” (Tratore).

Rompendo uma sequência de EPs iniciada em 2011 com “Minha Economia” e seguido por “Paraíso” (2012) e “Eras Glaciais” (todos disponibilizados no site oficial da banda para download gratuito), o Ludov volta ao formato álbum com um disco produzido por Arthur Joly, dono da extinta gravadora Reco-Head, e com arte assinada por Gabriel Bá. “Miragem” segue fidedignamente tradicional a proposta sonora da banda: transformar a tristeza latente ante as relações humanas em canções muito bem trabalhadas e grudentas.

“Miragem” é composto por 10 faixas predominantemente acinzentadas, e abre com “Copo de Mar”, parceria de Habacuque Lima com Tainá Azeredo, cuja letra faz ode as relações desgastadas: “O mar que você me deu não serve pra navegar”, canta Vanessa sobre um arranjo atmosférico que destaca o uso de sintetizadores analógicos (criados por Arthur Joly). “Na fila do B52’s” mantém o clima lúgubre com bela atuação vocal de Vanessa Krongold enquanto a melodia pop de “Cidade Natal”, que ganhou um belo vídeo clipe, promove em letra o retorno ao passado de tempos remotos que não voltam mais.

A ligeiramente ensolarada e pop “Quem Cuida da Casa” é, talvez, umas das melhores canções criada pelo grupo, graças a sua simplicidade, o lado adocicado da letra e as harmonias vocais que surgem na reta final, sob a orientação de Piero Damiani. A acelerada “De Cima do Muro” lamenta, poeticamente, a urgência dos tempos modernos. “Reparação”, canção de Mauro Motoki, é uma balada beatle dominada por sintetizadores que remetem ao trabalho solo de Arthur Joly.

A basicamente acústica “Perspectiva” aborda o receio e o medo de encarar o mundo como somos. Já “Sétima Arte”, parceria com o pianista Piero Damiani, fala da coragem ante o medo de ser protagonista de sua vida. Novamente o uso dos sintetizadores dá o tom na derradeira “O fim da Paisagem”, faixa que expõe de forma simples o grande espetáculo e surpresa que reserva uma simples contemplação da natureza.

Os tempos áureos em que bandas independentes atingiam o mainstream parecem não retornar mais, mas em contrapartida o trabalho realizado pelo Ludov comprova que a cena independente sobrevive, mesmo que à duras penas, por conta própria. “Miragem” é mais um belo exemplo desta seara e integra o seleto grupo de grandes discos deste ano ao lado de “De Lá Não Ando Só”, do Transmissor, e “Encarnado”, de Juçara Marçal – só para citar dois exemplos –, tamanha qualidade impressa em seus 38 minutos de duração, provando que nem só de ilusões vive o rock tupiniquim.

– Bruno Lisboa (@brunorplisboa) é redator e colunista do pignes.com

Leia também:
– “Caligrafia”, um dos melhores registros em estúdio do Ludov (aqui)
– Mauro Motoki: “Gosto de bater na tecla que é mais legal compor em português” (aqui)
– Entrevista 2009: Habacuque Lima fala sobre “Caligrafia”, por Murilo Basso (aqui)
– Entrevista 2006: Ludov passa por um momento de transição, por André Azenha (aqui)
– Entrevista 2003: por que a mudança de língua, de nome e por que Ludov?, por Mac (aqui)

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