Boteco: Cinco cervejas da mineira Wäls

por Marcelo Costa

Abrindo mais um passeio pelos lançamentos da Wäls, de Belo Horizonte, com a Verano, uma interessante Belgian Pale Ale que recebe dry-hopping de lúpulo Columbus. De coloração âmbar caramelada e creme branco de boa formação e permanência, a Wäls Verano exibe no nariz uma junção do domínio das notas maltadas adocicadas que remetem a caramelo com a força secundária do lúpulo norte-americano, que adiciona notas florais e cítricas ao conjunto – rendendo uma leve e envolvente sugestão de bala toffee. Na boca, as coisas se invertem com o lúpulo chamando para si a atenção e propondo refrescancia. O amargor cítrico é suave e pontual (são apenas 25 de IBU, mas presentes), e, em combinação com o malte, remete a mamão, caramelo e leve maracujá. O final é suavemente maltado com uma pitada de notas cítricas, que ficam, e ficam, e ficam, e ficam até se transformarem em retrogosto, que também conta com o malte. Uma boa cerveja, equilibrada e suave.

Da escola das cervejas de sessão, que podem ser consumidas em grande quantidade sem abdicar do sabor, a Wäls surge com a Session Citra, uma India Pale Ale de apenas 3,5% de álcool, mas 30 de IBU (o dobro das mainstream nacionais de boteco). O rótulo dá o recado: “Para combater o calor”. De coloração dourada com creme branco de boa formação e permanência, a Wäls Session Citra destaca no nariz um aroma espetacular com as notas cítricas inconfundíveis do lúpulo que é adicionado de “forma massiva”, segundo a cervejaria, na receita: abacaxi, laranja, limão siciliano, maracujá mais toques florais e herbais. Na boca, o amargor cítrico é como um estilingada: bate e some, deixando pelo caminho deliciosas notas cítricas, que seguem até o final, acompanhado de leve herbal e muito refrescância. No retrogosto, limão siciliano, maracujá e sorriso no rosto.

A Wäls Stadt Jever Rock & Gol é a segunda da linha da cervejaria dedicada ao bar que os mineiros mantêm em Belo Horizonte. A primeira é uma Premium American Lager e esta versão Rock & Gol, comemorativa da Copa 2014, é uma Amber Lager que (assim como a irmã) conta com dry-hopping do lúpulo bávaro Hallertau Mandarina. De coloração âmbar derivada da tosta do malte e com creme de boa formação e permanência, a Wäls Stadt Jever Rock & Gol destaca um aroma bastante lupulado distribuindo notas cítricas (bastante maracujá) sobre uma camada de malte de caramelo. Há uma leve sugestão de resina também. Na boca, o lúpulo volta novamente a dominar as atenções, mas muito mais com notas cítricas do que com amargor, que não é agressivo. Ainda que em segundo plano, o malte se mostra mais presente, ainda que seja mais um fator de equilíbrio do que de doçura. O final é cítrico e refrescante enquanto o retrogosto traz maracujá, resina e leve caramelo.

A Vanilla Hoppy Cookie é uma parceria dos mineiros da Wäls com os curitibanos da Way, que decidiram criar uma Imperial Brown Ale cuja receita une cinco variedades de malte, lúpulo britânico Polaris e favas de baunilha bourbon na maturação de três meses. O resultado é uma cerveja de 90 de IBU e incríveis 13% de álcool, tornando-a uma das cervejas mais alcoólicas do país. De coloração âmbar escura, a Vanilla Hoppy Cookie não exibe nada de creme: assim que despejada na taça formam-se bolhas de ar sem criar espuma, fator evidente da altíssima graduação alcóolica. No nariz, notas adocicadas remetendo a caramelo em primeiro plano, leve baunilha e percepção de álcool na sequencia. Pelo aroma já é possível sentir a licorosidade da cerveja, que na boca reforça a pegada adocicada e alcóolica percebida pelo nariz acrescentando amargor, sabe-se lá se do álcool ou do lúpulo. O final é mais álcool que caramelo enquanto o retrogosto traz calor, amargor e caramelo.

Fechando o passeio em duas partes (essa é a primeira, com a cerveja gelada após “descansar” na geladeira alguns dias antes de ser aberta entre 5 e 7°C) com a segunda colaboração dos mineiros com o Empório Alto de Pinheiros, a Wäls EAP 6 Anos, uma American Barley Wine com cinco tipos de malte, três de lúpulo (Tettnanger, Cascade e Galena.), maturada com lascas de carvalho Francês. Esse mix explosivo alcança 11,5% de álcool e 93 de IBU. Na taça, a Wäls EAP 6 Anos exibe uma coloração âmbar rubi com creme bege de baixa formação e média permanência. No aroma, caramelo intenso, álcool nítido, frutas escuras (nozes e ameixa) e secas (passas) mais quebra-queixo (doce de coco queimado). Na boca, a textura é licorosa (como manda o estilo) e o álcool intenso, o que não impede a percepção de caramelo, baunilha e leve amadeirado mais sugestão de vinho do Porto. O final é caramelo com uísque enquanto o retrogosto traz calor, caramelo, álcool e um toque amadeirado.

Na segunda avaliação, a Wäls EAP 6 Anos foi colocada na taça na temperatura ideal do estilo, entre 13-15 °C (num dia de 15°C em São Paulo, ou seja, temperatura ambiente). Ela ficou na geladeira por meia hora, tempo de refresca-la. O resultado: a coloração fica menos turva e mais próxima de um conhaque. O creme se formou razoavelmente, mas o álcool ainda impede uma duração prolongada. No nariz, a primeira sensação é de açúcar queimado na panela (novamente “quebra-queixo”), e, na sequencia, surgem as notas adocicadas derivadas do malte tostado (caramelo e baunilha) enquanto as frutas escuras se escondem (com insistência é possível perceber ameixa). Os 11,5% de álcool, no entanto, são nítidos. Na boca, a textura levemente licorosa bate ponto enquanto o álcool intenso faz a função de amargor em meio à doçura acentuada (caramelo, baunilha e açúcar queimado). O final é baunilha, açúcar queimado e álcool enquanto o retrogosto traz baunilha, amargor e álcool. Interessante.

Balanço
Produzida para ser consumida no verão, a Wäls Verano é uma bela aposta dos mineiros, exibindo um ótimo equilíbrio entre o lado adocicado do malte com o amargor cítrico do lúpulo. Lembra receitas californianas, como a da Acme Pale Ale, mas parece mais bem resolvida. Melhor ainda é a Wäls Session Citra, uma cerveja feita para ser bebida durante um bom tempo (churrasco, boteco, confraternização), mas que não sobe tão rapidamente (são apenas 3,5%), o que não interfere em seu sabor, agradabilíssimo. Com ela na taça, a vontade é de acender a churrasqueira e começar a festa. Uma cerveja levíssima e deliciosa, que cumpre seu intento de forma caprichada. Só o preço (R$ 20 – 600 ml) que podia ser mais em conta. O mesmo pode ser dito da Wäls Stadt Jever Rock & Gol, cuja garrafinha de 300 ml custa R$ 12: é uma cerveja deliciosa, cítrica e bastante refrescante, uma session beer de 5% tão boa quanto a Wäls Session Citra, mas que pode pesar no bolso algumas sessões depois.

A Vanilla Hoppy Cookie é uma parceria da Wäls com a Way, e duas das melhores cervejarias nacionais juntas decepcionam nesta cerveja que oferece apenas álcool e caramelo, muito pouco para tanta sabedoria cervejeira envolvida. Uma pena. Nem aquecida na taça melhorou (na verdade, o álcool ficou ainda mais evidente). Ainda assim, vou guardar uma garrafa para beber em 2017, e ver se o tempo de guarda melhora o conjunto. Já a porrada chamada Wäls EAP 6 Anos, segunda colaboração da cervejaria mineira com o bar paulistano (a primeira, de 5 anos, foi uma belíssima Special Lager) é uma Barley Wine que decidi beber em duas ocasiões: uma tirada da geladeira de casa, com temperatura entre 7 e 9 graus (o ideal para ela é entre 13 e 15 graus), e outra descansando apenas 30 minutos na geladeira. Na primeira, gelada abaixo do ideal, tanto a percepção de aroma quanto de sabor saiu prejudicada, mas, ainda assim, a sensação era de estar bebendo uma baita cerveja, caramelada e alcóolica, impressão que ainda aumentando conforme a cerveja aquecia na taça. Já a versão em temperatura ambiente aqueceu a garganta rapidamente, eliminou a sugestão de madeira presente na primeira versão e a impressão é de que ficou mais licorosa, açucarada e alcoólica. Entre as duas? Tenho tendência a escolher a primeira, e bebe-la vagarosamente para ir desnudando-a conforme a cerveja aquece na taça, mas nas duas situações ela não decepcionou (embora não arranhe o status das minhas preferidas Nøgne Ø Sunturnbrew e Flying Dog Horn Dog Barley Wine).

Wäls Verano
– Produto: Belgian Pale Ale
– Nacionalidade: Brasil
– Graduação alcoólica: 5%
– Nota: 3,04/5
– Preço pago: R$ 11 – 300 ml

Wäls Session IPA Citra
– Produto: India Pale Ale
– Nacionalidade: Brasil
– Graduação alcoólica: 3.8%
– Nota: 3,40/5
– Preço pago: R$ 20 – 600 ml

Wäls Stadt Jever Rock & Gol
– Produto: Amber Lager
– Nacionalidade: Brasil
– Graduação alcoólica: 5%
– Nota: 3,25/5
– Preço pago: R$ 12 – 300 ml

Wäls Vanilla Hoppy Cookie
– Produto: Imperial Brown Ale
– Nacionalidade: Brasil
– Graduação alcoólica: 13%
– Nota: 3,39/5
– Preço pago: R$ 20 – 375 ml

Wäls EAP 6 anos
– Produto: Barley Wine
– Nacionalidade: Brasil
– Graduação alcoólica: 11,5%
– Nota: 3,92/5
– Preço pago: R$ 25 – 375ml

Leia também
– Top 1001 Cervejas, por Marcelo Costa (aqui)
– Leia sobre outras cervejas (aqui)
– Sobre todas as cervejas da Wäls (aqui)

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