Boteco: Desbravando a BrewDog (Parte 2)

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por Marcelo Costa

Após começar o tour pelo catálogo da cervejaria escocesa com um rótulo de 0,5% de álcool, é hora de encarar alguns dos títulos aparentemente ameaçadores da BrewDog. Nos sete rótulos abaixo partimos de uma Alice Porter de 6,2% até chegar a Tokyo, de 18,2%. Ainda assim estamos longe do Everest da cervejaria, que ainda mantém em cardápio títulos como a Ghost Deer (28%), a Tactical Nuclear Penguin (32%), a Sink The Bismarck! (41%) e a The End of History (55% ABV), 12 garrafas embaladas dentro de esquilos empalhados. Porém, surpreende como esses malucos escoceses conseguem criar cervejas extremas, mas com uma qualidade absurda. Não deixa de ser surpreendemente incrível degustar uma cerveja de 15% de álcool, e descobrir que o liquido traz muito mais qualidades do que a porcentagem anuncia. Mas melhor começar debaixo. Ou, já que estamos na segunda parte, do meio. Segue o jogo:

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Da linha de cervejas sazonais da BrewDog, a Alice Porter nasceu de forma inusitada. O dono de um pub iria se casar e decidiu produzir uma cerveja especialmente para o enlance. A cervejaria comprou a ideia e nascia a Alicia Porter, que fez tanto sucesso na festa e em dois bares, que ganhou uma segunda tiragem. Na fórmula uma junção de lúpulos ingleses (Bramling X) com japoneses (Sorachi Ace), uma pitada de baunilha e muito malte escuro torrado. O resultado é uma cerveja preta de espuma densa e bonita. No aroma, o malte torrado se desfaz em café e caramelo com presença delicada de álcool. Na boca, a primeira sensação é de doçura, mas destaca um perfeito equilíbrio de malte torrado e lúpulo, que chega a marcar a garganta na saída. O álcool (6,2%), apesar de presente no aroma, não aparece na boca. O corpo é médio e a textura cremosa e apaixonante revelando uma menina que é uma pequena maravilha.

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A próxima é a BrewDog Dogma, uma scotch ale que traz em sua fórmula cinco tipos de malte (Munich, Crystal, Chocolate, Brown e Dark Chocolate), dois tipos de lúpulo (Saaz e First Gold) e mel escocês. No copo, o liquido negro e brilhante forma uma espuma cremosa e marrom de boa estabilidade. No nariz, diversas sensações: primeiramente surgem as notas evidentes de caramelo e café; depois, logo na sequencia, madeira, chocolate amargo, uísque, ameixa e baunilha. Uma maravilha. No paladar, acidez, amargor, salgado e adocicado se equilibram e surgem um seguido do outro com poucas diferenças de segundos. Está tudo ali dividido em notas de chocolate, café, ameixa e defumado com o álcool e o mel levemente presentes no final, seco, amargo e pungente. Soa como uma versão mais suave, delicada e menos porrada de uma Russian Imperial Stout. Bastante interessante.

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A Brewdog 77 Lager é “feita com 100% de malte e todo o lúpulo do mundo. Não contêm conservantes, aditivos, substitutos baratos do malte ou de qualquer outro lixo” – segundo os donos. Soa como deveriam ser todas as lagers de balcão (escrevi aqui). O primeiro lote surgiu em 2010, mas o pessoal separou uma parte e armazenou em velhos barris de uísque escocês por 18 meses resultando na Brewdog Barrel Aged 77 Lager, uma cerveja de 7,7% de álcool, cor dourada e espuma que sobe branca, mas baixa logo em seguida. O aroma traz madeira e álcool em primeiro plano. Com calma surgem notas cítricas que remetem a abacaxi e casca de laranja. No paladar, a acidez cítrica dá as cartas, mas é possível perceber o adocicado (caramelo e baunilha), o carvalho(uísque) e um pouco de terroso. O corpo é de médio para alto e a textura, áspera. Do jeito que bate na garganta, aquece. Bela companheira para dias frios.

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Agora acabou a brincadeira. Ou, dependendo do ponto de vista, está apenas começando. Com 9,2% de álcool, liquido de marrom intenso, opaco, e uma bela espuma de média duração, a BrewDog Hardcore IPA é uma declaração de amor aos lúpulos (o IBU bate 150 aqui). São três tipos de lúpulos na fórmula (Centennial, Columbus, Simcoe), os mesmos três reforçados no dry-hopping, e três tipos de malte (Maris Otter, Cristal e Caramelo), tudo elevado ao extremo. O aroma é uma porrada de notas cítricas e frutadas (como se estivéssemos rolando na grama) com um leve malte de caramelo fazendo charme. A expectativa para o paladar é de amargor intenso, e a BrewDog cumpre a tarefa com uma elegância de tirar o chapéu. A alta carga de lúpulo está presente ao lado do álcool, e ainda assim é possível sentir o doce do malte. Baita equilíbrio. A sensação inicial é de refrescancia, mas não se engane: a menina esquentará você. E ainda deixará um cítrico como lembrança no final. Como não se apaixonar?

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Próxima loucura: a linha BrewDog Paradox, que compreende uma série de Russian Imperial Stouts envelhecidas em velhos barris de uísque de pequenas destilarias escocesas: Springbank, Longorow, Christmas, Smokehead, Isle of Arran e Jura. As três últimas são mais facilmente encontradas no Brasil atualmente, sendo que você lerá abaixo sobre apenas duas delas. A primeira é a Paradox Isle of Arran, uma cerveja com dois tipos de lúpulo (Galena e Grambling Cross), quatro tipos de malte (Marris Otter, Dark Crystal, Caramalt e Chocolate Malte) e cevada assada. Essa mistura é envelhecida em barris que primeiramente foram de uísque The Arran Malt, depois de Xerez. A cor é um negro intenso e brilhante. A espuma castanha escura é intensa, mas não persiste. O aroma dá as cartas: amadeirado, nozes, frutas secas, álcool, xerez, chocolate amargo, caramelo, baunilha, café e vai embora. No paladar, o primeiro ataque é bastante complexo e traz os 10% de álcool e um dulçor conquistador que lembra calda de ameixa. Nada de acelerar: a linha Paradox é para se degustar suavemente como se estivéssemos bebendo um raro uísque, que, aliás, é presença marcante no retrogosto. Uau!

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Seguindo o método interessante da cerveja anterior, a BrewDog Paradox Jura também é envelhecida em velhos barris de uísque e recebe os mesmos tipos de lúpulo e malte, mas enquanto as anteriores passam “apenas” seis meses curtindo, a Jura descansa nove meses em barris que abrigavam Jura Single Malt Scotch Whisky, um uísque produzido na ilha de Jura, no oeste da Escócia. Como se fosse possível, a cor é ainda mais negra e mais brilhante. A espuma é um suspiro: sobe lentamente e desaparece num piscar de olhos – também, são 15% de graduação alcoólica. No aroma, as notas derivadas do malte torrado dançam como se estivessem em um musical da Broadway: café, chocolate, baunilha, nozes e ameixa seca bailam com álcool (que remete diretamente a uísque), madeira e um toque de defumado. No paladar, quem esperava o álcool se sobressaindo, se surpreende. O conjunto é tão equilibrado que deixa o bebedor a pensar: como esses caras conseguem? O álcool está ali, claro (o calor sobe que é impossível não percebe-lo), mas as notas de chocolate, café, ameixa, madeira e uísque também. Não é uma cerveja, é uma experiência.

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Próximo desafio: BrewDog Tokyo, outra Russian Imperial Stout, desta vez com 18,2% de álcool numa garrafinha de 330 ml. São quatro tipos de malte (Marris Otter, Dark Crystal, Caramalt e malte de chocolate), cevada e lúpulo Galena. Há ainda adição de Jasmim, Cranberries e chips de carvalho durante o processo de dry-hopping. Após tudo isso, quatro semaninhas descansando e ela está pronta para surpreender. A cor, assim como das duas Paradox anteriores, é um negro intenso e brilhante. A espuma sobe acobreada e se mantém por um tempo surpreendemente razoável – levando em conta a quantidade absurda de álcool. O aroma é bastante adocicado remetendo a açúcar mascavo, chocolate amargo, ameixas, baunilha e, claro, álcool e madeira. Na boca, o corpo é alto e a sensação óbvia é de aquecimento, mas mesmo com a percepção clara do álcool – que borbulha na língua, o que surge em primeiro plano é um forte adocicado com retrogosto amargo remetendo ao café (deve ser absolutamente perfeita acompanhando sobremesas). Intensa, mas delicada. Para apreciar com calma e carinho.

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No quesito preços, vale muito pesquisar para encontrar uma BrewDog em bons valores. A Alice Porter pode ser encontrada entre R$ 11 e R$ 22 (a média é R$ 20). Já a BrewDog Dogma está na faixa dos R$ 20. A Brewdog Barrel Aged 77 Lager pode ser encontrada entre R$ 25 e R$ 35 enquanto a Hardcore IPA trafega entre R$ 17 e R$ 27. A linha Paradox é a que sofre maior variação de preços: você pode encontra-la de R$ 24 até R$ 60. Fiz uma pesquisa rápida em seis sites especializados em cervejas, e os preços, em linha crescente, foram: R$ 39,90 – R$ 46,50 – R$ 52,74 – R$ 55,90 – R$ 60 – R$ 67,45. Ou seja, em se tratando de BrewDog, a palavra é pesquisar. E faça isso porque vale muito a pena.

BrewDog Alice Porter
– Produto: Porter
– Nacionalidade: Escócia
– Graduação alcoólica: 6,2%
– Nota: 3,86/5

BrewDog Dogma
– Produto: Strong Scoth Ale
– Nacionalidade: Escócia
– Graduação alcoólica: 7,4%
– Nota: 3,79/5

Brewdog Barrel Aged 77 Lager
– Produto: Strong Pale Lager
– Nacionalidade: Escócia
– Graduação alcoólica: 7,7%
– Nota: 3,43/5

BrewDog Hardcore IPA
– Produto: Double IPA
– Nacionalidade: Escócia
– Graduação alcoólica: 9,2%
– Nota: 4,38/5

BrewDog Paradox Isle of Arran
– Produto: Russian Imperial Stout
– Nacionalidade: Escócia
– Graduação alcoólica: 10%
– Nota: 4,26/5

BrewDog Paradox Jura
– Produto: Russian Imperial Stout
– Nacionalidade: Escócia
– Graduação alcoólica: 15%
– Nota: 4,94/5

BrewDog Tokyo
– Produto: Russian Imperial Stout
– Nacionalidade: Escócia
– Graduação alcoólica: 18,2%
– Nota: 4,10/5

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– Top 1001 Cervejas, por Marcelo Costa (aqui)
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