MECA Festival, uma crítica

por André Takeda

Eu estou velho. Tão velho que já estou começando a fazer comentários tipo “na minha época é que era melhor”. Pois é. Mas, desculpe a falta de humildade, mas às vezes é impossível não pensar que tenho razão. Hoje, por exemplo, decidi conhecer um pouco mais sobre o MECA Festival, que acontece lá no litoral gaúcho neste próximo sábado, 26 de janeiro. É a terceira edição do festival.

Admiro e aplaudo esse tipo de iniciativa. Mas então vejo o line-up. Uma banda pior que a outra, com clipes modernos cheio de gente bem vestida e uma fotografia de Instagram. Tudo bem, até aí seria uma questão de gosto. Só que cometi outro erro: entrar na página do Facebook do festival. E me dou conta que pior que a qualidade musical da banda é a maneira como eles estão vendendo o evento. É o marketing do hype. É a música como uma nova coleção de moda, que daqui a três meses todo mundo vai jogar fora. Sem falar nesse discurso de gaúcho para gaúcho que só tem graça no site Bairrista e olhe lá.

E é então que digo que na minha época era melhor. Menos simples, mas melhor. Nos anos 80 indie era apenas o diminutivo de independente e não um estilo de vida de revistas e blogs. Se não me engano, eu usava mais o termo alternativo para o tipo de música que ouvia do que indie. E sem internet, MP3 e CDs, conhecer novas bandas era uma aventura. Dependia de uma rádio diferente, de amigos que traziam coisas do exterior, de uma coluna mensal na Revista Bizz, de gravadoras como a Stilleto (um selo brasileiro que lançou vários discos legais nos anos 80). Tudo era mais difícil, e por isso acredito que a gente era mais crítico também. Era menos oferta na cara. OK, você vai dizer que com a internet tudo é mais democrático. E eu respondo: a democracia, no caso da música, pode ser uma grande porcaria. Em um mundo com democracia, likes e shares de amigos e modernos, separar os bons dos ruins é cada vez mais difícil.

Quando eu era adolescente o hype, para usar um termo de hoje, era Nick Cave. E Pixies. E Jesus & Mary Chain. E R.E.M. E Beastie Boys. E New Order. E Primal Scream. E Stone Roses. E The Cure. Alguns deles podem até não ser mais relevantes agora, mas é fato que escreveram seus nomes na história do pop. Nick Cave, por exemplo, está aí até hoje, lançando disco novo e em turnê com a Sharon Van Etten, uma jovem promessa do rock. E eu me pergunto se daqui a vinte anos a gente vai se lembrar de Dragonette, Friends e/ou Citizens! Não, não vamos. Mas para a organização e o público de festivais como o MECA isso não faz a mínima diferença. O importante é consumir essas bandas agora porque é cool. Amanhã pode ser “só 2013”. E, como diria a Heidi Klum, aufiedersen para elas.

Mas eu sigo em frente e leio os posts na página do evento no Facebook. E descubro que existem uns tais de clubinhos. Não sei bem o que isso significa, mas só a palavra “clubinho” me dá medo. É a ideia do exclusivo, da piada interna, do fazer parte de algo para ser alguém na vida. Dá para sentir o bairrismo gaúcho recheado de pretensão por todos os lados.

Na verdade, a impressão que eu tenho é que o tal MECA (que, puxa, já trouxe os relevantes Vampire Weekend, apesar de nem 90% do público identificar a influência de Paul Simon na música desses jovens de Manhattan) é um grande clubinho. O clubinho do hype, onde todos são community managers, criativos, donos de start ups, CEOs, fotógrafos, blogueiros e DJs. Tudo ao mesmo tempo.

Repito: acho legal a iniciativa. Só questiono a estética, o discurso. Desse clubinho eu não quero fazer parte. Prefiro ficar aqui, no meu canto, resmungando com a minha velhice e ouvindo Nick Cave. Cujo disco novo, aliás, promete muito.

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André Takeda (siga @andretakeda) é autor dos livros “O Clube dos Corações Solitários” (2001), “Cassino Hotel” (2004) e “A Menina do Castelinho de Jóias” (2011). É colaborador de primeira hora do Scream & Yell e assina atualmente o Tumblr Eu Quero Ser Amigo.

Download: baixe “Ao Vivo”, coletânea de textos de André Takeda em PDF (aqui)

22 thoughts on “MECA Festival, uma crítica

  1. Realmente, o Indie com toda a certeza é o estilo com a maior quantidade disparada de bandas porcaria. Lixo pior que fast-food, pois já vence antes mesmo de sair da chapa.

    A conclusão que eu tenho é que essa gente irrelevante (pois, vamos combinar, fotografo, dj, “criativos”, community managers de indie não servem pra nada e não fazem pagar as contas) citada por você não gostam de música.

    E rapaziada do mundo indie, vocês são criativos, certo? Então vamos ao menos criar nomes melhores para bandas. É um começo…

  2. Takeda, sou gaucho e provavelmente temos a mesma idade, já que lia a revista Bizz lá em 86/87, um dos primeiros discos que comprei foi o ” kicking against the pricks” do Nick Cave. me incomoda muito esse bairrismo gaucho e no geral não acho a menor graça um tipo de esnobismo chato e separatista que uma parte aqui no sul compra, eu e muitos estamos fora dessa merda.

  3. ‘pois, vamos combinar, fotografo, dj, “criativos”, community managers de indie não servem pra nada e não fazem pagar as contas’.

    Enjoada com essa visão pequena e desnecessária.. Faz todo esse criticismo ir por água abaixo.

  4. Belo texto. Agora um pergunta: Onde tu achou elementos de Paul Simon naquele som “tanga frouxa” do tal Vampire Weekend?

  5. Tem muito de Graceland no Vampire Weekend. Não sou o maior fã da banda, mas acho que quando eles acertam em uma música, acertam muito.

  6. Falou tudo!
    Outro dia vi um post estilo “Musas e musos indies”, pensei em como, em outra época, isso seria parte da Capricho, não da cultura indie.

  7. Cara na verdade esses clubinhos são abertos e servem para eles venderem cotas de patrocinios bem caras (eu acho) e quem tem um clubinho poder fazer uma “interação” com o público.

  8. Concordo com o que foi exposto no texto. O problema é que cai facilmente na armadilha da “Síndrome de tiozão”, aquele que alega que tudo no tempo dele era melhor, por mais que a intenção do texto não seja esta. Concordo que as bandas daqueles tempos eram infinitamente melhores do que essas escaladas para o Meca, mas imagino que tanto os “indies” de outrora, quanto essas mesmas bandas clássicas, devem ter sido alvo dos mesmos comentários negativos da parte da galera de 10 a 30 anos mais velha, dizendo “ah, saudade dos Beatles, Who, Sabbath, Zeppelin, King Crimson”, etc.

    Ainda assim, digo que tenho 25 anos e tenho grande carinho pelo povo “alternativo” 80-90, embora se encontre muita coisa boa ainda por aí hoje em dia.

  9. O texto aborda a questão, o contexto onde se insere, de uma maneira que só quem VIVE no meio sabe da porra toda que é.
    “O clubinho do hype, onde todos são community managers, criativos, donos de start ups, CEOs, fotógrafos, blogueiros e DJs. ”
    de agências de publicidade diretamente para as boates…

  10. Clubinho Hype não! Queremos bandas, não it girls, it boyolas e it chatos. E hype é maquina de escrever, totalmente wireless, como diria o povo daquele programa jovem da RBS, Patrola. Isso ai

  11. Takeda, os indies não me incomodam em nenhum aspecto. A relevância do movimento limita-se a alguns blogs e meia dúzia de curtidores, ou seja, ainda bem possui alcance bem limitado.

    O que me incomoda realmente são as bandas e músicas ruins. Esse é o maior problema do indie.
    E o termo alternativo, morreu? Fugazi, Mudhoney na minha opinião são exemplos bem acabados da cena alternativa.

  12. Concordo contigo quanto a necessidade da atenção quanto as bandas, pois realmente nem tudo que é novo é necessariamente bom. Não acho que pensar assim seja agir de maneira saudosista demais, ou ter “síndrome de tiozão” como foi bem comentado aqui. Mas cuidado com o teu preconceito com os gaúchos, teu desprezo por esse “esnobismo” e “pretensão”(que existem sim) foi demonstrado duas vezes no texto(precisava?). Estou com o Paulo, e acho esse papo de separatismo uma merda, e que não é todo gaúcho que é assim. Não confunda o fato de todo gaúcho ter orgulho de suas origens com bairrismo, pois esse, fica só pra alguns.

  13. Tenho 39 anos, creio que tu, Takeda, tenha uma idade parecida. Assim, posso dizer que a minha referência musical inicial tenha sido aquela da década de 80, de parte dessas bandas que mencionaste. Outra coincidência: também sou gaúcho, de Porto Alegre. Pois bem, a minha percepção é um pouco diferente. Se penso nos anos 80 (e, vá lá, também nos 90), realmente havia muita coisa boa para ouvir. É fato também, entretanto, que havia muitas bandas ruins e irrelevantes (assim como hoje). Dessa forma, acho muito perigoso cair nessas generalizações e nostalgias. Se a escalação do festival Meca é questionável, também é fato que Porto Alegre tem apresentado uma safra recente interessante de shows e bandas. Só em 2012, dentro do âmbito alternativo/underground, vi algumas novidades bem interessantes nos nossos palcos, tanto locais (Hangovers, Garage Monsters, Medialunas, Virus Korrosivus), nacionais (Futura, Cidade Cemitério, Renegades of Punk) e até mesmo internacionais (A Place to Bury Strangers). Se há espaço para cultura hipster, isso não quer dizer que fique impossibilitado que outras vertentes estéticas também apareçam, mesmo que numa escala menor. A vantagem de vivermos num mundo com internet e outra tecnologias é justamente a possibilidade de não nos restringirmos a um cenário monocultural.
    No mais, coisas como bairrismo, “orgulho de nossas raízes”, nacionalismo, ufanismo, tradicionalismo e coisas do gênero nunca acabaram em coisa boa (nazismo, fascismo, xenofobia, genocídios étnicos).

  14. Concordo contigo André Kleinert. Mas longe de mim ser xenófobo ou fascista! Só acho que o tom que o Takeda foi tão intolerante quanto o de muitos gaúchos que realmente acreditam em alguma superioridade por terem nascido no RS. No mais, acho que esse tipo de sentimento nem é exclusivo de um lugar ou de outro. Moro em Curitiba e também ouço papo de separatismo, e assim por diante…

  15. Sou gaúcho (e humano) e, como tal, acho que hoje não é um dia para discutir sobre música. Depois de uma tragédia como a de Santa Maria, é ridículo continuar o assunto.

    Dito isso, o meu problema com o hype é (1) quando ele não se justifica musicalmente e (2) a maioria das bandas legais hypadas perdem sentido em um ou dois anos. Fico imaginando se daqui a uma década vamos comemorar uma volta do MGMT como comemoramos a volta do Pixies (que amo) ou do My Bloody Valentine (que não gosto, mas entendo seu valor).

    E meu problema com o bairrismo gaúcho é a piada interna e essa ideia fixa de que vamos dominar o mundo.

    Para terminar, porque escrevi mais do que deveria, é errado pensar que não ouço bandas novas. O que mais rola no meu playlist nas últimas semanas é Islands, Avett Brothers, Russian Red, Veronica Falls e Guards. E estou apaixonado por uma banda superhypada do momento que é o Foxygen.

    No mais, obrigado ao Mac pelo espaço e a todos que leram o texto (sendo contra ou a favor do que escrevi aqui).

  16. Bacana o texto, compartilho da sua opinião, sou do interior do PR e quando queria ouvir coisa nova tínhamos que pegar o busão pra uma cidade maior pra ouvir o que tava rolando, assim que conheci pixies e outras bandas da epoca. Hoje em dia ainda aparecem algumas bandas bacanas que não apelam para o visual e nem bancam as engraçadinhas e tal, mas as que são idolatradas por essa mulecada sensível são as podres.

  17. quanto ao sr tizao, concordo sim! com tudo, apesar de euzinha ter só 21 anos, to com a mesma sindrome de tia, na minha epoca era melhor, haha, de fato as festas na minha cidade, so tocava coisa velha.VELHA E BOA! agora …deixa pra la, qto ao festival a ideia é boa, parece ser um festival bacana, mas qto as bandas,…nao vi, nao li, e nao gostei. nunca ouvi falar desses caras ae….

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