A estreia de Melody’s Echo Chamber

Melody’s Echo Chamber, a retomada pop francesa
por Plynio Nava

Artistas funcionam como antenas: comunicam expressões de seus berços a variadas cadeias de recepção. Sua natureza social irradia-se em campos, permitindo ao público apropriar-se de suas ideias e, consequentemente, gerar significados. Para quais territórios apontarão as antenas raciais de Melody Prochet?

Novidade no circuito europeu, a cantora francesa possui 25 anos de idade, um debut solo e uma dúvida ansiosa. A artista, que despontou este mês nas páginas do New York Times, da Vogue e do Guardian, agradou a crítica ao lançar-se como mentora do seu mais novo projeto, o Melody’s Echo Chamber.

Amparada por Kevin Parker, do Tame Impala, Melody Prochet chega a nós como melhor convém aos franceses – à sua moda: carregando nos lombos o homérico trabalho de revisar o imaginário pop de Paris. Musicista de formação, Melody Prochet domina piano, violão e sua voz lânguida dá o tom à sua mais nova empreitada.

A jovem cantora, cujo porte nos remete às francesas da década de 50, já teve passagem por grupos como Narcopletic Dancers e My Bee’s Garden (que chegou a lançar um CD e abriu shows do Tame Impala), mas nenhum dos citados foi suficiente para garantir-lhe a tarefa-chave de sua estreia com o Melody’s Echo Chamber: assimilação e tradução.

Influenciado por grupos como Stereolab e Broadcast, e facilmente ligado a artistas como Chris Cohen, o disco homônimo de estreia do Melody’s Echo Chamber apresenta uma coleção de indícios que, atentamente observados, tornam visíveis os prognósticos de um empreendimento pessoal. A consideração tem, claramente, faro profético, mas se ampara numa forte evidência: a renovação da chanson feita pela artista.

Melody Prochet aparece-nos, às vésperas do fim do mundo, como uma das mais honestas propostas do estilo neste começo de novo século, colocando em voga o primado da interpretação em detrimento dos aparelhos que complementam o projeto renovador de um gênero.

“Melody’s Echo Chamber”, o álbum, capta sonoridades para veicular sinestesias. Abrindo o disco, a faixa “Crysttallized” integra elementos do krautrock e electro criando um campo sonoro explosivo que cai perfeitamente bem nas pistas. Melody Prochet é sensual. Sua voz projeta a falsa inocência da puberdade para nos levar a mais flexível fronteira do dream pop.

Em SomeTime Alone, essa inclinação é bem acertada com o uso de arpejos que transportam os ouvidos mais sensíveis a paisagens oitentistas. Os efeitos sonoros, aliás, caracterizam perfeitamente a proposta do álbum, que abusa de delays, fuzz e reverbs, criando ambientes artificialmente nostálgicos, como pode se ouvir na faixa “Endless Shore”.

Se o conceito de Melody Prochet se justifica em sua busca pela revalorização do pop francês, nada mais sensato do que cantar em sua língua natal: “Quand Vas tu Rent” e “Bisou Magique” são duas peças vintage no melhor estilo Ye Ye Girl (Françoise Hardy pisca o olho) e coroam o álbum de estreia da cantora.

Melody’s Prochet dividiu as gravações de seu disco entre estúdios do litoral francês e Austrália. O álbum ganha edição nacional pelo selo Vigilante, da Deck, e retoma a dúvida que iniciou este texto: seriam seus indícios peças para compor um jogo autoral? Qual o alcance de seu projeto em territórios que anexam nichos para consolidar aldeias globais?

Garantindo espaço ao lado de Charlotte Gainsbourg, Émillie Simon e CocoRosie, esta é uma questão que somente este novo caleidoscópio, chamado Melody Prochet, poderá responder. E, claro, o próprio tempo.

– Plynio Nava (@PlynioNava) é jornalista e pesquisador de gêneros musicais. Apresenta o programa Sampler, na Rádio Universidade FM.

Leia também:
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– Kevin Parker e a arte de trás para frente, por Mateus Ribeirete (aqui)
– Charlotte Gainsbourg: melhor em estúdio do que no palco, por Marcelo Costa (aqui)
– “O inferno? Não, a França”, por Flavia Ballvé (aqui)
– Françoise Hardy e Serge Gainsbourg, Deuses Franceses do Pop, por Claudia Ferrari (aqui)

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