CDs: Marinas, Rita Lee, Cris Braun

por Marcelo Costa

“Literalmente Loucas”, Várias (Jóia Moderna)
O conceito: um álbum tributo às canções de Marina Lima (e de seu irmão, parceiro e poeta Antônio Cicero) registrado na voz de 12 cantoras da nova geração da música (im)popular brasileira. A jornalista Patrícia Palumbo caprichou na seleção de artistas (talvez Marina Aydar, Mallu Magalhães e Lulina pudessem entrar numa próxima parada), mas a seleção de canções lado C organizada pelo DJ Zé Pedro desperdiça um grande projeto, que poderia ganhar visibilidade e abraçar mais ouvintes. Ok, o fã-clube atual de Marina deve ser menor do que a torcida da Portuguesa, e junto ao das cantoras selecionadas deve lotar o estádio do Juventos, na Rua Javari, mas é quase um acinte homenagear o repertório da cantora e deixar de fora um hino como “Fullgas” (do verso clássico “Você me abre seus braços / E a gente faz um país” num momento de abertura política) e hits como “Virgem”, “Acontecimentos” e “Pra Começar” (logo de Marina, que sabia tão bem escolher suas covers). Das doze cantoras, Karina Buhr se sai muito bem com “Tão Fácil”, Barbara Eugênia brilha (escudada pela guitarra de Júnior Boca) em “Por Querer (Todas)”, Andréia Dias embala o ouvinte em “Quem É Esse Rapaz” e Anelis Assumpção delicia-se com a frágil “À Meia Voz” (em arranjo encorpado) num disco que ainda traz Tulipa, Nina Becker, Joana Flor, Marcia Castro e Iara Rennó (entre outros), algumas prometendo (outros olhos e) armadilhas. Marina cantava: “Sexo é bom”, mas “Literalmente Loucas” carece de desejo, unhas nas costas, tesão. É reverencial e tímido demais. Uma pena.

Preço em média: R$ 29
Nota: 5

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– Karina Buhr: qualidade e frescor que anda fazendo falta no mainstream nacional (aqui)

“Reza”, Rita Lee (Biscoito Fino)
Quebrando um silêncio de nove anos sem um álbum de inéditas (o último de estúdio foi “Balacobaco”, de 2003 – nesse meio tempo, Rita lançou “MTV Ao Vivo”, de 2004, e “Multishow Ao Vivo”, de 2009), a sessentona Rita Lee mostra que continua afiada em “Reza”, seu vigésimo primeiro álbum de estúdio. A produção dividida entre Roberto Carvalho e Apollo Nove acena o rumo: “Reza” é meio roqueiro, meio jazzy e meio eletrônico. Releve bobagens como “Paradise Brasil”, “Tutti Fuditti”, “Bamboogie Woogie” e “Pow” e concentre-se na ironia de rockzinhos básicos que reduzem as pancadas características de Iggor Cavalera (o ex-Sepultura assume as baquetas nas autodepreciativas “Tô um Lixo” e “Vidinha”, a segunda uma das melhores do álbum com Rita resumindo: “Faço terapia, malho todo dia, pratico yoga, não uso mais droga, vidinha besta, vidinha de merda”) e Flávio Forgotten (em “As Loucas”, em que Rita se apropria do dito popular: “Eles amam as loucas, mas se casam com outras”) a batidinhas anos 50, que, ambientadas na mixagem (que valoriza principalmente os timbres de guitarra), não trazem a marca dos bateristas – embora ainda assim empolguem. João Parayba marca presença na boa “Rapaz” (e em outras), e conforme o laser corre o álbum, “Reza” soa um disco que Rita (e Roberto Carvalho) já fez várias vezes (e, pelo jeito, continuará fazendo): “Divagando” clona “Nem Luxo, Nem Lixo”; a faixa título pode dar um bom mix com “Bwana”; “Gororoba” atualiza “Yê Yê Yê”, e por ai vai. Mais do mesmo para o bem e para o mal.

Preço em média: R$ 30
Nota: 6,5

Leia também:
– “MTV Ao Vivo”, de Rita Lee, não tem impacto, nem força, nem inspiração, por Mac (aqui)

“Fábula”, Cris Braun (Independente)
Gravado durante três anos na “ponte-aérea” Maceió-Rio, o terceiro disco de Cris Braun revela um cuidado especial com o repertório, que destaca logo na abertura duas canções de Wado (presente na guitarra): “Ossos” (do segundo álbum do compositor, “Cinema Auditivo”, de 2003) e a inédita “Cidade Grande”, resumo realista da vida nas capitais (elo entre “Tormenta” e “Pavão Macaco”) que questiona: “Será que ainda há sangue em nossas veias?”. O violão de 7 cordas, o cavaquinho e as castanholas embalam “Tanto Faz Para o Amor”, de Lucas Santtana e Quito Ribeiro, enquanto a delicada “Deve Ser Assim”, de Marina Lima e Alvin L (ele, parceiro de Cris no Sex Beatles, um grupo a ser redescoberto) conta com a guitarra de Gustavo Corsi, ex-Picassos Falsos. O “lado b” do álbum é mais incisivo, aberto pela instrumental “Artérias” (com Cris no baixo e no violão de nylon com distorção) e pela pegada forte de “A Viga” (“Pior que acordar sem cigarro é o time perder no domingo”, diz a letra), segue com o samba funk “Oscilante” e a ótima “O Amor Calou” (com citação de “Carinhoso”). “Memória da Flor”, que conta com Celso Fonseca, soa um resgate da memória daquilo que o samba tinha de melhor (território em que também trabalha Romulo Fróes, por exemplo), e fecha um disco para ser ouvido hoje, amanhã e em 2037. Oito anos separam “Fábula” de “Atemporal“, seu registro anterior, mas na prática parecem gêmeos nascidos no mesmo dia, filhos do mesmo mundo. Cris sabe bem o som que busca. E ele é bonito, bem bonito.

Preço em média: R$ 25
Nota: 8

Leia também:
– “Sou uma moça rock and roll, mesmo sem fazer rock and roll”, diz Cris Braun (aqui)

9 thoughts on “CDs: Marinas, Rita Lee, Cris Braun

  1. Rita Lee pra mim hoje em dia é que nem os Titãs. Ou seja, um defunto insepulcro.
    Ela parece fazer por obrigação.
    Como Chico Buarque, parece não ter mais tesão no ofício.
    Já esse projeto com músicas da Marina me lembrou o 3NaMassa. A idéia é bem melhor que o resultado.

  2. Pra mim, o problema da Rita é o Roberto. Se ela pegasse um produtor que colocasse o Roberto em seu canto, bem possível que o resultado soasse melhor. Ainda assim, metade do disco acima é bem boa – e ela ainda é uma grande letrista e tem boas sacadas. Só está pecando no registro.

  3. Putz, Mac, eu sempre achei que a Rita perdeu muito, em termos de musicalidade, com a parceria com o marido dela desde os anos oitenta.
    Virou um pop, bem feito é verdade, mas bem inofensivo.
    Gosto da Rita dos Mutantes e do Tutti Fruti.

    PS: Imagina se ela tivesse passado os anos 80 casada com o Arnaldo Baptista?!

  4. Acho a dupla Rita e Roberto geniais, pop de altíssimo nível. Mas concordo que a parceria deveria se ater às composições, deixando a produção do disco para outra pessoa.

  5. zé henrique, respeito suas opiniões, mas o chico lançou um disco ano passado, que por sinal entrou em diversas listas de melhores do ano, isso não quer dizer nada, mas musicalmente o disco está muito bom, bem arranjado e produzido. sem contar a turnê que ele fez. um abraço.

  6. Valeu a consideração, Lucas.
    Mas foi o próprio Chico há alguns anos quem disse que gostava nos dias atuais bem mais de literatura que de música.
    A impressão que me passa é que ele lança um disquinho e sai em turnê de cinco em cinco anos pra pagar as contas.
    No que eu lamento duplamente, Tanto o fato em si, quanto o absurdo de um artista do seu naipe ainda ter que correr atrás da grana.
    Mas, enfim, vai que a ruivinha Gulin deu um novo ânimo a ele, né?
    Já Rita Lee não me parece ter jeito.
    Ahh, a Rita mais pop, com o Roberto Carvalho, não é ruim, claro. Mas eu sempre lamento artistas mais para o rock virarem pop.
    Acho uma perda.

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