O grande show do James em São Paulo

por Marcelo Costa

Numa noite bastante fria de segunda-feira, véspera de feriado, uma banda inglesa não muito conhecida no Brasil está prestes a fazer seu primeiro show no país. Apesar de já ter vendido cerca de 15 milhões de discos em sua carreira, que começou em 1982 em Manchester, na Inglaterra (ou seja, contemporâneos dos Smiths), o James é praticamente desconhecido por estes lados, e precisou bancar este show único no Cine Jóia, em São Paulo, pelo simples desejo de tocar no Brasil pela primeira vez. Feriado, banda pouco conhecida e quase nenhuma divulgação nos meios de imprensa criavam a expectativa de uma noite vazia. Feliz engano.

Aproximadamente mil pessoas se dispuseram a enfrentar o frio para presenciar a estreia do James na terra de Neymar e Pedro Leonardo. Após um período de muito sucesso nos anos 90 (consequência direta de uma sequencia quase impecável de álbuns: “Gold Mother”, de 1990, “Seven”, de 1992, e principalmente “Laid”, de 1993 – os dois primeiros alcançaram o número 2 da parada britânica, enquanto o terceiro bateu na terceira posição), a banda se separou em 2001. Tim Booth, o vocalista, se mudou para Los Angeles, tentou carreira solo, mas cedeu ao apelo dos ex-companheiros em 2007, quando de uma jam session nasceram canções novas.

Corte para 2010, Festival da Ilha de Wight. Paul McCartney está encerrando seu show no palco 1, e ainda assim o James, headliner do palco 2, consegue atrair cerca de 10 mil pessoas no mesmo horário (o público aumenta assim que Sir Paul deixa o palco). Enormes na Inglaterra e praticamente inexistentes na América do Sul. No Lollapalooza Chile 2011, por exemplo, o orçamento limitado impossibilitou que o trompetista Andy Diagram acompanhasse o grupo, o que obrigou o corte de algumas canções do set list. A banda tocou, gostou, e fechou uma nova turnê para 2012 na raça, com shows em Santiago e, desta vez, em Buenos Aires e São Paulo.

A quantidade de pessoas na plateia parece não interferir no pique do James ao vivo. Ou, clichê máximo, a banda parece ter necessidade do palco, como se o “ao vivo” fosse necessário para o grupo continuar em frente. Em São Paulo, a coisa não é diferente. Ou, talvez, até seja: bem provável que o grupo não esperasse um séquito de fãs tão fiel do lado debaixo do Equador. Alguns modelos de camisetas esgotam na banquinha na entrada da casa (mesmo custando R$ 80) e uma plateia mais adulta (por vezes, até grisalha) aguarda o grupo entrar no palco.

“Dust Motes”, faixa climática do EP “The Morning After”, lançado em 2010, abre o show com certa dose de coragem: Tim Booth na voz acompanhado apenas pela guitarra estilosa de Larry Gott e por uma cama suave de teclados de Mark Hunter. A voz ecoa pelo velho cinema, e Booth parece exigir a atenção do público por cerca de três minutos, quando o resto da banda entra e o som preenche toda a casa. Será uma das raras concessões a material novo durante todo o show. Dali em diante, como diria outro, seria hit atrás de hit.

“Five-O”, do festejado álbum “Laid”, começou a festa, mas foi com “Seven” que o grupo mostrou a que veio: Tim Booth foi para a beira do palco e deixou seu corpo cair sobre as pessoas da primeira fila, cantando alguns segundos nos braços da audiência. Um corre-corre de fãs movimentou o gargarejo enquanto a banda aumentava o ritmo da canção num final épico. “Ring The Bells”, a próxima, surgiu em uma versão poderosa, e levou fãs à loucura ecoando o corinho brega “olê, olê, olê, James, James”. Era só a quarta música, e o faz tudo Saul Davies precisou dirigir-se a plateia, em português de Portugal: “Faz calma, faz calma”.

A plateia até tentou conter a emoção, mas “Born of Frustration”, cujo clipe bateu ponto na MTV Brasil no começo dos anos 90, incendiou o Cine Jóia: Booth deixou o palco e começou a cantar no meio do público, caminhando até o bar central do local (para desespero dos seguranças). Subiu no balcão e dali regeu a audiência em uma versão encorpada do hit, um dos grandes momentos da noite – que ainda teria “Say Something”, “Lose Control”, “Sit Down” e “She’s A Star”. A postura de palco do grupo é impressionante, e contagia. Quase uma aula.

Para o bis, quatro canções, e a noite se encerra com a ótima “Getting Away With It (All Messed Up)”, do subestimado “Pleased to Meet You”, de 2001. Finito? Não. Os técnicos desligam o som, mas o coro do público traz Tim e Larry para uma versão improvisada de “Sometimes”, voz e violão. O público canta junto, e Saul Davies aparece e pega um segundo violão. Andy Diagram também retorna, sem o trompete, e reforça o coro no refrão. A voz do público encobre a banda, e o baterista David Baynton-Power aparece, e fica na dúvida se vai ou não pra bateria, mas acaba cedendo e o que era improviso se torna uma grande versão num show de final épico.

O show termina, mas os aplausos não cessam. Saul Davies pede silêncio, e encerra a noite com um recado em português: “Nos esforçamos muito para tocar no país de vocês. Essa noite é muito especial para nós”. Não havia destaque no Guia da Folha. A Veja São Paulo não citou o show e os cadernos culturais ignoraram  a passagem da banda pelo País (Scream & Yell incluso, muito embora o site não seja especializado em serviço de shows), mas ainda assim, por duas horas, o James entregou aos paulistanos uma das apresentações mais empolgantes dos últimos meses na cidade. Mil pessoas assisitiram a um dos shows do ano. Felizes elas.

Veja outros vídeos do show aqui -> http://www.youtube.com/user/BRsurfer

Set List
Dust Motes (The Morning After, 2010)
Five-O (Laid, 1993)
Seven (Seven, 1992)
Ring The Bells (Seven, 1992)
Laid (Laid, 1993)
Johnny Yen (Stutter, 1986)
Hey Ma (Hey Ma, 2008)
Play Dead (Whiplash, 1997)
Born of Frustration (Seven, 1992)
Say Something (Laid, 1993)
Top Of The World (Gold Mother, 1990)
Lose Control (Gold Mother, 1990)
She’s A Star (Whiplash, 1997)
Sit Down (Gold Mother, 1990)
Stutter (One Man Clapping, 1990)

Bis:
P.S. (Laid, 1993)
Tomorrow (Wah Wah, 1994)
Sound (Seven, 1992)
Getting Away With It (All Messed Up) (Pleased to Meet You, 2001)

Bis 2:
Sometimes (Laid, 1993)

19 thoughts on “O grande show do James em São Paulo

  1. Pô MAC, não imaginas o palavrão que soltei quando vi essa chamada. James é uma das minhas bandas preferidas. teria feito a loucura de ir a sp só pra vê-los. que bom que pelo menos tem o video,,,mas foi dolorido ler teu texto. a frustração me bateu.

  2. Estive no show do James ,e ainda estou em estado de choque.Que show!!!
    Aguardei a saida da banda e todos os integrantes da banda agradeciam pela nossa presença.
    Perguntei quando voltariam e o Larry (pelo que entendi) precisaria de 10000 acessos na internet.
    So posso dizer ,”Venha de novo ao Brasil”,que serão bem vindos.

  3. Valeu cada tostão ter saído de Santa Catarina com minha esposa para assistir esse show maravilhoso. Inesquecível!!!! Espero que eles voltem em breve!!!!

  4. Sensacional!!!! Comprei o ingresso no primeiro dia no site ainda em US$! Não poderia perder por nada. A banda que acompanho desde 1986 e para mim é a melhor, em melodias, performance… O show foi D+ e o lugar uma grata surpresa. Para poucos e bons! Um clima alternativo, o som nem estava um primor, mas o todo foi inesquecível! Quanta à falta de divulgação, melhor assim. Estive no show do Morissey e a organização foi uma m… 5000 pessoas, sem educação, local péssimo para shows com palco muito baixo. Adorei esse clima intimista, e espero muito que voltem.

  5. Foda. Tentei muito ir para o show do James e ficar até o show do Noel. Mas, infelizmente não deu, o trabalho não deixou. Depois de ler o teu texto fiquei com mais raiva ainda. James é uma puta banda. Uma das coisas que escutei mais nos anos 90. Discos como Seven e Laid são fenomenais. Tim Booth é um cantor de mão cheia. Foda. De novo. O jeito é ver os videos e colocar o dvd do Getting Away With It live para rodar. Abração Mac (apesar do sentimento de inveja estar acima dos limites normais nesse momento) :))

  6. Saí do Recife pra passar 2 horas na fila, sob um frio de matar nordestino, mas foi foda, um dos melhores shows da minha vida! =)

  7. Cara, sua narrativa ,e deixou arrepiado e com o remorso de ter perdido este show.
    Sou de Salvador-ba e coisas como estas nunca vão acontecer por aqui.
    A distancia que nos separa de uma metropole de verdade nos tem tornado cada vez mais carente de espetáculos de qualidade.
    Mas felizes mesmo foram este mil espectadores..

  8. Sai de Floripa so para o show e já sabia, foi inacreditavel realmente de emocionar, exelentes musicos com otima presença em palco, claro destaque para o vocalista. Melhor show dos ultimos anos, se vou devovo.

  9. Pena o RJ ficar de fora. O James é espetacular, e gostaria muito de ter visto ao vivo Getting Away With It…

    “DANCE LIKE JOHN TRAVOLTA!!!”

  10. pois eu tratei de comprar ingresso e passagem assim que soube da vinda deles,
    e nunca fui tão feliz!!
    Amo eles desde 1990, e fui morar em Londres no 2º semestre de ’94, mas infelizmente eles lançaram o Wah Wah Wah sem nenhum show…
    Me mordi de raiva por nao poder ir no Lollapalooza do Chile ano passado…
    E finalmente fui recompensado!!
    Fiquei no gargarejo, com direito a apertar a mão do Tim, cantar todas as músicas, e sair rouco.
    Falotu “Just like Fred Astaire” ou “I know what I’m here for” representando o “Millionares” (que foi o 3º álbum deles a chegar no 2º lugar da parada inglesa em ), e Destiny calling” e/ou “Runaground” representando a fase do “Best of”.
    Mesmo assim, foi perfeito!

  11. Para todos que foram e para os que não poderam ir, curtão a pagina no Facce “James Brasil”.Para os produtores aqui no Brasil saiba que o James tem vários fãs e que tragam eles novamente.

  12. Marcelo parabens pelo texto!!
    Estivemos em NYC em 2009 apenas para ver um show do James e imaginando que eles jamis viriam ai Brasil, mas nada melhor qie ir a um show como este na nossa terra e com uma turma de amigos,
    Inesquecivel!!

  13. Que privilégio assistir a este show do James, superou todas as expectativas. Poder vê-los pertinho, cantar junto com eles e sentir toda aquela vibração da banda e dos fãs foi incrível!!! Coisa rara de acontecer em shows maiores. Para mim, foi uma emoção apenas comparável à primeira vez que o Echo & The Bunnymen tocou no Brasil. Bem que o James poderia seguir o exemplo do Echo voltar sempre pra cá… Enfim, como disse o Marcelo em seu excelente texto, feliz quem esteve lá. E quem não pode ir, que tenha uma nova chance de vê-los tocar no Brasil. Grande banda, grande show!!! Valeu James!!!

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