Pernambuco além da crítica

por Thiago Venanzoni

Na garoa de uma sexta-feira qualquer, desembarcam no aeroporto de Congonhas, em São Paulo, jovens de Pernambuco que diziam fazer o chamado Manguebeat, estilo de música que, grosso modo, mistura a batida do maracatu e sons regionais com instrumentos elétricos, mas que na realidade vai muito além disso. Pupilo, Otto, Fred 04, Lucio Maia e Chico Science eram alguns desses que partiam, no começo da década de 90, para tocar em festivais universitários e pequenas casas noturnas de São Paulo, desbravando, como verdadeiros migrantes nordestinos, a cidade grande e o sul do Brasil.

O que hoje é conhecido como um marco nacional, naquela época ainda era completamente novo. Os expoentes do Manguebeat queriam fazer música e cada um à sua maneira. Otto, um dos mais experimentais, afirmou algumas vezes que havia entre eles uma rivalidade sadia, na qual um queria se diferenciar musicalmente do outro. Por essa razão é possível presenciar na cena uma composição tão diversa da outra, mesmo que colocassem, já naquela época, tudo em um mesmo rótulo (indevido, diga-se).

A razão da rotulação é bem simples: tratava-se de algo estranho aos grandes centros, como São Paulo e Rio de Janeiro, e por todos serem de uma mesma região, o agrupamento indevido aconteceu. A crítica criou uma confusão, fácil de ser resolvida, mas que ainda, por insistência de alguns, permanece no senso comum.

Atualmente, como afirma o cantor China, “Recife (e Pernambuco) tem música ruim, como qualquer lugar, mas é onde se faz a melhor música do Brasil!”. O discurso nada burocrático do músico tem sua razão de existir. Não só para dizer que há diversidade na música do estado, como também afirmar que há muita qualidade. A recente geração de Mombojó, do próprio China – em carreira solo –, da não tão recente Eddie, de Jr. Black, Catarina Dee Jah, A Banda de Joseph Tourton, Karina Buhr, Orquestra Contemporânea de Olinda, entre outras, reafirma a exclamação colocada acima.

Um dos exemplos colocados, Mombojó, se traduz simbologicamente para a dita diversidade musical. Em seu mais recente álbum, “Amigo do Tempo”, lançado em junho do ano passado, ouve-se uma banda em profundo redescobrimento harmônico, situando-se em outras lacunas musicais que se diferem dos dois primeiros discos, “Nadadenovo” e “Homem Espuma” – esses dois, já diferentes entre si.

A explicação não está apenas na mudança estrutural do Mombojó como grupo, com a saída de um integrante e o trágico falecimento de outro, mas também em uma busca constante pelo movimento, pela mudança. Como dizem em sua canção “Justamente”, do disco de 2010, “Todo dia muda alguma coisa e não sou a mesma pessoa de algumas horas atrás”. Apesar da alternância de valores e sentimentos de suas canções, o Mombojó não perde a identidade, nem do Recife, e nem a construída desde a sua formação.

China acredita que o Pernambuco não se pode restringir apenas ao que houve no começo da década de 1990, cena a qual participou ativamente com sua antiga banda Sheik Tosado. Porém, não nega – e nem deve negar – que a turma que veio antes, do Manguebeat, foi, e ainda é, de suma importância para o que se faz atualmente no Estado. “A nossa última grande referência em Pernambuco tinha sido Alceu Valença, ainda da década de 1970 e 1980. O ‘mangue’ trouxe uma renovação na música local muito sentida e respeitada.”, completa o músico. De fato, as referências diversas e o modo autoral de composição nascido no estilo são as características que permanecem vivas entre os atuais músicos, e não apenas ao que se restringe à antropofagia e regionalidade do Manguebeat, como comparam por aí.

Entre os quase desconhecidos, a cantora e compositora Catarina Dee Jah compartilha dessa opinião. Para ela, tudo faz parte do desenvolvimento natural que o tempo trás e da revolução na troca de informações que hoje voa junto com a internet. Apesar de considerar isso algo bom, pondera e polemiza sobre o que se faz hoje em seu estado: “O Manguebeat foi a ponta de lança de tudo o que está acontecendo, mas hoje sobra estética e falta conteúdo”.

Dona de um estilo único e distante de quase tudo que se faz no país, com influências do soundsystem jamaicano, Bollywood e punk rock, Catarina – que em alguns momentos recebe a alcunha de “Joelma punk” – atrela a sua liberdade e seu conhecimento musical, e a de todo estado, à revolução citada: “Antes não existia uma cena, não existiam profissionais e técnicos, tudo isso foi formado a partir daquela época com as primeiras turnês internacionais e as primeiras edições do Abril pro Rock (festival de rock mais importante do Recife). Somos comprometidos com a música, isso está intrínseco na nossa maneira de falar, compor e viver.”

Na mesma toada estão os garotos instrumentais da Banda de Joseph Tourton. Para eles, não tem como dizer que não há nada do estilo encabeçado por Chico Science na música que é feita hoje em Pernambuco, porque, afinal, ele “mexeu na história da canção pernambucana”. Apesar disso, até por serem bem novos, defendem a opinião que este não existe mais e seu tempo já passou, ideia contemplada por alguns que fazem música por lá.“No nosso caso não fazemos músicas “manguebeat”, fazemos o som que nós gostamos de fazer: que nada mais é do que todas as influências dos integrantes unidas e sintetizadas.”, afirma Gabriel, um dos integrantes. A Banda de Joseph Tourton, que mescla influências de música do mundo inteiro em um som instrumental, é outra que reflete a qualidade musical, e, principalmente, a diversidade que se apresentam atualmente no Pernambuco.

O Manguebeat foi algo que teve – e tem – uma importância fundamental para a propagação do Pernambuco hoje e isso é um fato que nunca será alterado. Porém, as influências mudaram e a diversidade musical aumentou, o que desvencilha, um pouco mais, o que ocorre agora com o que houve antes. Deixando as claras, a música do estado está em um processo de amadurecimento, que busca outras musicalidades e outros suportes. Como diz Catarina Dee Jah, Pernambuco tem uma profusão de estilos que vai desde a cultura popular renovada à bandas de infinitos estilos sonoros. Ou seja, há no estado uma liberdade de criação e originalidade que não se vê no resto do país, o que coloca a dita cena musical contemporânea pernambucana muito além de um estilo, de um rótulo e, principalmente, da crítica.

20 thoughts on “Pernambuco além da crítica

  1. Mombojo era novo a 7 ou 8 anos atras, china então. Catarina de jaah é exotica, não necessariamente representa a musica de PE, ainda mais porque a qualidade é uma parada bem pessoal nesse caso. Tem muita coisa nova pra colocar no lugar galera ai, so A Banda de Joseph Tourton representa realmente o novo.

    Mas, se voce for ver a nova cena pernambucana, eles são o principal destaque realmente.

  2. Diego, se você perceber, essa geração toda faz parte da musica nova que se faz em recife. e porque? porque eles estão sempre se renovando e fazendo coisas interessantes.
    por exemplo: jr blakc e catarina foram produzidas por china, o joseph tourton foi produzido pelos caras do mombojo. então da pra sacar que na verdade, e como ja disse 04: o que era velho no norte, se torna novo no sul.

  3. isso ‘e um absurdo. o que se ve e um bando de picaretas musicais que nem sequer sabem ler partituras, se dizendo fazer um som inovador, enganando um monte de criticos musicais que na verdade sao jornalistas!

  4. as bandas da epóca do manguebit estão melhores ainda.mais amadurecidas e com muita experiência. e a nova geração da música pernambucana vem mostrando que recife é o lugar “altamente” compromissado com um som de qualidade.o que nos diferencia do resto do país é a multiculturalidade do nosso povo…tem espaço pra irom maidem como tem pra joelma e chimbinha….viva a MPB——MÚSICA PERNAMBUCANA BRASILEIRA!

  5. A questão principal a ser discutida é a confusão que ainda fazem sobre o que é feito em Pernambuco hoje, e foi o que eu tentei fazer no texto: trazer à tona esse debate. É um texto que esbarra no crítico, poderia ser um ensaio, um livro-reportagem, mas preferi dar voz aos envolvidos. O debate sobre a qualidade musical, de uma banda ou de outra, ou de quem faz música a mais tempo ou a menos tempo, está em outro parâmetro. Mesmo que eu cite tudo isso, é simplesmente para justificar a profusão de estilos que eclode dentro da cena de um estado.

  6. Angelo, o que é novo no sul, continua sendo velho no norte né?! Como moro mais pro norte, eles nao representam a nova música de PE pra mim. Talvez as bandas que eles estão produzindo podem ser a nova safra, mas não eles.

    Deixe de se curvar pro sul do pais, agora é a vez deles pagarem pau pra nós! É o que vem acontecendo de uns tempos pra cá…

  7. A Catarina Dee Jah disse que sobra estética e falta conteúdo.
    Ela tava falando dela?
    Sou pernambucano e muito fã do Manguebeat, mas essa geração atual – excetuando o Joseph Tourton – é muito fraquinha. O tal de JR.Black é de fazer rir.
    Ahh, Pupillo não é pioneiro. Ele nem participa do Da Lama ao Caos.

    PS: Não vejo confusão nenhuma com o som feito em pernambuco hoje em dia. Como em qualquer lugar o som é bom ou ruim.

  8. Orgulho ducaraleo de ter Pernambuco no sangue, na História e conhecer muitos desses “meninos”. Amigos, colegas de escola, família… tudo vale…

    Se é “Mangue”, ou se não é… agora não tem tanta importância. O importante mesmo é mostrar pro mundo as coiss boas que Pernambuco tem!!! A identidade musical essa galera já tem… falta somente rotular… mas precisamos e rótulos? Acredito que não.

    Beijos, meus queridos.

  9. Orgulho ducaraleo de ter Pernambuco no sangue, na História e conhecer muitos desses “meninos”. Amigos, colegas de escola, família… tudo vale…
    Se é “Mangue”, ou se não é… agora não tem tanta importância. O importante mesmo é mostrar pro mundo as coiss boas que Pernambuco tem!!! A identidade musical essa galera já tem… falta somente rotular… mas precisamos e rótulos? Acredito que não.
    Beijos, meus queridos.

  10. amigo Johnson.

    A música veio antes da partitura assim como a fala veio antes da escrita.
    Um músico que se diz músico, que não sabe os fundamentos nem muito menos a construção musical, é o mesmo que um escritor que não sabe ler, nem as funções gramaticais de sua lingua.

    O que se vê hoje em dia é um bando de maconheiros, que tocam o que vem a cabeça, sem nenhum fundamento. Pernambuco já está cheio de arte naif, agora ainda mais intrisseco na música por causas desses criticos bobalhões, como o que redigiu esta matéria!

    Mas você tem muito orgulho de ter uma arte ingenua!

  11. “O que se vê hoje em dia é um bando de maconheiros, que tocam o que vem a cabeça…”

    Músicos jovens com a cabeça cheia de idéias (e não só idéias, hehehe) fazendo o som que bem entendem é uma das definições de “boa música” pra mim. Há bons músicos que sabem ler partitura e maus músicos que também sabem ler partitura. Independente dessas discussões tolas, Pernambuco vem produzindo música boa desde muito tempo (diria até que antes do Manguebit) e isso é ótimo.

  12. O amigo Carlos faz o tipo – como diria Nelson Rodrigues: Idiota da objetividade.
    Não posso deixar de dizer que me causa dó gente obtusa.
    Desejo melhoras, man!

    PS: Nação Zumbi, Lenine, Otto… me faz ter orgulho do som feito por meus conterrâneos

  13. Amigo Carlos, releia antes de enviar: seus erros grosseiros gramaticais mais parecem sua ideia musical de Pernambuco, se é que me entende. São intrínsecos à sua mediocridade ingênua.

  14. Se a música de Recife é feita por uma bando de “picaretas musicais que nem sequer sabem ler partituras” e “um bando de maconheiros, que tocam o que vem a cabeça, sem nenhum fundamento”, então eu quero mais picareta musical maconheiro fazendo essa música na Bahia, no Rio Grande do Sul, em São Paulo, no Rio de Janeiro…

  15. Porra e olá!!

    Graças a Deus vcs tem algo pra discutir. Diferente de outro lugares do país. No Rio vivemos a miséria cultural do ¨funqui¨.
    Somos um país que não sabe nem de longe o que são suas raízes.
    Forró forever!!
    Chico na veia!!
    Pau no cú de quem acha que é músico quem lê partitura!!

    Beijos ensadencidos de saudades de um carioca

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