Belle and Sebastian ao vivo em SP

texto por Juliana Zambelo
fotos por Stephan Solon / Via Funchal

Assisti ao show do Belle and Sebastian no Via Funchal ao lado de um amigo que completava 30 anos dali a poucas horas. “Estou me despedindo dos meus 20 anos hoje”, ele disse. Naquela hora eu sentia a mesma coisa.

Em 2001, quando a banda veio para o Free Jazz, eu tinha vinte anos e um pouquinho. Estava na faculdade e lembro de ter matado a aula da tarde para estar cedo no Jóquei Club e não perder um segundo da noite.

Naquela época, o B&S tinha só quatro discos e um punhado de singles. Stuart Murdoch cantava sobre estudantes solitários, deslocados, infelizes, inseguros. Eu era tudo isso. Ele falava de mim. Oh, eu queria que alguém me tirasse dali. Sim, eu achava que estava morrendo.

Durante o show, com toda a plateia cantando cada uma das músicas em uníssono, extasiada, eu tive certeza que não era a única. O público cantava alto e encobria o som que saía dos autofalantes, o clima era de celebração e felicidade, um encontro de iguais. “Oi, eu sou meio esquisito. Você também? Legal, prazer”.

Dessa vez, o público era mais velho, a maioria em torno dos 30 anos. Era o mesmo público, nove anos depois.

Dias antes do show, entrevistei Stuart Murdoch e perguntei como ele se sentia em relação às músicas do início da carreira da banda e ele respondeu, quase sem emoção na voz, que pensava nelas como velhas amigas.

Há na vida velhos amigos com os quais você se reconecta automaticamente em questão de segundos, aquelas mesmas afinidades, o papo retomado do mesmo ponto anos depois. Esses são raros. Com a maioria deles só existem lembranças e nostalgias, um querer bem sincero, mas uma sensação de que vocês se tornaram pessoas diferentes, seus caminhos se separaram para não se cruzar nunca mais e é melhor que seja assim. A maioria das músicas que o Belle and Sebastian tocou no Via Funchal se encaixa nesse segundo tipo.

A paciência com Stevie Jackson e suas composições fracas já não existe. “Travelin’ Light”? Com tanta coisa melhor no repertório? O tédio se estampava no rosto de todo mundo à minha volta. “Jonathan David” à capela, mais tempo jogado fora. Enquanto isso, o público implorava pelos hits indies que não vieram.

O show teve quase duas horas de duração e um punhado de músicas mal escolhidas, retiradas dos álbuns do meio da carreira da banda: “Step Into My Office, Baby”, “Sukie in the Graveyard”, “If You Find Yourself Caught in Love”, “Piazza, New York Catcher”.


Os clássicos vieram em doses bem homeopáticas, dispersos ao longo do show (“The Fox in the Snow”, “If You’re Feeling Sinister”, “The Boy with the Arab Strap”, “Sleep the Clock Around”). Aos primeiros acordes, o público comemorava, gritava, pulava, e ia estranhamente esfriando no decorrer da canção, arrebatado pela consciência de que alguma coisa havia se perdido com o tempo. O vídeo de “Fox in the Snow” registra bem isso (assista aqui).

E então veio o bis e tudo mudou. “Get Me Away From Here, I’m Dying” foi o catalisador para o calendário perder o sentido e tudo voltar ao que era. Os olhos se encheram de lágrimas, que disfarcei dançando com um sorriso no rosto. A letra veio completa da memória, um verso puxando o outro sem esforço. “Judy and the Dream of Horses” veio na sequência trazendo mais ânimo aos fãs saudosos, mas Marcelo Costa, tal qual um profeta do apocalipse, anunciou o fim: “Eles estão encerrando os shows com essa”. Droga.

Ele se enganou. A banda hesitou, mas permaneceu no palco mais um pouco e engatou “Me and the Major”, deliciosa como sempre foi. E acabou. Voltamos a 2010.

Leia também
– Vídeos do show: “Fox in the Snow”, “Jonathan David”/”Get Me Away” e “Me and Major” (aqui)
– Entrevista com Stuart Murdoch, do Belle and Sebastian, por Juliana Zambelo (aqui)
– Belle & Sebastian faz show morno para velhos fãs em São Paulo, por Juliana Zambelo (aqui)
– Emoção: Belle and Sebastian ao vivo no Free Jazz, 2001, por Marcelo Costa (aqui)

12 thoughts on “Belle and Sebastian ao vivo em SP

  1. engraçado, eu realmente não tinha expectativa sobre este show. tanto que nem me esforcei para tentar ir. agora, ouvi falar que dezembro tem white lies em sampa. oh, god.

  2. “Há na vida velhos amigos com os quais você se reconecta automaticamente em questão de segundos, aquelas mesmas afinidades, o papo retomado do mesmo ponto anos depois. Esses são raros. Com a maioria deles só existem lembranças e nostalgias, um querer bem sincero, mas uma sensação de que vocês se tornaram pessoas diferentes, seus caminhos se separaram para não se cruzar nunca mais e é melhor que seja assim”. Uma verdade posta com muita sensibilidade.

  3. sério, achei showzaço! além do que foi lindaço ver que durante “fox in the snow” a maioria das luzes produzidas pela platéia eram de isqueiros, e não de celulares.

  4. O show foi maravilhoso!
    As sensações, a energia, a vibração das pessoas quando a sua música preferida era tocada…
    Inesquecivel.

  5. Eu esperava mais….do público….
    B&S é minha banda favorita mas não pude ir no show de 2001 pq não tinha idade (tinha 16 e no Free Jazz, só maiores de 18) e estava com a maior ezpectativa! Achei a banda boa, os caras empolgados, mas o público…eu esperava todo mundo cantando tudo junto, mas a galera tava meio morna…menos no bis.

    Como sou muito fã, curti, mas achei que seria o show da minha vida! Esse título o B&S não tirou do inesquecível REM!

  6. “Há na vida velhos amigos com os quais você se reconecta automaticamente em questão de segundos, aquelas mesmas afinidades, o papo retomado do mesmo ponto anos depois. Esses são raros. Com a maioria deles só existem lembranças e nostalgias, um querer bem sincero, mas uma sensação de que vocês se tornaram pessoas diferentes, seus caminhos se separaram para não se cruzar nunca mais e é melhor que seja assim. A maioria das músicas que o Belle and Sebastian tocou no Via Funchal se encaixa nesse segundo tipo.”

    Lindo isso. Mas pra mim, b&s sempre foi do segundo tipo. Eles vem e vão na minha vida, mas nossa conversa nunca termina.

  7. B&S:
    dois discos magníficos, os dois primeiros – principalmente Tigermilk.

    Dois ou três singles legais, um terceiro disco nota 6 e pouquinho,
    um quarto nota 5 e posteriores que não passam de ano.

    Um culto inexplicável num país inexplicável.

    B&S é o Iron Maiden delicado, se é que me entendem…

  8. Belle and Sebastian já foi minha banda favorita.

    Hoje sinto tristeza por eles não terem parado na hora certa. Costumo brincar que a banda acabou quando a Isobel saiu, que o Dear Catastrophe Waitress foi o disco póstumo e que esses aí do show no Brasil são impostores.

  9. eeee gente saudosista. quer que a banda faça sempre o mesmo disco? quer assistir ao mesmo show de 10 anos atrás?

  10. Eu não diria saudosistas, mas críticas. Ninguém reclama do Radiohead tocar músicas novas. Até o R.E.M. faz bonito com novo repertório no palco. O Wilco, apesar dos discos recentes não serem lá uma Brastemp, faz as canções crescerem – mesmo as novas. No caso do Belle and Sebastian, não. As músicas novas perdem feio para as velhas.

  11. O show foi ótimo. Não somos mais adolescentes. É claro que o show não seria igual. Pra quem conhece todos os discos, foi demais.

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