Entrevista: Kid Vinil

por Marcos Paulino

Se você tem mais de 30 anos, Kid Vinil dispensa apresentações. Caso seja mais jovem, saiba que ele é uma espécie de faz-tudo quando o assunto é rock. Tem muitas histórias pra contar do rádio, da TV, do underground e do mainstream. Já experimentou os holofotes da fama nos anos 80, depois de ter sido um dos precursores do punk no Brasil. Já marcou época com programas radiofônicos e televisivos. E conhece o mundo pop como poucos.

Seu currículo de bons trabalhos prestados ao rock and roll nacional inclui trabalhos com nomes lendários como o grupo punk Verminose, o pós punk new wave do Magazine (que estourou nos anos 80 e ensaiou uma retomada no começo dos anos 2000 com o bom disco “Na Honestidade”), o rock and roll com toques de blues do Kid Vinil e os Heróis do Brasil (com André Christovam na guitarra) e mais (vale fuçar a biografia do cara aqui).

Agora, Kid mantém uma coluna semanal no site Yahoo (leia aqui) e está trabalhando no lançamento do primeiro CD da Kid Vinil Xperience, banda que o acompanha nos seus shows, apresentando as músicas que fizeram parte de sua carreira. É formada por Carlos Nishimiya (guitarra), Fábio McCoy (bateria) e Carlos Rodrigues (baixo). Nesta entrevista ao PLUG, parceiro do Scream & Yell, ele lança seu olhar sobre o passado e o presente do rock nacional.

Qual a relação de Kid Vinil com o público jovem? Eles sabem que você é autor de hits como “Sou Boy” e “Tic Tic Nervoso”?
Os mais espertos até sabem que eu cantava essas músicas, mas tudo depende do interesse de cada um. Existem jovens interessados na música dos anos 80, não é uma maioria, mas sempre encontro pessoas me perguntando sobre as músicas e até fico espantado deles conhecerem meu trabalho. Mas isso é fruto daquilo que nós plantamos na década de 80 e sucesso é uma coisa que fica pra sempre, ainda bem!

Como você, que fez sucesso na época áurea do rock nacional, analisa a nova geração de bandas brasileiras?
A década de 80 foi uma época muito boa pro rock brasileiro, pois toda a mídia abria espaços para as novas bandas. Hoje é diferente. Existe uma geração de bandas para adolescentes, os chamados coloridos ou emos, que fazem sucesso com o investimento de grandes empresários. O rock de qualidade está na cena mais alternativa e nos festivais independentes. Curto mais essa turma dos independentes.

Falta uma ditadura (ou ao menos lembranças mais recentes dela) pra fazer a molecada transgredir mais, musicalmente falando?

Não exatamente isso, mas as coisas mudaram a partir da década de 90. A música mais popular no Brasil dominou as rádios e a TV com pagode, sertanejo, axé, funk. O rock perdeu espaço e, a partir disso, só produtos comerciais fazem sucesso. A culpa não é do sistema e da liberdade de expressão que vivemos, mas os grandes culpados são os caras que manipulam o poder das rádios, da TV e da imprensa, enfim, os megaempresários. Nada vai mudar esse cenário, infelizmente, pois a grana é que movimenta o mundo artístico hoje em dia, talento pouco importa. O jovem está cômodo nessa situação e não vai fazer nenhuma revolução pra mudá-la. É triste pensar nisso, mas é a verdade. Os tempos revolucionários se foram, o rock e a música brasileira de qualidade agonizam em nosso país.

E do cenário internacional, quais são as suas observações?
O cenário internacional, contrário a tudo que vivemos, ainda preserva suas raízes de criadores do rock e mantém bons projetos tanto na Europa quanto nos EUA. A cena independente lá fora é bem organizada, os jovens universitários ouvem boa música e são bem informados. A imprensa valoriza as coisas boas, as rádios abrem espaço pra música de qualidade. É bem diferente daqui. O problema é que muita gente acha que o rock independente de lá está em baixa, mas nem sequer ouve e tenta entender as novas propostas. É muito comum baixar qualquer coisa na internet, mas antes é preciso ter uma noção de boa música pra avaliar as novidades e isso é pra poucos ou pros mais espertos, que leem as melhores publicações da internet.

Você foi um dos precursores do punk brasileiro. Restou alguma coisa (que preste) daquela época?
As bandas mais tradicionais, como Cólera, Inocentes e Garotos Podres ainda estão na ativa. Acho que esses caras fizeram um movimento naquela época e continuam em atividade, isso é que importa.

Também consta em seu currículo uma fase de muitos holofotes, com o Magazine. Era mais difícil naquele período passar do underground para o mainstream?
Talvez, pois a mídia estava de olho em tudo que acontecia e dava o maior apoio pras novas bandas. Daí era muito mais fácil uma banda underground assinar com uma grande gravadora e fazer sucesso. Existem muitos exemplos de gente que começou no underground e depois assinou com uma grande gravadora, vide Legião, Titãs, Ira!, Capital, Plebe Rude etc.

A rádio é uma de suas paixões. Falta mais variedade às emissoras brasileiras hoje?
Com certeza, mais variedade e conhecimento musical, mas existem muitos interesses financeiros por trás disso tudo e isso impede a criatividade. Se não tocam coisas mais interessantes é porque têm medo de perder audiência. Trabalhei muito em rádio e lembro que, quando a audiência estava caindo, a única coisa que eles queriam era que a gente tocasse só músicas manjadas e sucessos de que o povo gosta, pro ibope subir. É isso que as rádios fazem até hoje. (Elas) têm medo de ariscar no novo ou no mais obscuro e no lado B da música. Uma pena!

Você é um dos que vê uma ditadura emo/sertaneja nas rádios?
Não é ditadura, é grana que fala mais alto, isso gera muito dinheiro e interesses de grandes empresários.

Você apresenta programas de TV desde a época pré-internet. Como era lidar com música e imagem naquele período?
Fazer TV era bem interessante, diferente do rádio, que era só abrir o microfone e sair apresentando música. Na TV é preciso produção, tem muitos detalhes e regras para se cumprir. Não dá pra ter a mesma liberdade do rádio, mas sempre fiz TV do que jeito que gostava, pois eu mesmo fazia meus roteiros e minha produção musical. Até mesmo o guarda-roupa era meu. Gosto de fazer TV assim, com toda liberdade.

Que tipo de programa de TV você gostaria de fazer hoje?
Um programa nos moldes do “Lado B” ainda faz falta, eu curtia demais apresentá-lo.

Que som você tem escutado ultimamente?
Muita coisa. Dos brasileiros, Haxixins, Do Amor, Falcatrua, Dead Lovers Twisted Heart, Superguidis, Tambourines, Garotas Suecas. Dos gringos, Warpaint, Ariel Pink’s Haunted Grafitti, Tame Impala, Tweak Bird, Of Montreal, Surfer Blood, Dum Dum Girls, Arcade Fire, Ttus Andronicus, Gaslight Anthem.

E qual você não escuta de jeito nenhum?
Passo batido em todos esses emos, tipo Restart, Strike, Fresno etc. E nem os emos de lá de fora, tipo Fall Out Boy, Panic at the Disco, Simple Plan etc.

A quantas anda o Kid Vinil Xperience? Vai sair um disco?
Sim, já entrou na fábrica e receberemos em breve. O nome do CD é “Time Was” e será um disco de obscuridades que gravamos da década de 60, não tem nenhuma música conhecida. Era um disco que eu queria fazer há muito tempo e tem a cara do Xperience. Será uma produção independente e venderemos em nossos shows.

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Marcos Paulino é jornalista e editor do caderno Plug, do jornal Gazeta de Limeira

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