Guerra ao Terror, de Kathryn Bigelow

por Marcelo Costa

Meses atrás, se alguém perguntasse sobre a carreira da cineasta Kathryn Bigelow, poucos saberiam citar um filme da diretora. Provável que ninguém se lembrasse de que ela é ex-mulher de James Cameron, o diretor todo-poderoso dono das duas maiores bilheterias da história do cinema: “Avatar” e “Titanic”. Porém, desde que “Guerra ao Terror” (“The Hurt Locker”) chegou aos cinemas em setembro passado, a mulher foi alçada a grande nome do momento e viu seu filme arrebatar nove indicações ao Oscar.

Kathryn havia dirigido oito filmes, sendo o mais famoso deles – para os brasileiros – a aventura “Caçadores de Emoção”, de 1992 (que mês sim, mês não, está na Sessão da Tarde). Em 2002, “K-19”, estrelado por Harrison Ford, fracassou nas bilheterias, e Kathryn Bigelow decidiu tirar férias da indústria cinematográfica, curiosamente assim como seu ex-marido, e decidiu voltar à baila no mesmo momento em que James Cameron colocava seu projeto mais ambicioso em prática.

As coincidências são bastante curiosas. “Guerra ao Terror” e “Avatar” arrebataram o mesmo número de indicações da Academia (nove), inclusive emparelhando-se nas duas categorias principais: Melhor Filme e Melhor Diretor. Mais: enquanto o primeiro foi laureado com os prêmios de Melhor Filme e Melhor Diretor de 2009 pela National Society of Film Critic (a crítica norte-americana), o segundo saiu aclamado do Globo de Ouro (a crítica estrangeira que trabalha nos Estados Unidos) com os mesmos prêmios.

Agora, esqueça tudo isso. E lembre-se do personagem de Robert Duvall na antológica cena de “Apocalispse Now” (eleito o melhor diálogo do cinema anos atrás – veja aqui), de Francis Ford Coppola, inebriado com o cheiro de napalm. “Você consegue cheirar isto? Cheire isto? É Napalm, filho. Nada no mundo tem um cheiro semelhante. (…) Sabe, uma tarde bombardeamos uma colina por doze horas. Quando tudo acabou eu subi a colina. (…) O cheiro, toda a colina… cheirava a vitória.”

“Guerra ao Terror” abre com uma citação do livro “War Is a Force That Gives Us Meaning”, do correspondente do New York Times, Chris Hedges. A citação diz: “O calor de batalha é um vício poderoso e muitas vezes letal, porque a guerra é uma droga”. E reforça: “A guerra é uma droga”. O que Kathryn busca nos 131 minutos de “Guerra ao Terror” é expor esse vício ao público, mas ela conseguiu transcender a história e não fez apenas um filme de e sobre a guerra, mas um empolgante e angustiante thriller de ação.

O roteiro assinado por Mark Boal, um jovem escritor que acompanhou um esquadrão antibombas, foca em três soldados norte-americanos que passam seus dias desarmando bombas no Iraque. A tensão é imensa, e a primeira cena tem tudo o que um fã de bom cinema admira. Um novo chefe chega ao agrupamento, louco a ponto de desarmar bombas sem toda a parafernália necessária, mas bom a ponto de desarmar meia dúzia de bombas em dois minutos.

“Guerra ao Terror” joga o público na rotina diária dos esquadrões antibombas. Coloca o espectador na posição de cúmplice, que observa e admira, em uma emboscada, em que o futuro do soldado tem apenas duas saídas: viver ou morrer. A cena é angustiante e, ao mesmo tempo, belíssima. Em certo momento, o sargento William James (Jeremy Renner), o tal maluco, pede água para matar sua sede, mas opta por abastecer a garganta de seu companheiro atirador (e desafeto), e permanecer com a boca seca.

William James é casado com Connie, (Evangeline Lilly, da série Lost) e tem um filho. Enquanto dezenas de soldados contam os dias para o fim de sua missão, James coleciona lembranças de bombas que desarmou. A família está em segundo plano. O próprio país não importa. James está viciado na adrenalina da guerra assim como o tenente-coronel Bill Kilgore (Robert Duvall) era viciado no cheiro de Napalm. O campo de batalha é sua vida. A guerra é sua droga.

Kathryn Bigelow filma com excelência e consegue um resultado surpreendente. O filme, que havia sido destinado à prateleira de DVDs no Brasil (já está nas locadoras desde dezembro sem ter passado pelos cinemas antes), ganhou sobrevida com as indicações, e estreou no país em fevereiro. Nada mais justo. “Guerra ao Terror” é para ser visto em uma tela grande. Na sala escura, o espectador poderá encolher-se na cadeira e apertar o estômago enquanto procura entender o vício a que é apresentado. E ver um grande filme. Será que o Oscar vai fazer justiça?

Leia também
– “Avatar”, de James Cameron, uma bobagem que surpreende, por Marcelo Costa (aqui)
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Marcelo Costa é editor do Scream & Yell e assina o blog Calmantes com Champagne

10 thoughts on “Guerra ao Terror, de Kathryn Bigelow

  1. Assino embaixo, o filme é muito bom mas, colocar ao lado do Avatar nas indicações é meio forçar a barra. E falo isto pelos critérios da academia, não pelos meus. Eu acho que eles(academia) estão querendo enfatizar a idéia dos soldados serem voluntários e do vício da guerra e se mostrarem arrependidos de tudo do que propriamente um bom filme.
    O engraçado de tudo isto é que talvez até americanos não entendam q os soldados são voluntários, duvido que no Brasil, mais de 12% das pessoas entenda isto.
    Mesmo assim, um ótimo filme.

  2. O filme não merece o Oscar!!!!!!!!!!!!!

    Me parece mais uma campanha convocando mais jovens para ir lutar na guerra por petroleo!!!!!!!!!!! Vi bem representado a ideia calvinista da predestinação e tambem o imaginário dos norte americanos de que eles e somente eles são capazes.

    O William James, mais me pareceu um daqueles herois(fodão) predestinado e obstinado a lutar pela sua patria onde deixou sua familia, o super soldado que sacrifica a vida familiar em favor da patria na luta contra um povo cruel assassinos de sua proprias crianças!!!!!!!!!!

    Percebi ainda, que no filme todos os iraquianos são potenciais terroristas e os soldados do EUA, são as vitimas de ataques e armadilhas covardes. Já os iraquianos aparecem como selvagens e ingratos que recebem com terror os paladinos da justiça, da paz e os defensores da Liberdade.

    Não posso dizer que o filme não transmite a angustia dos soldados n. americanos porque isso é obvio, mas a diretora pouco se preocupou em mostrar um pouco da guerra e dos atos terroristas vistos a partir da perspectiva dos iraquianos que tiveram seu pais invadido, e ainda tem suas crianças em meio ao fogo cruzado dessa guerra por petroleo!!!!!!!!!!!!

  3. Guerra ao Terror (The Hurt Locker) saiu no Brasil em DVD em abril de 2009 ! É realmente um ótimo filme sobre a guerra, mas não faz apologia da guerra, não é tendencioso, simplesmente mostra a realidade dos soldados desarmando bombas, fazendo o seu trabalho (certo, errado, estúpido ???).
    Enquanto a diretora Bigelow se arrastava e suava nas areias de algum deserto para fazer CINEMA, seu ex-marido Cameron comandava um esquadrão de GERENTES DE CENAS para FABRICAR AVATAR, fazendo cinema com letras minúsculas, pois só tem visual. Aguardo ansioso o Blu-ray de Guerra ao Terror !!!!

  4. meu pai viu o filme antes desse fuzuê de premios que o filme ganhou e nao gostou nem um pouco, o que achei estranho. Quando finalmente vi o filme, nao concordei com ele, eu gostei bastante do filme, a direção é otima, a historia é interessante, mas para mim, se perdeu um pouco na metade final (o que nao prejudica o todo).
    Mas considerei o mais fraco dos indicados a melhor filme, daria sem dúvida para Bastardos Inglórios, tanto no filme quando na direção e roteiro. Vai entender.

  5. Vi “Guerra ao Terror” e sinceramente achei fraco, não merecia mesmo os Oscars de melhor filme e direção, me senti um pouco mal pelo James Cameron também hahaha perder para a ex mulher é complicado! Ma so que importa é a injustiça, quem quiser pode dar uma olhada.. escrevi um post não muito amigável para “Guerra ao Terror” ..ainda acho Avatar bom demais para se deixar de lado!

    http://alenevesmkt.blogspot.com/

    Valeu!

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